Discurso durante a 89ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre a execução orçamentária de 2004 no que tange ao Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP). (como Líder)

Autor
Demóstenes Torres (PFL - Partido da Frente Liberal/GO)
Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Considerações sobre a execução orçamentária de 2004 no que tange ao Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP). (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 25/06/2004 - Página 19430
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), LIMITAÇÃO, PROBLEMA, SEGURANÇA PUBLICA, COMBATE, DESIGUALDADE SOCIAL.
  • REPUDIO, AUSENCIA, EXECUÇÃO ORÇAMENTARIA, FUNDO NACIONAL, SEGURANÇA PUBLICA, DENUNCIA, DESVIO, GASTOS PUBLICOS, MORDOMIA, PASSAGEM AEREA, GOVERNO, REGISTRO, DADOS, SISTEMA INTEGRADO DE ADMINISTRAÇÃO FINANCEIRA (SIAFI).
  • CRITICA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), PROPOSTA, ALTERNATIVA, PENA, LIBERDADE, PRESO, MOTIVO, INCOMPETENCIA, SISTEMA PENITENCIARIO, REGISTRO, DADOS, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO), AUMENTO, VIOLENCIA, ESPECIFICAÇÃO, JUVENTUDE.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO. Pela Liderança do PFL. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, “A segurança da humanidade é indivisível” - Luiz Inácio Lula da Silva.

Desde quando foi advogado de presos políticos no Brasil, o Ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, vem recebendo as louvaminhas de uma esquerda de baixa qualidade intelectual e, agora, no Poder, dotada de indispensável paixão pela cortesia. Há no Governo do Excelentíssimo Senhor Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, quase uma adoração pelas inclinações liberalizantes do Dr. Bastos em matéria de Direito Penal, especialmente quando o Ministro, ao discorrer sobre as causas sociais da violência, promove expansões filosóficas no sentido de que o fim da criminalidade seria corolário da superação das desigualdades sociais.

Uma vez exaurido o passivo social, ensina Bastos, a segurança pública brotaria por algum método de reprodução espontânea, ao passo que as normas penais iriam perdendo o sentido por uma questão consuetudinária. Belo raciocínio acerca de uma completa balela. Estamos ingressando no sétimo mês de 2004, e o Ministro Márcio Thomaz Bastos continua no lelelê, enquanto não consegue executar o Orçamento do Fundo Nacional de Segurança Pública no que se refere ao financiamento das políticas de proteção do povo brasileiro. Ao mesmo tempo, incorre em desvio de finalidade ao mandar para o balcão das companhias aéreas recursos destinados à aquisição de viatura, armamento e remuneração de policiais, por exemplo.

Sr. Presidente, o Governo Lula teve o desplante de executar do Orçamento do Fundo Nacional de Segurança Pública, conforme dados do Siafi, até ontem, apenas 0,08% da dotação de pouco mais de R$366 milhões. Ou seja, pagou exatamente R$295.358,49, sendo que deste valor 56%, R$166.786,81, foram destinados à quitação de passagens aéreas e despesas de locomoção.

Para encontrar facilidades na obtenção de mordomia, o Governo Lula está conferindo caráter orgânico a ficções legislativas, como se os Fundos que o PT administra deixassem de ser unidades orçamentárias para se tornarem repartições no sentido físico da burocracia. Então, no Fundo Nacional de Segurança Pública existe um Programa de Trabalho denominado Sistema Integrado de Formação e Valorização dos Servidores, onde foram empenhados R$300 mil com diárias; R$860 mil com passagens aéreas; R$300 mil com serviços de terceiros - pessoas físicas; e R$700 mil com serviços de terceiros - pessoas jurídicas.

Eu gostaria de saber como um Fundo contrata serviço, paga diária e viaja de avião. Não fosse o flagrante desvio de finalidade, impressiona o ânimo de locomoção que está sendo financiado com recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública. Com os R$860 mil empenhados é possível adquirir, por exemplo, aproximadamente 2,8 mil passagens aéreas de Brasília a São Paulo. Considerando-se uma média de 20 dias úteis mensais, seriam 120 dias disponíveis para viagem a trabalho nos primeiros seis meses de 2004, o que significa dizer que o Fundo Nacional de Segurança Pública disponibilizou verba para custear o equivalente a algo como 24 viagens por dia no trecho Brasília-São Paulo.

O Governo Lula não tem dinheiro para complementar os salários dos policiais. Não consegue investir em sistema de inteligência e polícia cientifica. Não há recursos para capacitação das instituições. Enfim, o cofre está hermeticamente fechado para o essencial, mas não falta o estipêndio para custear vantagens indiretas da honorável classe do Partido dos Trabalhadores.

O Governo poderia justificar que tamanho comparecimento dos lulacratas ao setor de embarque dos aeroportos se deve ao imprescindível exercício do direito de ir e vir dos membros do Conselho Gestor do FNSP. A escusa pode até explicar, mas não se justifica. O Conselho é composto por dois representantes do Ministério da Justiça, um representante de cada um de outros três Ministérios e da Procuradoria-Geral da República. O que é de razoável economia administrativa supor que se trata de agentes públicos que moram, trabalham ou se reúnem em Brasília.

Srªs e Srs. Senadores, o texto da Lei nº 10.201, de 2001, que instituiu o Fundo Nacional de Segurança Pública, é claro no seu art. 4º, em que relaciona que o FNSP apoiará projetos na área de segurança pública destinados, dentre outros, a:

I - reequipamento, treinamento e qualificação das polícias civis e militares, corpos de bombeiros militares e guardas municipais;

II - sistemas de informações, de inteligência e investigação, bem como de estatísticas policiais;

III - estruturação e modernização da polícia técnica e científica;

IV - programas de polícia comunitária; e

V - programas de prevenção ao delito e à violência.

De acordo com o espírito da lei, a listagem não é exaustiva, mas não há hermeneuta que consiga incluir o turismo ministerial no rol das políticas de segurança pública. Este Governo, como um todo, tem uma atração fatal pela movimentação aeroportuária, mas é espantoso como se pratica no Ministério da Justiça o desejo de voar e torrar o carvão do contribuinte com diárias.

Imaginei que o Governo Lula, em matéria de segurança pública, já tivesse exaurido o seu paiol de bobagens, mas, na semana passada, durante audiência na Comissão de Segurança da Câmara dos Deputados, o Ministro Márcio Thomaz Bastos fez uma declaração singular. Ao reconhecer que a União é incapaz de promover a melhoria do sistema prisional, o Dr. Bastos lançou mão da seguinte singeleza: “O Brasil precisa adotar as penas alternativas”.

(A Srª Presidente faz soar a campainha.)

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Já estou concluindo, Srª Presidente.

Srªs e Srs. Senadores, sinceramente não consigo entender o que pretende o Ministro da Justiça. Seria o Dr. Márcio Thomaz Bastos um Simão Bacamarte às avessas? Trata-se do personagem principal de Machado de Assis em O Alienista. Médico e cientista de inúmeros títulos e enorme reputação, Bacamarte montou um asilo e cuidou de internar quase todos os moradores de uma cidade, depois de promover acurados estudos acerca da loucura. Em uma sanha delirante, o médico reavaliou os resultados e passou a considerar mentecapto quem possuía perfeita sanidade. Por fim, Simão Bacamarte internou a si mesmo solitariamente no asilo da Casa Verde e morreu, apesar “do enterro com muita pompa e rara solenidade” com a reputação de ter sido o único louco da pequena Itaguaí.

Srª Presidente, se possível, concedo um aparte ao Senador José Jorge.

A SRª PRESIDENTE (Serys Slhessarenko. Bloco/PT - MT) - Não é possível.

A SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Então, vou apenas concluir.

Srªs e Srs. Senadores, o Ministro da Justiça possui mesmo uma extraordinária capacidade de simulação. Com habitual laconismo parece audaz quando recomenda que o Brasil precisa devolver às ruas parte preponderante da população carcerária porque o Governo Lula não tem capacidade de manter o sistema prisional operando com segurança e probidade. Vejam que, neste País, rigorosamente só cumpre pena em regime fechado quem comete crime hediondo e assemelhado ou é condenado a mais de oito anos por homicídio, por exemplo. Ninguém mais vai para a cadeia pela prática de furto, receptação, lesão corporal grave, estelionato ou homicídio culposo. A regra da liberalizante legislação brasileira já é a da mínima privação da liberdade.

Definitivamente, não é fácil para um criminoso conseguir cumprir pena em regime fechado no Brasil. Sem uma vasta biografia criminal gravada na periculosidade e na reincidência, praticamente ninguém fica preso neste País. Isso é vergonhoso, mas o Governo Lula acha pouco e pretende criar ambiente político para adocicar ainda mais o sistema penal. O pior é que esta Casa está corroborando para piorar a situação da segurança pública no Brasil. No ano passado foi aprovado o fim do exame criminológico, um evidente retrocesso, e rejeitada a adoção do Regime Diferenciado de Segurança Máxima para os presos de grande periculosidade e envolvidos com o crime organizado.

Srª Presidente, há duas semanas, a Unesco, em conjunto com o Instituto Ayrton Senna e a Secretaria Especial de Direitos Humanos, divulgou a quarta edição do Mapa da Violência no Brasil, cujos resultados apontam para uma catástrofe cotidiana, especialmente em relação aos jovens entre 14 e 24 anos. De acordo com os números, na década decorrida entre 1993 e 2002, o número total de homicídios no País saltou de 30.586 para 49.640, o que representa um incremento de 62,3%, enquanto a taxa de crescimento populacional foi de apenas 15,2%. Isso significa um aumento anual de 5,5%. Considerando-se que a variação a cada ano é de mais ou menos dois mil homicídios a mais, pode-se inferir que, em 2004, vamos contabilizar alguma coisa próxima de 54 mil homicídios.

(A Srª Presidente faz soar a campainha.)

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Para concluir, Srª Presidente, o Mapa da Violência IV demonstra que a população jovem é a mais atingida pela carnificina. De acordo com os dados, a taxa de homicídios em 1993 para a população total era de 20,3 para um grupo de 100 mil habitantes. Já para os jovens entre 15 e 24 anos, o índice era de 34,5 para um grupo de 100 mil habitantes. Em 2002, o indicador para a população total subiu para 28,4 por grupo de 100 mil habitantes, enquanto entre jovens o índice saltou para 54,7 para um grupo de 100 mil habitantes.

Outro dado interessante e que reforça o entendimento de que o Governo Lula faz cara de paisagem para o maior problema social deste País é o fato de que, em relação a 1980, a taxa global de mortalidade caiu, mas cresceu quando é estudada a faixa etária entre 15 e 24 anos. O Brasil, vale repetir, entre 67 países pesquisados pela Organização Mundial da Saúde, situa-se em quarto lugar em número de homicídios, perdendo apenas para Colômbia, El Salvador e Federação Russa, nações que vivem em permanente conflagração. A situação é tão séria, que o peso do Brasil é preponderante para jogar as estatísticas da América Latina no pior do Terceiro Mundo. A Organização Mundial da Saúde, em estudo publicado no início do mês e intitulado...

(A Srª Presidente faz soar a campainha.)

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Estou no último parágrafo, Srª Presidente.

A Organização Mundial da Saúde, em estudo publicado no início do mês e intitulado “A Dimensão Econômica da Violência Interpessoal”, aponta que houve no mundo 199 mil homicídios praticados contra jovens. Só o Brasil contribuiu com 10% dos assassinatos. Caso o Presidente Lula dedicasse aos brasileiros a mesma preocupação que dedica à humanidade, certamente, o primeiro-funcionário descobriria que o Haiti é aqui.

Muito obrigado, Srª Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/06/2004 - Página 19430