Discurso durante a 102ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários ao pronunciamento do Sr. Aloizio Mercadante. Análise do otimismo do governo Lula.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Comentários ao pronunciamento do Sr. Aloizio Mercadante. Análise do otimismo do governo Lula.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 04/08/2004 - Página 24208
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, DISCURSO, ALOIZIO MERCADANTE, SENADOR, LIDER, GOVERNO, CONTESTAÇÃO, INEXATIDÃO, ANALISE, SITUAÇÃO, PAIS.
  • ESCLARECIMENTOS, IMPOSSIBILIDADE, MANUTENÇÃO, SUPERIORIDADE, CRESCIMENTO, BRASIL, AUSENCIA, INFLAÇÃO, ANALISE, LIMITAÇÃO, PERIODO, RETOMADA, CRESCIMENTO ECONOMICO.
  • NECESSIDADE, INVESTIMENTO, INDUSTRIA, AMPLIAÇÃO, CAPACIDADE, PRODUÇÃO, PREVENÇÃO, IMPORTAÇÃO, ABASTECIMENTO, MERCADO INTERNO.
  • ANALISE, PROBLEMAS BRASILEIROS, DESEMPREGO, INFERIORIDADE, RENDA, TRABALHADOR, DEPENDENCIA, CAPITAL ESTRANGEIRO, CRITICA, POLITICA EXTERNA, POLITICA, REFORMA AGRARIA, POLITICA AGRICOLA, FALTA, CONTROLE, CORRUPÇÃO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, NEGLIGENCIA, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, ANTONIO PALOCCI, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), RESSALVA, POLITICA, JUROS.
  • REGISTRO, RECEBIMENTO, OFICIO, PRESIDENTE, BANCO DO BRASIL, AUSENCIA, ESCLARECIMENTOS, REMESSA DE VALORES, EXTERIOR.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, acompanhei o cerne do pronunciamento do nobre Líder Aloizio Mercadante, que estava muito na linha do discurso do Dr. Pangloss, analisando a realidade brasileira sob uma ótica exageradamente otimista. Tenho a impressão de que se deve lutar para realizar coisas boas no País, mas evitando o panglossianismo, que beira a ingenuidade, e, em matéria de política e de gestão da coisa pública, beira a insensatez.

Contarei às Srªs e aos Srs. Senadores um episódio do Governo passado. É muito bom a democracia brasileira se consolidar, porque são experiências que vão dando a quem já as viveu a possibilidade de olhar de maneira até privilegiada os fatos que estão a ocorrer na cena seguinte da política brasileira. Era voz corrente na equipe econômica do Presidente Fernando Henrique Cardoso - competente equipe, como o é a liderada pelo Ministro Antonio Palocci - que o Brasil cresceria não menos do que 15% entre 2000 e 2002 e que a inflação atingiria algo parecido com 13%, no máximo 14%, nos três anos acumulados. Logo, o Brasil viveria algo inédito em sua fase de República moderna: um triênio em que o crescimento do Produto Interno Bruto seria maior do que o crescimento nesse triênio da inflação acumulada. Isso era transmitido pela equipe econômica e, em seguida, os políticos ligados ao então Presidente Fernando Henrique Cardoso faziam as contas: “Com um quadro desses, não se perde eleição!”

Enfrentamos tantas crises de fora para dentro - e este Governo ainda não vivenciou nenhuma! - , enfrentamos tantos problemas, alguns com dados de deficiência do próprio Governo, do qual fui Líder no Congresso; outros, marcados por crises que nada tinham a ver com o que pudesse, ou devesse, ou que não pudesse ou não devesse fazer o Governo do ex-Presidente Fernando Henrique Cardos. O fato, Senador Leonel Pavan, é que as coisas não se passaram dessa forma.

Hoje, mais do que nunca, temos a obrigação de ser sinceros para com a nossa sociedade. O Brasil não tem possibilidade de crescer 5% em três anos seguidos sem a inflação dar o seu malfadado sinal de graça. Não é possível! O Brasil não conta com investimentos significativos a ponto de haver a alteração essencial na infra-estrutura brasileira que permita uma oferta maior de produtos, suficiente para prosseguir o esforço exportador e para fazer face a um consumo interno exigente.

Do jeito que as coisas se colocam, com a retomada que aí está e que deslumbra tanto o meu querido amigo Senador Aloizio Mercadante, mas que não passa de uma reposição cíclica, comparada com a base deprimida do ano passado, que teve crescimento negativo do PIB, não temos mais do que isso até o momento.

Todavia, alguns dos principais setores industriais do País estão com cerca de 90% da sua capacidade de produção exaurida. Ou seja, precisamos urgentemente de investimentos nesse setor, sob pena de termos novamente aquele impasse que já sabemos como será resolvido: rareia o produto e se utiliza o recurso da importação para baratear o preço desse produto. Isso significa diminuir o saldo da balança comercial brasileira e, em contrapartida, aumentar a taxa inflacionária, que levará inevitavelmente ao aumento da taxa de juros, que, por sua vez, conduzirá a uma maior restrição do crédito e, portanto, a um crescimento econômico medíocre.

Darei um dado, e serei bastante ponderado: se o Brasil crescer 3,5% ou 3,7% neste ano - cresceu menos 0,2% no ano passado -, no biênio, terá crescido um vírgula alguma coisa. Ou seja, dois vírgula qualquer coisa foi o que cresceu o Brasil nos últimos 20 anos, em média. Se não me engano, cresceu 2,4% ou 2,5% durante o período do Governo do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, em que houve tantas crises internacionais.

É muito pouco! É muito pouco porque temos a necessidade de fazer este País crescer de maneira sustentável a taxas acima de 4% ao ano, sob pena de sequer abrigarmos a mão-de-obra jovem que chega anualmente ao mercado de trabalho e, nem de leve, eliminarmos de maneira substancial os estoques antigos de desempregados.

Impõe-se, pois, o realismo. A taxa de investimento é baixa. O Brasil poderá este ano, quem sabe, beirar os 20%; e isso como proporção do PIB é muito pouco. A economia brasileira teria de ser capaz de investir 25% a 28% do Produto Interno Bruto a cada ano. Os 18% do ano passado são ínfimos; os 20% deste ano são insuficientes; os 22% ou 23% do auge do Plano Real, no Governo Fernando Henrique Cardoso, eram insuficientes também, eram insatisfatórios.

Daí o Governo vem com o jargão: “Geramos 800 mil empregos no ano não sei de quê”. Sabemos que somente a demanda da mão-de-obra jovem é acima de 1,5 milhão de pessoas/ano. Ou seja, o certo seria dizer: “Amenizamos o desemprego” - seria mais honesto -, e não dar a impressão de que se está efetivamente enfrentando e vencendo o déficit de postos de trabalho, que se contrasta com a evidente e natural sobra de mão-de-obra.

Temos problemas graves. O ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso analisava com muito realismo o quadro brasileiro. E dizia: “Teremos problemas no governo se não conseguirmos fazer a renda subir”. Não temos visto significativa mexida positiva na renda do trabalhador neste País. Isso significa que não se pode pensar em sustentar o crescimento com base na poupança interna. A poupança externa se afugenta do Brasil na medida em que não consegue, sob o Governo Lula, espancar as dúvidas quanto aos marcos regulatórios.

Este ano, o Brasil não atinge, com certeza, os US$10 bilhões de IED - Investimentos Estrangeiros Diretos. E o Brasil já chegou, no primeiro Governo do ex-Presidente Fernando Henrique, a US$32 bilhões de Investimos Estrangeiros Diretos. E, no ano que vem, não há perspectiva de ultrapassar a marca medíocre deste ano.

O País passou meses, Senadora Lúcia Vânia, recebendo algo como US$200 milhões, valor que tem merecido do capital estrangeiro a Venezuela do coronel Hugo Chávez, ou a Argentina conflagrada dos presidentes Kirchner, Duhalde e Menem.

O Presidente se vangloria de uma política externa que, a meu ver, é irrealista: perde um tempo enorme anistiando dívidas de países muito pobres, como se isso garantisse algum prestígio ao Brasil; aferra-se à tese démodée de o Brasil ter assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Essa é uma tese superada. O Brasil deveria, ao contrário, lutar para renovar a ONU e para que qualquer país - leia-se: Estados Unidos - deixe de ter poder de veto no Conselho. Isso, sim, daria peso a esse organismo multilateral. A idéia de fazer esse malabarismo todo visando a chegar ao Conselho de Segurança da ONU já deveria ter sido compreendida, até pelo Governo passado, como uma tese inócua, que não representa nada, até porque, no momento atual, está em crise o multilateralismo, e quem não representa nada é a própria ONU.

O Presidente se expõe a vexames: desfila com o ditador do Gabão, frio assassino das esperanças do seu povo; e já fez algo parecido quando assinou comunicado conjunto com o ditador da Síria. Nisso tudo, o lado humanista, o lado ético estão sendo agredidos e leva os investidores estrangeiros a pensarem com calma e com medo na perspectiva de aplicarem aqui seus capitais de maneira duradoura, futurosa.

O Governo brasileiro tem um Ministro que acende fósforo à gasolina. É o Ministro Miguel Rossetto, do Ministério do Desenvolvimento Agrário, que acaba de dizer que essas ocupações de terra ilegais e essas agressões às propriedades produtivas não têm nada a ver com a estabilidade do regime e do País. S. Exª entende que tudo está se processando na máxima normalidade. E as notícias são de morte de sem-terra ou de com-terra, de instabilidade, de agressão diária à Constituição. A longo prazo, isso não será bom para o carro-chefe das exportações brasileiras, que é o agronegócio. A longo prazo, isso será ruim, assim como o aparelhamento do Estado, a longo prazo, será absolutamente danoso para o futuro de uma empresa como a Embrapa, que, hoje, perde muito tempo com a agricultura familiar, como se fosse esse o seu dever, esquecendo-se de que a solução para se gerarem os recursos e os empregos de que carece o País está antes no agronegócio, na agricultura competitiva, que seja capaz de gerar cada vez mais divisas no jogo exportador do País.

O Brasil tem tido muitos problemas para fazer acionar a sua máquina. O Brasil tem feito a sua máquina funcionar de maneira lerda. Percebemos que, se é verdade que houve um esforço - um esforço muito duro, beirando o trágico - do Governo para economizar bem mais que os 4,25% a título do superávit primário de janeiro até agora, na contrapartida, temos visto que sequer aquilo que estão autorizados a gastar os Ministros atuais têm sido capaz de fazê-lo. Apenas 5% do que pode ser investido foi investido. Se era pouco investimento, então há muito pouco investido no País. Investimento é sinal de crescimento econômico, de geração de emprego, de crescimento com ares de crescimento sustentável.

Esse panglossianismo todo lembra, de certa forma, alguns momentos do Governo passado. É muito bom passar isso com honestidade, Senador Duciomar Machado, como estou fazendo ao Governo e seus Líderes, porque a pior coisa é repetir os equívocos. É bom repetirmos acertos e aperfeiçoarmos acertos; repetir equívocos não é bom.

A reposição cíclica já deixa o Governo arrogante, empafioso, cheio de si. O Governo já acha que resolveu os problemas do País e que, daqui para frente, não terá nada de diferente de um mar de almirante para navegar. Ainda não houve uma crise internacional que pudesse de fato servir de teste para o País. E espero que não haja. O Governo passado enfrentou oito; este não teve nenhum até o momento. Este enreda-se na própria malha da sua flácida perspectiva de controle ético, enreda-se nos escândalos, que, um após o outro, vão minando a credibilidade deste Governo. Um após o outro, esses escândalos vão minando a credibilidade deste Governo. Ora é um Diretor do Banco Central, ora é o Presidente do Banco Central, ora é o Presidente do Banco do Brasil; ora é o Ministro fulano ou o Ministro beltrano. Tem sido regra, não têm sido exceção, as trapalhadas se misturarem com um certo sentimento de onipotência, que faz do Partido dos Trabalhadores o partido do aparelhamento, que mistura o público com o privado, que pensa que por se imaginar ungido de alguma missão divina pode perfeitamente transgredir as regras da própria ética, merecendo perdão antecipado e indulgência plena e eterna. Não merece. Ninguém merece. É preciso que todos nos comportemos bem. É preciso que todos saibamos nos colocar à altura dessa sociedade exigente que aí está.

E digo mais: quis falar aqui da questão econômica. Não estou querendo ir para a ética pela ética; estou indo para a ética pelo econômico. Tudo isso mina a credibilidade. Cada vez que explode um escândalo aqui, sai uma nota no Financial Times; cada vez que explode um escândalo aqui, sai uma nota no Wall Street Journal; cada vez que explode um escândalo aqui, há mais gente assustada com a perspectiva de o País encontrar o seu caminho efetivo.

Se existe algo neste Governo que me parece sólido é o comando da política econômica pela orientação do Ministro Antônio Palocci. Considero o Ministro Palocci um profissional de rara capacidade, de rara sensibilidade, com sangue frio e perspectiva de apreender e de aprender. S. Exª fez um trabalho muito contestado pelo PT, partiu para os superávits primários, mas os petistas diziam que não seria bom fazer um superávit primário. O Ministro dizia que deveríamos manter o compromisso com as metas mais restritas de inflação, procurando levar o Brasil novamente para o seio de 3% ou 4% de inflação ao ano, no máximo, mas os petistas torciam o nariz e diziam que não era para se fazer isso. Diziam que era para se voltar ao regime de orgia.

O Ministro Palocci tem sido, a meu ver, a grande âncora deste Governo, com equívocos. Hoje, a taxa de juros está congelada em 16%. Isso significa, Senadora Lúcia Vânia, que temos muito pouco crédito pela frente. A restrição ao crédito continuará muito grande. Continua-se pagando muito de dívida externa, e o Ministro Palocci poderia estar hoje congelando os juros, sim, em 14%. Se tivesse ouvido o que lhe disse a Oposição à época - Oposição que concordava com o grosso do que o Ministro propunha -, um pouco mais de ousadia, teríamos hoje 14%. Seria bem melhor o congelamento dos juros a 14% do que a 16%. Já se sabe que, por tempo indeterminado, o Banco Central não vai mexer. Não me atrevo a dizer que deva mexer agora. Não vejo que deva. De fato, há uma pressão inflacionária que manda se ter cautela. Mas o Ministro poderia ter essa cautela com juros reais menores, até porque essa cautela seria com 14% de taxa básica de juros, não precisaria ser 16%. Então, esse é um erro que o Ministro Palocci cometeu. É um erro de dosagem. É um erro de timing. S. Exª, a meu ver, acertou no atacado, porque contra o seu Partido insistiu na austeridade fiscal, que herdou; contra o seu Partido insistiu nas metas de inflação, que herdou; contra o seu Partido insistiu no câmbio flutuante, que herdou. Um verdadeiro e eficaz antídoto contra a crise cambial tem sido neste País, como o foi em outros, o câmbio flutuante.

Isso tudo faz com que apareçam os engenheiros de obra feita. De repente, as ações do tão criticado Ministro Palocci, em função da reposição cíclica que aí está - e apenas isso, S. Exª não se engana e não vejo que engane o Presidente Lula - passem a ser apropriadas por todos aqueles que até eram contra a política econômica proposta por S. Exª.

A honestidade intelectual manda que digamos isso. A honestidade intelectual manda que repisemos isso. Ou seja: que bom se o Brasil puder crescer, ao longo de todo o Governo Lula, de maneira substancial! Que bom! Tomara que não tenha nenhuma crise pela frente. Tomara que não tenha! Agora, os problemas são muito graves. O Brasil tem problemas graves.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Já concederei um aparte a V. Exª.

Alguns são extragoverno, hoje pesando menos sobre nós, até porque, entre as heranças “malditas” legadas pelo Governo passado a este Governo - estou a usar aspas na palavra maldita, até porque é preciso se execrar mesmo essa formulação medíocre e mesquinha que foi proposta, em algum momento, pelo ufanismo de um Governo que imaginava reinar por sobre a realidade fazendo o papel de Alice no País das Maravilhas - e benditas, sem aspas, está essa quase auto-sustentabilidade, essa quase autodeterminação da Petrobrás em matéria de petróleo. O Brasil hoje importa muito menos. Mas aí está a crise do petróleo que, quando nada, conturba a vida econômica de alguns países que são clientes preferenciais do País.

Ouço o aparte do nobre Senador Eduardo Suplicy, com muito prazer.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Arthur Virgílio, primeiramente, observei em seu pronunciamento um volume de críticas severas, as quais iria comentar. Mas, nestes últimos instantes, V. Exª reconhece que o Ministro Antônio Palocci vem acertando na maior parte dos seus passos.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Tem errado no varejo e acertado no atacado.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - E V. Exª, como muitos, expressa que talvez pudesse haver maior ousadia na diminuição das taxas de juros. Creio, inclusive, que este deve ser um dos temas do diálogo que, muito provavelmente, teremos com o Presidente Henrique Meirelles quando aqui vier, convidado que for. Segundo pronunciamento do Senador Aloizio Mercadante e pela conversa que S. Exª manteve com o Líder do PFL, José Agripino, será apresentado, amanhã, um requerimento para que sejam convidados tanto o Presidente Henrique Meirelles, do Banco Central do Brasil, como também o Presidente do Banco do Brasil, Cássio Casseb, para que compareçam à CAE, possivelmente em datas diferentes, a fim de esclarecerem os diversos episódios. Considero adequado da parte de V. Exª que, em vez de pedir a demissão, a renúncia de ambos, primeiro procure ouvi-los com o respeito com que V. Exª sempre ouve as autoridades que vêm a esta Casa, assim como tantas vezes ouvi as autoridades, os ministros do Governo Fernando Henrique Cardoso sobre os problemas que havia na época. Essa é a sugestão que faço a V. Exª, porque, hoje, V. Exª já propôs que eles saíssem. Portanto, faço um apelo a V. Exª - até no sentido de que transmita esta mensagem aos Presidentes daquelas instituições - para que venham a esta Casa esclarecer os episódios mencionados por V. Exª. Inclusive, na oportunidade, S. Exªs poderão explicar as razões que levaram a economia brasileira a apresentar resultados tão positivos. Portanto, na Comissão de Assuntos Econômicos, teremos a oportunidade de sermos esclarecidos, o que será muito proveitoso para o Senado. Da mesma maneira que o Presidente Henrique Meirelles, hoje, expôs ao Presidente Lula todos os problemas que surgiram na imprensa, avalio que S. Exª terá toda a disposição para fazer o mesmo no Congresso Nacional. Transmito a V. Exª que, ainda hoje, estive com o Presidente Cássio Casseb, tentando dizer-lhe que será perfeitamente natural a sua presença aqui, pois tem V. Exª, como cada membro do Congresso Nacional, a responsabilidade de legislar, representar o povo e fiscalizar os atos do Executivo. Portanto, é mais do que natural que V. Exª faça as indagações. Mas eu gostaria que V. Exª, antes de tirar uma conclusão a respeito dessa questão, ouvisse S. Exªs com a devida atenção e respeito.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Muito obrigado, Senador Eduardo Suplicy!

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Sr. Presidente, preciso de um pouquinho de tempo para concluir. Vou encerrar respondendo ao Senador Eduardo Suplicy.

Eu falava dos problemas deste Governo, Senador Garibaldi, alguns dos quais o Senador Eduardo Suplicy aborda, ainda que pelo ângulo da defesa do Governo - S. Exª um homem correto e de cuja correção ninguém duvida neste País.

Mas explico a V. Exª, Senador, por que propus a demissão do Sr. Cássio Casseb. Acabo de receber um ofício de S. Exª: “A S. Exª Senador Arthur Virgílio, Líder do PSDB”. S. Exª me dá explicações sobre o caso “Zezé di Camargo e Luciano”. Parece até que ele não foi acusado de nada ligado à movimentação irregular no exterior. Isso significa menosprezar o que eu possa ter de inteligência; significa desrespeitar o mandato que aqui exerço, porque, se me enviasse pelo menos a explicação cabal sobre os dois temas de que é acusado, um que já está enfumaçado na imprensa, que é essa história do aparelhamento e da churrascaria Porcão, e o outro caso que é o do uso da movimentação irregular de recurso, tudo bem! Mas S. Exª não o fez. Finge que ninguém duvida de que o caso dele seja parecido com o de Candiota. Ele finge isso e diz: “Senador Arthur Virgílio, aqui está a explicação sobre o Zezé di Camargo e Luciano”. Digo-lhe: Presidente Casseb, eu gostaria que V. Sª me respeitasse, respeitasse a minha inteligência e respeitasse o mandato que exerço, porque, aqui, V. Sª está apenas tentando ganhar tempo e está, na verdade, demonstrando temor em explicar aquilo que a Nação quer saber, ou seja, se Cássio Casseb cometeu ou não algo parecido com Luiz Augusto Candiota. Candiota não ficou e sobre o outro se explica o Presidente Lula.

O Presidente Lula, de coração e por vocação, é um indulgente: não demitiu nem o Waldomiro. Ele foi demitido a pedidos. O Candiota foi demitido a pedidos. Esses aqui só sairão se quiserem. O Presidente Lula já disse isso nos jornais de hoje. A notícia foi publicada à farta.

Concluo dizendo que o outro problema que este Governo enfrenta é a falta de autoridade do Presidente para tomar atitudes. Nomeou mal e não sabe demitir. Tinha uma autoridade de palanque e não está sabendo exercitar essa autoridade de maneira democrática e firme ao longo do exercício do Governo.

Isso faz com que eu possa dizer, Sr. Presidente, que o Brasil é uma economia complexa e uma sociedade complexa também. Tem muitos problemas pela frente. Se quisermos discutir essa questão do desenvolvimento econômico de maneira honesta, concreta, correta, só temos um caminho: indagarmo-nos se somos capazes de fazer, daqui para a frente, aquilo que, em algum momento do Governo Itamar Franco, foi proposto pelo Ministro da Fazenda Fernando Henrique em relação à estabilidade, resolver o problema da inflação. Não resolvemos a questão dos juros e, sem equacionar a questão dos juros, não somos capazes de propor crescimento sustentado, a não ser que seja com uma manobra “engana eleitor”, para, depois, a frustração ser maior ainda, após fechadas as urnas e após sobrevir a nova lufada de realidade sobre este País.

Se quisermos discutir isso a sério, eu gostaria muito de ver o Presidente do Banco Central não ser acusado de nada, para discutirmos na Comissão de Assuntos Econômicos não a sua performance pessoal, ética, mas sim a questão dos juros, como se discutiu de maneira profunda, aproveitando os ensinamentos dos planos frustrados do passado, que desaguaram no grande êxito que foi o Plano Real. Temos que fazer o mesmo em relação aos juros. Fora disso, sabe V. Exª, que é um grande economista, que o Brasil não crescerá de maneira sustentada. Todo governo, no prazo de um ou dois anos, tem um crescimento razoável; todo governo tem algum momento de depressão, e, no final, a média é de aproximadamente dois pontos ao ano.

O Presidente Lula teria que fazer o Brasil crescer de maneira espetacular para poder superar essa idéia de fazer o Brasil crescer 4% ao ano. Imaginem, crescer 16% em quatro anos, sendo que cresceu menos de 0,2% no primeiro ano!

Estaremos aqui fazendo um trabalho, a meu ver, pequeno se não formos capazes de propor a verdadeira discussão à Nação: sair fora do panglossianismo pelo lado ingênuo, sair fora da operação “engana eleitor” pelo lado da perfídia. Temos de discutir para valer por que este País empaca no crescimento a partir do momento em que ele empaca na equação dos juros. Se não se resolve a equação dos juros, ele cresce em um ano e não cresce no outro. E, não crescendo no outro, a média fica ruim, o Brasil termina vendo as levas de desempregados aumentarem o coração desesperançado dos brasileiros, que, a cada momento, o reaquecem e, a cada momento, a frustração se renova. Proponho uma discussão alta, elevada.

Alerto o Governo: se insiste no otimismo exagerado, termina tendo um fim infausto, porque o otimismo exagerado é primo da ingenuidade se for, ao mesmo tempo, irmão da boa-fé. Ele é primo da perfídia se for parente da má-fé.

Pretendo, pura e simplesmente, que aqui analisemos o que vai acontecer com o País, e o País precisa resolver essa equação dos juros, essa equação do investimento, sem o que veremos a euforia do Governo de maneira absolutamente ciclotímica virar depressão. Aqui, já vi o Governo eufórico, já vi o Governo deprimido, e essa ciclotimia não é boa para o País, não é boa para o Presidente Lula, não é boa para ninguém de bom senso neste País. Quero evitar a ciclotimia. Deve-se estar eufórico hoje com resultados que são previsíveis; amanhã, deprimido com resultados que são previsíveis também. Com isso, vamos vendo o Brasil cada vez mais perder a fé no destino do País, e o brasileiro se criando, crescendo, acreditando que o Brasil do futuro já seria uma promessa perdida em algum momento deste presente.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/08/2004 - Página 24208