Discurso durante a 112ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com as implicações decorrentes da aprovação do projeto que regulamenta o setor audiovisual.

Autor
Rodolpho Tourinho (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: Rodolpho Tourinho Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CULTURAL.:
  • Preocupação com as implicações decorrentes da aprovação do projeto que regulamenta o setor audiovisual.
Publicação
Publicação no DSF de 19/08/2004 - Página 26853
Assunto
Outros > POLITICA CULTURAL.
Indexação
  • DEBATE, PROJETO, AGENCIA NACIONAL, CINEMA, AUDIOVISUAL, APREENSÃO, AUTORITARISMO, SOLICITAÇÃO, ATENÇÃO, GILBERTO GIL, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA CULTURA (MINC), RECLAMAÇÃO, SOCIEDADE CIVIL.
  • COMENTARIO, ATUAÇÃO, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DA BAHIA (BA), INCENTIVO, CULTURA, IMPORTANCIA, ESTADO, DESENVOLVIMENTO, SETOR.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO DA BAHIA, ESTADO DA BAHIA (BA), CRITICA, PROPOSTA, REGULAMENTAÇÃO, PRODUÇÃO AUDIOVISUAL.
  • CRITICA, TRIBUTAÇÃO, PRODUÇÃO, NATUREZA CULTURAL, REPASSE, PREÇO, CONSUMIDOR, AUMENTO, EXCLUSÃO, POPULAÇÃO CARENTE, PROTESTO, EXCESSO, BUROCRACIA, CARGO PUBLICO, CENTRALIZAÇÃO, AGENCIA, AUDIOVISUAL, RECOLHIMENTO, DIREITO AUTORAL.

O SR. RODOLPHO TOURINHO (PFL - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente José Sarney, Srªs e Srs. Senadores, Sr. Senador Heráclito Fortes, o assunto que me traz a esta Casa, a esta tribuna, é o projeto da Ancinav, na área da cultura. Tenho certeza de que venho representando, neste momento, o pensamento da minha terra, da Bahia, que tem fortes ligações com a cultura. Tenho certeza de que a expressão da cultura brasileira tem lá na Bahia uma das suas maiores riquezas.

Essa riqueza da expressão da cultura nacional, como tantas outras, está no DNA do povo da Bahia. Não há como falar do meu Estado sem falar na sua cultura; não há como falar do cinema nacional sem falar de Glauber Rocha; não há como falar em Glauber se não falarmos da Bahia. E, com certeza, essa terá sido uma das razões pela qual o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva convidou para Ministro da Cultura o eminente baiano Gilberto Gil, com quem tenho uma velha amizade, desde os bancos de ginásio, e que merece o nosso respeito não apenas pelo esforço que vem desenvolvendo em prol da cultura nacional, mas também pela sua história, pelo que representa na música brasileira, pelo que representa na defesa dos nossos ideais democráticos.

Mas falo hoje desta tribuna, Sr. Presidente, Srs. Senadores, para criticar pontos que considero bastante preocupantes do texto do projeto de lei que cria a Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual, a Ancinav, que tem sido divulgado pela imprensa.

Fico bastante à vontade para trazer a minha crítica não só pela velha amizade que tenho ao Ministro, a que já me referi, mas, especialmente, pela forte ligação com as raízes da cultura do meu Estado.

A Bahia tem em seu Governo experiências modelares para estimular a expressão da cultura. O Senador Antonio Carlos Magalhães, desde a sua primeira administração, incluiu nos programas de governo os programas culturais, e existem experiências que continuam com o Governador Paulo Souto, para estimular a expressão da cultura.

Ainda quando fui Secretário de Fazenda, implementamos ações que, ao mesmo tempo, objetivavam, por um lado, fomentar a expressão da cultura e, por outro, permitir a inclusão cultural do nosso povo.

Essas ações ainda hoje têm prosseguimento, no atual Governo, com o Secretário...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. PRESIDENTE (José Sarney. PMDB - AP) - Senador Rodolpho Tourinho, peço licença a V. Exª para registrar que se encontra neste plenário, acompanhada do Deputado Federal Pastor Frankembergen, uma delegação da Comissão de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados do México. Essa Comissão é composta pelos Srs. Deputados Fermín Trujillo Fuentes, Juan Antonio Guajardo Alzadua, Jorge Leonel Sandoval, Irene Hermínia Blanco Becerra, Elpidio Tovar de La Cruz, Feliz Adrian Fuentes Villalobos, o Adido Naval da Embaixada do México Capitão-de-Guerra Angel Sarmento e pelo diplomata Sr. Marco Antonio, Secretário da Embaixada.

Agradecemos a visita e desejamos à Comissão de Deputados do México uma feliz passagem pelo Brasil.

Muito obrigado.

Continua com a palavra o Senador Rodolpho Tourinho.

O SR. RODOLPHO TOURINHO (PFL - BA) - Eu dizia que a Bahia tem experiências modelares nessa área de estímulo à expressão da cultura que continuam, ainda hoje, no Governo de Paulo Souto, visando alocar recursos para o desenvolvimento das artes plásticas, da música, da dança, do cinema, do teatro e de outras formas de expressão cultural.

São programas como o “FazCultura”, em que a Secretaria da Fazenda patrocina a produção cultural; um outro, “Sua Nota é um Show”, permite ao cidadão trocar notas fiscais por ingressos para shows patrocinados pela Secretaria da Fazenda. Há ainda o “Sua Nota é um Show de Solidariedade”, que tem o objetivo maior de levar recursos a instituições de caridade; um outro, o “Faz Universitário”, colaborando com a formação universitária; o apoio constante, há mais de 10 anos, ao Salão da Bahia, seguramente um dos mais importantes eventos de artes plásticas do País; o apoio ao Balé Folclórico da Bahia, um dos mais respeitados do mundo, entre tantas outras ações. Todas elas trouxeram à Secretaria da Fazenda da Bahia a respeitabilidade perante a classe artística e ao povo do meu Estado, e me credenciam hoje para vir a esta tribuna expressar as minhas preocupações com as linhas gerais do projeto de lei da Ancinav, Agência de Cinema.

Não resta dúvida de que o Estado deve ter um papel insubstituível no desenvolvimento cultural, cabendo a ele a responsabilidade de implementar políticas públicas que promovam a diversidade cultural, gerando assim empregos e inclusão social.

Mas, o projeto de lei da Ancinav soa como se finalmente questões relativas à produção, difusão e enriquecimento da produção audiovisual no Brasil caminhassem na firme direção de o Estado brasileiro reassumir o seu papel fundamental de mediador e indutor desse processo.

Soa como música para os ouvidos, mas o que se esconde nas entrelinhas é uma preocupante desafinação, para a qual chamo a atenção não apenas dos membros da Comissão de Educação, mas também dos integrantes da Frente Parlamentar em Defesa da Cultura, da qual faço parte e que tem também a participação entre outros do Líder do Governo, Senador Aloizio Mercadante e de tantos outros Parlamentares preocupados com a questão da cultura no País.

A inclinação intervencionista ou autoritária do texto do anteprojeto de lei, que certamente não é da lavra do Ministro Gilberto Gil, tem sido tema de repulsa da sociedade brasileira. A Jornalista Miriam Leitão, por exemplo, em sucessivos artigos, entre os quais cito “Adeus Lênin”, na coluna “Panorama Econômico”, do Correio da Bahia, de 7 de agosto último (sobre o qual requeiro à Mesa que o insira nas Anais da Casa), tem alertado para o tom de dirigismo cultural e ela vem acompanhada de figuras expressivas da cultura do cinema nacional, como Arnaldo Jabor, Cacá Diegues e tantos outros que sofreram o doloroso aprendizado da conquista da liberdade de expressão do pensamento.

Por mais que conteste o tom das críticas que vem recebendo, apelo ao Ministro Gilberto Gil que pare e reflita sobre o clamor das vozes respeitáveis e preocupadas - às quais me somo - com um texto que está, sim, se reintroduzindo na legislação brasileira a marca do intervencionismo e que, ainda que não venha a ser usado por este Governo de forma autoritária (até porque não condiz com a biografia do Sr. Ministro), será deixado de herança para algum futuro governo que possa não ter a índole democrática.

Não bastassem as preocupações com os diversos dispositivos carregados das ameaças a que me referi, e que não cabe aqui detalhar, pois terão um fórum adequado nas Comissões desta Casa, não posso deixar de ressaltar, mais uma vez, uma ação deste Governo, que resultará em aumento de carga tributária, desta vez por meio da taxação que recairá sobre o setor de produção cultural.

O anteprojeto de lei da Ancinav está criando a chamada “Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica e Audiovisual Brasileira”, que incidirá, entre outras fontes geradoras, na exploração comercial de obras cinematográficas e videofonográficas e na venda de ingressos ao consumidor em salas de cinema e locais de exibição de obras cinematográficas.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a criação de taxas dessa natureza para o setor cultural terá a perversa conseqüência de aumentar ainda mais a “exclusão cultural”, exatamente no momento em que, por exemplo, o cinema nacional tem conseguido, a duras penas, reafirmar-se, inclusive, nos grandes centros internacionais, atraindo maiores bilheterias.

Hoje em dia, assistir a um filme no cinema pode ser considerado um divertimento para poucos, afinal os preços praticados nos ingressos, em especial nas grandes cidades, inviabiliza o acesso a essa forma de lazer à grande parte da população brasileira. Imaginar que o projeto do Governo tornará esses preços ainda mais elevados corresponde à elitização total desse tipo de entretenimento.

Além de penalizar a classe mais pobre, a nova taxação representa uma visível incongruência face os incentivos fiscais que são concedidos apropriadamente ao setor cinematográfico e que acabam sendo, de certa forma, retirados ou reduzidos.

Além de tudo isso, estão criando uma superestrutura burocrática para fiscalizar as atividades cinematográficas e audiovisuais. Pretende-se até passar para a tutela da Ancinav o que é recolhido de direitos autorais de músicas utilizadas pelas emissoras de televisão, que, em 2003, atingiu R$100 milhões. Lamento, porque agora a cultura passará a conhecer o que é contingenciamento também de recursos. Os fundos, hoje, deveriam estar financiando o crescimento da produção científica no País, do crescimento da pesquisa e desenvolvimento tecnológico. Vamos estender essa terrível forma de agir, própria não só deste Governo mas de outros passados também, que é o contingenciamento dos recursos que entram no Tesouro Nacional.

O Estado de S. Paulo, de 12 de agosto, denuncia que “Músicos estão em pé de guerra com ministério” por causa desse fato e também informa que “um dos primeiros impactos da nova Agência Nacional de Cinema e Audiovisual será a criação de 510 cargos públicos”. Então, para resumir, acho que criar tributos, aumentar taxas para a população pagar, aumentar a despesa com pessoal e aumentar o número de funcionários públicos é tudo que este País não precisa nesse momento.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para concluir meu pronunciamento, reafirmo meu apoio integral à cultura nacional, e como já afirmei pessoalmente ao meu amigo, o Ministro Gilberto Gil, entendo como de fundamental importância que o Ministério da Cultura receba maior destinação de verbas para investir em projetos que tenham a característica de construir a identidade nacional, geração de empregos e, em última análise, impulsionar o desenvolvimento da economia.

Entretanto, não é pelo caminho simplório e perverso da criação de taxações às produções culturais que esse objetivo será alcançado e, com certeza, não será com esse projeto de lei, eivado de ameaças às liberdades de pensamento, que a produção cultural brasileira continuará na sua trajetória crescente de sucesso.

Conclamo, finalmente, aos nobres Senadores, especialmente os integrantes da Frente Parlamentar de Defesa da Cultura, para dedicarmos especial atenção a esse projeto. Afirmo, desta tribuna, que, se ele vier a esta Casa na forma como tem sido divulgado pela imprensa, de minha parte receberá todo empenho pela sua rejeição. É preciso rediscuti-lo e revisá-lo nos aspectos mais duvidosos de toda a área cultural do País.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTO A QUE SE RERERE O SR. SENADOR RODOLPHO TOURINHO EM SEU PRONUNCIAMENTO

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e o § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“Adeus, Lênin”.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/08/2004 - Página 26853