Discurso durante a 113ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Contesta o empenho do governo Luiz Inácio Lula da Silva em creditar as suas ações aos bons resultados obtidos recentemente pela economia brasileira.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Contesta o empenho do governo Luiz Inácio Lula da Silva em creditar as suas ações aos bons resultados obtidos recentemente pela economia brasileira.
Publicação
Publicação no DSF de 20/08/2004 - Página 27261
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANALISE, POLITICA EXTERNA, BRASIL, MANIPULAÇÃO, ESPETACULO, SELEÇÃO, FUTEBOL, APRESENTAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, HAITI.
  • CRITICA, JOSE DIRCEU, MINISTRO DE ESTADO, CHEFE, CASA CIVIL, DECLARAÇÃO, DEMOCRACIA, POLITICA NACIONAL, NEGAÇÃO, AUTORITARISMO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ALEGAÇÕES, MANIPULAÇÃO, PARTIDO POLITICO, OPOSIÇÃO.
  • CRITICA, EXCESSO, PROPAGANDA, GOVERNO FEDERAL, APROPRIAÇÃO, CRESCIMENTO ECONOMICO, RESULTADO, ATUAÇÃO, GOVERNO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROTESTO, POLITICA FISCAL, ATUALIDADE, TRIBUTAÇÃO, REDUÇÃO, INVESTIMENTO PUBLICO, SUPERIORIDADE, TAXAS, JUROS, COMENTARIO, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE, FEDERAÇÃO DAS INDUSTRIAS DO ESTADO DE SÃO PAULO (FIESP), CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDUSTRIA (CNI), APREENSÃO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, DECISÃO, CONSELHO, POLITICA MONETARIA.
  • CONTESTAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, INEXATIDÃO, ANUNCIO, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), AUTORIZAÇÃO, INVESTIMENTO, INFRAESTRUTURA, SAIDA, CALCULO, SUPERAVIT, REGISTRO, ANALISE, ECONOMIA INTERNACIONAL, EFEITO, BRASIL.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos de volta à era dos espetáculos. Mas não pretendo, Senador Heráclito Fortes, falar sobre o espetáculo vivido no pobre Haiti, do qual já se falou demais na tarde de hoje, nem pretendo aprofundar qualquer análise sobre a opinião do ex-chanceler Celso Lafer, que afirmou, sobre o jogo da seleção brasileira no Haiti, tratar-se da expressão da política externa como política-espetáculo, que é a dimensão do estilo da atual administração. Não vou abordar a diplomacia-espetáculo. Não pretendo nem mesmo discorrer sobre o espetáculo da democracia segundo José Dirceu, principal Ministro do Governo Lula.

O Ministro José Dirceu disse que estamos vivendo o espetáculo da democracia, que não há surto algum de autoritarismo no País, que isso é resultante do nervosismo eleitoral da oposição, no que é acompanhado pelo Presidente do PT, José Genoíno, que fala em orquestração da oposição: “a oposição é que difunde os receios de que esteja ocorrendo no País uma escalada autoritária”. Não são as ações do Governo, os atos praticados, as iniciativas idealizadas ou as palavras proferidas pelo Presidente da República, em momentos de brincadeira ou de seriedade, não importa. Exemplo do que falo foi ter chamado de covardes os jornalistas que defendem a liberdade de imprensa e a afirmação de que teria ido ao Gabão aprender como permanecer no poder durante 37 anos.

José Dirceu diz que, fazendo alguns ajustes na divulgação dos atos governamentais, estaremos vivendo no país das maravilhas e dos espetáculos. Aliás, não sei por que o Ministro José Dirceu quer ajustes na divulgação dos atos governamentais, já que é exatamente nesse terreno que o Governo se sai extraordinariamente bem, que se comporta como especialista. Há um sistema de comunicação, organizado de forma excepcional, que procura atribuir ao Governo feitos que ao Governo não pertencem, não só através da propaganda institucional, mas sobretudo através da propaganda da informação, através da manipulação de determinados veículos de comunicação cujo poder indiscutível faz com que determinadas teses se impregnem na consciência da sociedade brasileira.

O Governo atribui a si méritos pelo crescimento econômico que se descortina no País. Não vamos discutir se é pífio esse crescimento econômico, se ele está muito aquém do crescimento econômico que se verifica nos demais países emergentes. Não vamos discutir isso. Vamos ponderar se realmente tem méritos o Governo, se pode comemorar os resultados da economia no presente momento. Reconhecemos que há um crescimento, mas a divulgação dele é que extrapola os limites da realidade. Chego até a imaginar a existência de 24 meses no ano. Repete-se tantas vezes, através do noticiário, a divulgação de índices de geração de emprego ou de crescimento econômico referentes a determinado mês, que chego a imaginar que o ano tem 24 meses e não 12. A cada semana tem-se a impressão de que se está concluindo um ano, em função da repetição de números referentes à geração de emprego ou ao crescimento econômico. Não importa que seja uma geração de empregos insuficiente, não importa que seja um crescimento econômico aquém das expectativas e das possibilidades do nosso País, pois há um cenário econômico internacional propício ao crescimento, e o que cabe discutir é se não estamos desperdiçando extraordinárias oportunidades de crescer mais no bom momento da economia mundial.

Comemoram-se índices econômicos que correspondem a 30 meses atrás, mas é bom frisar que com esses índices econômicos o Presidente Fernando Henrique não elegeu o seu sucessor. Como proclama César Benjamim, um brilhante jornalista e economista, se tivermos um crescimento de 3,5% este ano, temos que dividir o índice por dois, porque no ano passado nós não tivemos crescimento, caminhamos em retrocesso. Sofremos uma perda de PIB que não pode ser ignorada. Mas o que quero destacar é que, se há crescimento, devemos atribuir méritos a quem méritos possui, à cadeia produtiva nacional, especialmente ao agronegócio. As exportações do País aquecem, sim, a economia e fazem com que ocorra, inclusive, retomada no parque industrial paralisado. Há uma paralisia de cerca de 28% do poder de atuação do parque industrial. Há uma retomada, sim.

Mas quando o Governo é responsável pelo crescimento econômico? Quando ele aciona os instrumentos que alavancam o crescimento econômico. E quais são os principais instrumentos à disposição do Governo para alavancar o crescimento econômico? Sem dúvida, a política tributária. E o que fez o atual Governo com a reforma tributária? O que ocorreu em matéria de tributos na gestão Lula? Houve aumento da carga tributária.

Em que pesem os compromissos assumidos, as promessas proclamadas de que o Governo Lula não permitiria aumento da carga tributária, hoje discutimos se a carga tributária é 38% do PIB ou se já chega a 40% do PIB - era cerca de 36% do PIB ao assumir a Presidência da República Luiz Inácio Lula da Silva.

Portanto, aumentar a carga tributária é promover crescimento ou é inibir o crescimento? Aumento da carga tributária trabalha contra o crescimento. A política tributária que impõe uma carga que onera o setor produtivo é anticrescimento econômico.

Outro instrumento de política governamental para promover crescimento econômico é o investimento público. Mas o Governo reduziu de forma brutal o investimento público! Como pode atribuir a si, portanto, méritos pelo crescimento econômico? Os investimentos públicos despencaram de 14,6 bilhões, em 2001, para 6,5 bilhões, em 2003 - segundo cálculos da Associação Brasileira de Infra-Estrutura e das Indústrias de Base. Portanto, houve uma redução significativa dos investimentos públicos. Esse instrumento de alavancagem do crescimento econômico não foi utilizado pelo Governo.

Outro instrumento é a política de juros. As taxas de juros no Brasil resistem aos pleitos diversos de todos os setores produtivos e se mantêm num patamar exorbitante. As elevadas taxas de juros praticadas no Brasil trabalham também contra o crescimento econômico.

Srª Presidente Lúcia Vânia, Srªs e Srs. Senadores, os principais instrumentos de motivação da economia do País e de aquecimento econômico não foram utilizados pelo Governo para que ele possa creditar às suas ações o pífio crescimento econômico que se transforma em crescimento econômico espetacular por meio da sua publicidade.

Ontem o Copom reuniu-se e manteve em 16% a Selic. É o quarto mês consecutivo em que a taxa fica inalterada.

Quero repercutir uma informação nesta Casa, já que, como oposicionista, talvez não tenha a mesma autoridade para analisar essa postura do Governo, autoridade que devemos conferir a determinados agentes da nossa economia. A Fiesp, por intermédio do seu Presidente Horácio Lafer Piva, alerta: “estamos perpetuando uma anomalia”. Alertou a Fiesp também para uma possível ação do Banco Central para a valorização do câmbio. Seria uma temeridade o Banco Central deixar o nosso câmbio se valorizar para reduzir em alguns décimos de percentagem a inflação. Seria virar as costas para o nosso setor exportador.

A Fiesp também manifesta preocupação com a possibilidade de o Copom elevar os juros nas próximas reuniões. Tem sentido essa preocupação da Fiesp porque, se formos buscar a Ata do Copom do mês de julho, veremos uma evidência de que o Banco Central não descarta a possibilidade de aumentar os juros.

Certamente a nossa economia continuará apresentando sintomas de aquecimento, o Governo continuará a afirmar que ele é o responsável pelo crescimento econômico e continuaremos a assistir as Lideranças do Governo comemorando, da tribuna ou pela imprensa, o êxito da sua política econômica. Trata-se de uma política econômica que se esgotou ao final da gestão de Fernando Henrique Cardoso.

Para a Confederação Nacional da Indústria, a manutenção da taxa básica de juros em 16% reforça a postura conservadora do Banco Central.

Para o Presidente da Associação Brasileira de Infra-estrutura e das Indústrias de Base, Sr. Paulo Godoy, a decisão do Copom exigirá um esforço maior do Governo e do sistema financeiro para elevar o crédito ao investimento.

Esses temores e alertas da Fiesp, da CNI e da Abdib não são infundados. Creio que devemos substituir o ufanismo governamental pelo necessário e imprescindível realismo diante das circunstâncias econômicas que nos levam a comemorar determinados índices. O aumento da taxa de juros, por exemplo, que é uma possibilidade, pode comprometer de forma irreversível essa retomada do crescimento econômico, que se dá - repito - num bom momento da economia mundial e num momento de exportações sustentadas pelo agronegócio brasileiro, em razão exatamente do cenário internacional e não em função de políticas públicas adotadas pelo Governo brasileiro para estimular as nossas exportações.

Já me referi à redução dos investimentos públicos. Segundo a Abdib, são necessários 20 bilhões, anualmente, em investimentos na infra-estrutura para o Brasil entrar numa rota de crescimento sustentado, mas reduzimos esses investimentos a 14 bilhões. Portanto, o Governo deve 6 bilhões em investimentos para alcançar o patamar, que é modesto, e chegar ao objetivo que consideramos insuficiente, diante das possibilidades de crescimento econômico do Brasil, possibilidades que seriam comprometidas em função da ausência de uma infra-estrutura capaz de atender às demandas impostas pelo crescimento econômico.

Se analisarmos, por exemplo, o valor dos investimentos na China, concluiremos com maior convicção que esses números são insuficientes. O investimento anual da China é de US$200 bilhões. Falamos em US$20 bilhões/ano no Brasil, enquanto na China os investimentos chegam a US$200 bilhões/ano.

O Governo é desmentido pelo Fundo Monetário Internacional mais uma vez, pois divulga que já teria o aval do Fundo para excluir do cálculo do superávit primário os investimentos de até três bilhões em infra-estrutura. Não é verdade. O porta-voz do Fundo, Thomas Dawson, afirmou que os projetos pilotos relacionados a como tratar investimentos em infra-estrutura no cálculo do superávit primário ainda estão em andamento. Portanto, esses projetos não foram concluídos, e o Governo brasileiro não está autorizado a anunciar que poderá descontar do superávit primário R$3 bilhões em investimentos em infra-estrutura no País.

Já apresentamos aqui a opinião do economista César Benjamim relativa a essa comemoração dos índices de crescimento. É evidente que essa retomada do crescimento que se anuncia é fruto da fraca base de comparação do ano passado, que não pode ser parâmetro para definir a grandeza do crescimento econômico de um país. Não podemos perder esse dado da nossa realidade. Não há blindagem que nos possa assegurar uma retomada do crescimento econômico sem que haja uma flexibilização das atuais políticas fiscal e monetária. O Governo poderá atribuir a si os frutos do crescimento econômico se tomar a iniciativa da flexibilização da política fiscal e monetária e se retomar uma política de investimentos públicos que alcance, pelo menos, este patamar inicial de US$20 bilhões por ano.

Segundo as projeções do braço de pesquisas econômicas do grupo britânico que edita a revista The Economist, o preço das commodities no mercado internacional deve encerrar 2004 com uma alta acumulada de 14%, mas, em 2005, a cotação desses produtos deve permanecer estagnada. Portanto, o Governo tem que considerar esse fato já, para as suas projeções de 2005.

Há outro prognóstico pouco alentador para os países emergentes, sobretudo aqueles que tiveram o crescimento da economia sustentado pelas exportações. É que o recuo dos preços das commodities será acompanhado de um declínio do ritmo de expansão do comércio global.

Esse cenário favorável da economia mundial não se apresentará da mesma forma. Os sintomas indicam essa realidade no próximo ano. Essas previsões reformam e reforçam a necessidade de deslocar o foco da política econômica para a promoção dos investimentos públicos e privados.

Para concluir, Srª Presidente Lúcia Vânia, o PSDB não faz oposição ao País. Temos o dever de fazer oposição aos equívocos governamentais - é isso que procuramos fazer. Aplaudimos o crescimento econômico e queremos aplaudir aqueles que são verdadeiramente os artífices desse crescimento: os exportadores do País, os agricultores brasileiros, aqueles responsáveis pelo agronegócio, que, aquecendo a economia, permitem até uma retomada industrial, reduzindo o percentual de ociosidade, sempre colocado na média de 28% do nosso parque industrial, para promover crescimento e gerar emprego. Mas estamos muito longe do crescimento econômico dos demais países emergentes.

Falta o Governo realizar a sua parte E, para tanto, precisa mudar. Mudar a sua postura e, sobretudo, retomar investimentos, reduzir o seu apetite de arrecadação e tentar limitar as taxas de juros num patamar que possa ser acessível aos investidores privados do Brasil.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/08/2004 - Página 27261