Discurso durante a 142ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Homenagem a medicina brasileira pelo Dia do Médico.

Autor
Mão Santa (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PI)
Nome completo: Francisco de Assis de Moraes Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem a medicina brasileira pelo Dia do Médico.
Publicação
Publicação no DSF de 19/10/2004 - Página 31542
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA, MEDICO.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Senador Mozarildo Cavalcanti, que ora preside esta sessão, Srªs e Srs. Senadores, autoridades e lideranças médicas - não vou citar nomes porque poderia esquecer alguns, o que, mesmo involuntariamente, seria imperdoável -, brasileiras e brasileiros aqui presentes e que assistem a esta sessão pelo sistema de comunicação do Senado Federal.

Estamos aqui e, como Deus é o princípio de tudo, prefiro começar falando de Sua Palavra. No Livro do Eclesiástico, lê-se em “Médicos e Medicinas”, Capítulo 38:

Honra o médico por causa da necessidade, pois foi o Altíssimo quem o criou.

Toda a medicina provém de Deus e ele recebe presentes do rei:

A ciência do médico o eleva em honra; ele é admirado na presença dos grandes.

O Senhor fez a terra produzir os medicamentos; o homem sensato não os despreza.

Uma espécie de madeira não adoçou o amargor da água? Essa virtude chegou ao conhecimento dos homens.

O Altíssimo deu-lhes a ciência da medicina para ser honrado em suas maravilhas; e dela se serve para acalmar as dores e curá-las; o farmacêutico faz misturas agradáveis, compõe ungüentos úteis à saúde, e seu trabalho não terminará, até que a paz divina se estenda sobre a face da terra.

Meu filho, se estiveres doente não te descuides de ti, mas ora ao Senhor, que te curará.

Afasta-te do pecado, reergue as mãos e purifica teu coração de todo o pecado.

Oferece um incenso suave e uma lembrança de flor de farinha; faze a oblação de uma vítima gorda.

Em seguida dá lugar ao médico, pois ele foi criado por Deus; que ele não te deixe, pois sua arte te é necessária.

Virá um tempo em que cairás nas mãos deles.

E eles mesmos rogarão ao Senhor que mande por meio deles o alívio e a saúde (ao doente) segundo a finalidade de sua vida.

A profissão de médico é divina. Aqui já se citou Lucas, que curou a mãe de Pedro de uma febre, que a acompanhou até o sacrifício final de seu filho, que, por destinação, também foi sacrificado.

Estamos aqui, nesta Casa, da qual, sem dúvida nenhuma, o maior líder foi Moisés, que aceitou a missão difícil de libertar o povo de Deus. Ele acreditou na sua destinação. Não quis saber se o Faraó tinha exército; se havia o Mar Vermelho, o deserto, a seca, a fome ou o bezerro de ouro. Mas, o mano Moisés fraquejou e quis desistir. Atentai bem para isto: a caminhada dele foi mais longa do que a nossa. Foram 40 anos, e ele quis desistir, mas ouviu a voz de Deus, que lhe disse: “Procure os mais velhos, os de maior experiência, e eles lhe ajudarão a carregar o fardo do povo.” Então nasceu a idéia do Senado, melhorado na Grécia, na Itália, na França, e aqui simbolizado, em 181 anos, em Rui Barbosa.

O primeiro Senado do nosso País, Senador Mozarildo, era formado por 42 brasileiros; não havia portugueses e só dois médicos. A maioria dos Senadores daquela época, mais de vinte, era da Justiça. Esse pessoal veio ao longo do tempo fazendo leis boas para eles. Eram mais de vinte magistrados. Havia também dez militares, sete sacerdotes, um fazendeiro e um homem do campo.

Quis Deus, neste exato momento, representando toda a história, toda a sabedoria, que aqui chegasse o grande estadista, o nosso Presidente José Sarney, que traduz - um quadro vale por dez mil palavras - a grandeza desta Casa. Nenhum brasileiro hoje excede a vida de grandeza e o exemplo de Sarney. Eu diria que a paz desejada por São Francisco - “Senhor, faça-me um instrumento de vossa paz...” -, a paz que temos no Brasil foi alcançada graças à paciência, moderação e inteligência de nosso Presidente, Senador José Sarney.

Este é o Senado. Hoje a quantidade de Senadores médicos é maior do que aqueles dois há 180 anos, e com uma presença muito marcante. Foram citados Senadores e alguns usaram da palavra.

Mas quis Deus que chegasse o Presidente José Sarney, que nos inspira. Certa vez, ouvi S. Exª dizer que “a Pátria começa em Pinheiros, no meu Maranhão”. A minha começa no meu Piauí.

Serei breve, pois sou cirurgião - um só aqui. Para que tenhamos auto-estima, mantendo o amor e a crença em nossa profissão, devemos lembrar Juscelino Kubitschek, a que ninguém excedeu, que esteve aqui e foi exemplo em todo lugar.

O Piauí, lugar abençoado, é um Estado diferente. Neste País, vivemos a primeira experiência não democrática na ditadura civil de Vargas. Da ditadura militar nós nos libertamos graças à inteligência do então Presidente da República, Senador José Sarney, que soube fazer uma transição na paz, diferentemente de outros países. Vargas colocou interventor militar em todo o País. Todos eram tenentes. O Piauí é diferente. Somos diferentes. Nós fizemos este País grandão. Chegou D. João VI e disse: “Filho, fica aí com o sul, que vou ficar com o norte”. Não ficou. Fomos nós os primeiros a ir à luta em batalha sangrenta. No norte ficaria o Maranhão, que seria ligado a Portugal. Nós não deixamos. Quando olharem esse mapa grande, respeitem a coragem do bravo homem do Piauí na batalha sangrenta do Jenipapo. Os baianos fizeram uma batalha também, mas depois, em julho. A nossa foi em março. Fomos os primeiros que chegaram à luta. E assim se sucede. Atentai bem!

Também nos insurgimos contra Getúlio: nos livramos logo do interventor militar, Landri Sales. E Deus nos abençoou, deixando como interventor um médico: Leônidas Melo, piauiense de Barras, que estudou Pneumologia no Rio de Janeiro e foi para lá. E lá ficou. Foi interventor médico, por isso a Medicina do Piauí é avançada, e muito. Somos um dos poucos Estados brasileiros que fazem transplante de coração, não de brincadeira, mas com êxito. O interventor era médico de grande visão e implantou, com sua inteligência, um hospital, o Getúlio Vargas, um ícone. Assim foi que nasceu uma ponte com os norte-americanos. Como médico, orgulho-me do meu Estado, que tem uma das medicinas mais avançadas.

Teresina tinha uma universidade federal. Deus me permitiu governar o Estado e criar uma universidade estadual. Hoje, há também uma universidade privada. Portanto, existem três faculdades de Medicina na capital. Na área de transplante cardíaco, somos o segundo Estado do Nordeste.

A influência foi tão grande que, como Juscelino, que governou muito bem este País, vários foram os governadores médicos do Piauí. Quis Deus estar aqui o grande Senador Heráclito Fortes, que não é médico, mas fez muito pela Medicina. S. Exª deu início às obras de um pronto-socorro com um sonho, com um ideal - talvez o melhor -, quando foi prefeito de Teresina, em 1988. Infelizmente ainda hoje as obras estão paradas, e os governos não conseguem terminá-las.

O Estado do Piauí contou com o primeiro médico, um português, em 1803. E sucederam-se mais médicos governadores. Em 1873, governou Pedro Afonso Ferreira, e Dr. Leônidas Melo foi o interventor; depois, veio um brilhante cirurgião, Dr. José da Rocha Furtado, com curso no Rio de Janeiro; Dr. Tibério Barbosa Nunes, também formado no Rio de Janeiro, foi prefeito de Floriano e Governador; Dr. Dirceu Mendes Arcoverde, que tombou aqui nesta tribuna - Presidente José Sarney, daí eu sempre usar esta tribuna. Ele tombou aqui quando fazia o primeiro discurso como Senador da República. Fazendo o quê? Um homem obstinado, santo, virtuoso. Nenhum Governador do Piauí tinha mais virtudes do que Dirceu. Atentai bem: durante o período ditatorial, a primeira missão dele foi defender a saúde do governo militar. Sendo ele um homem tão sério, como seria difícil! Devido ao esforço, ele tombou aqui durante seu primeiro discurso. Teve um derrame, mas deixou para o Piauí o grande exemplo de probidade. Seu irmão, Valdir Arcoverde, foi Ministro da Saúde, e exerceu a profissão no Rio Grande do Sul. Era uma família ilustre.

Outros médicos do Piauí foram Senadores, como Dr. Lucídio Portella Nunes, homem austero, correto, de grande dignidade, fisiologista, irmão de Petrônio Portella, sem dúvida alguma, o maior político da história do Piauí e um dos artífices da redemocratização sem tiros, sem truculências, sem balas.

E Deus, em Sua bondade e generosidade, permitiu-me governar o Piauí por seis anos, dez meses e seis dias, até que me tomaram o poder. Mas, Sr. Presidente José Sarney, nunca conseguiram retirar Adalgisa e a mim dos corações dos pobres do Piauí. Essa é a verdade.

E aqui trouxe, a fim de simbolizar a grandeza da história da Medicina do Piauí, o Dr. Francisco Ramos. São muitos, não poderia trazer todos. Reconheço que não possuo muitos méritos. Meu avô foi o homem mais rico do Estado do Piauí. Possuía dois navios, Senador Mozarildo Cavalcanti. Não conheci ninguém que possuísse dois navios, Senador Heráclito Fortes. Chegou a possuir fábricas no Sul. Portanto, tive todas as condições de estudar, nunca me faltou oportunidade. Mas Francisco Ramos foi homem da região valenciana de Petrônio Portella, mas homem da enxada, do campo, de tirar leite da vaca, e saiu por aí lutando e lutando. Não sei como ele pulou do interior do sertão, de Valência, e saiu por aí, com pai vaqueiro. Tinha nome de Zé perigoso. Ele saiu lutando, por Teresina e Rio de Janeiro, como pedreiro auxiliar, assistente. Senador Mozarildo, ele foi à Alemanha, tornou-se neurocirurgião, o primeiro neurocirurgião do Piauí. O Hospital Getúlio Vargas, que fora criado por Leônidas Melo, que é um ícone do sistema de saúde da região, ele talvez tenha sido o que mais tempo o dirigiu. Alberto Silva, que governou por duas vezes aquele Estado, foi diretor do hospital e eu também.

Senador Heráclito Fortes, aquele pronto-socorro com que V. Exª sonhou ainda está parado, mostrando a incompetência, a inapetência, o desapreço dos políticos do Brasil. Quero dizer-lhe que Francisco Ramos fez, mais por gratidão, um pronto-socorro em 14 meses, com 150 leitos, salas de cirurgia, sala de queimados, UTI, etc. E a obra que V. Exª começou, Senador Heráclito Fortes, está lá, parada, há quase 14 anos. Então, essa é uma hora para sensibilizar o Brasil, o Governo, o PT, a prefeitura para terminá-la.

Aqui está uma homenagem, sobretudo porque ele acaba de lançar um livro que diz tudo isso, com muita grandeza. Nem a síntese das sínteses, eu não quis cansá-los sobre a história do Hospital Getúlio Vargas, construído na ditadura, mas ele é tão arrojado, tão lutador que passou para a história da Medicina do Piauí. Trata-se de uma das melhores obras sobre a medicina hoje no Brasil.

Lembro ao Presidente Senador José Sarney, que é um intelectual, a nossa Academia de Letras do Piauí e o médico e intelectual Francisco Ramos, que se consagra pela sua bela passagem pela medicina, fundador da Faculdade de Medicina Federal fundador da Faculdade de Medicina do Estado e outros serviços de saúde no Estado do Piauí.

O que queríamos mostrar é o orgulho. E aí está a importância de ser médico, como Juscelino Kubitschek, médico ligado à política, não era do Piauí, porque a definição de saúde não é a ausência de enfermidade ou de doença, mas o completo bem-estar mental, físico e social. Vê-se a necessidade de combater o pauperismo, a miséria, o desemprego, a fome e a injustiça social. É disto que nos buscamos aproximar: o bem-estar social. Poderíamos fazer muita mais, como eu o fazia, numa sala de cirurgia de uma Santa Casa de Misericórdia, com essas mãos guiadas por Deus, salvando um aqui, outro acolá. Não nos encanta o poder pelo poder, mas como um instrumento para fazer o bem e servir. Essa é a nossa virtude de médico. Entro, para valer, não com o meu exemplo, mas com o de Juscelino.

Agora, vou contar a minha vida. Já cirurgião, fui para o Piauí porque quis. Deus foi muito bom para mim, pois comigo aconteceu o inverso: só conheci esse negócio de desemprego como político. Deus foi tão bom comigo, que havia fila de emprego para eu escolher. De repente, a gente se envolve na política. Médico, muito novo, encontrei o Presidente Sarney na região do Parnaíba no começo dos anos 70, lá no Igaraçu, no Cabano. Ele, nos anos 70. Se ele é charmoso hoje, já pensou nos anos 70? Parecia o Clark Gable. Aí eu, ali, médico; ele trabalhando, buscando voto no Maranhão, em Araióses, na Tutóia, no Barro Duro. Foi lá que eu recebi esse apelido, Mão Santa, no Maranhão. E Parnaíba maior. Ele, com grandes amigos lá, empresários da cera, grandes amizades que sempre teve. Quis Deus recentemente que ele recebesse o título de nossa cidade pela amizade que tinha à cidade, pelos serviços de cidadão. E eu, Papaléo, encontrei-o nos anos 70 candidato a Deputado Federal, descansando das suas excursões no norte do Maranhão. Então, esta é a luta. De repente, inspirado por ele, sei que entrei nessa confusão. Eu, dedicado, fui um cirurgião muito bom, podia fazer curso fora; fazia; ia pelo Brasil e pelo mundo, todos os anos. Mas fui ficando híbrido: meio médico, meu político e, depois, nessa confusão. De repente, Papaléo e Heráclito, elegeram-me prefeito de Parnaíba. Presidente Sarney, de madrugada, eu me virava: pronto. E agora? Estava tão bom: era cirurgião, todo ano férias, viajava no mundo. Como é que fui entrar fria? Cirurgião é aquele templo de trabalho que é uma sala de cirurgia. E agora vou me lascar. Mas Einstein - recordei aqui no Dia do Professor - disse, Presidente Sarney, que educação é aquilo que a gente esquece da escola. Fica a disciplina e o aprender a estudar. Comecei a estudar Administração. Minha Adalgisa dormia e eu estudava um livro complicado de Henry Fayol, e pensava: “Vou me lascar. Não sei para que entrei nessa fria.” Foi chegando o dia da posse. De madrugada, minha mulher ficava na cama e eu estudava. Peguei um livro de capa amarela, de Taylor, o mago da Administração. Lá estava escrito que administrar é fácil. Dava como exemplo o trabalho do cirurgião. Então eu respirei aliviado. Para administrar precisa-se trabalhar em equipe - e é isso que faz o cirurgião. Para administrar tem-se que prever - e o cirurgião faz o diagnóstico. Para administrar tem-se que ter decisão, coragem, noção de tempo, saber quanto tempo vai levar para começar e terminar. Assim, fui acreditando em mim, a partir do exemplo do cirurgião. Já andei muito e agora estou aqui.

O cirurgião tem estas características: trabalho em equipe, decisão, coragem, arrojo e determinação para vencer as dificuldades. Segundo Henry Fayol, planejar é dar coordenadas, é fazer o controle. O pré-operatório é isso. Estamos fazendo ligeiro. O operação é a obra, o controle é o pós-operatório.

Para onde formos levaremos a nossa formação. Eu a trago e agora estou aqui. Estou agradecido.

O homem que mais me encantou - não foi V. Exª, Senador José Sarney, que encanta muito - foi Simon Bolívar. Eu sou apaixonado por Simon Bolívar. Sei que existe Che Guevara e Juscelino Kubitschek, que também eram médicos, mas sou admirador de Simon Bolívar. Quando D. João VI sugeriu a seu filho que pusesse a coroa antes que um aventureiro o fizesse referia-se a Simon Bolívar. Ele vinha libertar o Brasil. Era um aventureiro, aos 24 anos.

Quando estive na Venezuela, soube que ele foi soldado, cabo, capitão, general, comandante-em-chefe, brigadeiro, presidente, ditador, um libertador! Mas jamais abdicaria do título de bom cidadão.

Deus me proporcionou muitos títulos, mas eu jamais abdicarei da condição de membro da classe médica. Considero a Medicina a mais bela das ciências e o médico, o grande benfeitor da humanidade.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/10/2004 - Página 31542