Discurso durante a 148ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre o Decreto Presidencial 5.220. (como Líder)

Autor
José Jorge (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: José Jorge de Vasconcelos Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TELECOMUNICAÇÃO.:
  • Considerações sobre o Decreto Presidencial 5.220. (como Líder)
Aparteantes
Heráclito Fortes.
Publicação
Publicação no DSF de 27/10/2004 - Página 33253
Assunto
Outros > TELECOMUNICAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, DESRESPEITO, CONGRESSO NACIONAL, PUBLICAÇÃO, DECRETO EXECUTIVO, AUTORIZAÇÃO, MINISTERIO DAS COMUNICAÇÕES (MC), RECRIAÇÃO, DELEGACIA REGIONAL, CONTRATAÇÃO, TECNICO, DIREÇÃO E ASSESSORAMENTO SUPERIORES (DAS), QUESTIONAMENTO, AUSENCIA, CONCURSO PUBLICO, FAVORECIMENTO, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), USURPAÇÃO, FUNÇÃO, AGENCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES (ANATEL).
  • PROTESTO, EXCESSO, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), OBSTACULO, EXERCICIO, FUNÇÃO LEGISLATIVA, CONGRESSO NACIONAL, ESPECIFICAÇÃO, IMPEDIMENTO, PAUTA, AGENCIA NACIONAL, REGULAMENTAÇÃO, TELECOMUNICAÇÃO.
  • DENUNCIA, FALTA, ESTABILIDADE, NORMAS, REGULAMENTAÇÃO, SERVIÇOS PUBLICOS, REDUÇÃO, INVESTIMENTO, CAPITAL ESTRANGEIRO, RISCOS, CRISE, ABASTECIMENTO, ENERGIA.
  • SUSPEIÇÃO, OBJETIVO, GOVERNO FEDERAL, RETIRADA, AGENCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES (ANATEL), ADMINISTRAÇÃO, RECURSOS, FUNDO DE UNIVERSALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES (FUST).
  • DEFESA, CRIAÇÃO, AGENCIA, AMBITO ESTADUAL, DESCENTRALIZAÇÃO, FISCALIZAÇÃO, SERVIÇOS PUBLICOS.

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE. Pela Liderança do PFL. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, venho a esta tribuna denunciar mais um ataque desferido pelo Governo do Presidente Lula e do Partido dos Trabalhadores a esta Casa e ao espírito republicano aqui representado.

No início deste mês, foi publicado, à surdina e nas cinzas da ressaca eleitoral, o Decreto Presidencial nº 5.220, autorizando o Ministério das Comunicações a recriar as 11 delegacias regionais extintas no Governo passado e a contratar, no primeiro momento, 37 novos técnicos com nível de Direção e Assessoramento Superior (DAS).

Será que tais vagas serão ocupadas por servidores aprovados em concurso público? Se, efetivamente, todos as “falecidas” delegacias regionais voltarem a funcionar, quantos cargos comissionados a mais terão que ser criados? E a troco de quê, Sr. Presidente?

Na realidade, com tal ato, Srªs e Srs. Senadores, o Ministério das Comunicações acabará por assumir as funções que hoje são da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).

Trata-se, portanto, de mais uma atitude de desrespeito e desprezo do Governo com o Congresso Nacional, pois aqui tramita o Projeto de Lei nº 3.337, de 2004, que dispõe sobre a gestão e o controle social das agências reguladoras, já com um substitutivo apresentado pelo relator e estando em condições de ser votado pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados.

Sr. Presidente, esse projeto ainda não foi votado na Câmara dos Deputados exatamente pelo fato de a pauta da Câmara estar trancada, e a última informação que obtive é de que havia 16 medidas provisórias, mas esse número aumenta a cada dia. Nas últimas semanas aquela Casa conseguiu votar apenas três medidas provisórias - a que se referem os ofícios lidos no Expediente -, que agora vêm também fechar a pauta do Senado.

Aliás, conheço bem uma delas, que é até muito engraçada, pois regulamenta a questão do tal chip de censura em programas de televisão para crianças. Essa medida provisória praticamente repete um projeto que já havia sido aprovado pelo Congresso. O Executivo anulou o projeto e apresentou essa medida provisória, em claro desrespeito, o que inclusive tranca a pauta, em detrimento da apreciação dos tais projetos que considera prioritários para o Governo.

O Parlamento brasileiro, nobres Colegas, não podem ser relegado a segundo plano nessa importante discussão. Aqui devem ser travados os debates e levantadas as questões sobre o modelo e as funções das agências reguladoras, essas instituições que marcaram um novo paradigma na administração pública e que, definitivamente, vieram para ficar.

Se permitirmos, Sr. Presidente, o desmonte da Anatel, tal como está consubstanciado no decreto presidencial deste mês, a sanha governista acabará por atingir todo o sistema regulatório nacional, desmontando o processo de modernização do Estado iniciado no Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso.

O caso é muito grave, Srªs e Srs. Senadores, e simboliza a tônica da atual gestão federal. Passa-se por cima de tudo e de todos, não havendo o menor respeito às instituições ou aos compromissos firmados. O que somente parece interessar ao politburo petista é aparelhar a máquina pública e alimentar o seu ímpeto estadista.

Ora, Sr. Presidente, gostaríamos de saber, honestamente, para que ressuscitar a estrutura das delegacias regionais, que não têm mais função e só serviriam para ampliar o cabide de empregos daquele Ministério e desautorizar as atividades da Anatel.

No meu Estado, Sr. Presidente, todos os candidatos derrotados do PT e alguns aliados já conseguiram seus cargos. Inclusive, na hora em que forem criados esses cargos, não haverá aliados do PT para assumir, pelo menos que foram candidatos, porque cada um deles já estará em seu cargo público, nomeados pela Administração Lula.

Antigamente, no modelo anterior, as delegacias regionais tinham como tarefa fiscalizar as empresas de telecomunicações. Entretanto, com a criação da Anatel, suas atribuições foram deslocadas para a respectiva agência reguladora, tornando-as obsoletas e levando-as à extinção.

As delegacias regionais foram extintas, segundo palavras do ex-Ministro das Comunicações Juarez Quadros, “por não ter mais função. Elas fiscalizavam empresas de radiodifusão e telecomunicações, função que passou a ser exercida pela Anatel”.

Agora, tenta-se retirá-la das catacumbas e do ostracismo burocrático para abrir vagas destinadas aos fiéis “companheiros”. Não temos receio em afirmar que o decreto fulmina os princípios da moderna gestão do Estado, e seus efeitos acabarão por afastar, cada vez mais, futuros investidores do nosso sistema de telecomunicações.

Ações como essas sinalizariam uma vez mais, com a instabilidade de regras dos marcos regulatórios dos serviços públicos essenciais, que têm como conseqüência a fuga de investimentos privados. Somente no setor elétrico houve uma redução de 50% dos investimentos estrangeiros, entre os anos de 2002 e 2003, em virtude das incertezas regulatórias do Governo Federal.

Todos os jornais de hoje estão com matérias baseadas em um relatório da ONS. Diga-se de passagem, Sr. Presidente Eduardo Siqueira Campos, que esse relatório é até otimista, pois diz que poderá haver outra crise de energia no ano de 2008 se medidas não forem tomadas rapidamente.

Dentro desse sórdido processo de desarticulação institucional das agências reguladoras, deverão ser retiradas da Anatel, conforme intenção já manifestada pelo Governo, as outorgas dos serviços públicos de telecomunicações, como telefonia fixa, e a gestão dos recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST), que somam cerca de R$3 bilhões. Portanto, a questão deve estar nesse ponto. Na realidade, o Governo não quer que a Anatel administre os R$3 bilhões do FUST.

Sr. Presidente, o decreto presidencial publicado na semana passada reproduz algumas propostas contidas na sua versão anterior, elaborada em março de 2003, na gestão do então Ministro Miro Teixeira. Em um dos pontos que mais causaram calafrios nos investidores, atribuiu-se ao Ministério das Comunicações a função de supervisionar as atividades da Anatel.

Ora, Sr. Presidente, Srªs e Srs Senadores, todos nós sabemos que o modelo das agências reguladoras encontra sua razão na autonomia de sua gestão - agência sem autonomia é melhor que não exista -, calcada em um marco regulatório previamente estabelecido e que gere um ambiente de estabilidade e confiança para atração de novos e sólidos investimentos.

Infelizmente, parece que ou PT não entendeu direito como funciona o sistema, ou o abomina, por privar-lhe de mais um “naco” para o seu imenso apetite de poder.

Não é por outra medida, Sr. Presidente, que vira e mexe somos surpreendidos com os atentados petistas contra a autonomia das agências, não apenas com a Anatel, mas também com a Aneel, a ANP, e está acontecendo agora com a Ancine - talvez, um dos mais graves. Todas as agências reguladoras estão permanentemente sob pressão do Poder Executivo, a fim de que lhes seja tirado o poder. É assim na área da cultura, da energia, das telecomunicações.

Sr. Presidente, em vez de fazer renascer as anacrônicas delegacias regionais, o Governo deveria incentivar a descentralização da fiscalização dos serviços de telecomunicações por meio das agências reguladoras estaduais, tal como ocorre no segmento energético, em que a lei que criou a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) prevê esse tipo de delegação - que já é feito no caso específico, por exemplo, do nosso Estado. No Estado de Pernambuco, existe uma agência estadual que faz a fiscalização para a Aneel e que poderia também, por meio de convênio, fazer para a Anatel.

Se V. Exª me permite, Sr. Presidente, vou conceder um rápido aparte ao Senador Heráclito Fortes.

O SR. PRESIDENTE (Eduardo Siqueira Campos. PSDB -TO) - Trata-se de uma comunicação de interesse partidário. Como sei que o Senador Heráclito Fortes conhece bem a situação, tenho certeza de que S. Exª será extremamente breve nesse descumprimento regimental.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Serei um relâmpago neste aparte, Sr. Presidente. É apenas para colaborar com o Senador José Jorge quando fala na interferência praticada pelo Governo nas agências. Senador José Jorge, se abrirmos o Diário Oficial de hoje, veremos a demissão de dois integrantes do Denit, que são os Srs. Washington Lima de Carvalho, Diretor de Infra-Estrutura Aquaviária do Departamento Nacional de Infra-Estrutura, e Raimundo José Santa Cecília Corrêa, Diretor de Planejamento e Pesquisa do Departamento de Infra-estrutura Nacional do Transporte. Embora esteja aqui, entre aspas, que foi a pedido, uma matéria da Broadcast diz que é para ajustes na equipe. Sr. Presidente, acima de tudo, trata-se de um desrespeito ao Senado da República. Aproveito a presença do Líder do PMDB na Casa, que dá sustentação ao Governo, Senador Renan Calheiros, para chamar a atenção para esse fato. A Comissão aprova, vem a Plenário e as exonerações são feitas a menos de uma semana do segundo turno das eleições, sem cumprimento de mandato, sem nada. Apenas estou trazendo esses dois fatos, Senador José Jorge, para exatamente colaborar com o que V. Exª diz no que se refere à interferência na autonomia das agências. Muito obrigado.

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) - Agradeço a V. Exª o aparte e solidarizo-me inteiramente com ele. Na realidade, eu não sabia dessas demissões. Sou Presidente da Comissão de Infra-Estrutura. Essas indicações foram aprovadas pela Comissão de Infra-Estrutura há pouco tempo. Senador Renan Calheiros, quando essas indicações chegam aqui, querem que as aprovemos em 24 horas.

Às vezes, o Governo demora três meses para indicar uma pessoa e depois faz uma pressão muito grande para que aprovemos rapidamente.

Nesse esforço concentrado mesmo, aprovamos alguns nomes. Aprovamos o nome e, depois, por uma questão que deve ser política, para agradar algum aliado, a pessoa que tem mandato é demitida. Isso é muito grave e lamento que tenha acontecido.

Poder-se-ia seguir o exemplo do meu querido Estado, Pernambuco, onde a Agência de Regulação de Pernambuco (ARPE), uma das pioneiras no Brasil, atende a população na fiscalização de serviços como saneamento, energia elétrica, gás canalizado, etc. Poderia também fiscalizar a parte de comunicações.

Na própria lei que instituiu a Arpe, há previsão de atuar na área de telecomunicações. Entretanto, como suas atividades fiscalizadoras somente são exercidas mediante convênio com a União, ainda não se efetivou tal prerrogativa.

Meus caros Senadores e Senadoras, não podemos assistir, inertes, a mais esse golpe desferido pelo Governo Lula contra a boa administração pública. O modelo das agências reguladoras simboliza transparência e eficiência no trato da coisa pública. Enfraquecê-las ou desautorizá-las representaria um atraso de décadas no árduo processo de modernização da máquina estatal.

Pela valorização da República, pela valorização do Parlamento brasileiro, basta! Temos que impedir que as agências reguladoras tenham seus poderes diminuídos a cada dia por esse Poder Executivo, que é de momento, pois, certamente, daqui a dois ou três anos, teremos um outro Governo, com outra cabeça, que, certamente, vai valorizar as agências reguladoras.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/10/2004 - Página 33253