Discurso durante a 160ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre o aumento da carga tributária no Brasil.

Autor
Ideli Salvatti (PT - Partido dos Trabalhadores/SC)
Nome completo: Ideli Salvatti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL.:
  • Reflexão sobre o aumento da carga tributária no Brasil.
Aparteantes
José Jorge.
Publicação
Publicação no DSF de 18/11/2004 - Página 36672
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL.
Indexação
  • IMPORTANCIA, DISCUSSÃO, ORIGEM, DESEQUILIBRIO, INJUSTIÇA, CARGA, TRIBUTOS, PAIS.
  • ANALISE, EVOLUÇÃO, AUMENTO, IMPOSTOS, BRASIL.
  • REGISTRO, INICIATIVA, GOVERNO FEDERAL, REDUÇÃO, CARGA, TRIBUTOS, ESCLARECIMENTOS, AUMENTO, ARRECADAÇÃO, IMPOSTOS.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC. Como Líder. Sem revisão da oradora.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores que se fazem presentes nesta manhã no plenário, vim a esta tribuna para falar de um único assunto.

No Bom Dia Brasil de hoje, assisti a uma entrevista do empresariado nacional. Na chegada ao Congresso, tive a oportunidade de ler todos os cartazes e faixas expostos no gramado, referentes aos impostos brasileiros.

Isso faz parte, é claro, de todo um movimento que já se vem desenrolando há algum tempo. Se não me falha a memória, está sendo chamado de “feirão do imposto”. Tenho o entendimento de que é importante, é relevante que possamos trazer a público o peso que os impostos têm no nosso País, o volume da carga tributária. Mas também é importante deixar claro - e isto talvez seja falho, não esteja explícito no que vem sendo realizado -, que, na questão tributária brasileira, talvez muito mais grave do que a carga seja a injustiça tributária, porque efetivamente paga imposto no Brasil quem menos ganha. O peso da carga tributária é inversamente proporcional à renda da população. Quem mais ganha menos paga; quem menos ganha mais paga imposto proporcionalmente.

Isso já está comprovado com dados, com pesquisas; mas, no feirão do imposto, é muito irrelevante a discussão da injustiça tributária. No entanto, existe algo que não aparece nesse movimento, que é como se constituiu a carga tributária brasileira, como ela chegou ao ponto em que está hoje.

É um movimento interessante; no meu ponto de vista, relevante, importante. Inclusive hoje, no Bom Dia Brasil, as perguntas do Alexandre Garcia ao empresário do Grupo Gerdau foram pertinentes. Quando ele perguntou: “Mas, por que só agora? Por que não antes? A carga tributária não chegou ao ponto que está de repente, magicamente, num estalar de dedos; ela foi construída ao longo da história”. O desvio do assunto se deve ao fato de que o histórico da carga tributária, como ela se constituiu, como ela chegou ao ponto em que chegou é irrelevante, não aparece.

Estou tentando publicar um artigo, já há quase um mês, em um jornal de grande circulação nacional, que, quase semanalmente, tem dado espaço para Parlamentares desta Casa falarem da questão tributária. Mas não tenho conseguido publicar o meu artigo. A publicação estava prometida para segunda-feira, dia 15, mas isso não ocorreu. E não sei se será publicado porque o artigo tem como título Amnésia. Há uma verdadeira amnésia quando se fala da questão tributária.

O Sr. Senador José Jorge (PFL - PE) - V. Exª me permite um aparte?

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Senador José Jorge, estou usando os cinco minutos para fazer a minha comunicação inadiável. Só me faltam um minuto e dez segundos. Não posso conceder apartes. Quero usar o meu tempo.

O Sr. Senador José Jorge (PFL - PE) - Só trinta segundos.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Não. Desculpe-me, mas não vou lhe conceder aparte. Inscreva-se e terá oportunidade de falar. Vou usar o meu tempo até porque ele será pequeno para tudo o que quero falar.

As pessoas sofrem de amnésia e se esquecem que a carga tributária cresceu. No período de 1995 a 2002, houve o mais alto e brutal aumento da carga tributária da história deste País. Houve aumento médio da carga tributária acima de 1,2% ao ano. Aumentou de 26% para 36% do Produto Interno Bruto. Ou seja, de cada R$100,00 que se produziu de riqueza, em 1995, recolhiam-se 26% de imposto; hoje são 36%. Disso eles se esquecem, parece que ninguém fez. Dá essa impressão.

Parece que o problema da carga tributária elevadíssima, cruel e injusta que existe no Brasil é deste Governo. O principal ponto a ressaltar é: se queremos discutir seriamente a questão tributária, temos que discutir sob esses dois viés - a injustiça tributária, que é muito mais grave e séria do que a carga em si, que já é grave por si só; e como isso foi construído.

Se avaliarmos a questão de concentração no Governo Federal, devemos fazer um histórico: todas as contribuições que não são repartidas entre os demais entes federados, Estados e Municípios, não foram criadas agora; todas são anteriores, quais sejam: a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, PIS, Cofins, Cide, CPMF, e assim por diante. Aliás, se houve alguma reversão de repartição, foi agora. Quanto à Cide, por exemplo, acabamos de aprovar, primeiramente, um repasse de 25% e, agora, 29% não fica mais com o Governo Federal, vai para os Estados e Municípios.

Com relação à Contribuição sobre o Lucro Líquido, quando a matéria passou aqui nesta Casa, lembro-me de uma das primeiras polêmicas da qual tive a oportunidade de participar: ampliação de 3% para 4% para os bancos. Gerou uma polêmica. Quem fala tanto de carga tributária foi o primeiro a se levantar e se pronunciar contra: “Não se pode aumentar a contribuição do lucro líquido dos bancos!”

Então, entendo que temos de fazer um debate sério, porque a questão tributária é seriíssima, para ser tratado sem memória, sem história e sem análise, inclusive da repercussão social que a tributação tem.

Eu gostaria, ainda, de ressaltar algumas iniciativas importantes do Governo atual, que passam batidas. A desoneração da exportação; a desoneração tributária para reconstrução de toda a nossa malha portuária; a desoneração de investimentos e poupança de longo prazo; a desoneração, pela primeira vez, de impostos da cesta básica - propiciada recentemente pelo Governo -, tudo isso parece que não tem nada a ver. Essa arrecadação é necessária, até para que o Governo possa honrar outros compromissos que a amnésia também faz questão de esquecer, como pagar dívidas e honrar contratos que nos foram entregues. Afinal nem dívidas foram contraídas por este Governo nem os contratos de privatização com reajustes de tarifas exorbitantes. Então, essa amnésia deixa-nos, às vezes, um pouco nervosos.

Tenho lido e ouvido artigos e pronunciamentos que confundem aumento de arrecadação com aumento de carga tributária. Estamos batendo recorde de aumento de arrecadação. Só poderíamos estar fazendo isso. Por quê? Retomamos o crescimento, a economia está crescendo. Se cresce, se produz mais, vende mais, é óbvio que haverá mais arrecadação. Então é um erro primário confundir aumento de carga tributária com aumento de arrecadação.

Eu não agüento mais, já vim a esta tribuna, pelo menos umas cinco vezes, para falar a respeito desse IBPT - Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, que, só no ano passado, basta acessar o site, corrigiu quatro vezes os dados alarmantes de crescimento de carga tributária. Corrigiu, corrigiu, corrigiu e, no final do ano, descobriu que o tal aumento da carga tributária, que, no começo do ano, ele anunciava como sendo de 40%, tinha sido residual de 0,2%. E, na realidade, nem de 0,2% foi, mas de 0,16% apenas.

Quando se fala da reforma tributária, é importante registrar - e aqui, de novo, é bom falar da amnésia - que o Governo anterior teve oito anos, fez muitas alterações na área tributária, mas não teve coragem de fazê-las oficialmente, de forma pública e notória, encaminhando uma reforma tributária ao Congresso Nacional. As medidas foram pontuais, foi-se mexendo, criando-se contribuições, concentrando a arrecadação na União, mas quem teve coragem de comprar a briga, mandar projeto e instalar a polêmica no Congresso Nacional foi o atual Governo.

Então, quando se fala que a reforma tributária não está terminada, é verdade, não está, há uma série de medidas a serem tomadas, como a unificação do ICMS em apenas cinco alíquotas para acabar com a elisão fiscal, com a evasão fiscal, com a sonegação ostensiva, pois temos 27 legislações, 49 alíquotas. Por tudo isso é de fundamental importância que concluamos a reforma tributária. Mas por que ela não anda? Todos sabemos da pressão que os Governadores fazem. Ou vamos esquecer que há Governador que não quer, em hipótese alguma, que se unifique o ICMS, exatamente porque, ao unificar, acaba-se com a guerra fiscal. Tudo isso tem que ser dito.

Hoje, por exemplo, no programa Bom Dia Brasil, o Gerdau falou, falou, falou, e, em nenhum momento, registrou que, na reforma tributária, que tivemos a capacidade de negociar e trabalhar aqui neste Senado, está incluído o IVA, decorrente da unificação do ICMS em 2005, objetivando trabalhar a criação do imposto sobre o valor agregado, que, como todos sabemos, é um imposto mais moderno, mais eficiente, mais fácil de ser controlado e fiscalizado.

Queremos fazer o debate sobre a questão tributária? Todos nós queremos. Queremos avançar e diminuir a carga tributária? Todos nós queremos. Mas não vamos trabalhar com amnésia, porque isso é algo que não vamos admitir nem permitir. Amnésia é ficar batendo em tecla, em números, em dados que não coincidem com a realidade.

Sr. Presidente, peço desculpas por ter ultrapassado o tempo regimental. Como quem estava presidindo a Mesa teve muita gentileza para com o Senador César Borges, entendi que eu também poderia usufruir da mesma gentileza e ultrapassar o meu tempo.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/11/2004 - Página 36672