Discurso durante a 166ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Homenagem ao economista Celso Furtado, recém-falecido.

Autor
Mão Santa (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PI)
Nome completo: Francisco de Assis de Moraes Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Homenagem ao economista Celso Furtado, recém-falecido.
Publicação
Publicação no DSF de 23/11/2004 - Página 37405
Assunto
Outros > HOMENAGEM. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, CELSO FURTADO, EX MINISTRO DE ESTADO, ECONOMISTA, ADVOGADO, PROFESSOR, ESCRITOR, ESTADO DA PARAIBA (PB), RELEVANCIA, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, CRIAÇÃO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE).
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE), INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO, REGIÃO NORDESTE.
  • DEFESA, NECESSIDADE, CONGRESSO NACIONAL, VIABILIDADE, RETORNO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE), FORMA, HOMENAGEM, CELSO FURTADO, ECONOMISTA.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, brasileiros e brasileiras, a que nos assistem por intermédio do sistema de comunicação do Senado, quis Deus que estivesse presente a esta sessão de segunda-feira o Líder do Governo, o economista e Senador Aloizio Mercadante. Não vamos buscar o que nos separa - siglas partidárias -, mas o que nos une - sonhos, ideais, o amor pelo Brasil e a admiração a certos vultos nacionais.

Hoje, tive o prazer de ler um artigo do Senador Aloizio Mercadante no qual faz uma análise da vida e da obra do economista Celso Furtado, homenageando-o.

O Nordeste fica empobrecido porque perdeu aquele que sonhava de uma forma diferente. Há milhares de economistas. Aliás, Senador Paulo Paim, entendo que as melhores economistas são as donas-de-casa brasileiras, as mulheres dos trabalhadores brasileiros, que ganham um salário mínimo tão baixo, que nunca atingiu o valor com que sonha o Senador Paulo Paim.

O que nos faz vir à tribuna é o significado. Tudo nos remete a Celso Furtado. Este ambiente existe graças à ousadia de Juscelino Kubitschek.

Senador Aloizio Mercante, a nossa geração - V. Exª é um pouco mais novo - era muito ligada aos filósofos. Predominou no Brasil, quer no começo da política imperial, quer no nascimento da República, a filosofia positivista de Auguste Comte. Daí surgiram os dizeres da nossa bandeira: “Ordem e Progresso”. O francês Auguste Comte influenciou muito o Brasil. Aliás, toda a França. Paris era a capital do mundo, da democracia. A França deu seu grito com o lema: “liberdade, igualdade, fraternidade.” Foram influenciados por uma filosofia que tinha como inspiração o amor, como base a ordem e como fim o progresso.

O nosso economista, paraibano, era positivista. O que o diferia dos demais? Acreditar naquilo que é mais importante: o ser humano.

Em 2001, em sua última entrevista, ao jornal Brasil de Fato, deixou a mais bela mensagem aos economistas. Perguntaram-lhe: professor Celso Furtado, quais são os problemas fundamentais da sociedade brasileira atual? Senador Papaléo Paes, atentai bem! Presidente Lula, atentai bem! Esse homem do Nordeste, com a simplicidade do Nordeste, respondeu: “O primeiro desafio é dar prioridade ao problema social e não ao econômico”. Isso o distinguiu dos demais.

Senador Aloizio Mercadante, quando fui Governador do Piauí negociamos a nossa dívida. Quero ajudar V. Exª e penso que o único problema do País é a dívida dos Estados, pois é uma carga muito pesada. Eu advertia que só tem um jeito, que não há outro caminho: tem de ter coragem. Sofri o problema e quero ajudar.

Então, eles renegociaram a dívida com uns Estados com 13% e com outros com 11%, como foi o caso do Piauí. Ainda hoje me acusam, porque assinei e fui forçado. Consegui 11% devido ao meu temperamento - contestei todos os economistas -, porque já estava pronto para ser assinado e homologado o documento com 13%.

Senador Aloizio Mercadante, para reduzir os dois pontos percentuais, tive que fazer uma apelação sentimental. Deus ajudou um pouquinho o Piauí, porque para nós, segundo a insensibilidade dos técnicos, seriam 13%, mas havia outros Estados com 11%. Eu queria os 11%, mas eles estavam irredutíveis. E eu dizia para eles: vocês nunca viram a pobreza que há em lugares como Guariba, Acauã, pois o destino de vocês é Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Washington, Paris, Tóquio, Banco Mundial, Bird! Eu me recusava a assinar e brigava, irreverente.

Em substituição ao Ministro Pedro Malan - acho que Deus estava ajudando o Piauí - veio o Ministro Pedro Parente, filho de um homem do Piauí. “Mateus, primeiro os teus”. Então, apelei para o sentimento. Não é assim. A Federação é o pai e a mãe. E o filho doente tem de ser tratado diferentemente. O Piauí está doente e não pode receber um percentual de 13%. Creio que o Piauí deve isto ao Pedro Parente, que impôs, contrariando todos os técnicos, que o Piauí ficasse. Mas é pesadíssimo, porque nessa renegociação muitos fatores não entraram. Ela aumentou.

Entendo, Senador Aloizio Mercadante, que as outras são imutáveis. Nenhum Governador, seja de São Paulo ou do Piauí, poderá diminuir o funcionalismo público. A Lei Camata já diminuiu e a máquina tem de existir. Nenhum deles vai diminuir o que o Estado tem de gastar com a Justiça, o percentual de 6%; com o Poder Legislativo; com o Ministério Público ou com a Defensoria Pública; os 25% da educação; ou os 11% da saúde.

Senador Papaléo Paes, o único fator mutável para que um Governador possa respirar, administrar e proteger o seu povo é a dívida, por meio da renegociação, ampliação de espaços e diminuição do percentual. Mas disso ninguém fala. Todos fogem, porque vai de encontro ao dinheiro, ao poder econômico, aos banqueiros que muito ganham.

Celso Furtado esclarece que o primeiro desafio é dar prioridade aos problemas sociais, e não aos econômicos. Os problemas econômicos são aqueles que os economistas sabem equacionar razoavelmente, embora tropecem na interpretação de problemas macro ou micro. Às vezes, raciocinam no plano micro e inferem solução no ponto de vista macroeconômico, o que faz com que seja difícil sair da situação.

Contudo, não creio que seja somente por isso. O Brasil investiu muito, criou o sistema industrial dos mais poderosos do mundo, sendo hoje uma economia que pesa no sistema de decisões. Por outro lado, apresenta graves limitações. A capacidade de se autodirigir, criar seu próprio destino é extremamente limitada, o que tem a ver com o fator social, e não com o econômico. Se o Brasil proceder à identificação dos problemas sociais, conseguirá criar um tipo novo de opinião publica.

Faço esta homenagem porque vivi essa geração. Vi nascer no Nordeste um dos frutos mais importantes do sonho de Juscelino Kubitschek, o desenvolvimentista que imaginou o tripé industrial no Sul, o pai da indústria moderna. Brasília, sonho de José Bonifácio - a minha geração via no mapa do Brasil um quadrilátero e não entendia -, era um sonho desde o Império, que se manteve com a bandeira positivista de Ordem e Progresso. A transferência da capital para o centro do País viria para unir todos nós.

Juscelino ousou e tornou o Sul forte com o seu parque industrial. Todos nós vimos e andamos no sonho do primeiro fusca. E Brasília, como modificou? Então, ele imaginou um tripé e criou a Sudene - Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, que seria o elo. Sou testemunho porque tenho um irmão economista, que entrou na primeira leva por concurso. Vi aquela juventude dedicada, idealista: Delile, Leonides, Salmito, Paulo, economistas que promoveram o desenvolvimento do Nordeste por intermédio da Sudene.

Senador Aloizio Mercadante, o que considero mais importante na Sudene vem das palavras de Padre Antônio Vieira: “Um bem nunca vem só.” E, por Antoine de Saint Exupéry: “O essencial é invisível aos olhos.”

A Sudene fomentou a industrialização do Nordeste, que aí está, bem ou mal. Se houve corrupção, vamos fazer uma CPI, vamos botar o ladrão na cadeia, mas vamos ressuscitar a Sudene. O mais importante na Sudene foi o homem, Senador Aloizio Mercadante. Ela foi a primeira universidade do Nordeste, formando homens, técnicos capazes e responsáveis.

De 1995 a 2001, quando governei o Estado do Piauí, vários secretários e técnicos eram oriundos da Sudene, onde adquiriram experiência.

Aqui está o livro “Seminário Internacional de Celso Furtado: A Sudene e o futuro do Nordeste”, homenagem aos 80 anos de Celso Furtado e aos 40 anos da criação da Sudene. Foi lançado em junho de 2000. A Sudene teria, hoje, 44 anos.

O livro contém um discurso de José Targino Maranhão, atual Senador pela Paraíba, em homenagem ao aniversário de 80 anos desse grande homem Celso Furtado.

A Sudene deve ser vista como no tempo em que foi criada, em dezembro de 1959. Os Governos eram tímidos, eram acanhados, então, iam buscar o planejamento dos técnicos da Sudene. Hoje cada Estado se tornou auto-suficiente, com seus secretários de planejamento e suas estruturas. Mas, durante todos esses anos, o mais importante da Sudene foi a formação de técnicos competentes e capazes de administrar qualquer situação e possibilidade de riqueza para o Nordeste combater a pobreza.

Fui Prefeito de minha cidade e desde então reconheço a importância da Sudene. Nas horas de dificuldades e nos dramas da seca, a Sudene tinha estrutura para minimizar as emergências.

Senador Aloizio Mercadante, outro dia ouvi V. Exª citar Shakespeare. Palavras e mais palavras foram ditas, mas a maior homenagem que poderíamos fazer a Celso Furtado seria a ativação do programa de recriação da Sudene.

Lembro que o projeto de recriação da Sudene tramita nesta Casa, sendo Relator o grande e experiente dono do Nordeste, o Senador Antonio Carlos Magalhães - e o projeto já passou a Câmara Federal.

Celso Furtado criou a instituição em 1958. Portanto, é lógico que ela tem que ser modernizada, tem que ser modificada, tem que ser atualizada e, sobretudo, tem que ser moralizada. É preciso criar uma estrutura em que a ética predomine, para que nunca mais haja corrupção nessa instituição, inspirada no trabalho de Juscelino, que teve a grande idéia de entregá-la a Celso Furtado.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esta é a homenagem que devemos prestar a Celso Furtado, viabilizando o quanto antes a Sudene, que, sem dúvida, foi uma das melhores sementes que ele plantou em sua vida fecunda.

Aproveito os minutos finais do meu pronunciamento para fazer um registro. Lá, no meu Piauí, na cidade de São Raimundo Nonato, Senador Paulo Paim, onde está a Serra da Capivara, berço do homem americano, houve uma competição de ciclismo, Senador Papaléo Paes. Nessa oportunidade, segundo o Globo Esporte noticiou, faleceu uma ciclista. Certamente, não consultaram os cardiologistas amigos do Senador Papaléo para um check-up! Foram para um hospital - atentai, bem - e lá havia uma placa: Governador Francisco de Moraes Souza.

A bem da verdade, Senador Efraim Morais, é preciso ser mais cuidadoso. São Raimundo Nonato é uma cidade que tem um quadro médico muito bom, mas os hospitais que progrediram foram os privados, como é comum no Brasil. E este Governador de Estado encontrou, no lugar de um hospital, uma pocilga e investiu muito nela. Em 1997, eu o reinaugurava; eu reabria um hospital que tinham abandonado, porque os altos investimentos em saúde eram privados.

Lembro-me da festa, em 1997. Ao meu lado, Senador Papaléo Paes, estava o Deputado Federal Marcelo Castro, médico, professor, psiquiatra renomado, um dos mais brilhantes Parlamentares. Aliás, Senador Mercadante, eu gostaria de fazer um pedido: se o PMDB tiver direito a alguma coisa, chame esse Marcelo Castro e lhe entregue um ministério. Trata-se do mais competente filho de São Raimundo Nonato, médico. Senador Papaléo, jamais ele permitira uma farsa em sua cidade. E ele estava na inauguração. Pegamos um hospital acabado e o reconstruímos com as mais avançadas clínicas traumatológicas, oftalmológicas etc; e o Ministro da Saúde criou, rudimentarmente, uma UTI com duas unidades, com dois leitos - isso em 1997.

Senador Aloizio Mercadante, o Presidente da República, no ano de 2000, resolve comemorar os 500 anos do Brasil. A primeira comemoração foi em São Raimundo Nonato. O avião de Sua Excelência pousou no aeroporto que construímos. Senador Papaléo Paes, quando um Presidente da República visita uma cidade, segue com ele uma equipe médica precursora; e essa equipe, no ano de 2000, foi a esse hospital e disse que as suas instalações eram satisfatórias para atender até o Presidente da República.

Governei o Piauí até o dia 06 de novembro de 2001. Em 2004, após me sucederem no Governo o Senador Hugo Napoleão e o PT, tiraram os aparelhos do hospital e os levaram para a capital. Em 2000, repito, a equipe precursora de médicos do Presidente da República fez uma vistoria e considerou satisfatório o hospital. Disseram que ele estaria em condição de atender até o Presidente da República; a esposa do Presidente da República e toda a comissão. Isso é o que tem que observar o Ministro Humberto Costa.

À época, fomos orientados pelo Ministro da Saúde para implantar três leitos de UTI, em São Raimundo Nonato; e quatro, em Valença, no interior. Mas esses leitos também foram retirados de lá e levados para a capital.

Eu queria fazer esse esclarecimento e dizer que, no momento em que reabrimos aquele hospital, do meu lado estava o Deputado Federal, nascido naquela cidade, e médico Marcelo Castro. S. Exª, que é, sem dúvida alguma, um dos mais competentes Parlamentares deste Congresso, jamais permitiria que se tratasse de uma farsa.

Está tudo acabado em matéria de saúde no Brasil, Senador Paulo Paim! Esta, a advertência que faço. A saúde do Piauí é avançada para quem tem dinheiro para pagar hospital privado e para quem possui plano de saúde. E isso não ocorre apenas no Piauí ou em São Raimundo Nonato, mas no Brasil todo. O Ministro da Saúde tem que ser mais austero e mais responsável.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/11/2004 - Página 37405