Discurso durante a 168ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem ao Presidente Nacional da Autoridade Palestina, Yasser Arafat.

Autor
Maguito Vilela (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Luiz Alberto Maguito Vilela
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem ao Presidente Nacional da Autoridade Palestina, Yasser Arafat.
Publicação
Publicação no DSF de 25/11/2004 - Página 37585
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, YASSER ARAFAT, LIDER, PAIS ESTRANGEIRO, PALESTINA, REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, SOLENIDADE, FUNERAL, ELOGIO, VIDA PUBLICA, LUTA, PAZ, ANALISE, POLITICA INTERNACIONAL, CONFLITO, ORIENTE MEDIO.

O SR. MAGUITO VILELA (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, saúdo com muita honra o Embaixador da Palestina, meu amigo particular, Musa Odeh; o Embaixador da Venezuela, Julio José Garcia Montoya; o Embaixador da Argélia, Lahcène Moussaoui; o Embaixador do Sudão, Rahamtalla Mohamed Osman; o Embaixador da Tunísia, Hassine Bouzid; o Embaixador de Portugal, António Franco; o Embaixador da Áustria, Werner Brandstetter; o Embaixador da Síria, Ali Diab; o Embaixador do Cameroun, Martin Mbarga Nguele; o Embaixador da Polônia, Krzysztof Jacek Hinz; o Embaixador da Jordânia, Faris Shawkat Mufti; o Embaixador do Egito, Ihab Aboserie Ahmed; demais representantes de outros países aqui presentes.

Eu gostaria de iniciar minhas palavras dizendo que tive a honra e a satisfação de representar o Senado brasileiro nos funerais de Yasser Arafat, na capital do Egito, Cairo, por distinção do nosso querido Presidente José Sarney. Fui acompanhando o Ministro-Chefe da Casa Civil, José Dirceu, que na ocasião representou o Brasil e o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Representando a Câmara dos Deputados estiveram os Deputados Paulo Pimenta, do PT do Rio Grande do Sul, Luiz Greenhalgh, do PT de São Paulo, Maurício Rands, do PT de Pernambuco, e Jamil Murad, do PC do B de São Paulo. Estiveram presentes também jornalistas de todo o Brasil.

O Ministro José Dirceu desempenhou seu papel de forma brilhante, representando todos os brasileiros. Além de participar dos funerais, na base aérea do Cairo, esteve na Liga Árabe, onde foi saudado por todos os representantes, e assinou o livro de condolências de Yasser Arafat com a bandeira do Brasil.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Srs. Embaixadores, a morte do líder palestino Yasser Arafat causou realmente uma comoção mundial. Afinal, foi a morte de um dos grandes líderes do Século XX. É impossível questionar o mérito de sua luta, a força de seu idealismo e de suas convicções. É impossível não reconhecer a marca de sua personalidade e os significados de sua existência.

É impossível ignorar que a luta pela liberdade de seu povo lhe proporcionou o Prêmio Nobel da Paz em 1994.

Compareceram ao Egito para os funerais, Chefes de Estado de todo o mundo. Lá era possível sentir a comoção de tão significativa perda. E mais do que isso: era latente a tensão vivida na região, tensão que se arrasta há tantos anos e que tem se transformado em guerras, mortes e destruição.

O conflito permanente entre judeus e palestinos, sem dúvida, é uma situação que exige solução urgente por parte do restante do mundo. Não é compreensível, no atual estágio da civilização, que o mundo assista, apático e impassível, ao suicídio coletivo de dois povos de tão alta relevância histórica.

Já são mais de 50 anos de confronto, cujo saldo são mortes incontáveis e muitas destruições. No atual estágio do conflito, que se agravou a partir do ano 2000, foram mais de 3,6 mil palestinos mortos e mais de 30 mil feridos. Do outro lado, os israelenses contam quase mil mortes e mais de seis mil feridos.

As tentativas de negociações avançam e recrudescem ao longo dos anos como uma gangorra. E a verdade é que as grandes potências mundiais, capazes de interferir positivamente nesse processo, parecem que vão acostumando-se ao estado de permanente terror no Oriente Médio. A impressão que se tem é de que, cada vez mais, é menor o interesse real e pragmático de países como os Estados Unidos no sentido de implementar uma solução definitiva.

Agora, a morte de Yasser Arafat acaba fazendo com que os olhos do mundo se voltem novamente para a questão. Ironicamente, a saída de cena desse ícone da luta pela liberdade de seu povo pode significar avanços nas negociações para a implantação do tão sonhado Estado Palestino. Para os israelenses radicais, que se recusavam a discutir com Arafat, essa desculpa não existe mais. Mesmo na morte, Arafat dá sua contribuição à luta quase secular de seu povo ao abrir, de certa forma, as portas, com a sua própria morte, para o caminho da paz.

Foi com um gesto histórico de Yasser Arafat, quando passou a condenar o terrorismo em troca da possibilidade de um acordo para a existência dos dois Estados na região - um judeu e outro palestino -, que surgiram, sem dúvida, as primeiras possibilidades de paz. Agora, com sua saída da cena política, abre-se novamente, ainda com mais força, o desejo mundial de uma solução pacífica para o drama de israelenses e palestinos.

Mas para isso é preciso que as grandes potências, capitaneadas pelos Estados Unidos, entendam a urgência de se colocar essa questão como prioridade realmente, colocar no campo da preocupação prática a definição feita pelo Primeiro-Ministro inglês Tony Blair, quando disse que a retomada das negociações de paz no Oriente Médio “é o mais premente desafio do mundo de hoje”.

Sabe-se que não é tarefa simples a solução da equação em que cada uma das partes tem seu quinhão de razão e o fanatismo cria uma situação de permanente tensão. Mas, se não é fácil chegar à solução, não é nem um pouco difícil concluir que não é mais possível negar aos palestinos o direito a um Estado independente, uma nacionalidade, ao reconhecimento como nação.

A solução para a crise no Oriente Médio passa, necessariamente, pela criação do Estado Palestino, como determina a Resolução 181 da ONU, de 1947. Pela Resolução, o Estado de Israel foi criado; falta agora que os israelenses se retirem dos territórios ocupados, possibilitando a criação também do Estado Palestino. O papel das grandes nações do mundo passa exatamente por este caminho: fazer valer a Resolução da ONU e garantir os mesmos direitos a judeus e palestinos.

Enquanto a Resolução da ONU for cumprida para beneficiar apenas uma das partes, certamente, o conflito irá perdurar, as ações terroristas não irão acabar e o que teremos é a continuação dessa verdadeira carnificina que lá se instalou.

A solução da crise no Oriente Médio passa por um processo em que cada parte terá de fazer concessões caras, especialmente aos fanáticos, que, naturalmente, existem de ambos os lados. E é obvio que, sem uma interferência externa dura, isso não vai ocorrer.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a morte de Yasser Arafat não faz apenas com o que o mundo volte suas atenções para o Oriente Médio. Ela nos faz também pensar sobre a vida desse grande homem. Radical em seus primeiros anos como líder de um povo, Arafat soube se reinventar, tornando-se um estadista respeitado em todo o mundo.

Mais do que isso: num momento de graves conflitos, teve coragem de enfrentar os fundamentalistas e renunciar ao terror como forma de lutar pela independência, reconhecendo o Estado de Israel e abrindo os primeiros canais para a paz.

É claro que os palestinos ainda estão distantes do sonho de ter uma pátria livre e segura, um Estado reconhecido onde possam trabalhar e construir um novo estágio de dignidade em suas vidas. Mas os passos dados foram importantes e suas conquistas se devem em grande parte a esse grande líder Yasser Arafat.

Os palestinos hoje são reconhecidos como um povo e como uma nacionalidade, e a pessoa mais importante nesse processo foi, sem dúvida, Yasser Arafat.

No momento de sua morte, o líder palestino mostra novamente a sua estatura mundial, evocando o retorno das negociações de paz. A sua morte não o tira da História. Ao contrário: seu exemplo ficará para sempre como sinônimo de idealismo e de luta pela liberdade.

Que a morte de Yasser Arafat tenha o poder de fazer com que aqueles que têm condições de ajudar, especialmente os Estados Unidos, o façam, mas que o façam com isenção e imparcialidade, levando-se em conta não apenas os legítimos interesses dos israelenses, mas também os legítimos interesses dos palestinos.

Uns como outros têm os mesmos direitos à liberdade e à independência. Uns como outros têm o direito de ter o seu próprio Estado. E é isso o que se busca há mais de meio século. E é isso que terá como significado maior a paz, que o mundo espera de seus líderes.

Extremamente feliz a iniciativa do Senado em realizar esta sessão especial em homenagem a esse grande líder. Mas a grande homenagem que o mundo pode prestar ao líder Yasser Arafat, de estatura mundial, é fazer cumprir o que determinou a ONU, criando, no Oriente Médio, o tão sonhado Estado Palestino. Seria essa não apenas uma ação de paz, mas uma ação de justiça a um povo que tanto tem sofrido ao longo dos anos.

Não há como negar o legado que lhe proporcionou seu passado de luta pela liberdade e pela autodeterminação de seu povo. A revista Veja, na edição publicada na semana que antecedeu a morte de Yasser Arafat, conferiu-lhe o título de “O Dono da História”. E ele realmente foi, é e continuará sendo o dono da História.

Era o que eu tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/11/2004 - Página 37585