Discurso durante a 174ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários ao estudo realizado pelo IBGE sobre a situação de diversos setores do país. Crise de competência gerencial do governo do PT.

Autor
Demóstenes Torres (PFL - Partido da Frente Liberal/GO)
Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Comentários ao estudo realizado pelo IBGE sobre a situação de diversos setores do país. Crise de competência gerencial do governo do PT.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, José Jorge.
Publicação
Publicação no DSF de 03/12/2004 - Página 40240
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, ESTUDO, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), LEVANTAMENTO DE DADOS, SITUAÇÃO, SETOR, SAUDE, EDUCAÇÃO, SEGURANÇA PUBLICA, HABITAÇÃO, SANEAMENTO, PAIS, COMPROVAÇÃO, EFICACIA, ANTERIORIDADE, GOVERNO.
  • IMPUTAÇÃO, RESPONSABILIDADE, CRISE, BRASIL, INCOMPETENCIA, GESTÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), GOVERNO FEDERAL.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como disse Paulo Francis, “meu talento, em uma terra de capachos, se manifesta contestando”.

Recentemente o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) publicou um estudo chamado “Indicadores de Desenvolvimento Sustentável 2004”. O trabalho vem sendo feito desde 2002 e “integra-se ao conjunto de esforços internacionais para a concretização das idéias e princípios formulados na Agenda 21”. Os dados são originados de “estudos e levantamentos do próprio IBGE e de outras instituições” em três dimensões: a ambiental, a social e a econômica. Ao todo, o estudo fornece uma base de informações da maior confiabilidade sobre o comportamento do Brasil em diversos setores. Na verdade, o documento tenta responder o que realmente aconteceu com o País após a Conferência Rio 92. Mais que uma radiografia brasileira em tabelas, mapas e gráficos, o estudo apresenta várias respostas à crise brasileira. Somos realmente uma Nação condenada ao limbo do subdesenvolvimento? É verdade que o Brasil piorou desde então? E uma pergunta imprescindível: a Era Fernando Henrique Cardoso destinou mesmo ao PT um país caótico e ingovernável? Ou seja, qual é a natureza da propalada herança maldita?

Vou deter-me a partes do estudo por uma questão de brevidade. Srªs e Srs. Senadores, em todas as campanhas eleitorais, a saúde é o setor que emblema a ineficiência do Estado brasileiro. O tema dá azo a promessas mirabolantes e estimula a prática da demagogia. O Brasil precisa avançar nas políticas de saúde pública, mas o balanço do período compreendido entre 1992 e 2002 mostra que os indicadores, no geral, são positivos, conforme demonstra o IBGE.

No item “esperança de vida ao nascer”, indicador que expressa o conjunto das condições sociais, o Brasil evoluiu de 67,3% para 71%. Já a taxa de mortalidade infantil caiu significativamente no período. Em 1992, era de 42,8 para cada grupo de mil nascidos vivos. Dez anos depois, declinou para 27,8. Ainda é alta, mas mostra que o Governo anterior realizou políticas corretas, tanto que o indicador despencou nos quatros anos últimos da Era FHC.

A imunização de crianças contra doenças infecciosas é outro indicador superpositivo. Em 1992, o Brasil tinha uma taxa de cobertura de poliomielite de 64,77%. Em 2002, o número, felizmente, saltou para 98,84%, sendo de 100% nos dois anos anteriores. Conforme vou comentar adiante, o Brasil poderia ter investido mais em saneamento no período. Mesmo assim, as internações hospitalares causadas por doenças relacionadas a condições sanitárias inadequadas por grupo de 100 mil habitantes caíram pela metade no intervalo em análise.

Os Indicadores de Desenvolvimento Sustentável 2004 mostram que no setor educacional foi empreendido um esforço notável de inclusão, mas faltou o ensino de qualidade. De acordo com o IBGE, a taxa de escolarização das pessoas de 7 a 14 anos de idade era de 86,6% em 1992 e fechou 2002 em quase 97%. Inclusive entre negros e pardos, um segmento de brasileiros historicamente marginalizado em todos os sentidos. Já a taxa de alfabetização das pessoas com mais de 15 anos também evoluiu, embora aqui caiba uma consideração: era de 82,8% em 1992 e subiu para 88,2% em 2002. Seriam 16 milhões de analfabetos, quando o próprio IBGE reconhece que o número seria o dobro caso fossem considerados os parâmetros do conceito de analfabetismo funcional, ou seja, aquele indivíduo que tem menos de quatro anos de escolarização e não consegue entender a mensagem de um anúncio publicitário ou resolver uma conta de dividir.

A Unesco acaba de divulgar uma pesquisa que apresenta dados preocupantes sobre o estudante brasileiro: 58% dos 10.010 jovens entre 18 e 20 anos entrevistados não freqüentam mais a sala de aula. E o Governo do Excelentíssimo Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, ainda fica fazendo demagogia eletrônica na televisão ao afirmar que o Brasil Alfabetizado está presente em 3 mil municípios e que serão resgatados da iletralidade 2,3 milhões de brasileiros neste ano, quando o Neomobral, que só existe no delírio publicitário do PT, é um tipo de programa desaconselhado pelo próprio Inep - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, pois é sabido e comprovado o esforço inútil de ensinar o indivíduo a assinar o nome.

Sr. Presidente, os números do IBGE mostram certamente que a melhoria da educação no Brasil deveu-se aos investimentos proporcionados pelo Fundef - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, ainda que os recursos destinados a qualificar o corpo docente, adquirir merenda escolar e manter o aluno na escola tenham sido dilapidados em uma malha municipal de corrupção integrante de uma das formas de crime organizado. O Ministério Púbico Federal fez um levantamento sobre a administração do Fundef e concluiu que, de cada três reais investidos, somente um real chega ao destino final.

O País acabou de realizar eleições municipais, mas não houve renovação, uma vez que o caixa dois reproduz um modelo de político bandido, pronto para roubar o leite das crianças sem o menor pudor. O cientista político Bolívar Lamounier escreveu que a única iniciativa de reforma política verdadeira que houve no Brasil foi a edição da Lei de Responsabilidade Fiscal. Considero perfeito o raciocínio, embora o controle de contas públicas no País seja um procedimento muito mais formal do que efetivo.

Os indicadores do IBGE comprovam que a segurança pública é um setor que apresenta o maior passivo social no Brasil. Os números demonstram sistemática evolução negativa, comprometem o projeto de civilização brasileira, ainda que o Presidente Lula acredite que a situação não seja tão grave assim, tanto que no Congresso da Abav - Associação Brasileira de Agentes de Viagens, ocorrido no mês de outubro, no Rio de Janeiro, justamente no Rio de Janeiro, afirmou que, se se fizesse menos apologia da violência, certamente o País iria melhorar a sua auto-estima e aprimorar a imagem internacional. É aquela velha idéia marxista de encontrar vantagem no cativeiro. O estudo do IBGE, com base nos insuspeitos indicadores do Datasus - Departamento de Informática do SUS, comprova que o coeficiente de mortalidade por homicídios, em cada grupo de 100 mil habitantes, saltou de 19,1%, em 1992, para quase 30%, em 2001. Anteontem, o Ministério da Saúde divulgou dados mais atualizados apontando os sinais de piora. Em 23 anos, dobrou o número de mortes por homicídio. Em 1980, representavam 19,8%, e, no ano passado, o número foi para 40,3%. Entre as mortes causadas por arma de fogo, a situação é imponderável. Em uma década, a relação evoluiu desesperadamente de 50,3% para 70,8% dos óbitos. Foram 265 mil mortos no período.

A publicidade do Governo Lula tem um poder de inebriar impressionante. A tal campanha de desarmamento do Ministério da Justiça é um belo exemplo. A princípio, estipularam um número de recolhimento de armas absolutamente minimalista para, depois, anunciar o sucesso absoluto da iniciativa com o recolhimento de pouco mais de 200 mil armas.

Ora, Sr. Presidente, a Corregedoria de Polícia do Estado de São Paulo estima que só na região metropolitana da capital circulam mais de dois milhões de armas ilegais. Ao contrário da crítica fácil, o Estatuto do Desarmamento foi um avanço, pois define quem pode usar arma. Mas que ninguém se iluda da tolice de imaginar que a lei será capaz de retirar a arma das mãos do bandido sem uma política efetiva de combate ao crime organizado, especialmente do tráfico de drogas, que faz da comercialização ilegal de armas uma atividade subsidiária.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sobre o setor de habitação, o relatório do IBGE mostrou também números positivos, embora de lenta evolução. Em 1992, o índice relativo de domicílios permanentes adequados para a moradia era de 36,8%. Já em 2002, elevou-se para 50,6%. Houve melhoria razoável no serviço de coleta direta ou indireta de lixo, com o crescimento da rede de cobertura de 66,6% para 84,8%.

Infelizmente, o Brasil ainda está muito longe no tratamento do problema. Enquanto o primeiro mundo encontra alternativas para diminuir o volume de lixo produzido, como o de embalagens, no País, um sistema bastante lucrativo instalado estimula a produção de rejeitos, uma vez que as empresas ganham por volume transportado.

Por outro lado, são irrisórias as iniciativas de coleta seletiva e da indústria de reciclagem. Há uma saturação de espaço para acondicionamento do lixo nas grandes cidades. Em São Paulo, por exemplo, de acordo com estudos do jornalista Washington Novaes, as distâncias entre o local de coleta e de deposição já ultrapassam os 60 quilômetros, em um quadro que tende a piorar. Já nos Municípios pequenos, a situação é degradante. Nos grotões, os rejeitos são normalmente acondicionados a céu aberto. Para se ter noção da medida do abismo, conforme os dados do IBGE, na zona rural, 41,4% do lixo é jogado em terrenos baldios ou logradouros; outros 42,6% são queimados ou enterrados na propriedade.

Os indicadores de saneamento do IBGE demonstram que foi tímida a evolução da distribuição de água tratada no período, o que revela a apatia geral dos governos brasileiros com o setor, ainda que seja sabida a economia proporcionada. Para cada R$1,00 investido em saneamento, são poupados R$5,00 em saúde. Em 1992, a rede geral de abastecimento de água cobria 88,3% dos domicílios particulares permanentes na área urbana. Em 2002, o indicador alterou pouco, chegando a 91,3%.

O acesso ao esgotamento sanitário é talvez o mais grave problema setorial. Os números totais apontam que o Brasil possuía uma rede coletora de 45,5% na área urbana em 1992 e chegou, uma década depois, a apenas 51,6%. A situação é dramática em regiões como o Norte e o Nordeste, com Estados apresentando taxa de cobertura de 1%, enquanto no Sudeste o índice de alcance apresenta padrão médio de 77,9%. Isso evidencia o quanto são gritantes as diferenças regionais neste País.

Srªs e Srs. Senadores, de acordo com os dados do Siafi, neste ano o Ministério das Cidades, talvez uma das mais notáveis ilhas de incompetência do Governo Lula, teve o desplante de investir 0,16% dos recursos orçamentários destinados aos programas de saneamento.

O Sr. José Jorge (PFL - PE) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Com muito prazer, Senador José Jorge.

O Sr. José Jorge (PFL - PE) - V. Exª está dizendo que o Ministério das Cidades é uma ilha de incompetência no Governo Lula. Creio que ilha existente no Governo Lula é de competência. V. Exª mencionou de forma equivocada.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Trata-se de uma das ilhas, Senador. São muitas.

O Sr. José Jorge (PFL - PE) - Uma das muitas ilhas.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Com certeza.

Pois bem, dos R$96 milhões autorizados para programas de saneamento, apenas R$156 mil foram executados. O comportamento da Fundação Nacional de Saúde não é diferente. Dos R$864 milhões destinados no Orçamento de 2004 para o setor, foram pagos 4,39% até a presente data.

A dimensão ambiental é talvez a face mais visível do desenvolvimento sustentável e tornou-se, ainda que equivocadamente, sinônimo da Agenda 21. De acordo com o IBGE, com base em dados do Ibama, no que se refere à biodiversidade, a Mata Atlântica lidera o ranking das espécies ameaçadas de extinção, seguida do Cerrado. Aliás, ingressei no ano passado com proposta de emenda constitucional para consagrar o cerrado como patrimônio nacional, para que políticas ambientais sejam aplicadas com mais vigor, muito embora o Governo Lula administre o setor com alto grau de festividade e quase nenhum de providência. Para comprovar o que afirmo, valho-me mais uma vez do Siafi. No Orçamento deste ano, o Ministério do Meio Ambiente conseguiu realizar 41,6% da dotação autorizada, o equivalente à bagatela de R$3,60 destinados à saúde ambiental de cada brasileiro.

Sr. Presidente, é certa e vantajosa a competitividade brasileira no agronegócio, e sou um entusiasta da iniciativa, pois mesmo não tendo nenhuma relação direta com o meio rural, cresci observando a prosperidade que a produção primária conferiu a Goiás. Mas o Brasil não pode se descuidar do controle de insumos. No caso dos fertilizantes, por exemplo, são comprovados os ganhos de produtividade e da redução da área plantada, mas são sabidos os danos ambientais causados pelo produto, como a acidificação dos solos e a contaminação das águas de rios, lagos e aqüíferos subterrâneos. No período entre 1992 e 2002, a quantidade comercializada de fertilizantes por área plantada saltou de 69,44 para 143,62 quilogramas por hectare. Os indicadores do IBGE mostram que a Amazônia Legal está em decomposição. O deflorestamento é constante, crescente e, ao que parece, incontrolável.

Concedo o aparte ao Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Demóstenes Torres, V. Exª fez uma avaliação crítica sobre o Ministério das Cidades, e o Senador José Jorge quis dizer que seria o Governo incompetente, mais do que apenas o Ministério das Cidades. V. Exª observou que o Ministério das Cidades não teria gasto tudo o que lhe teria sido destinado no Orçamento. Hoje a Senadora Ideli Salvatti citou dois aspectos do Ministério das Cidades - o de saneamento e o de habitação. Comparando o número de famílias beneficiadas com tratamento de água, nos anos de 1995 a 1996, foram 114 mil famílias; em 1999 e 2000, 259 mil famílias; em 2003 e 2004, 457 mil famílias. Portanto, houve um crescimento muito significativo. Na área de habitação, o número de famílias atendidas com aquisição, melhora ou construção de unidade habitacional, que, em 1995 e 1996, foi de 418 mil, progrediu para 711 mil no biênio 1999 e 2000; no biênio 2003 e 2004, já no mandato do Governo Lula e de responsabilidade do Ministério das Cidades, Secretaria da Habitação, 908 mil famílias foram atendidas. Sem nenhuma adjetivação, houve evolução. Pretendo apenas dar uma boa informação a V. Exª, que sempre procura, assim como o Senador José Jorge, ser justo pelo menos com os números e os fatos. Muito obrigado.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Com certeza.

Senador Eduardo Suplicy, o IBGE fez esse levantamento para demonstrar cabalmente que não há herança maldita do Governo Fernando Henrique Cardoso; pelo contrário, em quase todos os setores, o Brasil cresceu significativamente. Aqui também não se está fazendo apologia ao Governo que passou, mesmo porque faço críticas à área de segurança pública, à área de preservação ambiental e a outras áreas.

Naturalmente, ainda que se comparem determinados períodos de um Governo e de outro, é fato que o Ministério da Cidade investir 0,16% dos recursos orçamentários destinados ao programa de saneamento, convenhamos, é um vexame para qualquer governo, especialmente para um que tem todo o seu foco voltado para o desenvolvimento social. Os números são inexpressivos, e os dados do Siafi o demonstram com muita clareza.

Dizia eu que a dimensão ambiental talvez seja o problema maior, tanto que a Mata Atlântica lidera o ranking de desmatamento. O cerrado segue nessa mesma direção.

            Sr. Presidente, sou um entusiasta nessa área de crescimento rural, mas temos um problema grave, especialmente em relação à Amazônia.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Sr. Presidente, vou concluir.

Os números do IBGE expressam um Brasil prenhe de contrastes, mas em evolução e cuja herança da última década é perfeitamente administrável. O País só não está melhor porque há notória crise de competência gerencial do governo do PT. No entanto, ele se move - parafraseando Galileu.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/12/2004 - Página 40240