Discurso durante a 33ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários ao artigo "Nos sertões do Brasil, um caminho espinhento para a santidade", de autoria do jornalista Larry Rother, publicado no jornal The New York Times, edição do último dia 25.

Autor
Reginaldo Duarte (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: José Reginaldo Duarte
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Comentários ao artigo "Nos sertões do Brasil, um caminho espinhento para a santidade", de autoria do jornalista Larry Rother, publicado no jornal The New York Times, edição do último dia 25.
Publicação
Publicação no DSF de 06/04/2005 - Página 7458
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, THE NEW YORK TIMES, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), COMENTARIO, DATA, COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO DE NASCIMENTO, CICERO ROMÃO BATISTA, SACERDOTE, MUNICIPIO, JUAZEIRO (BA), ESTADO DO CEARA (CE).

O SR. REGINALDO DUARTE (PSDB - CE. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo a tribuna neste momento para comentar o artigo publicado no jornal The New York Times, de 25 de março do corrente ano, intitulado "Nos sertões do Brasil, um caminho espinhento para a santidade", de autoria do jornalista Larry Rother.

Essa matéria para nós nordestinos e, sobretudo, para nós de Juazeiro do Norte, no Ceará, representa mais um milagre operado pelo Padre Cícero. Antes o respeito e devoção a esse homem, cuja vida se confunde com a do sofrido povo nordestino, estava restrita ao nordeste, tomou dimensões nacionais e hoje é motivo de debate em fóruns internacionais. O artigo destaca uma data religiosa das mais importantes para o nosso Nordeste. No dia 24 de março foi comemorado o nascimento do Padre Cícero Romão, o nosso santo Padim Ciço. Fonte de inspiração para estudiosos; centro de atenção de milhões de pessoas, referência de santo milagreiro para aqueles que nele têm fé, Padre Cícero construiu uma vida de dedicação aos pobres, a justiça e de combate às desigualdades sociais. Foi um homem que orgulhou a sua gente e a sua terra.

Como é sabido a vida do Padre Cícero foi permeada de grandes feitos, de grandes controvérsias e, para muitos, posso dizer mesmo que para a maioria dos nordestinos, de muitos milagres.

Sr. Presidente, para que conste dos Anais do Senado Federal, requeiro que o artigo publicado no jornal The New York Times seja considerado como parte integrante deste pronunciamento. O texto é o seguinte:

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR REGINALDO DUARTE EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso 1º e §2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

Diário do Juazeiro do Norte”

Nos sertões do Brasil, um caminho espinhento para a santidade

Por Larry Rother

            Publicado em 25 de março de 2005

JUAZEIRO DO NORTE, Brasil, 24 de março - Durante a celebração de uma missa aqui, um dia em 1889, uma mulher que estava recebendo a comunhão declarou que a hóstia tinha se transformado em sangue em sua boca. Embora a comunidade local tivesse achado que isto era um milagre, a Igreja Católica Romana não ficou satisfeita e, finalmente, afastou Padre Cícero Romão Batista, o padre envolvido, de suas obrigações.

Mas a fama de Padre Cícero como um fazedor de milagres continuou a se espalhar, tanto que até hoje pessoas de todo o Brasil, país com a maior população católica no mundo, acreditam que ele seja um santo. Agora, para alegria dos seguidores que chegam em massa aqui durante a Semana Santa, em seu aniversário dia 24 de março e outras datas importantes, a mesma hierarquia eclesiástica que evitou e perseguiu o adorado “Guia e Intermediário Espiritual” está, finalmente, começando a reabilitá-lo.

“Padre Cícero foi uma figura controversa, cujas ações incomodaram muitas pessoas, como as ações dos profetas geralmente incomodam”, disse Fernando Panico, o bispo da Igreja Católica aqui em Juazeiro desde 2001. “Mas não podemos negar que ele sempre permaneceu fiel à Igreja apesar de seu sofrimento, nem podemos ficar indiferentes à expressão simbólica da fé que ele representou para o povo”.

A cada ano, algo em torno de dois milhões de peregrinos visitam os locais e santuários associados ao Padre Cícero aqui no coração do árido sertão nordestino do Brasil. Há a capela onde ele está enterrado, a casa onde morreu, a igreja onde foi pároco, um museu e, surgindo no alto de uma colina, sobre esta cidade de 225.000 habitantes, uma estátua de alabastro de 24 metros de altura, com seu característico chapéu de abas rasas e sua bengala na mão.

Encorajados pela mudança de atitude da Igreja, os discípulos de Padre Cícero esperam que ele possa ser rapidamente beatificado e canonizado. O Bispo Panico disse que “parece existir boa vontade em Roma”, mas também falou de um longo e complicado processo.

Sempre que o processo começa, os seguidores de Padre Cícero ficam confiantes no fato de que eles terão muitos milagres para dar apoio à sua causa. Aqui, na “Casa dos Milagres”, amontoam-se modelos de braços, pernas, mãos, pés, cabeças e tórax feitos em madeira, plástico e cera, deixados por peregrinos que atribuem ao Padre Cícero suas espetaculares recuperações de doenças e acidentes fatais.

Há também fotografias e cartas de gratidão, muitas escritas com a caligrafia tremida dos que têm pouca escolaridade. Mas outros testemunhos agradecem Padre Cícero por vitórias em ações legais ou por terem conseguido menções acadêmicas, e um conhecido cantor popular deixou um memento agradecendo a intercessão do padre que lhe permitiu voltar ao sucesso e sobreviver a um acidente de carro.

Pessoas do lugar dizem que até mesmo o Bispo Panico foi agraciado com os poderes de cura do Padre Cícero. Quando o Bispo disse, alguns anos atrás, que sofria de câncer, os peregrinos começaram uma campanha de orações pela sua recuperação. Ele agora se encontra em remissão e, enquanto ele hesitava em falar de um milagre, outros falaram abertamente.

“Padre Cícero é um profeta, um santo, um ser divino que tem o poder de conceder inúmeras graças àqueles que nele têm fé ”, disse Maria Pereira Cordeiro, uma aposentada de 64 anos. “Eu não sou uma pessoa culta, mas eu penso que Deus mandou Dom Fernando para ajudar a Igreja a reconhecer a grandeza de Padre Cícero.”

Mas a veneração ao Padre Cícero é mais do que um fenômeno religioso. Afastado de suas obrigações paroquiais, ele se voltou para a política. Tornou-se o primeiro prefeito de sua cidade, que hoje chama a si mesma de “Capital da Fé” e mais tarde foi escolhido governador de seu estado natal e eleito para o Congresso, embora nunca tenha servido em qualquer um dos dois postos.”

Ele morreu em 20 de julho de 1934, com a idade de 90 anos. “Entre as classes menos favorecidas havia o sentimento de que Padre Cícero retornaria logo com a declaração do milênio e a libertação dos pobres”, disse Ralph della Cava, autor de excelente trabalho em inglês sobre Padre Cícero e um especialista na religiosidade popular do Brasil.

Com o tempo, o sentimento passou, substituído “por um sentimento de que Padre Cícero é mais um fazedor de milagres ou intermediário diante do Santíssimo, assim como qualquer outro legítimo santo da Igreja”, acrescentou Dr. Della Cava, um pesquisador sênior associado ao Instituto de Estudos Latino Americanos da Universidade de Colúmbia.

Enquanto a Igreja Católica Romana continuou a ser cética sobre abraçar Padre Cícero e seu legado, outros não o foram. Por anos, qualquer político candidatando-se a um cargo estadual ou nacional tinha que fazer uma parada em Juazeiro do Norte; alguns candidatos e eleitos até mesmo pagam por ônibus fretados e caminhões superlotados, conhecidos como “paus de arara”, que trazem os peregrinos.

Um fator para a recente reviravolta na Igreja pode ser simplesmente que o exército de peregrinos seja uma força espiritual grande demais para a Igreja ignorar. Quando denominações fundamentalistas Protestantes estão desafiando o domínio da Igreja Católica Romana no Brasil, faz mais sentido ver os devotos de Padre Cícero como aliados do que como fanáticos ou cismáticos.

“Graças aos peregrinos e à sua fé, as igrejas evangélicas não estão conseguindo fazer incursões aqui”, disse Bispo Panico. “Padre Cícero é como um antivírus”.

Manoel de Lima Sousa, pastor de uma igreja da Assembléia de Deus que se encontra nas circunvizinhanças da estátua gigante, diz que tem sido muito mais difícil converter católicos nesta região do que em qualquer outra parte do Brasil. Ele descreveu Padre Cícero como “um grande homem cuja memória merece respeito e que fez coisas admiráveis pelo povo”, mas também disse que os grupos evangélicos não poderiam, de boa fé, aceitar o culto que cresceu à volta dele.

Algumas famílias tradicionais locais que se sentiram ofendidas pelo zelo do Padre Cícero em defender os mais pobres também continuam a manifestar suas dúvidas quanto à sua reabilitação. Mas parece que não há como frear ainda outro milagre em Juazeiro.

“A Igreja esperou 500 anos para reconhecer que cometeu um erro ao condenar Galileu”, disse André Herzog Cardoso, reitor da Universidade Regional do Cariri. “Não penso que vá cometer o mesmo erro agora. É uma questão de sobrevivência”.

Era o que eu tinha a dizer. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/04/2005 - Página 7458