Discurso durante a 42ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários à proposta de criação do cargo de senador vitalício. Justificativas a requerimento de autoria de S.Exa., no transcurso do Dia do Índio, que solicita voto de tristeza pelo falecimento de crianças indígenas por desnutrição.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. FORÇAS ARMADAS. POLITICA INDIGENISTA.:
  • Comentários à proposta de criação do cargo de senador vitalício. Justificativas a requerimento de autoria de S.Exa., no transcurso do Dia do Índio, que solicita voto de tristeza pelo falecimento de crianças indígenas por desnutrição.
Aparteantes
Gilberto Mestrinho, José Agripino.
Publicação
Publicação no DSF de 20/04/2005 - Página 9759
Assunto
Outros > SENADO. FORÇAS ARMADAS. POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, RETIRADA, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, CRIAÇÃO, CARGO PUBLICO, VITALICIEDADE, SENADOR, OCUPAÇÃO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • CRITICA, EXERCITO, REPRESSÃO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, MULHER, CONJUGE, MILITAR, SOLENIDADE, PRESENÇA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REIVINDICAÇÃO, CUMPRIMENTO, PROMESSA, MINISTERIO DA DEFESA, PAGAMENTO, REAJUSTE, SALARIO.
  • OPORTUNIDADE, DIA, INDIO, JUSTIFICAÇÃO, REQUERIMENTO, VOTO DE PESAR, MORTE, CRIANÇA, COMUNIDADE INDIGENA, CRITICA, NEGLIGENCIA, MINISTERIO DA SAUDE (MS).
  • ANEXAÇÃO, CARTA ABERTA, FUNCIONARIOS, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), REIVINDICAÇÃO, CUMPRIMENTO, PROMESSA, POLITICA INDIGENISTA, APROVAÇÃO, PLANO DE CARREIRA.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ainda a respeito da proposta de emenda constitucional que criaria a figura do Senador vitalício, é bom esclarecermos as coisas de uma vez por todas.

Tenho a convicção de que isso pode ser bom para o País. Apresentei uma proposta de emenda constitucional no alvorecer do ano de 1995, se não me engano. Ela vinha eivada de um vício, porque previa o direito de voto, o que desequilibraria o princípio federativo. Dois anos depois, eu a refiz, dando direito de voz e não direito de voto. Houve, à época, muita incompreensão, ao lado de opiniões favoráveis e contrárias à aprovação da matéria.

Há dias, o Senador Aloizio Mercadante me procurou e perguntou-me se eu estaria disposto a apresentar essa PEC novamente. S. Exª me disse: “Na viagem que farei com o Presidente da República e com ex-Presidentes da República, penso em abordar essa questão”. Eu lhe disse: “Muito bem! Se isso for algo recebido com respeito pelas Lideranças do meu Partido, do Partido de V. Exª e dos demais Partidos com assento nesta Casa, creio que dará para levar o debate adiante - sem que isso signifique concordância de todos”.

No retorno, o Senador Aloizio Mercadante disse-me que a conversa havia trafegado bem e que houvera declarações favoráveis do Presidente Renan Calheiros nesse sentido. Percebi, no entanto, que já não havia unidade dentro do PT. O Presidente José Genoíno se coloca claramente contra a idéia. Na Oposição, não há unidade. O Líder José Agripino faz reparos. Há pouco, o Senador Pedro Simon trouxe-me um argumento muito forte, sobre o qual temos de meditar: como ficaria o próximo Presidente da República, se aqui, sentados neste plenário, estivessem os ex-Presidentes Fernando Henrique Cardoso, Itamar Franco, José Sarney e Lula, recém-saído do poder? Quantos pólos de poder não se constituiriam aqui dentro?

Tudo isso é matéria para se meditar. E, de qualquer maneira, levando em conta as resistências que percebi colocadas diante da propositura, eu a retirei por entender que o clima não seria por uma aprovação pacífica e que todos os indicadores são no sentido de mais maturação, de mais meditação, para que cheguemos à conclusão, daqui a alguns anos, se há ou não procedência de se retomar esse assunto - ou, quem sabe, não venha ele jamais a fazer parte dos nossos instrumentos institucionais.

Sr. Presidente, hoje, trago uma notícia bastante triste:

A Polícia do Exército reprimiu uma manifestação de mulheres de militares que protestavam na solenidade do Dia do Exército, na qual estava presente o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. As manifestantes foram mantidas a cerca de 400 metros do palanque, onde o Presidente Lula, a Primeira-Dama e o Vice-Presidente, Ministro da Defesa, Sr. José Alencar, participavam da solenidade no QG do Exército.

Uma das manifestantes chegou a passar mal quando tentava passar a barreira formada por cerca de 70 policiais.

            Tenho a impressão de que há o compromisso muito claro, assumido pelo Ministro da Defesa anterior, no sentido de dar os tais 23% de reajuste aos militares. Esta é a resposta pacífica, correta e democrática: o cumprimento da palavra para essa demanda. A repressão, sobretudo a esposas de militares ou de civis, repressão a mulheres, não é o que se espera como desdobramento, Senador Gilberto Mestrinho, da democracia brasileira.

Sr. Presidente, hoje é Dia do Índio. Se, infelizmente, não há o que comemorar, há motivo de sobra para lamentos. Por isso, contristado, estou encaminhando à Mesa requerimento, pedindo voto de tristeza pela morte de 19 crianças indígenas, todas por desnutrição, por fome, por incúria de um Governo insensível.

Relegadas pelo Governo do Presidente Lula a um estado de abandono, as populações indígenas sofrem a dor da incompreensível morte de “indiozinhos” em Mato Grosso do Sul. Só neste ano, morreram 19 crianças indígenas, naquela região, de fome e desnutrição. O Ministro da Saúde, Humberto Costa, diz que as estatísticas são essas mesmas e que estão dentro da média normal.

O Sr. José Agripino (PFL - RN) - V. Exª me permite um aparte, Senador Arthur Virgílio?

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Concedo o aparte, com muita alegria, ao Senador José Agripino.

O Sr. José Agripino (PFL - RN) - Senador Arthur Virgílio, até me resguardei de tocar especificamente nestes assuntos - Funasa, população indígena, morte de índios na infância -, para fazê-lo na próxima quinta-feira, no debate do qual participará o Ministro Humberto Costa. Mas V. Exª, Senador Arthur Virgílio, que é do Amazonas, tem a obrigação de fazer o registro do fato doloroso que faz. Quero relatar a V. Exª um dado que, para mim, pareceu o mais preocupante de todos: no relatório do Ministério da Saúde, há uma menção clara - mostrarei a V. Exª -, há um compromisso desse Ministério, de 2004 a 2007, de reduzir em 85% a mortalidade infantil das populações indígenas. Senador Arthur Virgílio, isso está escrito. A população indígena no Brasil é de 300 a 350 mil índios em tribos. A população infantil é da ordem de 80 a 100 mil crianças. O drama que estão vivendo as populações indígenas infantis comove todo o Brasil. Evitar a morte de 100 mil crianças é meta para o Governo heróico, que tem o Ministro heróico que faz a intervenção no Rio de Janeiro e posa de herói! Colocar no relatório como meta até 2007 - dois anos mais - atingir uma redução de 85% na mortalidade infantil da população indígena parece-me uma piada e um desrespeito. O Ministro tinha a obrigação de, no mínimo, registrar no relatório: “Nós, que somos os heróis da intervenção no Rio de Janeiro, que praticamos a saúde de primeira categoria, no padrão da Suécia, da Suíça e da Alemanha, no Brasil inteiro, menos no Rio de Janeiro, porque lá há um Prefeito incompetente” - no entendimento deles -, “assumimos o compromisso de, até 2007, eliminar 85% da mortalidade infantil”. Isso é o desmascaramento de um Governo que é incompetente, e mostra a sua incompetência por escrito. Mais do que incompetente, é desumano, principalmente com as populações indígenas sobre as quais fala V. Exª.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Obrigado, Líder José Agripino. V. Exª se esquece de dizer do heroísmo do Ministro ao ter sido obrigado a demitir cerca de uma dúzia de assessores, acusados fortemente de corrupção e “vampiragem” de recursos da saúde brasileira.

Mas, de fato, e até para registrarmos um pouco o passado, nos governos Itamar Franco e Fernando Henrique, as populações indígenas cresceram, aumentaram, o que, na verdade, era um bom prenúncio em relação aos tempos futuros, levando em conta que Darcy Ribeiro previa o fim dessas populações, e esse grande brasileiro terminou sendo desmentido pelas estatísticas daqueles governos.

Concedo o aparte ao Senador Gilberto Mestrinho.

O Sr. Gilberto Mestrinho (PMDB - AM) - Nobre Senador Arthur Virgílio, nós, do Amazonas, podemos falar muito bem das populações indígenas. Temos cerca de 175 mil, mais da metade dos índios brasileiros, em nosso território, em nosso Estado. Mas sabemos desse drama que vivem os índios, com as doenças que estão infestando as suas populações. Como disse o nobre Senador José Agripino, a questão de saúde é importantíssima. Mas o que acontece é que, com essa proteção desmedida que o Governo dá às ONGs, organizações não-governamentais, o tratamento dos índios, a saúde deles, foi entregue a meia dúzia de espertos que dominam essas ONGs. Com elas, não há mais remédios para os índios, não há mais médicos, não há mais nada. Os próprios índios estão querendo que volte o sistema antigo, porque essa história de ONG só vale na saúde e no meio ambiente, que, lamentavelmente, são dirigidos por esses órgãos.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Obrigado, Senador Gilberto Mestrinho. V. Exª acompanha, como eu, o desmonte do Programa de Saúde Indígena que foi montado no governo passado.

A Folha de S.Paulo mostra uma foto, que é terrível: um cacique aplicando ungüento para curar a perna de um dirigente da Funai. Ou seja, em vez de eles curarem os índios, os índios agora estão curando, supostamente, os dirigentes da Fundação Nacional do Índio. Ou seja, o show de incompetência e de crueldade é verdadeiramente um espetáculo no Governo do Presidente Lula.

            Prossigo, Sr. Presidente, no tema relativo ao Dia do Índio.

O Ministro Humberto Costa disse que não havia nada de anormal na estatística - morre indiozinho dentro da média. Chego a imaginar que o nada fazer do Governo petista vai encontrar razão de ser na única coisa compreensível nesse quadro de tristeza: o eleitorado indígena é muito pequeno para merecer a atenção de quem está no poder. E, se é assim e sendo o objetivo dos petistas a missão impossível de fazer da reeleição do Presidente Lula um passeio, o que eles fazem é entoar a cantilena do ora, em mi bemol ou em ré maior, pouco importa - no caso, ora, ora os índios.

Dá para perceber que o sentimento das populações indígenas é de apatia diante deste Governo. Ontem, alguns índios estiveram na Câmara dos Deputados para reclamar ao menos que a saúde gerida atualmente pela Funasa voltasse aos padrões anteriores. O que os índios querem dizer com essa reivindicação? Quem sabe um sonoro “vade retro, Ministro Humberto Costa”.

Enquanto isso, naquele seu programinha matutino de rádio, o Presidente Lula, fingindo esquecer que índios estão morrendo de fome, declarou, em alto e bom tom, “demarcamos a reserva indígena Raposa do Sol”. Teria sido um marco para ele. De marco o que sabemos é que as cruzes vão aumentando nos cemitérios indígenas, principalmente cruzes para os “indiozinhos” que morrem de fome no Mato Grosso.

O pouco caso do Presidente Lula, que é geral, atinge em cheio as populações indígenas. Há poucos dias, os servidores da Funai paralisaram suas atividades, na tentativa de sensibilizar...

(O Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Já concluo, Sr.Presidente.

...o governo petista diante do descumprimento de uma promessa, mais uma, feita pelo Presidente aos povos indígenas do Brasil.

 

Estou anexando a este pronunciamento a Carta Aberta dos Funcionários da Funai diante da falta de cumprimento da palavra empenhada por Lula. Explicam esses servidores que os povos indígenas sofrem e insistem na implantação de uma política indigenista mais moderna e democrática, que até agora não foi realizada.

Ademais, como denuncia a carta aberta, a política posta em prática pelo governo petista em nada ajuda; pelo contrário, leva ao sucateamento.

O Governo também não adotou qualquer providência para aprovar o plano de carreira desses servidores, ameaçados inclusive de perder o plano de saúde do Geap, já a partir de julho.

Por isso, em homenagem ao Dia do Índio, que transcorre neste 19 de abril, trago a este Plenário esse alerta, transcrevendo a carta aberta dos servidores da Funai.

E relembro que apresentei um voto de tristeza pelo descaso com que este Governo trata os “indiozinhos” brasileiros. Que esse voto de tristeza seja discutido e aprovado ou rejeitado por este Plenário, mas cada um mostrando exatamente a sua posição. A minha é a de que não podem sequer dizer que receberam herança maldita, até porque não morreu nenhuma criancinha com mais de dois anos. São todas criancinhas com menos de dois anos, órfãs, claramente órfãs, de um Governo que tem dois anos e pouco de idade. Ou seja, está faltando governo nesse setor, como também para tocar o dia-a-dia da administração deste País.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ARTHUR VIRGÍLIO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“Carta aberta dos funcionários da Funai”


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/04/2005 - Página 9759