Discurso durante a 54ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração dos 40 anos de atividade da Rede Globo de televisão.

Autor
Cristovam Buarque (PT - Partido dos Trabalhadores/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Comemoração dos 40 anos de atividade da Rede Globo de televisão.
Aparteantes
Gerson Camata, Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 04/05/2005 - Página 13034
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, EMISSORA, TELEVISÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), COMENTARIO, IMPORTANCIA, FORMAÇÃO, IDENTIDADE, AMBITO NACIONAL, DEFESA, UTILIZAÇÃO, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, EDUCAÇÃO, POPULAÇÃO.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Eduardo Siqueira Campos; Sr. Presidente do STJ, Dr. Edson Vidigal; Sr. Ministro Ciro Gomes; meu caro amigo João Roberto Marinho; Srªs e Srs. Senadores, no Brasil, qualquer instituição que consegue completar 40 anos já merece uma homenagem; se, além disso, ela consegue ser uma empresa que se espalha por todo o Brasil, merece muito mais; se, além disso, ela consegue representar e levar a imagem do Brasil ao mundo inteiro, ela merece ainda mais essa nossa homenagem. Por isso, a Globo, que tem 40 anos, que é nacional, que está no mundo inteiro, merece - e só por isso já merecia - a homenagem do Senado Federal. Mas isso não é tudo.

Nenhuma outra organização teve papel tão importante na segunda metade do século XX na formação da identidade nacional. Em qualquer país, uma nação se unifica pela educação igualitária de suas crianças. É a escola que consolida os mitos nacionais, que transmite a História e as histórias do País. É ela que consolida os sentimentos comuns, as visões comuns, o imaginário de um povo. Mas, no Brasil, um País sem escola, sem educação, foi a mídia que fez esse papel ao longo dos últimos anos.

Entre os órgãos da mídia, nenhum outro teve um papel tão importante quanto a Rede Globo. Meu caro João Roberto, aproveitando que ao seu lado está o Ministro Ciro Gomes, eu diria que a Rede Globo é o São Francisco da cultura nacional, sem querer provocar debates com o Governador que estava aqui há pouco, João Alves, e com o Governador, Ministro e Senador Antonio Carlos Magalhães. Há um detalhe: estou seguro, Ministro Ciro Gomes, de que esse “rio da cultura” todos nós gostaríamos de ver transportado para todo o Brasil. E isso não seria difícil se colocássemos nas escolas sistemas mais eficientes para receber aquilo que a Rede Globo e outros órgãos produzem.

Ao longo desses 40 anos, seus noticiários, suas novelas, suas reportagens, seus programas de humor, suas entrevistas, seus programas educacionais foram elementos centrais de como os brasileiros passaram a ver o Brasil. E tem sido também os instrumentos que levam ao mundo a imagem do Brasil.

            Nesses 40 anos, certamente a figura do Dr. Roberto Marinho foi decisiva, mas não foi a única. Sem os seus repórteres, artistas, atores, atrizes, escritores, roteiristas, engenheiros, sem cada um de seus trabalhadores executivos, incluindo seus três filhos, a Rede Globo de Televisão poderia durar 40 anos, mas jamais teria chegado à importância que teve e que tem.

            Pode-se até discordar da forma como, às vezes, a Rede Globo nos fez e nos faz ver o Brasil, mas não se pode discordar que o Brasil vê o Brasil através das câmeras da Rede Globo. Cada brasileiro vê a Globo como o olho pelo qual capta e entende o Brasil.

            Sem a Rede Globo, nesses últimos 40 anos, o Brasil seria um arquipélago de grupos isolados, sem uma visão comum do País. A Rede Globo fez pontes entre os brasileiros, transformando o arquipélago em um continente. Mas esse continente continua dividido pela desigualdade decorrente da brecha educacional que divide o Brasil. Brecha determinada pela ausência de uma política nacional unificadora com estratégias de inclusão, de permanência e qualidade da educação para todas as crianças, não importando a cidade onde nasça nem a vontade do prefeito. O modelo brasileiro de educação, estadualizado e municipalizado, mantém um sistema perverso que consolida a desigualdade, porque o berço da desigualdade está na desigualdade do berço.

Oferece esse sistema municipalizado uma escola desigual, conforme a riqueza da cidade e a vontade do prefeito. Não fosse a mídia falada, especialmente a Globo, talvez nem mais o próprio português seria o mesmo para todos os brasileiros, pelo tamanho do vocabulário, pela riqueza do uso da gramática, pela sintaxe, que cada grupo social vai desenvolver.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PT - DF) - Ouço o aparte de V. Exª.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Ilustre Senador Cristovam Buarque, primeiro, cumprimento-o pelo ângulo que V. Exª focaliza a importância da TV Globo para o Brasil. Estou aqui entre afiliados da TV Globo - o Plínio Profeta da MTV, o Carlos Lindenberg da TV Gazeta, o Jaime Câmara e tantos outros que estão aqui - e quero dizer que essas afiliadas é que dão a capilaridade e, ao mesmo tempo, a dimensão continental e maravilhosa deste País, trazendo para os olhos do Brasil inteiro aquilo que cada um sente na sua região. Por exemplo: quando, no Espírito Santo, avança a agronomia - começamos a fazer o plantio do café adensado -, o paulista e o paranaense, assiste ao Globo Rural e imediatamente toma conhecimento dessa nova técnica e começa a copiá-la. Ao mesmo tempo, vemos a festa bem folclórica do Nordeste, ou a festa dos pomeranos no Espírito Santo, ou a manifestação folclórica dos poloneses no interior do Paraná, ou o primo do Papa Karol Wojtyla, no dia da sua morte, falar aos brasileiros sobre a história de alguém tão ilustre e tão importante para a história do mundo. Então, essa capilaridade da TV Globo tem duas mãos: uma mão que leva para o Brasil o espetáculo todo e outra que recolhe a grandeza e a diversidade do Brasil e a distribui para que o País possa se conhecer. Somos, ilustre Senador, da geração do entalado. Quanta maldição contra a televisão brasileira! Os enlatados, os enlatados! Certamente, hoje, alguém da vanguarda, do retrocesso, qualquer um do País, vai estar xingando os enlatados. Graças a Deus, enlatados brasileiros da Rede Globo, que estão invadindo o mundo. Muito obrigado a V. Exª.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PT - DF) - Agradeço ao Senador Gerson Camata por evitar um esquecimento. Sempre que pensamos na Rede Globo pensamos mais na Globo do que na Rede. De fato, sem as transmissoras, o arquipélago continuaria. A Rede é fruto do trabalho da Globo com todos os seus associados.

Sr. Presidente, além desse trabalho integrador como mídia que a Globo faz, deve-se lembrar, embora não seja o seu aniversário hoje, o papel da Fundação Roberto Marinho - tive a honra de pertencer ao seu Conselho -, que teve um papel fundamental no preenchimento do vazio educacional brasileiro.

Sr. Presidente, se a Globo passar ao Brasil a necessidade de educar o Brasil, ela estará quase completando sua tarefa de unificadora, porque sozinha ela não vai ter esse papel, porque esse papel é do Estado brasileiro.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PT - DF) - Por favor, Senador Ney Suassuna.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Senador Cristovam Buarque, solidarizo-me com V. Exª nesta comemoração dos 40 anos da Globo, dizendo que a Globo faz parte da nossa vida, seja no campo educacional - V. Exª acabou de falar na Fundação -, seja quando queremos saber da realidade do Brasil e do mundo e ligamos a televisão nos noticiários, seja quando queremos fugir da realidade e procuramos a ficção, por meio das novelas que, por mais que nós, nordestinos, machões, digamos que não assistimos às novelas, quando percebemos estamos viciados, acompanhando capítulo por capítulo, nem que seja de ouvido. Às vezes, o Brasil inteiro fica envolvido, como foi o caso da última novela, Senhora do Destino. Portanto, congratulo-me com V. Exª e desejo à Globo não 40 anos a mais, mas muitos e muitos decênios, se Deus quiser, com o sucesso que tem. Muito obrigado.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PT - DF ) - Obrigado, Senador Ney Suassuna.

Sr. Presidente, continuando na linha do Senador Ney Suassuna, quero dizer que os próximos 40 anos não bastarão à Globo, que não terá condições - e nem é o seu papel - de completar a unificação brasileira. Vai ser preciso também a escola.

Quem sabe possa partir da Rede Globo, nos próximos anos, fazer o povo brasileiro perceber que não basta a Globo para o povo ver o Brasil, que será preciso a escola, onde a televisão poderá ser usada como instrumento pedagógico, como recurso didático.

Se a Rede Globo passar ao Brasil essa necessidade de educar o Brasil, ela estará completando sua tarefa de unificadora nacional. E dentro de não mais que dez ou vinte anos, quando completar seu 50º ou 60º aniversário, a Globo poderá dizer que ela não apenas mostrou o Brasil aos brasileiros, mas também ajudou a ensinar os brasileiros, por meio da educação, a compreender e transformar o Brasil.

Esta é a nossa homenagem e o nosso apelo para a Rede Globo e para todos que a fazem.

Não vou concluir dando parabéns a V. Sª, meu caro João Roberto, porque quero dar parabéns ao Brasil por ter a Rede Globo. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/05/2005 - Página 13034