Discurso durante a 55ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa do estreitamento das relações entre Brasil e Argentina.

Autor
Cristovam Buarque (PT - Partido dos Trabalhadores/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Defesa do estreitamento das relações entre Brasil e Argentina.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 05/05/2005 - Página 13260
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • DEFESA, REFORÇO, RELACIONAMENTO, COOPERAÇÃO, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, OBJETIVO, PREVENÇÃO, CRISE, CONFLITO, PAIS ALIADO.
  • SUGESTÃO, DIALOGO, SENADO, BRASIL, PARLAMENTO, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, COOPERAÇÃO, ITAMARATI (MRE).

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é uma velha tentação política unir um povo fazendo guerras com vizinhos. Isso foi muito comum, ao longo do Século XX, em muitos países. No começo, os líderes acreditam que o conflito ficará apenas nos discursos, mas muitas vezes o discurso termina despertando um ânimo popular de animosidade com outros povos. Quando isso acontece, ninguém controla mais o conflito, que passa a durar anos ou décadas.

Nos últimos dias, provocada ou não, a mídia tem divulgado notícias de reclamações mútuas entre líderes brasileiros e argentinos. Enquanto ficarem na mídia, essas notícias provocam apenas um ligeiro desconforto e uma inquietação muito leve nas populações. Se, entretanto, as notícias se transformarem em posições políticas dos líderes em seus discursos, o desconforto gerará uma grande preocupação. E, se, dos líderes, o antagonismo chegar à opinião pública, o conflito poderá ficar sem controle.

Por isso, Sr. Presidente, é preciso que estejamos alerta de que tudo poderá acontecer e de que um retrocesso de décadas pode ocorrer com prejuízos históricos imensos aos dois lados em disputa.

Não podemos deixar que um jogo de futebol - eu morava em Honduras, pouco depois da chamada guerra do futebol em El Salvador - e declarações de um ou outro líder a um jornalista atrapalhem as relações do Brasil com a Argentina. Nossas relações não permitem qualquer razão objetiva que justifique inimizade; ao contrário, temos argumentos fortíssimos para que aconteça exatamente o oposto: a cooperação, cada vez mais estreita, entre Brasil e Argentina. A geografia, a economia, a história e o rumo do mundo global amarram Brasil e Argentina a um futuro de cooperação ou nenhum futuro. Qualquer conflito entre nós servirá apenas para fortalecer a hegemonia de outras potências no continente. Reduzirá uma imensa possibilidade de cooperação na área econômica, cultural, na segurança, não apenas no continente, mas em todo o Atlântico Sul, onde a Argentina e o Brasil são determinantes.

Por isso, Sr. Presidente, é nossa obrigação, como líderes políticos, alertarmos os Governos dos dois países para o risco que corremos. Se deixarmos essas notícias se transformarem em posições, e essas posições se transformarem em inquietação popular. E, ao mesmo tempo, é preciso que nós, líderes brasileiros, insuflemos nossos governos a estenderem as mãos para o entendimento entre os nossos dois países.

Concedo um aparte ao Senador Eduardo Suplicy, que me solicita.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Prezado Senador Cristovam Buarque, hoje e ontem, ao ler essas notícias sobre as desavenças entre autoridades argentinas e brasileiras, fui acometido do mesmo sentimento de V. Exª. E cumprimento-o, porque, como Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado Federal, V. Exª está cumprindo hoje com o seu dever e a sua responsabilidade. Precedi V. Exª, até meados de fevereiro, na presidência dessa Comissão, da qual ainda sou membro, e quero somar-me à recomendação que faz V. Exª. Entendo que temos muitos motivos para mantermos um bom relacionamento com os argentinos e não valorizarmos possíveis diferenças, como as que temos tido ao longo da história, notadamente na área esportiva, seja no Maracanã ou no La Bombonera. Elas representam apenas divergências de torcidas, entusiasmadas por nossos times, sejam as próprias seleções nacionais ou o Boca Junior, o Corinthians, o Flamengo, o Santos, o River Plate, etc. Que essa rivalidade no futebol seja sempre parte das nossas vidas, assim como ocorre com as torcidas do Santos e do Corinthians, Palmeiras e Corinthians, que, às vezes, confrontam-se com maior entusiasmo, mas de forma saudável. Com respeito às diferenças relativas ao comércio, à integração, precisamos realmente apoiar o espírito e o esforço daqueles de quem desejamos nos aproximar. Parece-me que as palavras do Ministro Celso Amorim são nessa direção. E tenho a convicção de que, quando os Presidentes Lula e Néstor Kirchner - que, inclusive, está por vir ao Brasil na próxima semana, para o encontro de cúpula dos países árabes com os países sul-americanos - se encontrarem, será uma oportunidade fantástica para que ambos superem eventuais diferenças. Abraço a causa de V. Exª e transmito aos argentinos, ao Ministro das Relações Exteriores, ao Presidente Néstor Kirchner e também ao jogador de futebol que, dias atrás, fez uma observação inadequada ao Grafite - ou seja, como um símbolo de todos os argentinos -, que nós, brasileiros, também procuraremos agir no sentido de uma aproximação, sabendo que o destino e o progresso da Argentina e do Brasil dependem muito do nosso bom relacionamento. Vamos perseguir com muito carinho o objetivo dessa aproximação, de tal forma que possamos, argentinos e brasileiros, paraguaios, uruguaios e os demais, ter realmente uma integração a mais completa possível.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PT - DF) - Agradeço a V. Exª pelo aparte, Senador, e quero dizer que, se estou prestando esse serviço ao meu País como Presidente da Comissão de Relações Exteriores, em parte foi porque apreendi com V. Exª quando era Presidente e eu, membro, da mesma Comissão.

Sr. Presidente, creio que devemos, como líderes, fazer o que o Senador Eduardo Suplicy sugere. E uma coisa a mais: é preciso alertar os nossos compatriotas e pedir que este alerta também seja feito na Argentina, de que não podemos ser arrogantes um com o outro. A história dos dois países mostra quase que uma gangorra; isto é, quando um está muito bem, o outro não está tão bem assim. Já houve tempo em que brasileiros iam à Argentina e compravam ruas inteiras em Buenos Aires. Já houve tempo em que os argentinos compravam edifícios inteiros nas praias do Brasil.

Assim, se hoje um dos dois países passa dificuldades, isso não pode ser motivo para que, arrogantemente, tentemos tirar proveito ou, com se diz por ai, esnobemos o povo de um país irmão.

Como disse, por anos, fica em posição cômoda um, enquanto o outro passa dificuldades, para anos depois essa situação se inverter. Portanto, qualquer de nossos países que, em um momento, desdenha a situação do outro deve se lembrar que, em breve, essa posição poderá inverter-se. Nas relações entre Argentina e Brasil, nenhum dos dois poderá se julgar superior na economia, ainda menos se observarmos o conjunto dos indicadores socioeconômicos.

Ou agimos acordados ou perderemos os dois.

Por isso, é urgente passarmos de ambos os lados os descontentamentos, sairmos da conjuntura de cada um e olharmos o futuro comum que temos e podemos construir adiante. É do interesse dos nossos dois países que a estratégia de ambos seja vista em conjunto, e não isoladamente, muito menos em conflito.

Isso é possível e ainda é tempo.

Sr. Presidente, apresento ainda uma sugestão: abrir um diálogo direto entre os dois Senados; que a Presidência do nosso Senado convide o Presidente do Senado argentino - em cooperação obviamente com o Governo brasileiro, consultando o Ministro Celso Amorim, apesar de sermos Poderes separados - para que venha aqui fazer uma palestra para nós, Senadores. Assim, colaborando com ambas as chancelarias, talvez possamos ajudar a fortalecer as nossas relações, no lugar de acirrar as nossas disputas.

Era o que eu tinha a dizer, com muita esperança de que isso fique na mídia, mas que os nossos povos e os nossos governos se juntem para fazer dois povos e dois governos fortes.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Sr. Presidente, permita-me apenas sugerir que essa proposição possa, amanhã, ser votada na reunião da Comissão de Relações Exteriores, quando certamente será aprovada. E, assim, o Presidente do Senado poderá fazer o convite já com a aprovação da proposição de V. Exª, Senador Cristovam, feita no âmbito da Comissão.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PT - DF) - Por sua sugestão, Senador Eduardo Suplicy, levarei a idéia amanhã à Comissão.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/05/2005 - Página 13260