Discurso durante a 86ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexões sobre a crise política no país.

Autor
Alberto Silva (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PI)
Nome completo: Alberto Tavares Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA.:
  • Reflexões sobre a crise política no país.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Marco Maciel, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 21/06/2005 - Página 20357
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA.
Indexação
  • ANALISE, GRAVIDADE, MISERIA, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, BRASIL, PROTESTO, SUPERIORIDADE, RECURSOS, PAGAMENTO, DIVIDA PUBLICA, NECESSIDADE, PRIORIDADE, CRIAÇÃO, RENDA, EMPREGO, ACESSO, EDUCAÇÃO.
  • DEFESA, PRIORIDADE, PROGRAMA, AMPLIAÇÃO, EDUCAÇÃO PRE-ESCOLAR, OBJETIVO, ALIMENTAÇÃO, CRIANÇA, MERENDA ESCOLAR, REGISTRO, EXPERIENCIA, ESTADO DO PIAUI (PI), GESTÃO, ORADOR, EX GOVERNADOR.
  • CONCLAMAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, RETOMADA, DIREÇÃO, PAIS, BUSCA, SOLUÇÃO, PROBLEMAS BRASILEIROS, SIMULTANEIDADE, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO.
  • ANALISE, POSSIBILIDADE, EMPREGO, CAMPO, APREENSÃO, PROJETO, Biodiesel, EXPLORAÇÃO, TRABALHADOR RURAL, SEMELHANÇA, PROGRAMA NACIONAL DO ALCOOL (PROALCOOL), DEFESA, DIVULGAÇÃO, EXPERIENCIA, COOPERATIVA, ESTADO DO PIAUI (PI).

O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo a tribuna, nesta tarde, imbuído de um sentimento a respeito do que está acontecendo neste País e que deixa o povo e os políticos, nesta Casa e na outra Casa do Congresso, perplexos.

Arma-se - e é necessário que assim seja - uma CPMI para apurar as denúncias de corrupção e, enquanto isso, neste enorme País, neste grande País, a economia cresce - fala-se nos jornais que a economia vai bem -, visto que já dobramos a casa dos 100 bilhões.

Lembro que, quando recebi o título de Conselheiro da República, no discurso que fiz ao agradecer ao Presidente aquele diploma que me era conferido, disse a Sua Excelência: Presidente, se temos 100 bilhões, já ultrapassamos essa casa pela primeira vez e isso se deve à política econômica do atual Governo - não podemos deixar de reconhecer -, para que esse dinheiro todo? Para pagar dívidas internas e externas?

Naquela ocasião, ao falar a respeito do êxito da campanha do Presidente lá fora, levando o nome do Brasil como um País emergente, disposto a ajudar os outros, de um povo bom, hospitaleiro, sério e trabalhador, soube que Sua Excelência ficou emocionado, pedi: Presidente, diga aos ricos que vamos pagar esse dinheiro, mas que nos devolvam uma parte dele para aplicarmos aqui no País, na construção de um programa que gere renda e que contemple a educação, a saúde e a segurança. Pela ordem, que haja renda, emprego e educação. Havendo renda as pessoas se alimentam e não adoecem. Creio que as filas dos hospitais - e aqui está o meu companheiro Mão Santa, do Piauí, que é médico, e garanto que S. Exª concorda comigo -, que as filas dos doentes, a maior parte, decorre de fome crônica. Essa máquina perfeita que Deus criou, que é o homem, precisa se alimentar desde que a criança deixa o seio da mãe. Entretanto, no Brasil, há uma série de fatos que não deveriam acontecer.

Por exemplo - e já falei isso aqui uma vez, inclusive o nosso grande Ministro que está ali, Cristovam Buarque, até tomou um susto -, o Ministério da Educação, do alto da sua sapiência, ainda não resolveu um problema que é tão claro: as crianças de dois a seis anos ainda não têm escola no Brasil. Há uns ensaios de pré-escolar, mas não existem ainda. E como não há pré-escolar, não há merenda. Então, as crianças de dois a seis anos, de um modo geral as pobres, não têm a merenda escolar, não comem. É incrível que isso esteja acontecendo num País tão grande como o nosso.

Penso que se deve incluir o pré-escolar como prioridade nº 1 no programa Educação, até mesmo antes da universidade, antes do Ensino Básico, porque o cérebro das crianças de dois a seis anos que não se alimentam diminui. Não sou um especialista, mas tenho certeza de que os médicos aqui, inclusive o Presidente Tião Viana, sabem que, se uma criança não se alimenta ou se alimenta pouco, o seu cérebro diminui.

Temos uma experiência vivida, provada do Projeto Casa Escola que criamos no Piauí, quando éramos Governador, para crianças de dois a seis anos. Não fizemos prédios, não movimentamos como se fosse uma escola normal. Criamos um fato novo no ensino deste País: as pessoas de classe média mais baixa ofereceram as suas casas para criarmos nelas uma escola. E alguém pergunta: e no barraco cabe uma escola? Cabe, sim, uma mesinha com seis cadeiras e uma professora. V. Exªs já imaginaram o que aprendem seis crianças de cinco anos com uma professora e se alimentando?

Criamos uma fábrica de alimentos porque não podíamos usar a merenda escolar, que só pode ser dada para crianças a partir de sete anos. Criamos uma fábrica de alimentos - e o Senador Mão Santa sabe perfeitamente que isso é verdade - e alimentamos 50 mil crianças, Srªs e Srs. Senadores. Isso não é brincadeira! E havia professoras que ensinavam essas crianças por uma metodologia diferente e adequada aos nossos meninos mais pobres. E a primeira coisa que eles aprendiam é que eram brasileiros - fiz questão disso -, eram piauienses pertencentes a um País grande e forte. Eles seriam os cidadãos do futuro e, nunca, os desvalidos ou os deserdados da sorte. Dentro do seu barraco, eles aprendiam a ler, a escrever e a amar este País.

Creio ser isto o que está faltando neste momento: trazer esperança ao povo brasileiro. De cada lado, nota-se algo. Traz-nos constrangimento ver que todo Governo está enrolado. Não digo A, B ou C, pois quem decidirá isso são as CPMIs. Mas, enquanto isso, o que fazemos do País? Vamos deixá-lo parado? O comandante está dirigindo a Nação. É claro que Sua Excelência terá de reformular o Governo. Diz-se que novos ministros serão nomeados.

Está na hora de o Senado e a Câmara dizerem ao povo brasileiro: qual é nossa responsabilidade? Nós fazemos leis, mas não temos canetas para executá-las. No entanto, posso sugerir ao Presidente Lula o seguinte: “Presidente, assuma o comando. Vossa Excelência está no comando do País. Digam os artigos que Vossa Excelência sabia ou não, Vossa Excelência foi eleito com 70 milhões de votos. Os brasileiros não podem descrer de Vossa Excelência de uma vez por todas”.

Para onde vai este País? Quem guiará o País? Enquanto se apura - deve-se apurar e estamos aplaudindo o movimento das duas Casas do Congresso, criando comissões que apurem a realidade -, o que devemos oferecer ao comando do País? Braços cruzados? Dizem que a reforma política resolverá. Sim, mas tem tempo. Vamos, ao longo do que vai acontecer, pensar a reforma política. Ela resolverá o problema? Não. Qual é o problema número um? Venho de uma escola em que não se admitia que, entre vários problemas, não se aprendesse a discernir qual era o principal. O principal problema do Brasil, hoje, é a corrupção? Não. É a falta de segurança? Sim. É a educação? Sim. É saúde? Sim. A corrupção é fruto de quê? Não podemos saber, não vamos diagnosticar. Existe no mundo inteiro. Tem no Brasil? Tem. Vamos apurar. Mas o País deve parar? Nós, aqui, devemos ficar de braços cruzados ou poderemos oferecer alguma coisa ao Presidente, ao País? Falo em nome dos meus companheiros. Como engenheiro, como ex-Governador por duas vezes, como Senador pela segunda vez, como Deputado duas vezes, como Prefeito duas vezes, creio que tenho experiência e idade suficientes para dizer: Presidente, aja, assuma o comando! O País está estarrecido, está com medo do que vai acontecer porque não está vendo um timoneiro. É como quem está em um avião e dizem que o comandante desmaiou. Os passageiros vão deixar o avião cair ou vão pedir que o co-piloto assuma? Não tem co-piloto. O comandante é Sua Excelência mesmo. Assuma, Presidente, assuma todas as responsabilidades! Inclusive, do que está acontecendo na CPI.

Aqui vai o meu conselho: o desemprego, esse sim. Daqui, o Senador Pedro Simon fez um belo discurso. Diria que S. Exª pintou um quadro com pinceladas fortes, em português escorreito e perfeito. Disse dos desempregados, dos que estão morrendo de fome, disse tudo, mas não disse o que fazer. O que fazer? Sabemos que é assim mesmo, mas o que fazer? S. Exª declarou que encaramos os Sem-Terra como se fossem uns vândalos ou qualquer coisa assim.

Eu diria, como engenheiro que sou, que devemos ordenar as coisas. Aprendi, na minha escola, que, primeiro, se faz uma ordenação, descobre-se qual é o problema. Se você tem um problema, há diversas variáveis e, dentro delas, existe o imponderável. Está ali um engenheiro, meu colega, que sabe do que estou falando: a linguagem matemática dos imponderáveis. O imponderável é o povo, com seus problemas difusos. Não sabemos exatamente quantos são os problemas. O povo precisa de transporte, de educação, mas, em primeiro lugar, quer emprego. E de onde vem o emprego? Como vamos resolver o problema? Vamos para o campo? Vamos para o campo.

O biodiesel, por exemplo, é uma solução? Todo mundo diz que sim, que chegou a hora de um combustível alternativo. Mas sabe o que está acontecendo? Estamos caminhando para uma espécie de Proálcool.

No Piauí, Senador Mão Santa, montaram uma usina para 90 mil litros de biodiesel/dia. Então, chamaram os lavradores e disseram: “Vocês vão plantar mamona para nos vender, mas o preço nós é que vamos dar”. Assim, vamos ter um Proálcool outra vez: os grandes usineiros, e os bóias-frias cortando cana. Eu não quero isso.

Estamos montando, Senador Mão Santa, em nossa cidade, Parnaíba, um protótipo para servir de exemplo ao Brasil. Parnaíba terá uma usina dos próprios lavradores. O Banco do Nordeste aceitou a proposta: ele financiará uma usina de biodiesel, e os lavradores farão parte do projeto. Sabem como? O Pronaf - Programa Nacional de Agricultura Familiar é um programa antigo que o atual Governo está implementando. Hoje, quando o lavrador é cadastrado no Pronaf, recebe o dinheiro no banco. Quando chega em casa, pergunta à mulher o que está faltando. Ela responde que está faltando tudo e, então, ele gasta uma parte desse dinheiro. No fim, ele se enrola, porque não tem educação suficiente para gerir o recurso que nunca teve. Ele recebe o dinheiro e o gasta. Depois, planta uma roça comum, a renda não dá e ele não paga ao Pronaf.

Então, propusemos ao Banco Nordeste uma associação. Em Parnaíba, serão 1.500 lavradores, oriundos daqueles bairros que V. Exª criou, Senador Mão Santa. Por exemplo, no Bairro Piauí, estão morrendo de fome, porque, no seu tempo, ainda havia obras e serviços, mas agora não tem. Eles estão na pior. Então, estamos cadastrando esses homens para plantar mamona e feijão. Eles receberão o dinheiro do Pronaf, mas não o levarão para casa. Propusemos abrir uma conta no banco em nome dele e da associação.

Criamos o Instituto de Desenvolvimento do Piauí, uma ONG e não uma Oscip, que vai administrar e gerenciar o dinheiro e também a usina, com a sua parte industrial. E o que a usina vai fazer? Acrescentar valor industrial ao trabalho do homem do campo, que colheu a mamona e a entregou na usina.

E, durante o tempo em que cuida da roça, de onde vem seu dinheiro? De um cartão igual ao nosso. O Banco do Nordeste abre uma conta para ele com o dinheiro do Pronaf e estabelece, como combinado, algo em torno de R$250,00 por mês. Ele tem o cartão e tira o dinheiro semanalmente. Com isso, alimenta-se e sustenta a família, enquanto planta. E, depois que colhe, entrega tudo na usina, que transforma o produto em óleo, o qual vale R$2,50 o litro e pode ser exportado.

Nesse caso, qual será a renda do lavrador com apenas três hectares, com os argumentos que estou usando aqui e com os implementos que vamos dar? Será de R$700,00 a R$800,00 por mês E assino embaixo, como engenheiro e ex-Governador. A usina de 90 mil litros pagará R$0,60 pelo quilo da mamona. No máximo, ele terá 900kg por hectare. Portanto, em três hectares, terá 2.700kg. A R$0,60...

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Alberto Silva, o maior líder da nossa geração, John Fitzgerald Kennedy, disse: precisamos de muita imaginação, muita invenção, muita criação e muita coragem para atravessar a nova fronteira. Quero dar o testemunho de que, quando V. Exª governou o Piauí, foi fiel a essa inspiração de John Kennedy.

O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI) - Muito obrigado, Senador Mão Santa.

Apenas desejo que Deus me dê ainda vida e saúde para ver esses projetos de educação na residência dos pobres. Não precisamos de salas de aulas, mas de professoras que amem este País e que sintam que a educação dos pequenos é uma necessidade nacional.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI) - Sr. Presidente, se me permite, concluiria concedendo um aparte ao nosso companheiro Cristovam Buarque, um dos grande homens desta Casa, que tem algo a dizer, e ficaria muito agradecido em poder ouvi-lo.

O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PT - DF) - Senador Alberto Silva, gostaria de dizer da satisfação de ouvir o seu discurso não apenas porque falou em educação, mas porque há dias, nesta Casa, pergunto-me se nós - 723 líderes eleitos no plano federal, somando Senadores, Deputados, Presidente, Vice-Presidente - estamos à altura do momento. O Brasil tem sua história amarrada como se fosse um nó ou diversos nós: o nó da corrupção, o nó da concentração da renda, o nó da exclusão social, o nó da educação. E, às vezes, pergunto-me se estamos à altura. Se, daqui a vinte ou trinta anos, quando historiadores centrarem-se sobre o que falamos e fizemos aqui, dirão que aqui estava uma geração à altura do desafio ou se nós passamos ao largo, alheios à grande crise que o Brasil vive na busca de desatar esses nós que amarram seu futuro. Seu discurso me dá esperança.

O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI) - Muito obrigado, Senador Cristovam Buarque.

Encerro, Sr. Presidente. Concluindo...

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE) - Senador Alberto Silva, V. Exª me permite um aparte?

O SR. PRESIDENTE (Demóstenes Torres. PFL - GO) - Pode deferir o aparte, se desejar, Senador Alberto Silva.

O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI) - Com o maior prazer, ouço o Senador Marco Maciel.

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE) - Senador Alberto Silva, em rápidas palavras, quero apenas cumprimentar V. Exª pelo discurso que produz na tarde de hoje e que não me surpreende. Já o conheço há muito tempo, sei dos seus conhecimentos na área de sua específica formação no campo da engenharia, mas também sei que V. Exª é um humanista, que domina bem todos os assuntos, conhece os problemas de nosso País, sabe como encaminhá-los, como resolvê-los. Portanto, meu cumprimentos pelas palavras que profere na tarde de hoje.

O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI) - Sr. Presidente, permita-me encerrar dizendo: Presidente Lula, aqui nas duas Casas do Congresso há homens dispostos a ajudá-lo; convoque-nos! Armemos um programa mínimo; não vamos nos perder em várias soluções periféricas. Vamos ao miolo da questão: gerar emprego, gerar esperança para este País. Convoque os homens das duas Casas do Congresso, diga o que deseja e teremos algumas sugestões a fazer a Vossa Excelência para sairmos dessa entaladela que não nos vai levar aos caos. Tenhamos fé em Deus e fé neste País. Somos 180 milhões de brasileiros e, por isso, temos a obrigação de não nos omitirmos.

(Interrupção do som.)

            O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI) - Tenhamos fé! Tenho certeza de que sairemos desta, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/06/2005 - Página 20357