Discurso durante a 121ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Alerta ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre os prejuízos advindos do crescimento da corrupção.

Autor
Mão Santa (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PI)
Nome completo: Francisco de Assis de Moraes Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Alerta ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre os prejuízos advindos do crescimento da corrupção.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Heráclito Fortes.
Publicação
Publicação no DSF de 29/07/2005 - Página 25867
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, BIOGRAFIA, ULYSSES GUIMARÃES, EX PRESIDENTE, CAMARA DOS DEPUTADOS, ASSEMBLEIA CONSTITUINTE, DEFESA, RESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, AVALIAÇÃO, PREJUIZO, CORRUPÇÃO.
  • SUGESTÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CONSELHO, SENADO, PROVIDENCIA, COMBATE, CORRUPÇÃO.

O SR. MÃO SANTA (PMDB-PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Edison Lobão, que preside esta sessão, Senadoras e Senadores na Casa, brasileiros e brasileiras, V. Exª, Senador Edison Lobão, é um homem cheio de virtudes e entre elas nunca faltou a paciência. Nessas sessões não deliberativas, houve um acordo no sentido de que o orador teria dez minutos e mais cinco.

Senador Eduardo Suplicy, não aparteei V. Exª para não tirar a autoridade desse extraordinário homem público e justo, que é o Senador Lobão, do nosso querido Maranhão, mas V. Exª tinha os cinco minutos. Quero aproveitar para homenageá-lo por trazer a obra de Tocqueville. Não li esse livro de Tocqueville, mas li o que ele escreveu sobre Montesquieu e O Espírito das Leis. Ele é, sem dúvida nenhuma, um dos mais acreditados teóricos da política.

Senador Lobão, quero trazer aqui a minha colaboração. Não trouxe Tocqueville, mas trouxe um brasileiro, um homem nosso, aquele que disse que “viver não é preciso, navegar é preciso”, “criar é fazer surgir”: Dr. Ulysses - Uma biografia.

            O que faria Dr. Ulysses, que enfrentou, que navegou tanto nos mares bravios da ditadura? E quis Deus que ele estivesse morto, encantado no mar, ele que aqui disse: “...navegar é preciso”.

Feliz do país que não precisa buscar - ó, Lula, aprenda! - exemplos em outros países. Vou trazer exemplos daqui mesmo, porque Lula não vai ler Tocqueville, não vai. Ele não leu nem a Bíblia, que diz: “Não roubarás”. Vou trazer aqui, Lobão, Dr. Ulysses - Uma biografia. Ele teve uns apelidos - eu também: Mão Santa -, Dr. Ulysses teve os dele, Senador Suplicy, atentai bem: Sr. Diretas, Sr. Constituição, um senhor na ética da política. Feliz do País que não precisa buscar exemplos em outros - com todo respeito a Tocqueville. Eu mesmo já li um livro dele e fiz a minha apreciação, mas o Lula não vai ler isso aí.

Vou ser breve, vou dar uma aula aqui, eu estou para isso. O Senador Salgado, mineiro e grandão, disse que não entendia bem - ouviu, Lobão? - o Senado, que não se trabalhava... Vou dar a S. Exª também o entendimento, e ao Lula. Os dois que se sentem no banco de aluno para aprenderem o que é o Senado.

Senador Lobão, Moisés, o grande líder da História, recebeu uma missão. E, com a sua fé, ele não quis saber se tinha exército de faraó, se tinha mar Vermelho, se tinha deserto, se tinha seca, ele foi. Demorou quarenta anos, a idade do meu Partido, o PMDB. Por isso é que nós falamos, e eu falo em nome desse Partido. Eu posso falar. Em 1970, eu estava no pau; em 1974, estava Ulysses aqui, disputando contra o Geisel, só para “navegar” e nascer a redemocratização. Ela é nossa. O PT não tem nada com democracia. Ela é do PMDB. V. Exª conhece a História. Dr. Ulysses beijou a Constituição no dia 5 de outubro de 1988 - o Senador viu isso - e ele disse que desrespeitar a Constituição é desrespeitar a Pátria; trair a Constituição é trair a Pátria.

Nós ficamos traindo. Aquele negócio de medida provisória é traição. Aquilo é safadeza. Fomos nos acostumando a não cumprir nem as leis de Deus, como não roubarás, que está lá, avaliem a lei dos homens, que Ulysses beijou!

Lobão, do Maranhão, do Gonçalves Dias:

“Minha terra tem palmeiras,

Onde canta o sabiá;

As aves que aqui gorjeiam

Não gorjeiam como lá.”

“Não chores, meu filho;

Não chores que a vida

É luta renhida;

Viver é lutar.

A vida é combate,

Que os fracos abate,

Que os fortes, os bravos,

Só pode exaltar.”

            Forte e bravo foi Ulysses. Ó, Lula, aprendei!.

Em 5 de outubro de 1988, dia da promulgação da Constituição, às 8h40, ele sai de casa. “Esperei mais de 20 anos por este dia”. Ulysses esperou mais de 20 anos; Moisés, 40 anos. Aí Moisés quis desistir porque o povo não pegou as tábuas de Deus e foi adorar os bezerros de ouro. Moisés quis desistir, largar tudo - aí vem o Senado, a que quero estender isso -, mas ouviu a voz de Deus: “Moisés, busque os mais velhos, os mais experimentados, setenta, forme o conselho e eles o ajudarão a carregar o fardo do povo”. Daí nasceu a idéia de Senado, melhorado na Grécia e na Itália, no Renascimento, e aqui, por Rui Barbosa.

Lula deveria ter vindo aqui. Nós o ajudaríamos. Quantas vezes eu disse que ele não estava no caminho certo? Eu votei no Lula. Ajudei a elegê-lo. Quantas vezes eu disse que o núcleo duro não era duro, era burro? Quantas vezes? Aqui eu disse que tinha um “Zé Maligno”.

Ulysses disse uma frase marcante, às 17h07 - V. Exª estava presente -, no final do discurso que encerrou a Constituinte: “A sociedade foi Rubens Paiva e não os facínoras que o mataram”. Rubens Paiva era o pai do autor daquele livro dos anos 60...

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Marcelo Rubens Paiva.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - Marcelo Rubens Paiva.

Obrigado, Senador Eduardo Suplicy. Lula nunca se aconselhou com V. Exª.

Sob palmas, o Plenário se levantou. Após 30 segundos, ele terminou o discurso:

A Constituição. “Certamente não é perfeita. Ela própria o confessa ao admitir a reforma.”

Mas:

“Quanto a ela, discordar, sim. Divergir, sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la, nunca. Traidor da Constituição é traidor da pátria. Conhecemos o caminho maldito: rasgar a Constituição, trancar as portas do parlamento, garrotear a liberdade, mandar os patriotas para a cadeia, o exílio, o cemitério”.

Traidor da Constituição é traidor da Pátria. Conhecemos o caminho maldito: rasgar a Constituição, trancar as portas do Parlamento, garrotear a liberdade, mandar os patriotas para a cadeia, o exílio, o cemitério.

Suplicy, atentai, levai junto com Tocqueville só essas palavrinhas - ele pode ler só essas, não vou exigir mais; o Presidente está atormentado, eu sei psicologia. Eu não vou exigir muito, mas isso, anote... Aliás, eu vou lhe dar o livro. Só isso: a corrupção...

É mais fácil ele aprender do Ulysses - eu aprendi. A corrupção é o cupim da República, Lula. Ele disse aqui, V. Exª estava presente. Ulysses disse: a corrupção é o cupim da República; República suja pela corrupção impune, tomada pelas mãos de demagogos que, a pretexto de salvá-la, a tiranizam.

É, nós estávamos perto de um Zé maligno, tirânico, ele quis fazer disso aqui Cuba, mas nós reagimos. Foi, no Senado, aqui, éramos poucos de plantão. Ele corrompeu Câmara, corrompeu todas as outras instituições e poderes. Mas nós estávamos aqui, Zé. V. Exª é testemunha, éramos poucos, poucos - do PT, só o Suplicy; que é testemunha da nossa verdade.

Mas ele não leu Moisés, era para ouvir. Nós somos o pai da Pátria. Eu disse aqui daquele núcleo duro e burro: ninguém vai entrar aqui.

(Interrupção do som.)

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - Eu disse: o que me trouxe foi o estudo, o trabalho e a força do povo livre do Piauí. E não vêm, tem sinal vermelho para eles. Eles já escreveram a história... Eu disse que nenhum viria, não tinham sido prefeitinho ou governador como nós. Carreiro é senador vitalício: trinta anos, sabe mais do que nós, viu outros, e ele sentia, dava força.

Atentai bem! Suplicy, com esse telefone estamos mortos, porque o Lula, para aprender, é difícil, e V. Exª... Ele disse:”Não roubar” - anote. Acrescento: “não deixar roubar, pôr na cadeia quem roubou”, disse Ulysses Guimarães. Não é simples? Os mestres estão aí. Eis o primeiro mandamento da moral pública.

Queria ainda dizer o seguinte. Um repórter me perguntou sobre Frei Beto. Eu disse: “Frei Beto foi ao Lula e não ensinou nada.” Estou é com o Padre Antônio Vieira, que disse que quem perde a honestidade não tem nada a perder.

E agora falo como médico e cirurgião. Juscelino também o foi. Aliás, foi até cassado aqui - para verem como é a política! Sou médico-cirurgião ginecologista. Eu entendo que honestidade é como virgindade: nunca vi meio virgem, é ou não é, to be or not to be. Não tem esse negócio de ser meio honesto.

Então, o Presidente foi leniente: “Não, a Ministra levou só um pouquinho de dinheiro para Buenos Aires, foi pouco”. O outro roubou: “Era pouco”. Teve a coragem de dizer: “Essa confusão toda é porque um do quinto escalão tirou só três mil”. Não existe isso, é o exemplo.

Diz Padre Antônio Vieira: o exemplo arrasta. Os Waldomiros arrastaram. E são todos famintos. É isso mesmo.

Faltou-lhe Sócrates, que diz que só há um grande bem, Senador Edison Lobão, que é o saber. Faltou-lhe isso. Só há um grande bem: o saber. Existe a ciência da Administração, que ensina: planejar, designar, orientar, coordenar e fazer o controle. Se ele não quis ir a uma faculdade de Administração, tem a sabedoria do povo, que diz: “O olho do patrão é que engorda o boi”. Não é verdade, Tuma? Puseram o Lula, se encantou e ficou aí. Ele era o dono da pátria, da República - e com o nosso voto! Então, essas são as nossas palavras.

Senador Eduardo Suplicy, sua missão é extraordinária. Quero o PT forte. Entendo que a democracia precisa de partidos fortes. Não quero destruí-lo, eu o quero forte, mas que nos enfrente frontalmente, de peito aberto, numa luta democrática, e que não tente cooptar, comprar o PMDB de Ulysses Guimarães, meu e do povo. O PMDB é o povo, o PMDB é a democracia, não essa indignidade de comprar por carguinho.

Ó Lula, aprendei o que o núcleo duro não lhe ensinou. Com as propostas de continuar o militarismo no início da República, foram chamar Rui Barbosa e dar a chave do cofre do Ministério da Fazenda. Ele disse: “Não troco minha trouxa de convicções por um ministério”. Faço uma adaptação para o PMDB: não abrimos mão da democracia, que é nossa, conquistada aqui com o anticandidato Ulysses e Sobral Pinto na ditadura em 1974. Como agora: na plenitude da dificuldade, o PMDB vai se negar à grande virtude da democracia que é a alternância de poder? Queremos participar. E o quero forte. V. Exª representa ainda as virtudes que faltam ao PT.

Com a palavra o Senador Eduardo Suplicy.

O SR. PRESIDENTE (Edison Lobão. PFL - MA) - Senador Mão Santa, V. Exª sempre nos encanta com a sua poderosa oratória, tanto que nem nos apercebemos de que já havia chegado ao final da prorrogação dos cinco minutos. Em todo caso, em se tratando de V. Exª e do Senador Eduardo Suplicy, darei mais um minuto, na convicção de que o Senador Eduardo Suplicy será breve em seu aparte.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - E quis Deus que, depois do Suplicy, falasse Heráclito Fortes, que acaba de chegar. Está citado aqui: Heráclito, amigo de Ulysses, companheiro de Ulysses, cedeu casa para Ulysses morar nos momentos das dificuldades da luta democrática. Essa é grandeza do Piauí na história do Brasil, Heráclito.

Com a palavra o Senador Suplicy, estrela do PT.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Prezado Senador Mão Santa, agradeço-lhe pela sua atenção e respeito para comigo. Quero aqui fazer uma ponderação relacionada à disposição ontem anunciada pelo Ministro Jacques Wagner, da Coordenação Política, de dialogar com a oposição no Congresso Nacional. Ainda que o PMDB esteja na base de sustentação do Governo, V. Exª tem sido um membro efetivo da oposição. O Ministro Jacques Wagner diz que está disposto a dialogar com representantes da oposição. Eu avalio que será importante V. Exª dizer ao Presidente Lula: “Nós aqui queremos votar de acordo com aquilo que avaliamos ser o interesse da Nação, o interesse público. Não precisa haver qualquer tipo de conversa de nomeação de pessoas, de liberação de verbas ou o que seja, mas quero ter a possibilidade de fazer recomendações sobre o que precisa ser realizado”. Na relação entre o Executivo e o Congresso Nacional vamos nos pautar pelas normas sempre defendidas pelo Presidente Ulysses Guimarães do PMDB. Muito obrigado.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - Agradecemos e queremos dizer que saberemos colocar os interesses da Pátria acima de qualquer mágoa pessoal.

Com a palavra, se me permite V. Exª, o Senador Heráclito, ele que possibilitou uma presença nos momentos de dificuldade de Ulysses.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Sr. Presidente, esse som aqui da minha banca me persegue, permanentemente está com defeito. Eu tenho certeza de que os funcionários da Casa vão acionar a sua capacidade tecnológica para resolver de uma vez por todas esse problema.

O SR. PRESIDENTE (Edison Lobão. PFL - MA) - A Presidência tomará as devidas providências.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - É lamentável, mas já venho de algum tempo solicitando. Um dia serei atendido, Sr. Presidente. Senador Mão Santa, eu fico muito feliz de V. Exª estar aí, por meio da obra do nosso amigo jornalista Scartezzini, traçando alguns dos momentos interessantes vividos pelo Dr. Ulysses. V. Exª agora quase repete uma frase que ele usava muito: “A Pátria é o povo, e o povo vencerá”. Era uma convicção que ele tinha.

(Interrupção do som.)

O SR. PRESIDENTE (Edison Lobão. PFL - MA) - Eu farei mais uma, a sexta prorrogação do seu tempo.

OSR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - Obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Mas o interessante do aparte de V. Exª é que nós estamos aqui num plenário repleto de amigos pessoais do Dr. Ulysses Guimarães: Eduardo Suplicy, de quem ele tinha maior orgulho além de ligações pessoais, ligações familiares. Tinha pelo Eduardo Suplicy o maior apreço e vaticinava que ele teria um grande futuro. Evidentemente que o nosso Suplicy não chegou à metade da sua capacidade, mas São Paulo espera poder ainda merecê-lo de maneira mais plena. Conheci o Senador Romeu Tuma pelas mãos do Dr. Ulysses Guimarães. Na época, o Senador Romeu Tuma era da Polícia em São Paulo, salvo engano. Não era, Senador Tuma? E o Dr. Ulysses tinha por S. Exª a maior fascinação. Outra figura por quem ele nutria grande adoração é o Senador Edison Lobão. Lembro-me muito da preocupação permanente do Dr. Ulysses com a campanha que o Lobão travou...

(Interrupção do som.)

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - (...) na primeira tentativa para ser governador e na segunda. E um fato interessante: quando o Dr. Ulysses voltou dos Estados Unidos, após um problema de saúde, estávamos nós dois no Aeroporto de Brasília para recebê-lo. Daí por que V. Exª fala num ambiente que lhe é muito familiar. E o velho Ulysses era um homem que gostava de cultivar as amizades, mas tinha um predicado fantástico: não abria mão da sua condição de homem público e não abria mão, acima de tudo, de conviver com pessoas que tivessem o espírito público acima de qualquer outra ambição, bem como tivessem compromisso com a dignidade administrativa. De forma que eu parabenizo V. Exª por estar revivendo para o País alguns aspectos da vida daquele homem, tão bem escritos pelo jornalista Scartezzini. Muito obrigado.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - Agradecemos ao Senador Lobão. Pediria que aqueles versos do Maranhão... Como no futebol há uma prorrogação, que fossem descontados alguns minutos.

Só para terminar, sintetizando a esperança. Ele fala na esperança, aquela esperança venceu o medo, mas a corrupção está vencendo a esperança. Não podemos deixar acontecer isso.

Então, Ulysses disse: Esperança! O estadista é o arquiteto da esperança! Atentem bem! Ele vai e diz: São Lucas é o evangelista mais querido, porque é amoroso, não é apocalíptico, é o profeta da esperança, o poeta silvestre de “Olhai os lírios do campo”. E ele conta que, na sua última viagem com Juscelino, este lhe disse que a política é a esperança.

Ó, Deus, que este Senado faça voltar a esperança de melhores dias ao Brasil!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/07/2005 - Página 25867