Discurso durante a 133ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas ao pronunciamento do Presidente da República. Propostas para o Brasil sair da atual crise.

Autor
Cristovam Buarque (PT - Partido dos Trabalhadores/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Críticas ao pronunciamento do Presidente da República. Propostas para o Brasil sair da atual crise.
Publicação
Publicação no DSF de 13/08/2005 - Página 27396
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • AVALIAÇÃO, PRONUNCIAMENTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, RESPOSTA, CRISE, HISTORIA, FALTA, DIRETRIZ, AUSENCIA, ESCLARECIMENTOS, RESPONSABILIDADE, CORRUPÇÃO, GOVERNO FEDERAL, EFEITO, PERDA, CONFIANÇA, POPULAÇÃO.
  • CONCLAMAÇÃO, SENADOR, BUSCA, SOLUÇÃO, CRISE, POLITICA NACIONAL, UNIÃO, DEFESA, INTERESSE NACIONAL.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, vivemos nesta manhã um momento histórico. Senador Luiz Otávio, mas é um momento que não foi enfrentado como se fosse histórico. Há crises financeiras, crises políticas, crises históricas, e cada uma delas exige enfrentamentos de acordo com a própria dramaticidade.

Hoje, de manhã, o Presidente da República não demonstrou que essa crise é maior do que política. Ela é uma crise histórica. É política, quando se muda um Ministro ou outro; é histórica, quando se muda um Presidente ou outro no meio do mandato, ou quando o Presidente perde a credibilidade, ou quando é envolvido em fatos que a opinião pública não pode tolerar.

Lamentavelmente, o Presidente da República fez um discurso que não tem a dimensão histórica do momento e da tragédia que vivemos. O Presidente do PT, Tarso Genro, hoje pela manhã, falou que o Presidente Lula precisava fazer um discurso, olhando o futuro e a história como um estadista; mas o Presidente não fez.

Primeiro, um discurso como esse não tinha que ser feito diante de Ministros, intermediando a ligação dele, Presidente, com o povo. Esse era um discurso para ser feito com a solenidade de estarem ele e o povo, com a câmara no meio. Não podia ser um discurso com pessoas assistindo. Segundo, o Presidente não podia usar o momento para falar de projeto de Governo - esse é um outro momento. Era para ele falar daquilo que o povo está sabendo, indignado; mas ele não fez isso. Ele diluiu o seu discurso. Terceiro, não foi específico, Senador, naquilo que, de fato, o povo está querendo saber: a responsabilidade dele ou não. Quarto, não olhou nos olhos do povo e disse que não sabia. Ainda assim, depois de dizer isso, tinha que ter dito “Eu não sabia” - e esse é um pecado extremamente grave em um líder. Na Igreja, roubar é um pecado fundamental, mas não o é estar ao lado, conivente com o ladrão; na política, ser tolerante, não perceber, não olhar é um equívoco muito grande. O Presidente não fez isso. Seu discurso foi, portanto, frustrante e não serve para retomar a confiança de que precisamos. E aí vem a última das conseqüências negativas.

Nos últimos meses, Presidente Mão Santa, ouço, de todos os lados, a pergunta: “O que fazer?” E digo com a maior sinceridade: “Não sei”, porque esperava que o Presidente nos dissesse o rumo que deveríamos tomar. A partir de agora, o Presidente demonstrou que não vai dizer o rumo.

Por isso, nenhum de nós, Senadores, têm o direito mais de dizer que não sabe o que fazer. A partir de agora, nós somos os líderes, porque do Presidente não ouvimos o rumo, o destino. Ele disse que está indignado, como todos os 180 milhões. Mas ele não é um dos 180 milhões: é o nosso Presidente. Não basta estar indignado, como Presidente; é preciso transformar essa indignação em uma ação, em uma condução, em um projeto. E isso ele não fez. Ele se igualou aos outros 180 milhões, o que é muito bom do ponto de vista democrático das relações pessoais, mas uma tragédia para o País do ponto de vista da liderança.

Assim, Sr. Presidente, do jeito que, presidindo esta sessão, sugeri que fizéssemos uma vigília - o que o Senador Arthur Virgílio ratificou, e digo isso, sem querer fazer qualquer jogo de palavras -, penso que teríamos de fazer algo a partir de segunda-feira. Este Senado, a partir de segunda-feira, não pode mais ser o mesmo. Não pode nem mesmo haver figuras como o Senador Luiz Otávio, defendendo o Governo, ou como o Senador Arthur Virgílio, posicionando-se contra ele, como Oposição. Temos de ser brasileiros, na segunda-feira, muito mais do que Oposição e Governo. Teremos de costurar uma saída para o momento grave que o Brasil vive, porque o Presidente mostrou que não vai chamar o povo brasileiro nem a nós para construirmos esse caminho.

Quero que fique registrada, Sr. Presidente, Srs. Senadores, esta minha angústia de que, a partir de segunda-feira, a agenda do Senado deve mudar. Não podemos mais ter uma agenda para aprovar um ou outro projeto ou para ficar aqui usando e repetindo angustiadamente as palavras “Duda” e “mensalão”, “mensalão” e “Duda”. Acho que devemos começar a falar na palavra “Brasil”.

O Brasil vai olhar para nós depois do discurso do Presidente, porque não terá mais como olhar para o Presidente como o farol que nos dará um rumo. Isso vai aumentar a nossa angústia, que vai aumentar a nossa responsabilidade.

Gostaria, Senador Luiz Otávio - e V. Exª é aqui um representante do Governo, como eu deveria ser -, de nos ver juntos na próxima semana, procurando um caminho. Por incrível que pareça, hoje, V. Exª, de outro Partido, está mais solidário ao Governo, do que eu, que sou filiado ao Partido dos Trabalhadores. Mas sou filiado ao Partido dos Trabalhadores que o Senador Aloizio Mercadante disse que não é esse que está aí, porque esse que está aí não está dando ajuda ao Presidente.

Até o Tarso Genro tentou dar essa ajuda, hoje de manhã, quando cobrou do Presidente um discurso estadista, olhando a História e não a política apenas. Ele não olhou a História, e isso me deixou bastante frustrado, bastante preocupado.

Mas, a partir de segunda-feira, não repetirei mais os meus e-mails, cartas e telefonemas dos amigos e liderados perguntando o que fazer, e eu dizendo que não sei, esperando o Presidente. A partir de segunda-feira, terei de dizer o que considero necessário fazer para que este País saia dessa sua crise histórica, porque o Presidente, hoje de manhã, não nos disse.

Essa é a minha angústia nesta sexta-feira, já de tarde, mas a minha esperança é a de que, a partir de segunda-feira, retomando os trabalhos, nós, Governo, Oposição e aqueles que hoje nem sabem se são Governo ou Oposição, juntemo-nos em torno de algo maior do que o dia-a-dia, do que a História e do que todos esses nomes que estão aparecendo, que é o nome do Brasil.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/08/2005 - Página 27396