Discurso durante a 158ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Solidariedade com os colonos desalojados do Toldo Pinhal, no município de Seara/SC. Preocupação com a eminência de alagamento da cidade de Blumenau tendo em vista a depredação pelos índios da região, em reivindicação por melhores condições, dos equipamentos da Barragem de Ibirama.

Autor
Leonel Pavan (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SC)
Nome completo: Leonel Arcangelo Pavan
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • Solidariedade com os colonos desalojados do Toldo Pinhal, no município de Seara/SC. Preocupação com a eminência de alagamento da cidade de Blumenau tendo em vista a depredação pelos índios da região, em reivindicação por melhores condições, dos equipamentos da Barragem de Ibirama.
Aparteantes
Augusto Botelho, Mozarildo Cavalcanti.
Publicação
Publicação no DSF de 15/09/2005 - Página 30995
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • REGISTRO, DENUNCIA, CAMARA MUNICIPAL, MUNICIPIO, SEARA (SC), ESTADO DE SANTA CATARINA (SC), PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, POPULAÇÃO, VITIMA, DESPEJO, AREA, GRUPO INDIGENA, CRITICA, OMISSÃO, GOVERNO FEDERAL.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, A NOTICIA, ESTADO DE SANTA CATARINA (SC), DIVULGAÇÃO, LEVANTAMENTO DE DADOS, ANTROPOLOGO, INEXISTENCIA, ATUALIDADE, GRUPO INDIGENA, TERRAS, REGIÃO, RECONHECIMENTO, DIREITO DE PROPRIEDADE, INDIO.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), AUSENCIA, EFICACIA, POLITICA, PRESERVAÇÃO, DIREITOS, INDIO, PROPRIEDADE RURAL.
  • DENUNCIA, INVASÃO, GRUPO INDIGENA, BARRAGEM, ESTADO DE SANTA CATARINA (SC), OBJETIVO, REIVINDICAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ATENDIMENTO, NECESSIDADE, INDIO, REGIÃO, APREENSÃO, ORADOR, POSSIBILIDADE, INUNDAÇÃO, MUNICIPIOS, EFEITO, QUEBRA, EQUIPAMENTOS, AÇUDE, SOLICITAÇÃO, PROVIDENCIA, GOVERNO.

O SR. LEONEL PAVAN (PSDB - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Senadora Serys Slhessarenko, Srªs e Srs. Senadores, dias atrás recebi um ofício da Câmara de Vereadores do Município de Seara, no meu Estado de Santa Catarina, solicitando-me que, desta tribuna, eu me pronunciasse sobre um assunto de extrema importância para o meu Estado, principalmente para o Município de Seara, porque, mesmo tendo enviado inúmeros ofícios e pedidos aos Ministérios e ao Governo Federal, até aquele momento a Câmara de Vereadores não havia sido atendida.

O ofício a que me referi relata a grave situação em que se encontram os colonos desalojados da área denominada Toldo Pinhal. O encaminhamento do ofício, assinado pela ilustre Vereadora Lourdes Maria Gaida, Presidente da Câmara Municipal daquele Município, deu-se por proposta, aprovada em plenário, de autoria do Vereador Valdir Giaretta, e tem por objetivo denunciar, de um lado, a omissão dos Poderes Públicos e, de outro, os problemas financeiros e psicológicos que vêm afetando os colonos e seus familiares.

Relatam ainda, os Vereadores, a ocupação das terras de Toldo Pinhal, bem assim a de outras áreas naquela região do Alto Uruguai catarinense, e que os conflitos se arrastam há décadas, sem que as autoridades encontrem uma solução definitiva para minorar os sofrimentos daquelas pessoas e para pôr fim aos conflitos envolvendo colonos e populações indígenas.

De acordo com documento da Câmara Municipal de Seara, os colonos das pretensas áreas indígenas daquela região, embora tenham sido desalojados há uma década, não foram ainda reassentados, nem receberam indenização por suas terras. Ao referir-se às “pretensas áreas indígenas”, a Câmara Municipal de Seara esclarece que, desde 1919, não se registrou a presença de índios naquelas terras, que haviam sido colonizadas com o aval do Poder Público há quase um século. “Portanto - ressalta o documento -, trata-se de ‘aldeamentos’, ou seja, terras possivelmente ocupadas pelos índios em tempos remotos, e não de área indígena, como tentam fazer crer a Funai e a União”.

“O Supremo Tribunal Federal - acrescenta o ofício - tem decidido com acerto que terras ocupadas pelas populações indígenas há 80 ou 100 anos, e hoje ocupadas por colonos, não podem ser consideradas áreas indígenas e sim ‘aldeamentos indígenas’, motivo pelo qual cometeu-se grave injustiça ao desalojar os colonos de suas terras, ocupadas por eles há mais de 80 anos”.

Em que pesem todo o respeito e todo o carinho que temos por nossos índios, Srª Presidente, o argumento dos colonos de Toldo Pinhal parece ter fundamentos bastante sólidos. Eles lembram que a antropóloga Rosana Badalotti, por meio de entrevistas e levantamentos históricos, demonstrou que pequenos grupos indígenas viveram um período na região, mas, ainda assim, em tempos remotos. O jornal A Notícia - um dos grandes jornais do nosso Estado de Santa Catarina -, há dois anos, informou: “Além de descartar a presença de índios no Alto Uruguai, o levantamento da antropóloga mostra que os agricultores que chegaram ao Alto Uruguai no início do século passado ocuparam as terras a partir de incentivos dados pelo Governo Federal da época”. Isso significa que eles só ocuparam as terras porque o Governo Federal os assentou e ainda deu incentivos.

Ninguém, em sã consciência, pode negar aos índios o direito de viverem em suas terras. Da mesma forma, ninguém pode ignorar que a questão territorial é crucial para a sobrevivência dos povos indígenas e para a manutenção de sua qualidade de vida. Porém, os protestos dos colonos - repercutidos pelos Vereadores de Seara - nos parecem amplamente justificados. Por um lado, foram desalojados de uma área que ocupavam, com incentivo do poder público federal - diga-se, de passagem -, desde o começo do século passado; por outro, embora a reserva de Toldo Pinhal, que agora abriga os índios caigangue, tenha sido criada em 27 de outubro de 1996, até hoje os colonos não foram indenizados pelas terras que lhes pertenciam, ou melhor, que lhes pertencem, porque, até que sejam indenizados, elas lhes pertencem por direito.

Senador Mozarildo Cavalcanti, vou conceder-lhe um aparte, mas antes quero chegar ao final do pronunciamento, até para que meu raciocínio fique mais claro.

Os processos ajuizados pelos agricultores, reivindicando a indenização ou visando ao reassentamento, ainda não foram julgados sequer na 1ª Instância, segundo dizem, em face dos recursos e das manobras da Funai e da União.

Não bastassem esses fatos, uma nova demarcação, que implicará a remoção de duzentas famílias, encontra-se em andamento no Município de Seara, conforme denúncia à Câmara de Vereadores.

Assim, Srª Presidente, ao reportar-me ao ofício da Câmara de Vereadores de Seara, quero solidarizar-me com os colonos que se encontram nessa situação aflitiva e encarecer às autoridades judiciais e do Poder Executivo uma solução firme, decidida e breve para que eles não sejam prejudicados.

Temos de respeitar os índios. Precisamos dar-lhes sustentação, cumprir os nossos compromissos e convênios, oferecendo-lhes espaço, terra, condições de trabalho, casa, escola, saúde. Porém, nessas áreas, há mais de um século, não existem mais índios. Nessa área, foi o próprio Governo Federal que propôs incentivos para que colonos pudessem ali trabalhar.

Concedo um aparte, com muito honra, ao meu querido amigo, Senador Mozarildo Cavalcanti, que tem certamente uma história nessa área.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Senador Leonel Pavan, nós, inclusive, fizemos parte da comissão externa do Senado que foi ao seu Estado analisar esse conflito. Na verdade, estivemos em Santa Catarina, em Mato Grosso, em Rondônia, em Roraima e a situação não é diferente também em vários outros Estados. Então, o que, na verdade, existe é um conflito federativo provocado pela União. Refiro-me à União, porque o Governo Federal usa logicamente um órgão de terceira grandeza - digamos assim -, que é a Funai, onde parece haver um alojamento de colegas ou professores de Deus, que definem qual terra é indígena, por que não é terra indígena etc. O Supremo já tem uma Súmula sobre isso, mas eles não obedecem. Creio que deveríamos provocar o Supremo para decidir esse conflito federativo, que envolve vários Estados do Brasil. Na realidade, na Amazônia, por exemplo, é um absurdo o que se faz. Hoje, só para resumir, a população indígena do Brasil corresponde a 0,2% dos brasileiros, e atualmente 12% do território nacional já é demarcado para terras indígenas. Não há nenhum país do mundo que tenha tal correlação. Mesmo assim, concordo com V. Exª: devemos, sim, olhar cada caso, cada tribo, dar assistência, mas não passando por cima de direitos seculares, de uma ordem institucionalizada, de um modus de vida que, muitas vezes, até agrada aos índios, pois os antropólogos da Funai resolvem dizer que tem que ser do jeito que eles entendem. Então, solidarizo-me com V. Exª. Temos, sim, que levar essa luta de maneira não-ideológica. Temos que olhar com racionalidade e com bom senso. É lamentável que o Senado esteja acordando muito lentamente para a questão. Pior ainda é a postura do Supremo, que devia chamar essa causa e decidi-la como conflito federativo. Muito obrigado.

O SR. LEONEL PAVAN (PSDB - SC) - O Senador Mozarildo tem já uma história de luta nesse sentido, pedindo justiça, para que o Governo Federal tome as devidas providências. Não somos, em hipótese alguma, contra aqueles que já estão no nosso País, há muito mais tempo que nós, os índios, mas o que não se pode fazer é a injustiça também com os colonos. O direito de cada um deve ser preservado e reconhecido, mas não pode o Governo Federal, às custas de falta de planejamento, no passado, às custas de falta de vontade política do Governo Federal, prejudicar os nossos colonos e também os índios, porque ninguém, nem os índios nem os colonos, estão se sentido seguros devido à falta de uma política mais ampla e mais segura por parte da Funai e da União.

Concedo um aparte ao Senador Augusto Botelho, com muita honra.

O Sr. Augusto Botelho (PDT - RR) - Senador Pavan, faço este aparte a V. Exª apenas para relatar algo sobre essa história de que vão reassentar as pessoas. Lá em Roraima já foram demarcadas 34 áreas indígenas, que já correspondem a 50% do meu Estado. Não somos contra demarcação de área indígena. Ocorre que as pessoas são postas para fora de suas casas, de suas propriedades e não são reassentadas. Lá em Santa Catarina não será diferente. Outro fato também é que a Constituição refere-se às terras que os indígenas, tradicionalmente, habitam. Se esse pessoal está lá há cem anos, eles não habitam essa região. Esse fato aconteceu no meu Estado, e é por isso que quero alertá-lo. Tenho certeza de que todos os produtores que forem postos para fora de suas áreas não serão reassentados, porque lá em Roraima ninguém foi reassentado. Há mais de vinte anos estão sendo postos para fora, e ninguém é reassentado. Então, acredito que V. Exª tem que gritar e lutar, defender os direitos dos indígenas, mas tentar dar um jeito de fazer indenizações justas, porque eles vêm, avaliam a terra hoje, daqui a 15 anos voltam, reavaliam as benfeitorias, que estão há 15 anos abandonadas, e querem pagar pelo valor auferido nessa avaliação de 15 anos depois. A maioria dos colonos, em Boa Vista, que saiu há 20 ou 25 anos, continua esperando indenização e reassentamento. Nenhum foi reassentado até agora, em nenhum Governo.

O SR. LEONEL PAVAN (PSDB - SC) - Quero incorporar os apartes do Senador Mozarildo e de V. Exª ao nosso pronunciamento.

Ainda sobre os índios, queria fazer uma outra denúncia, e gravíssima. O Alto Vale e o Médio Vale de Santa Catarina têm três barragens, sendo uma em Ituporanga, a outra em Taió e uma terceira em José Boiteux - no caso, tanto a de Ibirama quanto a de José Boiteux eles chamam de barragem de Ibirama, mas ela fica, na verdade, em José Boiteux. São três barragens, sendo que a barragem do Ibirama - ou de José Boiteux - é maior do que as outras duas juntas; é maior do que a barragem de Ituporanga e de Taió. Aliás, ela é o dobro das duas juntas.

Essa barragem de Ibirama ou de José Boiteux comporta um volume de água - caso ocorra um problema, muita chuva na região -, dentro da cidade de Blumenau e das cidades próximas, de mais de três metros de altura. Digo isso para chegar a uma denúncia. Essa barragem de Ibirama ou de José Boiteux foi invadida por índios dos dois Municípios. São índios que convivem com a comunidade e que nós respeitamos; pessoas que trabalham e que estão agregadas à economia e à vida social daquela região.

Eles invadiram essa barragem e depredaram alguns equipamentos, para chamar a atenção do Governo Federal. O painel e os quadros de comando da barragem foram destruídos; os cabos de aço das duas comportas existentes foram cortados. Uma comporta está fechada; a outra, semi-aberta. Se houver uma chuva muito grande na região, algumas cidades poderão ser inundadas, a exemplo da enchente que ocorreu há muitos anos, quando milhares de pessoas ficaram desalojadas, com prejuízos enormes para Santa Catarina e para o Brasil.

Existe um convênio entre o Deinfra e o Governo do Estado para a manutenção dos equipamentos e da barragem, a qual não está recebendo os devidos cuidados de parte da União. E os índios estão lá. Já vieram, por diversas vezes, a Brasília, procuraram Ministérios e a Funai e disseram que não vão sair enquanto não forem atendidos. Acharam uma forma de protestar, porque vêm aqui, pintam-se, andam, fazem seus protestos e não são ouvidos. Não são ouvidos! À sua maneira, fazem manifestações pacíficas, mas a Funai não lhes dá atenção, o Governo não lhes dá atenção. Eles precisam de rodovias, postos de saúde, escolas, infra-estrutura; querem que sejam cumpridos os convênios. Como não são ouvidos, invadiram a barragem, depredaram os painéis e a sala de comando, cortaram os cabos. Em função disso, poderá haver uma catástrofe, caso venham a ocorrer muitas chuvas na região.

De quantos milhões e milhões de reais terão de dispor o Governo Federal, o Estado, as cidades, para cobrir os prejuízos, se houver uma inundação em função da depredação e das más condições dessa barragem?

Queria deixar registrado - certamente há alguém da Funai, do Ministério Público, da defesa civil me ouvindo - que um desastre naquela região vai custar muito caro ao País, a todos nós. Não é possível que o Governo não tenha condições de investir R$2 milhões na barragem de Ibirama ou de José Boiteux e de atender os índios, que reivindicam apenas escolas, postos de saúde, estradas, infra-estrutura. Não é possível que este Governo, que está envolvido em um mar de lama e que usa os microfones da mídia nacional demagogicamente, falando das conquistas sociais, não dê a devida atenção a casos como esse, que poderá gerar inúmeros prejuízos à Nação.

Somo a minha voz, desta tribuna, à da imprensa, que já tem alertado os Parlamentares de Santa Catarina - Deputados Federais, Senadores e Vereadores -, bem como os Prefeitos, os Vice-Prefeitos e as entidades sociais. Todos estão seriamente preocupados, porque, se ocorrer uma catástrofe, certamente o Brasil será penalizado pelos prejuízos econômicos e pelas perdas de vidas.

Fica aqui o nosso pedido, para que os representantes do Governo que nos estão ouvindo e assistindo tomem as devidas providências, urgentemente, a fim de que não haja uma catástrofe como a de Nova Orleans. Blumenau, o Alto Vale do Itajaí, essa região de Santa Catarina já sofreu muito com inundações e perdas de vidas. Esse é o registro que deixo.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/09/2005 - Página 30995