Discurso durante a 158ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas ao Judiciário pela concessão de liminares favoráveis a deputados petistas passíveis de cassação alegando a ausência da ampla defesa no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados.

Autor
Almeida Lima (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SE)
Nome completo: José Almeida Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODERES CONSTITUCIONAIS.:
  • Críticas ao Judiciário pela concessão de liminares favoráveis a deputados petistas passíveis de cassação alegando a ausência da ampla defesa no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados.
Publicação
Publicação no DSF de 15/09/2005 - Página 31002
Assunto
Outros > PODERES CONSTITUCIONAIS.
Indexação
  • PROTESTO, INTERFERENCIA, JUDICIARIO, ATUAÇÃO, LEGISLATIVO, ESPECIFICAÇÃO, LIMINAR, CONCESSÃO, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), SUSPENSÃO, PROCEDIMENTO, COMISSÃO DE ETICA, CAMARA DOS DEPUTADOS, JULGAMENTO, DEPUTADO FEDERAL, VINCULAÇÃO, RECEBIMENTO, PROPINA, GOVERNO FEDERAL.
  • ESCLARECIMENTOS, ATUAÇÃO, COMISSÃO DE ETICA, PROCESSO, INVESTIGAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), REGISTRO, PERMANENCIA, DIREITO DE DEFESA, DEPUTADO FEDERAL.
  • LEITURA, PARECER, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), CONFIRMAÇÃO, AUSENCIA, COMPETENCIA, JUDICIARIO, INTERFERENCIA, TRABALHO, LEGISLATIVO.
  • PROTESTO, PREJUIZO, REPUTAÇÃO, CONGRESSISTA, OPINIÃO PUBLICA, EFEITO, CRISE, NATUREZA POLITICA, GOVERNO FEDERAL, DEFESA, URGENCIA, PUNIÇÃO, RESPONSAVEL, CORRUPÇÃO.

O SR. ALMEIDA LIMA (PMDB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os fatos, sem dúvida alguma, estão atropelando todo e qualquer planejamento que o Parlamentar faça para o exercício do seu mandato nos dias atuais. Fatos se sobrepõem a fatos.

Eu pretendia, nesta sessão, falar sobre pesquisas eleitorais. Não o farei mais.

A liminar concedida pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal, Dr. Nelson Jobim, Presidente daquela Corte, força-me exatamente a tecer comentários por entendê-la, político e juridicamente, incorreta. Estamos diante de uma crise institucional, não apenas político-social, pois presenciamos a interferência inadequada do Poder Judiciário nas ações do Poder Legislativo.

O art. 2º da Carta Magna assegura que os Poderes da União são independentes e harmônicos entre si, e não se pode admitir que o Supremo Tribunal Federal venha a interferir nas decisões interna corporis desta Casa do Congresso Nacional.

Seis Parlamentares do PT, acusados de corrupção - João Paulo Cunha, Josias Gomes da Silva, Luiz Carlos da Silva, Paulo Roberto Galvão da Rocha, José Mentor Guilherme de Mello Netto e João Magno de Moura -, impetraram mandado de segurança, com pedido liminar, para suspensão do procedimento encaminhado à Comissão de Ética da Câmara dos Deputados até que a decisão do mandado de segurança, no mérito, seja prolatada. A alegação, Srªs e Srs. Senadores: a falta da ampla defesa.

Um absurdo! Sobretudo porque, até o presente momento, o que existia, o que estava em tramitação, era o inquérito pela Comissão Parlamentar de Inquérito. O processo instaurado o foi exatamente nessa oportunidade, e o mais simples advogado, o mais simples estudante de Direito sabem que é o momento adequado para a ampla defesa.

Sr. Presidente, Senador Romeu Tuma, que presidiu inúmeros inquéritos policiais federais na função que exercia como delegado da Polícia Federal, hoje nobre Senador, V. Exª sabe muito bem que não há defesa na fase inquisitória, não há defesa na fase de investigação. Instaurado o processo, aí sim - e ele foi instaurado na Comissão de Ética da Câmara dos Deputados -, os indiciados terão duas oportunidades de defesa: a defesa na Comissão de Ética e a defesa no plenário, inclusive a defesa em causa própria ou por meio da constituição de advogado para a sustentação oral.

Durante a tramitação do processo na Comissão de Ética, há a possibilidade da apresentação da defesa escrita, da apresentação de provas documentais e testemunhais. Não há, portanto, que se falar na tese de que foi ferido o direito à ampla defesa. Srªs e Srs. Senadores, não houve sequer, ainda, o ato de cassação de mandato para se dizer: a defesa foi impedida, a defesa não foi feita. E a decisão do Ministro-Presidente, a quem estabeleço uma crítica neste instante, não condiz com a jurisprudência da Suprema Corte.

Aliás, em mandado de segurança por mim impetrado naquela Corte por ocasião de decisão do Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, desta Casa, na tramitação da PEC sobre a Previdência Social, o Ministro Cezar Peluso decidiu que se tratava de interpretação à norma regimental, portanto, interna corporis, e não competia a interferência do Judiciário no Poder Legislativo. Da lavra do próprio Presidente, Ministro Nelson Jobim, a seguinte decisão, que passo a ler um trecho:

A orientação do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que a interpretação de normas regimentais é questão “interna corporis” e escapam ao controle do Judiciário.

Isso, fazendo referência ao Mandado de Segurança nº 20415, Pleno, do Relator Aldir Passarinho, de 19 de abril de 1985.

E cita outras decisões também do Pleno, como uma de 1984, cujo Relator era o Ministro Soares Muñoz, e uma decisão de 2003, do Ministro Velloso.

O Ministro-Presidente Nelson Jobim conclui, em matéria determinada à publicação, no dia 18 de agosto último, agora de 2005, em que S. Exª era Relator de uma reclamação procedente do Superior Tribunal de Justiça:

“Assim, concluo que a questão é “interna corporis” e que o Superior Tribunal de Justiça tem competência para suspender decisões judiciais que interferem no funcionamento do poder legislativo. Nego seguimento à reclamação.”

Há uma outra decisão do Ministro Cezar Peluso, em que S. Exª diz, em certo trecho:

Sói dizer-se, aí, que, incidindo normas regimentais de caráter só ordinatório, o conflito envolve questões interna corporis, que, sob pena de fratura grave ao princípio da separação, só podem encontrar resposta mesmo do Poder Legislativo, a salvo de cognição jurisdicional (...)

Uma outra decisão, também do Ministro Nelson Jobim, com solicitação de informações em 6 de junho de 2005:

“A natureza interna corporis da deliberação congressual - interpretação de normas do Regimento Interno do Congresso - desautoriza a via utilizada. Cuida-se de tema imune à análise judiciária. Precedentes do STF.

Na sua decisão, chega a dizer em seu despacho o Ministro: “Ao que tudo indica não foram observadas as disposições regimentais relativas ao devido processo legal”.

Não se trata, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de questão constitucional. Não se trata sequer de Regimento, mas de um ato, o Ato nº 17, de 2003, que é da Mesa da Câmara dos Deputados. Nem se trata de resolução que fala sobre o Regimento Interno. Portanto, disciplinando procedimento para esses casos e que institui o procedimento contraditório.

Considero, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma decisão gravíssima. A sociedade brasileira - e aí já não mais falo do ponto de vista jurídico, mas do ponto de vista político-social - não admite e não aceita esse tipo de decisão. É uma decisão contraditória; é uma decisão que poderá levar o julgamento dos seis Parlamentares indiciados a uma futura decisão no mérito do mandado de segurança.

Lembrem-se que a questão recentemente decidida pelo Supremo Tribunal Federal, relativa à decisão do Tribunal Superior Eleitoral, envolvendo os Vereadores suplentes deste País, passou aproximadamente um ano no Supremo Tribunal Federal - ação idêntica, mandado de segurança. Terminará o mandato dos Srs. Deputados impetrantes, se tivermos que analisar pelo foco da tramitação, da falta de agilidade nas ações no Supremo Tribunal Federal.

Entendo que a crise passa a ser institucional. O Poder Legislativo sofre uma interferência do Poder Judiciário. Esta Casa, a Mesa do Congresso Nacional, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, precisam tomar providências urgentes para que a desmoralização da classe política não venha a ser ampliada. É preciso chamar o feito à ordem. É preciso que o Congresso Nacional, que o Parlamento, dê um basta a esse tipo de decisão. Nós não podemos ficar omissos, calados, diante do que consideramos um grave erro, um grave equívoco.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na tarde de hoje vinha fazer um outro pronunciamento, como disse no início, sobre pesquisas eleitorais e deparei-me com a decisão do Presidente Ministro do Tribunal Federal.

Ao trafegar na Esplanada dos Ministérios no carro oficial que utilizo, dirigindo-me a esta Casa, eis que ao meu lado um senhor de idade esbravejava ao ver o carro oficial do Senado sem identificar o Senador, dirigindo ao Parlamento e ao Senado adjetivos que são impublicáveis e, de forma até impensada, porque repentina, eu solicitei ao motorista que se aproximasse do carro e baixei o vidro e respondi que eu tinha dignidade e que ele procurasse separar o joio do trigo. Foi aí, então, que ele identificou e pediu perdão e desculpas, sobretudo ao dizer: “Senador, perdoe-me, eu lhe conheço, ouvi o seu pronunciamento no dia de ontem. Você é de Sergipe assim como o Deputado Federal João Fontes”. Eu agradeci e segui em frente.

Se não tomarmos uma posição, Sr. Presidente, Senador e Deputado vão apanhar na rua. Senador e Deputado vão ser desmoralizados. Eu me orgulho do mandato de Senador que exerço! Eu me orgulho do político que sou! Eu não vou deixar de usar o carro preto. É o carro oficial que eu utilizo para o deslocamento oficial, para o exercício das minhas funções. Eu não deixarei em aeroporto ou em canto nenhum, embora já tivesse ouvido Parlamentar assim afirmar, deixar de usar o broche na lapela de Senador da República. Eu me respeito. Eu me dou ao respeito. Eu não admito esse tipo de agressão!

Sr. Presidente, não irei me esconder, não. Mas o tipo de decisão tomada na tarde de hoje pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Nelson Jobim, está levando a classe política ao desrespeito público. A exemplo das concessões de liminares para que corruptos confessos venham às Comissões Parlamentares de Inquérito - que têm procedimentos idênticos ao de juízes - com o direito de mentirem e de se calarem, de se omitirem. Isso é um absurdo! Sou Senador da República, porque tive a legitimidade do voto popular. Desejo preservar o meu mandato. Desejo preservar a honra desta instituição, que é o Senado da República. Se não fizesse, Sr. Presidente, o pronunciamento que faço na tarde de hoje, eu estaria desonrando a mim próprio, a classe política digna e este Parlamento.

Portanto, o que nós precisamos, aí sim, é tirar da vida pública os ladrões que estão a envergonhar todos nós. Essa é a medida que precisa ser tomada, é isso que defendo, é isso que eu faço.

Por essas razões, venho à tribuna do Senado Federal, mais uma vez, para dizer que esse não é o procedimento correto. O próprio Ministro refere-se a um ato que estabelece os procedimentos, que, possivelmente, não se equivalem nem à resolução, que é o Regimento Interno da Casa, quando a jurisprudência do próprio Supremo Tribunal Federal, ratificada por decisões da lavra do Ministro Nelson Jobim, diz de forma contrária.

Não podemos nos acovardar, Sr. Presidente, Srs. Senadores, diante de fatos dessa natureza. Alguém até pode dizer: ‘Senador, mas é uma decisão do Ministro, Presidente da mais alta Corte de Justiça do País, e V. Exª vai fazer um pronunciamento?” Sim; sou Senador da República, a Constituição me garante o direito de expressão. A imunidade parlamentar que estabelece a Constituição não é um privilégio do Senador, não, é assegurada ao Parlamentar como um privilégio da sociedade, que não tem o direito e a oportunidade do “jus esperniandi”, de contestar, de gritar, de reclamar. Daí a Constituição atribuir ao Parlamentar a imunidade, a inviolabilidade, pelas suas palavras, pelas suas decisões e pelos seus votos.

            O que eu não posso admitir é a omissão, é a covardia diante de uma crise como esta em que estamos vendo desmoronar os valores éticos e morais...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ALMEIDA LIMA (PMDB - SE) - (...) da vida pública brasileira.

Quero dizer a V. Exªs que saio desta tribuna feliz, tranqüilo, por entender que, assim fazendo, estou cumprindo a minha obrigação.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/09/2005 - Página 31002