Discurso durante a 168ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre matéria do jornal O Globo, mostrando estudo feito pela Fundação Getúlio Vargas, acerca dos gastos de uma família brasileira com a educação.

Autor
Cristovam Buarque (S/PARTIDO - Sem Partido/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • Comentários sobre matéria do jornal O Globo, mostrando estudo feito pela Fundação Getúlio Vargas, acerca dos gastos de uma família brasileira com a educação.
Publicação
Publicação no DSF de 29/09/2005 - Página 33376
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ESTUDO, AUTORIA, FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS (FGV), APRESENTAÇÃO, DADOS, INVESTIMENTO, FAMILIA, EDUCAÇÃO, FILHO.
  • CRITICA, INEFICACIA, ESTADO, ATENDIMENTO, NECESSIDADE, EDUCAÇÃO, POPULAÇÃO, PROVOCAÇÃO, INFERIORIDADE, QUALIDADE, ACESSO.
  • DEFESA, FEDERALIZAÇÃO, RESPONSABILIDADE, EDUCAÇÃO, BRASIL, COMENTARIO, IMPORTANCIA, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, EDUCAÇÃO BASICA.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Sem Partido - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado pelo tempo e, sobretudo, pelos elogios.

Sr. Presidente Mão Santa, o jornal O Globo de hoje, ou melhor o Globo online, traz uma matéria sobre estudo feito pela Fundação Getúlio Vargas, mostrando que uma família brasileira média gasta 3,6% do orçamento com educação. Isso mostra que os pais e as mães de família estão dando uma lição em nós, dirigentes nacionais. As famílias estão mostrando que, para elas, a educação é importante. As famílias estão mostrando que o pai que educa seu filho faz tudo o que é preciso, e o filho faz o que ele precisa fazer. Um pai de família que educa um filho resolveu o problema daquele filho, e aquele filho vai resolver os problemas dele.

Lamentavelmente, na hora de dirigir o Estado brasileiro, não fazemos o mesmo. O papel de um dirigente, assim como o papel de um pai de família, seria educar o seu povo, porque o povo educado faz o que falta fazer. Não estamos fazendo isso.

Mas o que é estranho é que essas famílias que gastam esse dinheiro - que chega, para surpresa mesmo daqueles que se dedicam à educação, ao valor de R$35 bilhões por ano -, nós todos, o Brasil inteiro, dirigentes e povo, não estamos percebendo como seria muito mais eficiente que, em vez de deixar que as famílias fossem obrigadas a gastar esse dinheiro, tivéssemos um programa nacional de educação que permitisse que a escola pública oferecesse esse serviço, de maneira eqüitativa, a todas as crianças brasileiras.

Ao jogar nas mãos das famílias a responsabilidade da educação de seus filhos, estamos, em primeiro lugar, criando uma desigualdade brutal. E a desigualdade, como esse estudo mostra, é grave, porque as famílias de classe média gastam proporcionalmente mais do que as famílias de classe pobre, que são famílias de classe média baixa também.

Se gastássemos, em vez desses R$35 bilhões que as famílias gastam, R$7 bilhões agora, chegando a R$20 bilhões de recursos federais, poderíamos dar um salto de qualidade na educação brasileira e, mais do que isso, dar um choque de igualdade na educação brasileira, acabando com o drama dessas famílias. Se o pai da família morre - ou se morre a mãe, no caso de ela ser a que tem a renda maior -, essas crianças ficam sem escola.

Não há saída para o Brasil, enquanto as famílias brasileiras forem obrigadas a gastar esses recursos todos na educação dos seus filhos e enquanto o Estado brasileiro não assegurar, independentemente do nível de renda familiar, a escola de qualidade para todos. Mas isso é tão óbvio, as famílias sabem tão bem, então, por que nós, dirigentes, não sabemos? E digo não apenas nós, do Governo, e não apenas essa geração. Ao longo de todo o tempo, o Brasil jamais estabeleceu a educação como prioridade e, com isso, planejou reservar os recursos necessários.

E não é muito o que é necessário. Mas não basta recurso, é preciso que os professores entendam que o papel deles é educar; é preciso que, ao lado dos governantes, as famílias entendam que não basta pagar a escola para o seu filho ser educado, mas que é preciso acompanhar o andamento da educação dos seus filhos. É preciso que a mídia entenda que, no mundo de hoje, não basta que as crianças fiquem por quatro ou mesmo seis horas na sala de aula se depois a mídia as deseduca por duas, três, cinco, dez horas.

Por que não descobrimos, como os pais de família já perceberam, e esse estudo mostra, que vale a pena o esforço nacional para nacionalizar a educação?!

V. Exª, Sr. Presidente, foi Prefeito e Governador e sabe que, nos ombros do Prefeito e do Governador, não dá para fazer uma educação de qualidade para as crianças daquele cidade, daquele Estado, sem falar que há uma desigualdade imensa de uma cidade para outra.

Como podemos deixar a educação para o Município?! Por que, para ser funcionário do Banco do Brasil e manejar o dinheiro, o cidadão precisa passar em concurso público federal e, para ser professor e cuidar das crianças, basta passar em concurso municipal? Por que municipalizamos as crianças e federalizamos a universidade? No mínimo, a responsabilidade e o cuidado deviam ser iguais.

Quero insistir que, quando aqui chegar o Fundeb, que transforma o Ministério da Educação em um banco, porque...

(Interrupção do som.)

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Concedo mais dois minutos a V. Exª.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Sem Partido - DF) - Dois minutos bastarão, Sr. Presidente.

Esse Fundo transforma o Ministério em um banco, e o Ministério deve ter a responsabilidade de intervir, de estar presente, de fiscalizar. O Fundo apenas transfere dinheiro. Quando chegar aqui o Fundeb, creio que esta Casa deverá se debruçar sobre o assunto e analisar com cuidado não apenas como jogar mais dinheiro na educação, mas como intervir na educação, não apenas no sentido de alocar R$1 bilhão.

Vi, há pouco, que o aumento de salário para uma categoria de profissionais do setor público vai custar R$4,5 bilhões, e não conseguimos os R$7 bilhões necessários para dar um salto de qualidade no ensino, por meio da nacionalização da educação básica no Brasil; nacionalização mantendo a descentralização gerencial, nacionalização mantendo a liberdade pedagógica, para que possamos dizer: criança, quando nascer no Brasil, é, primeiramente, brasileira. Depois é que ela é pernambucana ou piauiense.

Esse é um desafio em relação ao qual esta Casa não pode ficar alheia.

Sr. Presidente, quando chegar aqui o Fundeb, teremos a chance de dar um salto, nacionalizando a educação básica no Brasil, criando e trazendo para nós, no plano federal, a responsabilidade pela educação das nossas crianças.

As famílias estão dando o exemplo. Está na hora de os dirigentes também darem o exemplo que é preciso, tratando a criança como um patrimônio fundamental de uma Nação, tal qual o filho é patrimônio fundamental da família.

Era isso o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Agradeço-lhe a sua paciência e tolerância por ainda estarmos aqui, em sessão, a esta hora da noite.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/09/2005 - Página 33376