Discurso durante a 209ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações a respeito do processo de cassação do Deputado José Dirceu. Defesa da obstrução da votação do Orçamento. (como Líder)

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO.:
  • Considerações a respeito do processo de cassação do Deputado José Dirceu. Defesa da obstrução da votação do Orçamento. (como Líder)
Aparteantes
Antero Paes de Barros, Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 26/11/2005 - Página 41282
Assunto
Outros > LEGISLATIVO.
Indexação
  • REGISTRO, DECISÃO, BANCADA, SENADO, OPOSIÇÃO, GOVERNO FEDERAL, OBSTRUÇÃO PARLAMENTAR, VOTAÇÃO, ORÇAMENTO, PERIODO, PROCESSO, CASSAÇÃO, JOSE DIRCEU, DEPUTADO FEDERAL.
  • DEFESA, IMPORTANCIA, CASSAÇÃO, DEPUTADO FEDERAL, DEMONSTRAÇÃO, EFICACIA, PUNIÇÃO, CONGRESSISTA, VINCULAÇÃO, CORRUPÇÃO, GOVERNO FEDERAL.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Como Líder. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ontem, as oposições anunciaram, no Senado, a firme disposição de bloquear a votação do Orçamento até que se decida sobre o rumoroso e vagaroso caso José Dirceu. Aí, Senador Antero Paes de Barros, diziam alguns,: “Isso é intromissão no Supremo”. Não. Nem acho que o Supremo esteja se intrometendo no Senado porque, se amanhã tivéssemos de julgar, por crime de responsabilidade, um Ministro do Supremo, nós o faríamos aqui. Não acho que haja intromissão no Supremo, que vai decidir como quiser. Então, não há pressão. São cinco votos honrados de um lado e cinco votos honrados de outro, e está vindo o sexto voto honrado do grande Ministro Sepúlveda Pertence. Nem é, muito menos, Senador Edison Lobão, intromissão em assuntos da Câmara, porque aquela Casa vai decidir se e quando quiser. É, isto sim, o Senado, que é parte integrante do Congresso Nacional, opinando sobre a melhor forma de se trabalhar a principal peça do Congresso Nacional, que é o Orçamento. Temos o que dizer sobre o Orçamento, sim. O orçamento é uma decisão bicameral, as duas Câmaras reunidas. Entendemos que o Orçamento não deve ser votado, simbolicamente, assinado, portanto, por alguém sob suspeição.

Se a Câmara quiser decidir pela absolvição do Deputado José Dirceu, que decida. S. Exª é tão legítimo quanto qualquer outro Senador ou Deputado que não esteja sob suspeição e assina o Orçamento. Se a Câmara quiser condená-lo, S. Exª não estará presente, e se vota o Orçamento. Agora, nesse limbo, não concordamos.

Senador Cristovam Buarque, vamos deixar bem claro o que entendemos que está por trás disso tudo. Questão até de justiça. O Presidente Lula, que às vezes tem beirado o cinismo - diz coisas que chegam bem perto mesmo do cinismo -, diz que o “mensalão” virou refrão de carnaval. Não virou. Virou refrão de corrupção, virou sinônimo e rima com corrupção, isto sim, e no Governo dele, isto sim também. O Presidente Lula diz que Roberto Jefferson* foi cassado porque não provou o “mensalão”. Não. Ele foi cassado porque confessou a participação dele em esquemas espúrios, isto sim, e não porque não se tivesse provado o “mensalão”, até porque o Presidente Lula não vai querer prova mais óbvia de “mensalão” do que o Visanet*, se quiser a prova documental. E se quiser, pelo lado do ridículo, eu diria que tem até a cueca para mostrar que houve “mensalão” neste País.

O Sr. Roberto Jefferson foi cassado, e o Sr. José Dirceu* não vai ser julgado? Não consigo entender isso. Não consigo perceber. Mais ainda: se o Sr. José Dirceu é apontado como suposto corruptor, os supostos corrompidos vão ser cassados como? Como é que se vai ter moral para pedir a cassação de qualquer outro nome se não se julga, se não se delibera sobre o Sr. José Dirceu? Não vai dar.

Estou vendo algo grave. O Senador Sérgio Guerra ontem foi no ponto. O que é grave? O Deputado José Dirceu não sendo julgado ou não sendo cassado, abre-se espaço para todos os acusados nesse episódio do “mensalão” serem, eles também, absolvidos. Não tem sequer sentido eles serem julgados se se opta por dizer que não houve o “mensalão”, que o Sr. José Dirceu não praticou a chefia do “mensalão” e que, portanto, nada aconteceu, é tudo imaginação da imprensa, é tudo intriga da Oposição. Para usar uma linguagem do jargão parlamentar e do entendimento popular, vamos nós fazer uma pizza, que vai começar aqui, enorme, vai passar pelo Palácio do Planalto, vai tomar conta de toda a Praça dos Três Poderes. Uma pizza gigante, em que dá para colocar todos os sabores, uns 40 sabores, cada fatia com um quilômetro. Será essa a grande pizza.

O fato é: por que uma pessoa que não desfruta da simpatia da Câmara tem supostamente mais votos a defendê-lo - segundo pesquisa do O Estado de S. Paulo - do que o Sr. Roberto Jefferson, que, pelo que eu conhecia da Câmara, desfrutava de mais simpatia do que ele? É que aqueles “mensaleiros” e os que são aliados dos “mensaleiros” descobriram, intuíram e concluíram que se o Sr. José Dirceu não for punido, nenhum deles o será também. Então, está havendo uma aliança pela impunidade. E essa aliança pela impunidade tem que ser denunciada desta tribuna e tem que ser transmitida à Nação para que comece uma pressão sem precedentes e se faça o julgamento implacável de todos aqueles contra os quais possa haver provas de participação em ilícitos.

O Sr. Antero Paes de Barros (PSDB - MT) - V. Exª me permite um aparte, Senador Arthur Virgílio?

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Pois não, Senador Antero Paes de Barros.

O Sr. Antero Paes de Barros (PSDB - MT) - Inicialmente, cumprimento V. Exª pela oportunidade do tema, até para dizer que, não sendo cassado José Dirceu - que é uma deliberação autônoma e independente da Câmara dos Deputados, que pode não cassar -, aquela Casa poderia fazer um gesto maior: trazer Severino Cavalcanti e Roberto Jefferson de volta. Porque um foi cassado por R$7,5 mil; o outro denunciou o esquema do mensalão, e é uma denúncia que vinha das vísceras do PT, vinha do estômago do PT. Ali há pessoas que receberam R$50 mil, que é bem maior que os R$7,5 mil de Severino Cavalcanti. Há quem tenha recebido R$20 mil, dizem que é muito pouco, mas é bem maior do que o que recebeu Severino. Então, essas questões devem ser analisadas com autonomia e independência pela Câmara dos Deputados, embora eu ache que nós todos, das duas Casas do Congresso Nacional, devamos extrair uma lição desse episódio, fazendo os outros processos de outra forma, a fim de que sejam menos contestados pelo Poder Judiciário. Motivos para obstruir a votação do Orçamento não faltam nesta Casa, a começar pelos privilégios a Prefeituras do PT e a Parlamentares do mensalão, porque somente esses têm liberação de recursos. Não seria preciso nem esse episódio do José Dirceu. Motivos para obstrução da votação do Orçamento existem aos borbotões, e acredito que estamos com tanto desapego ao Poder Legislativo que deveríamos estabelecer uma outra condição, além das colocadas por V. Exª. Por que não dizer que somente votaremos o Orçamento depois de apreciado o projeto do Senador Antonio Carlos Magalhães? Projeto esse que obriga serem aplicadas as contribuições dadas pelo Poder Legislativo - que são uma pequena parte do Orçamento -, fazendo com que o Orçamento não seja apenas uma peça de ficção. Penso que isso faria com que o Governo, qualquer que fosse, tivesse um comportamento republicano na aplicação dos recursos públicos brasileiros.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - V. Exª tem razão. Ontem, um funcionário do Senado me perguntou, com o espelho das minhas propostas para o Orçamento, se eu preferia jogar não sei quanto de minha dotação para o Calha Norte ou para a Educação. Eu disse: “Faça como você quiser, porque estou com pressa e o Governo não vai liberar minhas emendas mesmo. Então, que diferença que faz colocar no Calha Norte ou na Educação?” E é um critério muito claro, ou seja, punir os eleitores do Líder de um Partido de Oposição no País. É um critério de um Governo sem critério.

Senador Cristovam Buarque, por favor.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senador Arthur Virgílio, não vou entrar nos detalhes do caso do Deputado José Dirceu - quando eu era do Governo, já briguei demais com ele para continuar brigando agora que ele está nessa situação. V. Exª traz um problema sobre o qual precisamos nos debruçar. Há um choque entre as forças que compõem as instituições da República Democrática Brasileira. As relações nossas com o Poder Executivo estão feridas pela forma como as medidas provisórias nos são empurradas goela abaixo, e as relações com o Supremo estão ameaçadas pela forma como aquela instituição intervém aqui dentro. Não estamos interferindo no Supremo nem no Poder Executivo, mas não há uma harmonia hoje. O Senador Edison Lobão foi Relator de um caso na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania - é até bom que S. Exª esteja aqui. No caso, por exemplo, do Senador Capiberibe, há um peso; no caso de outros, há outro peso. Por quê? Qual é a lógica? Como é que o Supremo decide para dar tranqüilidade à opinião pública de acreditar que, de fato, é a justiça que está sendo feita? E segundo: o que é que esta legislatura vai passar para a História diante dessa submissão em que estamos aos outros dois Poderes? Que imagem ficará de nós, Senadores deste tempo, quando disserem tudo o que engolimos, no máximo com direito a esperneio, como o Senador Arthur Virgílio, que é um dos que mais faz, bem como o Senador Antero Paes de Barros. Então, quero ver esta Casa se debruçar sobre um problema mais sério do que o caso José Dirceu, embora este seja o mais importante hoje, que é o problema das relações institucionais entre os três Poderes no Brasil.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Obrigado, Senador Cristovam Buarque. V. Exª se porta com muita elegância em relação ao ex-Ministro José Dirceu, e isso é uma marca que o faz apreciado por todos os seus colegas. 

Mas a grande verdade é esta: a Oposição tomou uma decisão, nós temos motivo de sobra mesmo para fazermos obstrução à aprovação da peça orçamentária. Este me parece extremamente consistente. Nós queremos dar satisfações à Nação. Se não é importante dar satisfação à Nação no campo ético, eu não sei o que é mais importante neste País.

Quanto ao resto, claro que o Governo faz um certo jogo de cena; finge que está preocupado com o Sr. José Dirceu. Se estivesse preocupado e se o considerasse inocente, poderia nomeá-lo Chefe da Casa Civil de novo ou poderia nomeá-lo Líder do Governo na Câmara. Como não pode nomeá-lo, o Governo, de certa forma, o condena e acaba vendo o Sr. José Dirceu como uma espécie de trambolho, um problema de que o Governo estaria louco para ver a Câmara se desincumbir, se desobrigar, para que o Governo se desobrigasse sem ter de se desgastar com o Sr. José Dirceu.

Mas o fato é que duvido, se alguma abelhinha estiver lá rondando a cabeça do Presidente Lula, que o Presidente Lula não esteja achando incômoda a presença do Sr. José Dirceu no Congresso. Vai dizer que não, vai morrer dizendo que não e pronto. Mas eu tenho a convicção de que é um trambolho, sim, mas a convicção de que a Câmara é soberana para absolvê-lo ou condená-lo. Absolvido, ele assina o Orçamento conosco; condenado, a Câmara está livre desse problema e o Congresso também. Agora, na dúvida e no limbo, optamos por obstruir a peça orçamentária e por não permitir que avance a votação do Orçamento com pessoa desse porte sob suspeição.

E digo mais: se não há culpa do Sr. José Dirceu, o Governo não o coloca na Casa Civil de novo porque não quer. Agora, se não há culpa do Sr. José Dirceu, então não há de ninguém mais na Câmara. Então, não houve. É tudo invenção da Oposição, é tudo intriga da imprensa. Então, não houve, e nós podemos nos preparar para assar essa pizza fantástica que será uma pizza de quilômetros com todos os sabores. Ela começa aqui, vai atravessar os dois eixos - Eixo Norte e Eixo Sul de Brasília. Será um tapete de pizza de todos os sabores, porque não é isso que a Nação brasileira está querendo. É fundamental que todos os Poderes atentem para as expectativas da Nação, que quer explicações claras e rumos conseqüentes em relação a essa questão ética. E, portanto, que os Poderes falem, sabendo que a Nação irá julgá-los logo a seguir.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

Era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/11/2005 - Página 41282