Discurso durante a 11ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem ao Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira, pela passagem dos 50 anos de sua posse como Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem ao Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira, pela passagem dos 50 anos de sua posse como Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 01/02/2006 - Página 2546
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, JUSCELINO KUBITSCHEK, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, ELOGIO, VIDA PUBLICA.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Presidente Maurício Corrêa, Dom José Freire Falcão, Governador Joaquim Roriz, Governador Marconi Perillo, Srª Anna Christina Kubitschek, Desembargador José Gerônimo de Sousa*, senhoras e senhores, vejo que Juscelino já começa a operar alguns milagres há tão pouco tempo da sua morte: é uma das raras vezes em que subo a esta tribuna sem ser para rebater declarações do Senador Aloizio Mercadante.

O fato é que esta sessão é rica, refletindo a riqueza da grande figura humana que era Juscelino Kubitschek. O Senador Antonio Carlos fez, talvez, o mais feliz pronunciamento, dentre os tantos pronunciamentos felizes de sua lavra que eu tenha ouvido. Elaborou raciocínio tão singular, tão original, aquele de que Brasília é fruto da tenacidade de um, de Juscelino, e da casca de banana do Congresso, por outro lado. Ou seja, “ele não vai construir”, “ele não será capaz”. Portanto, “vamos aprovar porque ele se desmoraliza e chegamos a intentos políticos que desejamos”.

Isso me desperta a nítida impressão de que devo olhar, Senador Paulo Octávio, para Juscelino levando em conta a perspectiva histórica do seu momento.

Tenho acompanhado esta minissérie. Em algum momento ele diz para sua esposa, Dona Sarah, “vamos para os Estados Unidos”, algo corriqueiro nos dias de hoje. À época parecia ao contemporâneo de Juscelino atitude de um pioneiro, de um desbravador. Algumas pessoas dizem: “o que faz esse tal Coronel Licurgo na minissérie?”

Não tem nenhuma ligação com Juscelino, uma ligação mínima, mas, sem dúvida, talvez, a tentativa muito inteligente de contextualizar o momento histórico em que se encaixava Juscelino, comparando-o com a figura aberta que ele era. Ou seja, naquele mundo conservador de então, cabia o brutamonte, o troglodita, que era o Coronel Licurgo, e cabia um homem com a visão do futuro, capaz de compreender o drama da mãe solteira, capaz de ser solidário, aberto na sua relação pessoal, aberto na sua relação com os companheiros, leal e, ao mesmo tempo, inteligente o tempo inteiro.

Ou seja, a partir do discurso do Senador Antonio Carlos Magalhães, eu me pus a pensar sobre o que não aconteceria de bom se, nos tempos de hoje, Juscelino Kubitschek pudesse nos governar, com todas as facilidades de acesso ao conhecimento, com a facilidade de comunicação que faria sua voz ecoar de Brasil a Brasil em poucos minutos a cada momento que ele quisesse. O Juscelino, que foi exemplo de convicção democrática numa época em que o Brasil ainda vivia ameaçado pelos pronunciamentos militares; o Juscelino, que tinha sua clara definição por um país constitucional e que foi capaz de perdoar os golpistas de Jacareacangas e Aragarças; o Juscelino, que foi firme e inflexível ao defender o seu Governo e, certa ou erradamente, ao processar essa outra grande figura - não cabe aqui o ódio, os ódios ficaram para trás e até a Frente Ampla os sepultou - de parlamentar, de administrador, de homem público que foi Carlos Lacerda.

Quando aqui passamos em revista um Governo que tomou posse há 50 anos, que, como disse muito bem o Senador Paulo Octávio, construiu Brasília em 42 meses, que cumpriu suas metas uma por uma, que teve seus equívocos de política econômica - e quem não os comete? -, que teve seus erros de política administrativa - e quem não os faz? -, mas que tem, no conjunto da obra, um saldo enorme, que começa no democrata e termina no grande realizador. Mais ainda, passou para o País a clara noção de que era possível se realizar, era possível se desbravar, era possível unificar este País e era possível se consolidar a idéia de que a vocação do Brasil, ainda que depois viesse a pairar sobre nós a sombra negra de uma ditadura, era a democracia. (Palmas.)

A propósito disso, Sr. Presidente, lembro um episódio extremamente rico que ocorreu na comemoração dos dez anos de Brasília em sessão deste Senado, a mesma Casa que, depois, presenciaria o discurso histórico de Juscelino defendendo o seu mandato e, aliás, despedindo-se da vida pública, cassado que havia sido pelo arbítrio de um ato de força: o Ato Institucional nº 1. No décimo aniversário, aconteceram aqui dois discursos significativos. O Líder da Arena consegue fazer um discurso bem elaborado, desses em que a assessoria se esmera e que ele lê, suponho eu sem ter tropeçado. Discurso bonito na forma, em que conseguiu não citar uma só vez o nome de Juscelino Kubitschek, comemorando o aniversário de Brasília. Depois, a esse se segue um discurso lacônico do Líder do MDB, Nelson Carneiro. Em três ou quatro linhas, ele diz mais ou menos o seguinte: “Homenagear Brasília sem citar JK é como falar nas tábuas e não mencionar o nome de Moisés”. E se calou, deixando calado atrás de si o Plenário inteiro do Senado. Era uma época obscura.

Eu queria me referir à solidão de Juscelino, porque, nos seus momentos brilhantes, vemos o homem público muito assediado. Sou filho de político, já sou até pai de político, por isso não me encanto muito com essas luzes dos momentos melhores, não me encanto muito com essas luzes. Mas percebo que não há nenhum autor da cena pública que não conheça os seus momentos de mais assédios, de mais prestigiamentos ou os seus momentos de maior solidão.

Juscelino, o Presidente por todos cantado e decantado em verso e prosa, conheceu momentos de absoluta convivência com ele próprio. Eu era menino, meu pai vai numa delegação de Senadores a Paris. Havia Senadores de todos os partidos. Alguns beijavam diariamente a mão de Juscelino Kubitschek. E havia um deles que não tinha relação pessoal e nem política com Juscelino, que era o Senador Josaphat Marinho. Meu pai disse: “Olha, marquei um encontro com o Presidente Juscelino. Eu gostaria muito de ir até lá. Vocês estão dispostos a ir comigo?” Foi um silêncio enorme, nenhum foi, a não ser Josaphat Marinho, que não tinha a menor ligação pessoal e política com Juscelino.

Essa solidão lhe doía, porque lhe doía o exílio. Essa solidão não o fez menor porque o fez esquecer as divergências com Lacerda quando celebraram o Pacto da Frente Ampla para enfrentarem o regime de força. Incluiu João Goulart, que era outro coração generoso. A solidão não o fez mesquinho porque a vida inteira ele se apegou ao que o seu espírito pedia: a boa conversa com os amigos, a boa música, a boa dança, a figura da gratidão, aquele que escreve o bilhete de saudades, aquele que, como homem, tinha os seus sonhos e, como homem, ao mesmo tempo, sabia limitar-se ao que era a contingência de um tempo que estava acima dele. Juscelino Kubitschek de Oliveira é um personagem que a nossa história repassa, mas que faz parte daquilo que de melhor possamos ter escrito para trás.

Foi muito feliz a idéia do Senador Paulo Octavio de propor esta homenagem. (Palmas.) Nunca é tarde para aprendermos a reverenciar os nossos maiores e até fazemos como os nossos índios e os orientais sabem fazer muito bem: valorizar muito a sabedoria dos que viveram, valorizar sobremaneira a sabedoria dos que fizeram, dos que construíram, aprender muito com os erros dos que erraram, aprender mais ainda com os acertos dos que acertaram e sobretudo registrar as lições de quem fazia da sua força de vontade uma inquebrantável manivela para abrir as portas do futuro. Juscelino Kubitschek sabia abrir as portas do futuro. Sua ascensão foi rápida para alguns; foi sólida para outros. Sua ascensão se deu em cima do que de melhor ele poderia passar primeiro para o povo de Belo Horizonte, depois para o povo das Minas Gerais, depois para o povo brasileiro.

Volto a dizer, Senador Antonio Carlos, como teria sido bom ser governado por Juscelino agora, neste momento de tão radiosa conjuntura internacional, neste momento de tecnologia avançada, neste momento em que ele não teria que dizer mais para a D.Sarah : “Vamos para os Estados Unidos”; neste momento que o mundo estaria nas mãos dele, ao seu alcance, para promover todas as grandes mudanças que este País sugere, as grandes mudanças de que este País necessita, as grandes mudanças que este País requer, que o povo deste País exige, líder de massas sem ser a figura do demagogo, líder de massas e pelo lado positivo. Há o líder de massas que pode dizer muito bem: “Uso o meu dom de ser o líder de massas para rebaixar a compreensão das pessoas que eu lidero. Outros dizem: “Sou um líder de massas e uso a compreensão que o povo tem das minhas palavras para ele se elevar ao lado da minha capacidade de me elevar junto com ele.”

Vi em Juscelino, Senador José Agripino, um líder positivo. Eu vi em Juscelino um líder capaz de ser duro, corajoso pessoalmente, corajoso historicamente, corajoso politicamente, mas, sobretudo, alguém que, em todos os momentos da sua vida pública marcou de maneira muito forte a sua presença, marcou a sua presença quando acertou, marcou sua presença quando errou. E considero que foi um equívoco, por exemplo, ele não ter entendido que seu mandato findaria com o alvorecer do regime de força de 1964; marcou sua presença, quando acertou, perdoando Carlos Lacerda; e marcou sua presença para todo o sempre nessa história que não paramos de reescrever, porque cada um de nós hoje percebe que o Brasil, dos mais novos aos mais velhos, o Brasil inteiro faz o que uma geração já sentia, que é se apaixonar outra vez, Senador Paulo Octávio, por Juscelino Kubitschek de Oliveira.

Muito obrigado. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/02/2006 - Página 2546