Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Retrocessos do Programa Bolsa-Família.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Retrocessos do Programa Bolsa-Família.
Aparteantes
Arthur Virgílio.
Publicação
Publicação no DSF de 03/03/2006 - Página 6689
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMPARAÇÃO, PROGRAMA, BOLSA FAMILIA, RENDA MINIMA, VINCULAÇÃO, EDUCAÇÃO, AUMENTO, ASSISTENCIA SOCIAL, FAVORECIMENTO, REELEIÇÃO, PERDA, RETIRADA, PRIORIDADE, ESCOLA PUBLICA, AUSENCIA, EMANCIPAÇÃO.
  • IMPORTANCIA, PROGRAMA, RENDA MINIMA, AMBITO, POLITICA, VALORIZAÇÃO, EDUCAÇÃO.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente - ou Srª Presidenta, depende de como usamos: de forma politicamente correta ou de forma correta de acordo com o dicionário.

Srª Presidenta, Srªs e Srs. Senadores, há pouco, assisti a um debate entre os Senadores Eduardo Suplicy e Arthur Virgílio sobre se houve ou não evolução no Bolsa-Escola. Penso que a palavra correta, o verbo correto é dizer que houve aumento, comparando-se o Bolsa-Escola com o Bolsa-Família. Aumento. Do ponto de vista do conceito, houve um retrocesso, houve uma involução. E essa involução está clara por alguns gestos do Governo Lula. Houve, sim, um redirecionamento rumo a um programa com impacto eleitoral que o Bolsa-Escola não tinha. E vou dizer por quê.

A involução começa com o nome. Por mais nobre que seja a família, do ponto de vista do futuro, há uma diferença entre o programa Bolsa-Escola e o Bolsa-Família. A escola é emancipadora; a família é protetora. Quando estamos em dificuldades, a proteção é importante, é fundamental, e não digo que o Bolsa-Família seja uma coisa ruim para quem precisa daqueles R$80,00, mas ele não emancipa. A emancipação vem da escola. Essa foi a primeira involução; esse foi o primeiro retrocesso.

O segundo ocorreu quando a administração saiu do Ministério da Educação para o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, que é uma expressão que não diz a verdade. É o movimento da assistência social - e tenho o mais profundo respeito por ela. No entanto, assistência social é uma coisa; emancipação é outra.

Havia muitos programas de assistência social aos escravos. Havia grupos organizados que protegiam os escravos contra violências, que tentavam lutar para que os filhos não fossem vendidos separadamente das mães, mas que não lutavam pela abolição. É no radicalismo da abolição que está a verdadeira expressão da emancipação.

Obviamente, o terceiro retrocesso - e o Senador Arthur Virgílio tocou nisso sem explicitar - ocorreu quando o Governo misturou programas diferentes.

O Governo Fernando Henrique criou um programa chamado Bolsa-Escola, com finalidade educacional, e outros programas assistenciais para garantir alimentos, renda e remédios. Quando se misturou tudo isso, ficou impossível levar-se a sério a exigência da freqüência escolar. Está na lei que, para se receberem os benefícios do Bolsa-Família, todos os filhos devem estar na escola. Contudo, como separar uma família que tem criança de uma que não tem, exigindo de uma a freqüência e de outra não? Misturou-se e, ao se fazê-lo, perdeu-se a nitidez. Ao se perder a nitidez, não se trata mais de um programa de fato educacional.

Tenho acompanhado isso. Hoje há até um número maior de escolas informando a freqüência do que antes, quando o processo estava em implantação; mas não há o corte da bolsa nem haverá, porque o objetivo deixou de ser educacional. Ao se transformar num programa desse tipo, ele passou a ser eleitoral, para não dizer eleitoreiro. Não vou dizer que escolhem famílias de amigos do Governo. Não vou dizer isso. Não tenho nenhuma informação de que haja fisiologismo na escolha das famílias. Todavia, se elas não são cobradas, sentem-se como se estivesse recebendo um favor. Aí, aproximam-se de quem faz o favor. É o velho paternalismo.

Eu era Governador do Distrito Federal quando implantamos o Bolsa-Escola, pagando um salário mínimo. E digo com tranqüilidade, não com alegria: eu não tive tantos votos entre muitas das famílias que recebiam o Bolsa-Escola. Sei disso. Por quê? Porque eu ia lá onde estavam as mães e dizia-lhes: “Vocês não me devem nada! Vocês estão recebendo porque os seus filhos estão na escola. Se eles faltarem mais de dois dias, cortaremos a bolsa”. E cortávamos, às vezes com dor no coração.

Nunca me esqueço de um homem, na cidade do Guará, que me procurou para dizer que não estava recebendo a bolsa. E eu disse: “Mas, então, o seu filho não vai à aula”. E ele disse: “O meu filho vai à aula”. E eu disse: “Mas só tem um?” Ele disse: “Não; eu tenho dois, mas o outro sumiu, fugiu”. E eu tive de lhe dizer: “Nós vamos dar todo o apoio, primeiro, para encontrar o seu filho; depois, todo o apoio à sua família; mas enquanto o seu filho não aparecer e não for à escola, a Bolsa-Escola você não vai receber. Vai receber outro programa assistencial, mas não a Bolsa-Escola.”. Disse-lhe isso com dor no coração, mas tive de fazê-lo - e isso todos os dias.

Senador Arthur Virgílio, na verdade, o Senador Eduardo Suplicy, que lamento não esteja aqui, não errou, mas usou o verbo “evoluir” de maneira equivocada. Deveria ter usado o verbo “aumentar”: aumentou no valor e no número, mas evolução não houve. Dá para se dizer que houve, do ponto de vista assistencial, um aumento considerável no número de famílias; mas, do ponto de vista conceitual, houve uma involução, pelas três razões que citei: o próprio nome tem um simbolismo grande, a palavra “escola”; o fato de o gerenciamento ter saído do Ministério da Educação; e, também, o fato de que a cobrança deixou de ser possível ou fácil diante da mistura de programas necessários de assistência com programas necessários de emancipação por meio da educação.

Pouca gente sabe, mas a idéia do Bolsa-Escola surgiu de algo que a elite brasileira sempre teve e nunca reclamou. Aqui, pagam-se bolsas de estudo para que aqueles que já se formaram continuem estudando, porque o Brasil precisa de pessoas que, ao serem engenheiros, não sigam para a carreira, seduzidos pelo salário que o mercado paga. É preciso que virem doutores em Engenharia. Então, pagamos 450 milhões - valores do ano passado - a 35 mil jovens - não sei se todos tão jovens - já formados e que queriam continuar estudando, coisa que o Brasil precisa. E creio que 450 milhões e 35 mil ainda sejam pouco.

A partir daí, pensou-se: “Mas se pagamos para quem já se formou continuar estudando em vez de ir para o mercado, por que não pagamos para tirar do mercado crianças que estão trabalhando, para que venham para a escola?” Essa foi a lógica, que pouca gente sabe de onde surgiu: a de não deixar criança ir para o mercado. Ela evoluiu no sentido de se dizer: “Não vamos dar apenas para quem está trabalhando, mas para todas essas crianças que estão na fronteira da evasão escolar” - e aumentou-se o número.

No livro em que exponho a idéia do Bolsa-Escola pela primeira vez e em que faço referência ao Suplicy, por conta de sua proposta de renda mínima - e isso é de 90 -, sugiro que deveríamos pagar o benefício para todas as famílias com crianças na escola pública, para não se separarem as pobres das ricas, uma vez que, se estão na escola pública, provavelmente não são ricas. Além disso, o custo da seleção, às vezes, é maior do que o do pagamento a todas elas.

Eu propunha para todas, Senador Virgílio. Fiz as contas e mostrei que não era tanto, eram 2,4 bilhões, naquela época, quando meio salário mínimo representava R$50,00. Hoje, o salário mínimo, felizmente, aumentou um pouco.

De fato, houve uma involução, com um aumento no número de famílias. Quanto ao valor, foi muito ligeiro o seu aumento, se somarmos o Bolsa-Escola com o Vale-Alimentação, com o Bolsa-Alimentação e com todos esses programas. Não foi tanto, mas houve aumento, e temos que respeitar que cresceu o número. Claro que isso é positivo, mas não é suficiente.

Do ponto de vista da emancipação, houve um retrocesso; do ponto de vista da assistência, houve um aumento. Eu não podia deixar de falar isso porque ouvi esse debate.

Concedo o aparte ao Senador Arthur Virgílio, lamentando que o Senador Suplicy não esteja aqui para ouvi-lo.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - O Senador Suplicy me disse que viajaria. Ele, certamente, teria apreciado muito participar desse debate. Antes de tudo, Senador Cristovam, devo lembrar que V. Exª trouxe essa idéia para o Brasil e que havia uma discussão sobre a questão cronológica: V. Exª implantou com êxito aqui, José Roberto Magalhães Teixeira implantou com êxito lá em Campinas. Lembro-me de V. Exª ter teorizado mais, mas os tucanos vão morrer dizendo que... É aquela história dos irmãos Wright e de Santos Dumont. O fato é que V. Exª tem méritos enormes por ter buscado, a meu ver, com a filosofia, com a conceituação correta, implantar o Bolsa-Escola no País. V. Exª foi muito feliz. Na medida em que o Governo aumenta e involui, ele visa ao eleitoralismo, como diz Dom Geraldo Majella; ele visa aos votos. Ele não está com o foco na criança, na emancipação pela via da revolução da educação, mas em aumentar o percentual do Presidente Lula nas pesquisas que estão saindo a cada momento. Infelizmente, é isso. Havia o projeto Sentinela para isso, o projeto de erradicação do trabalho infantil para aquilo outro, havia um terceiro, um quarto e um quinto. Ele juntou tudo, e o foco se esfarelou. O foco deveria ser a escola e, mais ainda, com porta de entrada, evidentemente, e com porta de saída, porque senão, ao longo do tempo, não há orçamento que agüente. Segundo, se não há a perspectiva da emancipação, a impressão que se tem é de que o Governo quer manter pessoas como esmoleres pela vida inteira, negando-lhes a cidadania básica, a de poderem viver às custas do seu trabalho. Então, deve existir porta de saída. Sai a família do Sr. João e da Dona Maria, e entra a família do Sr. Pedro e da Dona Francisca; mas não dá para ter o Sr. João, a Dona Maria, o Sr. Antônio, o Cristovam, o Arthur, todo mundo. Não dá, porque o orçamento não resiste.

Tem ainda um outro dado que julgo - V. Exª falou muito bem da mistura de Programa - bem exemplificador de como o Governo encara essa questão. Ele está, nas suas estatísticas, falando do Pronaf - Programa de Agricultura Familiar. No entanto, as denúncias que me chegam do Nordeste são que bilhões de reais estão sendo “torrados”: até R$1.000,00 por família, quase que um compromisso eleitoral, quase que uma compra de votos. Ou seja: “Toma R$1.000,00”, sem vinculação a nada estratégico. Mil reais por família. Dizem que isso aí tem, de certa forma, influenciado até em resultados de pesquisa. Esse fato deveria ser olhado pelo Tribunal Superior Eleitoral. Está todo o mundo de olho nisso. Porque se quer, de fato, desenvolver a agricultura familiar, que se pense também, estrategicamente, na agricultura familiar e se imagine uma forma de as famílias serem auto-sustentáveis no trabalho que passam a exercer. Agora, se pura e simplesmente sai distribuindo dinheiro aqui e acolá, cria alguns mostrengos que, amanhã, vão reverter contra o futuro das próprias pessoas que supostamente o Governo gostaria de beneficiar. Queria agradecer, primeiramente, a V. Exª pela honestidade intelectual de sempre e pelo socorro, ou seja, V. Exª desenvolveu, com muito mais assertividade, a idéia que era minha: de que não tinha havido evolução. Questionei o Senador Eduardo Suplicy se teria havido evolução, e V. Exª disse muito bem: houve aumento, mas não evolução. V. Exª foi além ao dizer que houve involução. Houve, porque perderam o foco. A questão fundamental para o Governo passado e para V. Exª era a emancipação das crianças via educação. Neste Governo, não; é a emancipação eleitoral do Presidente Lula. É preciso dizer isso com todas as letras para que a gente não fique perdendo tempo e fique engodando, pela omissão, a análise do povo brasileiro.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Quero aproveitar o momento para fazer um registro. O Presidente Fernando Henrique Cardoso foi autor de uma das grandes generosidades raras em política ao adotar, para o Programa que ele levou ao Brasil inteiro, o nome que eu criei aqui, em 1994, na campanha eleitoral, quando, pela primeira vez, denominei o Programa como Bolsa-Escola. Quando eu apresentei a idéia, em 1986, eu o chamava de Renda Mínima Vinculada à Educação. Na campanha eleitoral de 1994, passei a chamá-lo de Bolsa-Escola. Raramente um Presidente adota o nome de um programa de governo vindo de um adversário político - é preciso reconhecer isso. No México, por exemplo, que implantou um programa melhor do que o nosso - devo reconhecer -, inclusive vieram a Brasília para aprender, lá, o Presidente Fox mudou o nome que o Presidente Zedillo havia dado. Aqui, o Presidente Lula, ao mudar o nome, acho que também estava por trás a idéia de dizer “é nosso”. Se fosse o Bolsa-Escola, não seria.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - V. Exª me permite mais um aparte?

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Se a Srª Presidente o permitir.

A SRª PRESIDENTE (Heloísa Helena. P-SOL - AL) - Tenha a absoluta convicção de que terá todo o tempo que entender necessário, Senador Cristovam Buarque.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Chamo a atenção para um outro ponto significativo: essa história de trocar os nomes ou de subverter os fatos é uma marca muito negativa que revela o caráter flácido do Governo que aí está. Não vou além: o Governo está montando, junto com o Sr. Duda Mendonça - que está cercado de todas as suspeitas do mundo -, uma campanha enorme, de milhões e milhões de reais, para dizer que o Brasil ficou auto-suficiente em petróleo graças ao Lula. Vai dizer, depois, com aquela cara pascácia: “Pela primeira vez, neste País, não sei o quê...”, aquela conversa chata, porque aquilo é chato. Ele está-se tornando um chato de galochas - temos de admitir isso com clareza. Muito bem! Se nós olharmos friamente as estatísticas, veremos que, no Governo Figueiredo, evoluía a 17,5% ao ano a produção de petróleo. Por que Figueiredo foi genial nesse campo? Não, não; porque ele se beneficiou do abastecimento de bacias que foram descobertas há 20 anos, e que, graças à Petrobras, graças à sociedade brasileira, esse processo foi amadurecendo e desaguou de uma maneira muito favorável à estatística do Governo Figueiredo, sem que ele tenha sido, precisamente, o mentor de tudo aquilo. O segundo, foi o Presidente Fernando Henrique com dez pontos não sei o quê. Foi genial? Foi fantástico? Não foi! Apenas o Presidente Fernando Henrique se beneficiou - a meu ver - da abertura do petróleo. Isso ele tem a ver, porque foi ele quem fez, inclusive contra o voto do Presidente Lula e de seu Partido de então. Mas outros avanços tecnológicos de épocas anteriores a de Fernando Henrique amadureceram e explodiram no Governo dele. Agora, no Governo Sarney, foi 5%. Neste Governo Lula, a média é 3% ao ano. Não há explicação para isso. Por que caiu tanto o aumento de produção neste Governo? Ou seja, a rigor, se ele tivesse sido competente, nós teríamos a auto-suficiência antes e não agora. Antes, e não apenas neste momento. Muito bem, estão montando uma parafernália para tentar ganhar votos de novo por aí e fazendo algo que é criminoso, algo que dá a entender que ele recebeu 96% de auto-suficiência; faltavam 4%. Demorou um tempão e, agora, no final do Governo, atinge os 4%. Se o ritmo deste Governo fosse aquele do Governo Figueiredo, já teriam alcançado há muito tempo; se fosse o do Fernando Henrique, já teriam alcançado há muito tempo; se fosse o do Sarney, que foi baixo, 5%, teriam alcançado há algum tempo. Isso é criminoso, porque desinforma, mexe com a cabeça das crianças, torce a compreensão do povo brasileiro. Dá a impressão de que não temos um processo histórico, de que não somos uma Nação, de que não temos instituições maduras, de que a Petrobras não era coisa alguma e passou a ser porque Lula é genial, porque é o guia genial dos povos e conseguiu fazer a Petrobras, inerte, de repente, trabalhar. Agiu quase como Deus: “Levanta-te, Petrobras, e anda”. Isso tem de ter um cobro, porque é brutalmente atrasado. Se eu fosse usar uma linguagem de coluna social, eu diria: “Presidente Lula, deixe de ser cafona. Deixe de ser out ”. Se tivesse que usar uma linguagem política, visando à história do País, eu diria: “Presidente, isso é criminoso, é autoritário, é desonesto. A partir daí não poderemos acreditar no senhor em mais nada, porque o senhor mente sobre tudo. O senhor está mentindo sobre a questão do petróleo, está preparando uma megacampanha com um dinheiro que poderia ir, quem sabe, para o Bolsa-Escola. O senhor está gastando dinheiro com isso, e nas mãos do Duda Mendonça. Não sei como o senhor ainda contrata o Duda Mendonça. Será que é por que, se não o contratar, ele falará? Será que o senhor dá ainda oportunidade de trabalho a ele porque, caso contrário, ele falará? Será que é isso?” Este é o País do silêncio? É o País em que Delúbio não morreu de fome, em que Delúbio não trabalha, mas come; o Waldomiro não trabalha, mas come; o Silvio Pereira não trabalha, mas come. O Sr. José Dirceu recebe um dinheiro e, de repente, compra uma moto, e não sei o quê. Não se sente neles a menor necessidade de viver. Parece-me que vivem do silêncio! Qualquer um vive de seu trabalho, essa gente vive do silêncio. Para mim, está muito claro que essa gente vive do silêncio. Querem, agora, impingir a idéia de que a Petrobras não fez nada, de que não tem processo histórico nenhum e de que eles chegaram à auto-suficiência porque o Presidente Lula é genial. No campo do Bolsa-Escola é a mesma coisa: “Pegamos R$2 milhões...” Ele não diz que havia milhões e milhões de pessoas beneficiadas por outros programas, desvirtua o sentido do Bolsa-Escola, transformando tudo no que ele chama de Bolsa-Família, e sem ter a dignidade de reconhecer, como V. Exª reconhece no Presidente anterior, que é ter dito: “Olha, isso aqui foi do Governo do Cristovam, está aqui o nome, e acabou”, em vez de ficar nessa disputa medíocre que, a meu ver, não é boa para o povo que recebe esse tipo de insulto intelectual, nem para o Presidente também, porque parece aquele afogado que fica o tempo todo pedindo socorro e, quando se chega lá, ele diz que é brincadeira. Um dia, deixa ele morrer, porque está brincando o tempo todo. Então, no dia em que precisar de credibilidade, ele não terá apoio das pessoas, porque elas vão dizer: “Poxa, passa o Governo todo mentindo, não ataca a questão da corrupção, não enfrenta as denúncias que fazem contra ele, procura mostrar que o importante é ter feito isso e aquilo e que corrupção é uma besteira! Não tem de discutir corrupção”. Com isso, ele vai criando um quadro muito negativo de conceito - não sei se ele está preocupado com isso - em torno dele. Mas isso é muito bom, porque a verdade vai aparecendo. São pessoas como V. Exª que vão, com enorme apuro técnico e muita sensibilidade política, procurando, pura e simplesmente, estabelecer a verdade. A verdade é: não há qualquer preocupação social. Há preocupação em usar o social para arranjar votos. Vou repetir: não há a menor vontade do Presidente em emancipar a criança brasileira carente. Ao contrário, ele quer a criança como cliente, esmoler dos seus óbolos, e ele quer se emancipar eleitoralmente pela via da demagogia mais deslavada e mais cínica que o Brasil possa ter visto. Obrigado a V. Exª.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Srª Presidente, vou concluir com duas questões.

Primeiro, mesmo que o Bolsa-Escola seja correto, com registro de freqüência, com valor alto, não resolve se não vier acompanhado da escola. E aí não adianta pagá-lo se não fizermos uma revolução no salário e na formação do professor, se não se começar a fazer aquilo por que V. Exª luta, que é o atendimento na primeiríssima infância, por meio de creches públicas. Se a criança chega, com todo o programa Bolsa-Escola do mundo, mas já sem condições de aprender, também não será emancipador o programa.

Então, o Bolsa-Escola só funciona se vier junto com a escola, e tem de se gastar muito mais em escola do que no programa, o que não se está fazendo. O Governo Federal gasta, hoje, mais com o Bolsa-Família do que com educação básica. Falo do Governo Federal. Quando somamos Estados e Municípios, é claro que aí se gasta mais.

Finalmente, para concluir, quero dizer o seguinte: o que o Governo fez foi sair do futuro, ficar preso ao presente e deixar de construir uma nova geração para ganhar a próxima eleição. É lamentável que, nesse sentido, tenha havido uma involução, um retrocesso, não apenas do ponto de vista social, mas também do ponto de vista político.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/03/2006 - Página 6689