Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre o investimento da Telemar na empresa Gamecorp, que tem como um dos sócios, o filho do presidente Lula. (como Líder)

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Considerações sobre o investimento da Telemar na empresa Gamecorp, que tem como um dos sócios, o filho do presidente Lula. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 03/03/2006 - Página 6693
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • REPUDIO, IMPUNIDADE, TRAFICO DE INFLUENCIA, CONTRATO, EMPRESA, FILHO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, TELEFONIA, AUSENCIA, RESPOSTA, PEDIDO, ORADOR, ESCLARECIMENTOS.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, OMISSÃO, ESCLARECIMENTOS, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, AUTORITARISMO, DESVALORIZAÇÃO, DECLARAÇÃO, CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB), COMENTARIO, NEGLIGENCIA, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • REITERAÇÃO, GRAVIDADE, IMPUNIDADE, HOMICIDIO, PREFEITO, MUNICIPIO, SANTO ANDRE (SP), ESTADO DE SÃO PAULO (SP), NECESSIDADE, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), GARANTIA, SEGURANÇA, PARENTE, VITIMA, AMEAÇA.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, acompanhei com atenção o pronunciamento que trouxe à Casa ainda há pouco, e V. Exª se revelou, tanto quanto eu, constrangida com essa questão familiar. Temos conversado muito, e V. Exª sabe como isso me atinge, como sei que atinge V. Exª, e, portanto - V. Exª disse bem -, não se trata de ver se é filho de Fulano ou se é irmão de Beltrano. Mas certos fatos públicos têm de ser discutidos e analisados com dureza e com exigência pelos agentes políticos deste+.- País. Eu me refiro a esse episódio da Gamecorp. Primeiro, fiz uma solicitação na semana passada aqui e, muito brandamente, pedi que a empresa desse uma explicação. Ela não a deu. Seria uma explicação clara, cabal. Eu adoraria poder vir aqui e dizer que tudo não passa de um mal-entendido. A empresa não deu importância à modesta solicitação que lhe fiz.

Portanto, não se trata de filho, de irmão, de parente ou de quem quer que seja. Trata-se de uma pequena empresa de fundo de quintal que recebeu aporte de uma grande empresa de telefonia no valor de R$15 milhões, até o momento.

Trata-se do fato de que, nessa guerra de gigantes, outra grande empresa de telecomunicações teria contratado um advogado ligado ao ex-Ministro José Dirceu por R$8 milhões e o célebre compadre do Presidente Lula, advogado Roberto Teixeira, por R$1 milhão, sem que se saiba até agora, diz a revista Veja, qual foi o serviço jurídico. Os advogados tinham de aparecer à luz e de dizer: “Os serviços prestados foram tais e tais”. Enfim, tinham de procurar justificar. Não foi pouco dinheiro, estou falando aqui de R$9 milhões; falo de mais de US$4 milhões.

Há outra acusação terrível: a empresa que se associou à Gamecorp teria sido beneficiada por um ato monocrático do Presidente da República. Até que ponto foi feito o justo?

O Presidente Dutra, com toda aquela sua simploriedade, dizia que no governo não se deve comprar nada nem vender nada, porque, se se vai comprar, o vendedor pode querer vender por quase nada para beneficiar o dono do poder; se se vai vender, o dono do poder pode querer comprar muito caro para chegar igualmente ao coração ou à sensibilidade dos detentores do poder de mando, do arbítrio, da decisão discricionária, enfim.

Então, esse é um caso que - volto a dizer - não gosto de mencionar, mas há muito dinheiro em jogo. Não se trata de brincadeira, mas de algo que envolve dinheiro público, envolve um método. Então, é fundamental que a empresa venha a público - insisto nisto - para dar sua explicação cabal e diga: “Olha, aconteceu isso, por isso, aquilo e aquilo outro”. Desse modo, veremos se é convincente ou não a explicação da empresa. Mas que o Governo está cheio de episódios obscuros e que esse é um deles é verdade, e a tática de não responder tem sido uma marca do Governo do Presidente Lula. Em nenhum momento, enfrentou as acusações de corrupção. Foi aí que ele perdeu, já não para V. Exª, mas para mim, até um certo encanto.

Eu imaginava que ele reagiria de outro jeito. Pensei, no começo desta crise, que ele iria enlouquecer, que iria dar o nome das pessoas todas, que iria detonar, demitir, fazer e acontecer. Não demitiu ninguém. O José Dirceu se arrastou um tempão; outro se arrastou um tempinho; outro se arrastou mais outro tempão. Quase todos saíram a pedido, a começar pelo Waldomiro Diniz. Não consegue destratar nenhum deles. Chamou de “nosso Delúbio”, no programa “Roda Viva”, o antigo Tesoureiro do PT. Não parece ter liberdade para ser duro com nenhum deles. Não foi capaz de dizer: “Meu Governo estava indo bem até que um bando de gente que pensei que fosse decente, gente que não presta, fulano, fulano e fulano...”. Não foi capaz de fazê-lo. Deu impressão de ter alguma relação com eles que lhe impossibilitava de falar, mais clara e seriamente, sobre todos os episódios.

Diz que foi traído. Traído por quem?! Trair é um verbo que exige complemento. Não se trata de verbo intransitivo. Traído por quem? Quem o traiu? Quando foi traído? Em que momento foi traído? Qual foi a traição?

Se o episódio é corrupção, alguém é traído porque não sabe, porque condena ou porque não recebeu sua parte. Há mil ilações. Mas não é possível entendermos como legítima a resposta que não aponte nem Fulano, nem Beltrano, nem Sicrano. E esses aí teriam de ser apontados à execração pública, tendo em vista o processo, e o Presidente mostraria com clareza a sua índole.

Igualmente, tenho aqui confrontado essa história do PT em relação ao caso Santo André. Dizem que estamos mexendo numa ferida, pois, afinal de contas, trata-se de um companheiro deles que foi assassinado. Mas o interesse de deslindar esse fato tem sido nosso, sem termos essa ligação toda com Celso Daniel. Eles fizeram tudo para obstaculizar todos os passos que a CPI deu. Fizeram tudo para desmoralizar sempre que alguém do Ministério Público disse alguma coisa que levasse à elucidação de algum dos pontos obscuros - e são muitos nesse caso. E tal comportamento causa estranheza. Que interesse é esse? Que solidariedade é essa em que a família fica de um lado, e eles, do outro? A família não gosta deles. A família está se mudando. Isso é grave, Srª Presidente. A família está se mudando. No começo, disseram que o irmão de Celso Daniel, João Daniel, é louco. Isso é possível. Há louco aqui, louco acolá, louco no sanatório, louco fora. Diziam que o Bruno não é louco, mas ele veio e confirmou tudo que o dito louco havia declarado. Pergunto se o Bruno passou a ser louco também.

O Bruno e o outro estão se mudando, não da cidade, não do bairro, não do Estado, mas do País. Estão indo embora, pois estão sentindo-se ameaçados. O Ministro da Justiça, a essa altura, já deveria ter ido à casa deles ou deveria ter mandado a Polícia Federal buscá-los, cercados de toda segurança, para virem aqui e terem uma audiência com ele, para dizerem o que está acontecendo com eles. Deveria ser dito a eles: “O Estado brasileiro garantirá a segurança dos senhores e da sua família. Quais são as pessoas que precisam de segurança? Quais são as pessoas que precisam de guarda da Polícia Federal 24 horas por dia? Onde está? Quais são as suspeitas?”.

Na medida em que o Governo se tranca em copas, a impressão que passa é que não está preocupado com a situação, a impressão que passa é que o Governo vê como inimigos esses cidadãos que causaram, quem sabe, alguns dissabores ao Presidente com as denúncias que fizeram. É complicado, é uma coisa muito complicada. Não vejo com bons olhos a forma como eles agem. Não vejo isso com bons olhos.

Estão se mudando alegando que estão ameaçados. Isso aqui é uma democracia ou não é? Se é uma democracia, quem os está ameaçando? O que faz a autoridade máxima desse segmento, que é o Ministro da Justiça, que não vai lá e dá inteira cobertura a eles?

Aqui já tive problemas. Já denunciei pressões absurdas e ilegítimas, que soube repelir do jeito que sou capaz, contra a minha família. V. Exª também já passou por momentos difíceis, por tentativas de agressão à sua família, por ameaças a V. Exª e a seu filho. Que País é este em que estamos vivendo? Que País é este? É um País onde alguém diz: “Estou ameaçado em um caso investigado por uma CPI. Vou embora do Brasil, porque não acredito nas autoridades”. E não é só o irmão que eles diziam que era louco, não. Está indo o louco, está indo o bom, está indo o mais ou menos, está indo a mais ou menos, está indo todo mundo. E não está chocando ninguém!

Alguém da CNBB diz algo que não agrada aos ouvidos do Príncipe; aí, algum Gregório Fortunato, intelectual do Príncipe, vai e resolve dar um tiro simbólico no Major Rubem Vaz, fictício. Vai lá e diz: “A CNBB tem de cuidar é do Padre Pinto”, que é um padre que estaria rezando missa com umas roupas esquisitas, maquiado, enfim. Sei lá como a Igreja vai lidar com o Padre Pinto! Ela vai lidar do jeito que ela quiser lidar. Se não lidar corretamente, ela vai perder ponto perante seus fiéis. Ela tem de saber como lidar. Eu é que não vou agora ensinar, literalmente, padre a rezar missa. Não vou.

Agora, o fato é que só mandaram a Igreja cuidar do Padre Pinto porque a Igreja, pela CNBB, disse que não concorda com algumas medidas deste Governo, com alguns gestos e posturas deste Governo. Então, dizem eles desdenhosamente: “Vai cuidar do Padre Pinto”; ou seja: “Não se meta com coisa nossa. Não se meta com cosa nostra. Não se meta conosco; saia fora, senão vamos jogar para você o bombardeio”. É muito complicado isso. Este País me inquieta.

Renner dizia da Alemanha pré-nazista o seguinte: “Quando, de noite, penso no meu País, perco o sono”. Estou preocupado. Estou preocupado, porque essas pessoas que nos governam não reconhecem as demais forças do País como legítimas. Não reconhecem. Não reconhecem legitimidade em ninguém. Eles reconhecem apenas a eles próprios como autores de uma proposta que não está escrita e que salvaria o Brasil. Então, tem messianismo e tem autoritarismo aí. Portam-se de maneira extremamente autoritária - não sei se à Mussolini, à Stalin, à Hitler mesmo, mas se portam de maneira autoritária.

A partir do momento em que não reconhecem as demais forças do País como legítimas, eles começam a colocar em xeque os valores fundamentais da democracia brasileira, que se fundamentam no contraditório, que se fundamentam no choque de opiniões. Esses valores fundamentam-se precisamente na necessidade de uma Oposição forte fiscalizar o Governo para que o Governo erre menos.

Um governo democrático deveria agradecer a uma oposição consciente pelo favor que lhe presta de apontar-lhe os erros. Este Governo, não; irrita-se. Não faz mais porque não pode, mas tentou calar os intelectuais brasileiros com a Ancinav; tenta o tempo inteiro restringir a liberdade de imprensa; tenta o tempo inteiro amordaçar a opinião dos seus adversários, e, agora, diz, de maneira desdenhosa, que a CNBB não deve interferir intelectualmente sobre o processo político. E estamos vendo a família toda do Sr. Celso Daniel mudar-se com medo de morrer. Eles não vão me dizer, agora, que são todos loucos na família. Aliás, loucos ou não loucos, não se deve deixar ninguém ser assassinado. Não deve, pura e simplesmente, ter assassinato no País. Não há pena de morte formal; não deve haver pena de morte informal também. E casos graves, como esse envolvendo a empresa Gamecorp, têm que ser esclarecidos de maneira clara; têm que ser expostos; tem que vir uma explicação muito nítida. Chega de falta de transparência. Chega de ficarmos fingindo que não estamos vendo coisas muito graves que estão se passando neste País.

Muito obrigado, Srª Presidente. Era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/03/2006 - Página 6693