Discurso durante a 50ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à postura da diplomacia brasileira com relação à Bolívia pedindo uma atitude mais firme e menos ingênua nas negociações com o país vizinho.

Autor
Ramez Tebet (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Ramez Tebet
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Críticas à postura da diplomacia brasileira com relação à Bolívia pedindo uma atitude mais firme e menos ingênua nas negociações com o país vizinho.
Aparteantes
Antero Paes de Barros.
Publicação
Publicação no DSF de 04/05/2006 - Página 14112
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • REPUDIO, TRAIÇÃO, GOVERNO ESTRANGEIRO, RESCISÃO, CONTRATO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), EXPLORAÇÃO, COMERCIALIZAÇÃO, RECURSOS NATURAIS, GAS NATURAL, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, QUESTIONAMENTO, POLITICA EXTERNA, BRASIL, FALTA, PREVISÃO, OCORRENCIA, MOTIVO, CAMPANHA ELEITORAL, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, ANUNCIO, NACIONALIZAÇÃO, CRITICA, NEGLIGENCIA, RESPOSTA, ITAMARATI (MRE), PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESRESPEITO, DIREITO INTERNACIONAL, ALEGAÇÕES, SOBERANIA, EXPECTATIVA, REUNIÃO, CHEFE DE ESTADO, PRESERVAÇÃO, INTERESSE NACIONAL.

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O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Vou compreender o anseio da Casa. Eu também estava ansioso para ter oportunidade de falar ainda esta semana, porque o assunto é importante para o Brasil; sendo importante para o Brasil, é importante que esta Casa se pronuncie como um todo, como eu percebi ontem, embora não estando aqui. Percebi os vários pronunciamentos a respeito da crise, e não podemos tampar o sol com a peneira e dizer que ela não está existindo, porque atinge em cheio a dignidade do Brasil, a meu ver, esse ato irresponsável - eu diria até um ato de traição - do Presidente da Bolívia contra um acordo que foi firmado sob os auspícios da soberania boliviana e da soberania brasileira, permitindo que a Petrobras lá se instalasse e comercializasse ou explorasse os recursos naturais daquele país, sob a forma de um contrato firmado depois de mais de cinqüenta anos de negociação, Sr. Presidente.

Digo ato de traição por quê? Porque, Sr. Presidente, é inconcebível fazer o que foi feito. É inconcebível o Presidente Lula, aos abraços na campanha do Presidente Evo Morales, tendo conversado há poucos dias com o Presidente, dizer-se tomado de surpresa. O Brasil não foi. Contudo, a diplomacia brasileira, o Governo brasileiro foi traído! Isso para se dar uma grande dose de tolerância ao Presidente Lula. Porque não é possível, pois o ato foi anunciado em praça pública! O presidente da Bolívia fez campanha em cima desse assunto, em cima da nacionalização, em cima da exploração das riquezas naturais pela sua própria gente, pelo seu próprio povo! Como pode o Brasil alegar surpresa? Como pode a nossa diplomacia alegar surpresa? Como podemos tolerar? Porque até agora não houve um ato forte, não houve um ato enérgico do Brasil; não houve um ato, por exemplo, Senador Gerson Camata, como o ato praticado pela Espanha em defesa da sua Companhia, que está lá praticamente no mesmo ramo da nossa querida e tão saudada Petrobrás.

Eu não poderia, portanto, deixar de ocupar esta tribuna. E começo fazendo o que estou fazendo: questionando a fala do nosso Presidente da República, do nosso Luiz Inácio Lula da Silva. Por quê? Porque diz o Presidente, na nota do Itamaraty, que o Brasil reconhece o direito de soberania da Bolívia para nacionalizar seus recursos naturais, sem questionar a soberania sob a qual firmou-se um contrato entre as partes - a Petrobras e o Governo boliviano -, que deve ser respeitado sob pena de rompimento de regras do próprio Direito Internacional. Soberania, sim, deve reger os Estados, mas também as vigas que sustentam esse edifício legal.

Ao reconhecermos que a Bolívia está exercitando sua soberania, temos de reconhecer que o Brasil estava explorando aquele país! É a conclusão lógica!

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Permita-me, Excelência...

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Se a Bolívia praticou um ato de defesa de sua soberania, então o Brasil estava extorquindo a Bolívia! Como é que o Itamaraty chega a uma nota tão frouxa como essa?

O Sr. Antero Paes de Barros (PSDB - MT) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Como sentará à mesa de negociação daqui a uns dias, depois da eleição de julho? Senador Roberto Saturnino, conheço as posições de V. Exª em defesa dos interesses nacionais...

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Senador...

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Concedo um aparte a V. Exª, Senador Antero.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Logo em seguida a V. Exª, subirei à tribuna para falar sobre o mesmo assunto.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Pois não.

Senador Gerson Camata, peço-lhe desculpas pois V. Exª havia solicitado o aparte primeiro, mas V. Exª compreende... 

O Sr. Antero Paes de Barros (PSDB - MT) - Posso esperar, Senador. Falo em segundo lugar então.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Não, vamos ganhar tempo.

O Sr. Antero Paes de Barros (PSDB - MT) - Pois não. Quero cumprimentar V. Exª pela oportunidade do pronunciamento e adicionar o seguinte: a nota do Presidente Lula foi infeliz, a nota do Governo foi infeliz. O Presidente duplicou o Itamaraty: há o Itamaraty propriamente, que sempre teve uma política correta, diplomática, e há o assessor internacional do PT no Palácio do Planalto - é um ombudsman do Itamaraty. O Presidente da República foi eleito para proteger o País, a soberania nacional, não me consta que tenha sido eleito para proteger a Bolívia. Não estou defendendo que o Governo brasileiro aja como um país imperialista e explorador da Bolívia, queremos relações justas e humanas entre os países da América Latina, até para buscar concretizar o sonho de Bolívar, mas o Presidente Lula, com o seu pronunciamento, pode estar cometendo um crime de lesa-pátria ao não defender uma empresa brasileira chamada Petrobras. Parabéns a V. Exª.

O SR. RAMEZ TEBET (PDMB - MS) - Senador Antero Paes de Barros, veja V. Exª que isso tudo acontece quando o Brasil propala a auto-suficiência do petróleo. Isso aconteceu uma semana após a reunião entre o Presidente Lula e os Presidentes da Argentina, da Venezuela e o próprio Evo Morales. E o Governo proclama que o ato pegou o Brasil de surpresa! É incompreensível. É algo que realmente mexe com os nossos brios e impõe atitude enérgica do Governo.

Há que se utilizar a via diplomática sim, mas não - para ser bondoso - da forma ingênua como tem-se comportado o nosso Itamaraty de uns tempos para cá. Lembro a propósito, Senador Gerson Camata, a quem vou conceder um aparte em seguida, que o Brasil tinha acabado de perdoar uma dívida da Bolívia de US$ 52 milhões, e foi essa a resposta que o Presidente da Bolívia deu ao Brasil. Quer dizer, vem aqui, toma café, reúne-se com o Presidente Lula, volta e baixa um decreto dessa natureza! Como compreender isso? Como aceitar uma coisa dessas?

Eu não vim aqui, Sr. Presidente, atacar a diplomacia brasileira. A diplomacia brasileira tem os seus encantos e vem sendo aplaudida em seu relacionamento com todos os países do mundo, mas, de uns tempos para cá, tem sido preciso ter paciência. Não é esse o comportamento que se espera do nosso Itamaraty. Não é possível isso! O Presidente Lula vai participar de uma reunião agora em Foz do Iguaçu. Vamos ver o que vamos conseguir, vamos lá com força, vamos lá com menos ingenuidade.

            Sr. Presidente, fui um dos poucos aqui do Senado da República que tive oportunidade de estar em Corumbá junto com o ex-Presidente da República - o contrato envolvendo o gasoduto foi firmado depois de 50 anos de negociação em Corumbá, lá no meu Estado, e também na cidade vizinha do nosso Brasil, Porto Soares. Mas também quero dizer que esse gasoduto corta 720 quilômetros do território sul-mato-grossense. Os prejuízos para o meu Estado, em matéria de arrecadação sobre esse gás, são muito grandes, mas eu não vim aqui tratar disso. Vim aqui cumprir um dever de consciência: apontar...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Quantos minutos ainda tenho, Sr. Presidente? Já se esgotou o meu tempo?

Vou procurar encerrar. Vou conceder um aparte ao Senador Gerson Camata e vou encerrar, Sr. Presidente.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Conclua, Senador. Falarei depois.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - O assunto, Sr. Presidente, é muito importante. Não cheguei a abordá-lo em toda a sua extensão, mas quero deixar uma conclusão: a democracia brasileira deve deixar de lado as vaidades, o nosso Presidente da República deve escolher melhor os seus parceiros e dar prioridade aos verdadeiros interesses nacionais, cuidar melhor do nosso Brasil para depois alçar vôos internacionais. É verdade que vivemos em um mundo globalizado, mas ele começa na defesa dos interesses maiores do povo brasileiro.

Senador Tião Viana, por favor.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Estou solicitando a palavra pela ordem.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Sr. Presidente, vou atender ao apelo de V. Exª e encerrar meu pronunciamento. Talvez eu retorne a esta tribuna para tratar deste assunto, mas, de qualquer forma, deixo o meu apelo: vamos enxergar primeiro o nosso Brasil tão extenso, tão vasto, vamos olhar primeiro o Brasil. Os interesses da América Latina são importantes sim, o Brasil defende o Mercosul e tem cedido naquilo que pode, mas não podemos deixar de defender os verdadeiros interesses nacionais com firmeza. Precisamos saber reconhecer os nossos verdadeiros amigos.

Sr. Presidente, este é o posicionamento de um modesto Senador de Mato Grosso do Sul que, após ouvir o pronunciamento de um ex-Vice-Presidente da República, o Senador Marco Maciel, tem a ousadia de ocupar a tribuna para manifestar-se sobre um assunto tão importante. Ainda que tenha contado com a condescendência de V. Exª, o tempo foi limitado, não pude apresentar todos os argumentos, mas deixo marcado o meu posicionamento nos Anais da Casa.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/05/2006 - Página 14112