Discurso durante a 61ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre a questão da agricultura e da pecuária no país. Comentários sobre todas as renegociações já havidas desde 1995.

Autor
Sibá Machado (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Machado Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • Reflexão sobre a questão da agricultura e da pecuária no país. Comentários sobre todas as renegociações já havidas desde 1995.
Publicação
Publicação no DSF de 18/05/2006 - Página 17041
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • COMENTARIO, MANIFESTAÇÃO, PRODUTOR RURAL, ANALISE, DADOS, MINISTERIO DA AGRICULTURA PECUARIA E ABASTECIMENTO (MAPA), CRESCIMENTO DEMOGRAFICO, BRASIL, MUNDO, QUESTIONAMENTO, OBJETIVO, ATIVIDADE AGRICOLA.
  • ANALISE, ORDEM CRONOLOGICA, RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA AGRARIA, PERIODO, GESTÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, EVOLUÇÃO, ATUALIDADE, REGISTRO, DIVERSIDADE, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, ATENDIMENTO, REIVINDICAÇÃO, AGRICULTOR, COMENTARIO, INFLUENCIA, VOLUME, DIVIDA, ECONOMIA NACIONAL.
  • COMENTARIO, LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, REFERENCIA, LUCRO, PRODUTOR RURAL, ANTERIORIDADE, CRISE, NEGLIGENCIA, PAGAMENTO, DIVIDA, TENTATIVA, IMPUTAÇÃO, ESTADO, RESPONSABILIDADE, SITUAÇÃO.
  • ANALISE, NOCIVIDADE, EFEITO, AUSENCIA, PLANEJAMENTO, INVESTIMENTO, AGROPECUARIA, EXCESSO, PLANTIO, DESTINAÇÃO, EXPORTAÇÃO, POSSIBILIDADE, PREJUIZO, ATIVIDADE SAZONAL.

O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Sr. Presidente. Obrigado, Senadora Ideli Salvatti, pela cessão do tempo.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos vivendo um momento em que, novamente, lideranças do setor rural brasileiro se manifestam e considero legítimos esses manifestos. Aliás, participei de muitos deles e fui um dos organizadores do “Grito da Terra Brasil”, que nasceu no ano de1992. Coincidentemente, neste ano, tanto o setor mais abastecido da produção agrária brasileira, economicamente falando, quanto o menos abastecido estão - é claro que por motivos um pouco diferentes e com soberania e independência das manifestações -, em datas iguais, fazendo reivindicações nos mesmo ambientes, em Brasília.

Sr. Presidente, eu queria, hoje, despojar-me um pouco da minha paixão político-partidária e tentar fazer uma reflexão mais fria a respeito da agricultura e da pecuária no nosso País.

A minha formação acadêmica é Geografia e um dos pontos que estudamos muito nessa área é a população. Sr. Presidente, uma coisa que tem chamado a atenção de muitas pessoas que estudam a população humana no mundo é saber onde vai parar essa explosão demográfica.

O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento apresenta os seguintes números: a população mundial deverá passar dos 6,1 bilhões de pessoas, em 2000, para 8,13 bilhões, em 2030, sendo que, no Brasil, a população deverá atingir a casa dos 235 milhões de habitantes.

Sr. Presidente, pergunta-se: deve-se produzir para o comércio, para se ganhar dinheiro e ficar rico, ou produzir para se abastecer a mesa das pessoas? É comum vermos, no mundo inteiro, as pessoas que têm um pouco mais de condições financeiras terem uma verdadeira paixão por animais, que, em alguns casos, dentro de casa, recebem tratamento melhor que as pessoas, e não se sabe o que fazer com dois bilhões de seres humanos que passam fome e sede em vários continentes.

Voltando ao tema, alguns discursos têm um teor muito catastrófico, Sr. Presidente. Parece que o mundo vai acabar amanhã. Participo desses movimentos sociais desde 1979 e, de lá para cá, também já fui catastrofista algumas vezes, pois precisava pregar para as pessoas, até mesmo para estimular a mobilização, que o mundo poderia acabar amanhã.

Quero fazer um breve comentário sobre todas as negociações que já houve desde 1995, do Governo Fernando Henrique até agora. Não quero discutir papel de Governo, mas as reivindicações que aportam não somente ao Congresso, mas principalmente ao Executivo.

Cito uma nota técnica que diz que as principais reivindicações dos agricultores são: alongamento das dívidas rurais para pagamento em 20 anos, manutenção das taxas de juros de 3% e redução dos juros das dívidas anteriormente renegociadas e que sejam superiores; manutenção da equalização pelo Tesouro Nacional, nos termos da Lei nº 8.427/92; bônus de adimplência; prazo de carência, no mínimo, de um ano; inclusão na renegociação do Funcafé, Prodecer I e II, Programa de Recuperação da Lavoura Cacaueira Baiana; e a reabertura dos prazos para as renegociações, prorrogações e composições de dívidas amparadas em recursos dos fundos constitucionais.

Sr. Presidente, em termos de volume de dinheiro, segundo avaliação que ainda não é 100% precisa, estima-se que essas negociações gerariam um impacto imediato de R$33,08 bilhões. Desse valor, cerca de 27,5 são de dívidas já renegociadas por meio da securitização, do Pesa, dos fundos constitucionais e de outras negociações, e 3,8 bilhões, Sr. Presidente, são de dívidas ainda não renegociadas.

No ano de 1995, quando era Presidente Fernando Henrique Cardoso, foi acordada, pela Lei nº 9.138, de 29 de novembro, uma base de renegociação para as dívidas daquele momento, que não vou ler agora. Depois, pela Lei nº 9.866, de novembro de 1999, houve outra renegociação. A terceira renegociação foi feita por meio da Lei nº 10.427, de 2002; a quarta, pela Lei nº 10.177, de 2001; a quinta, pela Lei nº 10.464, de 2002, que complementou as leis anteriores; e assim sucessivamente. Houve também algumas medidas provisórias, como a do Governo Lula, que atende a pequenos produtores endividados da Região Nordeste.

Sr. Presidente, lendo artigos de alguns analistas que estudaram mais friamente o problema, quero louvar a matéria do jornalista André Barrocal, da revista Carta Maior:

Os ganhos do setor entre 2002 e 2004, com dólar e preços agrícolas altos, fizeram a festa dos produtores rurais e financiaram o aumento, às vezes desordenado, de plantações e do bem-estar deles.

A chiadeira recente de setores ruralistas, especialmente os da soja, permite supor que poucos se preocuparam em guardar dinheiro para pagar dívidas e preparar-se para mudança de ventos numa atividade que atravessa altos e baixos periódicos.

Agora que o dinheiro escasseou, tentam empurrar para o Estado uma conta de R$4 bilhões a R$6 bilhões em dívidas privadas e adiar o pagamento de R$9 bilhões em débitos públicos. Essa é a principal bandeira do protesto de grandes agricultores contra a crise previsto para esta terça-feira (16), em Brasília.

Sr. Presidente, ele avalia que o setor não se preocupou em fazer um planejamento mais adequado.

Eu nasci em uma família de origem agrícola, Sr. Presidente. Meu avô foi agricultor no Piauí, meu pai foi agricultor no Pará e vivi da agricultura durante boa parte de minha vida. Nesses anos todos, os mais pobres e desassistidos agricultores e mesmo os mais ricos têm - não sei por quê -, em suas cabeças, que “o próximo ano será melhor do que o atual”. Sr. Presidente, há tanto otimismo, que, às vezes, eles não se preocupam em fazer um pré-planejamento.

Sr. Presidente, quando eu era agricultor no Pará, o primeiro produto que gerou muita riqueza por lá - inclusive, estimulou-nos a fazer o plantio imediato - foi o cacau. Esse produto gerou muito dinheiro. Aqueles que plantaram cacau compraram carros novos, fizeram novas casas. E o cacau foi plantado em todo o lote. Quando o preço do cacau caiu, Sr. Presidente, não havia arroz para comer. Aí, algumas pessoas diziam: “Está na hora de diversificar a produção; não podemos ter por princípio apenas a monocultura”. E a monocultura brasileira, desde a chegada dos portugueses, é uma política de plantation, uma política de exportação apenas, em que se pensa nas chamadas commodities, na dolarização do produto, assim por diante.

A falta de planejamento é quota de contrapartida. Não podem xingar o Governo Federal e dizer que não negociou! Há, aqui, dez negociações, que totalizam R$27 bilhões, que saem do bolso de todo mundo! Então, está na hora de fazer uma negociação mais justa.

Não está aqui detectado, mas, com certeza, existem pessoas que não estão cumprindo seu dever, que estão aproveitando a corona de outros. Sei que há crises cíclicas, sim; que há o problema metereológico, climatológico; que há o problema da influência da economia mundial e da influência de vários fatores, Sr. Presidente. Assim, devemos trabalhar com o mínimo de planejamento para o setor. Ensinaram-me, quando eu era agricultor, para tomar cuidado: “Sibá, tem de diversificar!”.

Sr. Presidente, depois do cacau, foi a vez da pimenta-do-reino, que deu muito dinheiro. A minha família fez tudo para plantar pimenta-do-reino. Quando a pimenta-do-reino caiu, passamos fome. Essa é a lógica da agricultura desde o período neolítico, quando a agricultura foi criada pelas mulheres há dez mil anos.

Sr. Presidente, aqui, o debate foi muito apaixonado, foi feito com o coração na mão. Por outro lado, entendo que ele não foi lógico nem preciso. Se colocarmos o guizo no pescoço do gato, todos aqui têm contrapartida. Sim, o Governo tem de atender, porque existe um problema posto. O dólar caiu. Mas caiu por quê? Porque a economia foi responsável, já que não poderia instituir um câmbio por decreto. Poderíamos decretar que o dólar, no Brasil, teria de ficar na casa dos R$3,00. Mas haveria lastro para segurar uma situação dessa? Não sei. Sr. Presidente, podemos dizer, por decreto, um monte de coisas bonitas, mas é a economia que tem de prevalecer de forma organizada.

Portanto, quero louvar, sim, o movimento, que é justo. Há uma crise conjuntural, não estrutural. A crise é estrutural na sua essência histórica. Pelo que se sabe, a agricultura é um produto primário, não gera riqueza na ponta, mas gera riqueza nos passos que dá na cadeia produtiva. Se continuarmos vendendo soja bruta para a China e se um dia o chinês não quiser mais comprá-la, irá sobrar soja, Sr. Presidente. Se todos plantarmos cana-de-açúcar, porque o álcool e o açúcar estão com bom preço, é lógico que, se ocorrer algum problema, seja lá o que for com o preço da cana-de-açúcar, iremos passar fome e necessidade. Disso entendo, porque já senti na pele.

Sr. Presidente, faço, aqui, uma espécie de desabafo, porque não posso mais aceitar que o debate se faça com paixão e até com desonestidade. Há, sim, um problema a ser resolvido, que tem de ser enfrentado de frente, como foi o caso da violência registrada em São Paulo e em Mato Grosso do Sul. Não podemos ficar aqui a debater se foi o Governo A ou Governo B o responsável por tais problemas, se alguém fez mais ou menos. Há um problema? Vamos enfrentá-lo juntos; vamos nos dar as mãos e superar essa dificuldade que estamos vivendo neste momento!

Agradeço a V. Exª, Sr. Presidente, pela atenção e pelo tempo que me concedeu, além do regimental.

Era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/05/2006 - Página 17041