Discurso durante a 178ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa do diálogo entre Executivo e Legislativo, que não pode prescindir de temas como educação, reforma política, combate à corrupção e políticas de inclusão nas áreas de ciência, tecnologia e cultura.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Defesa do diálogo entre Executivo e Legislativo, que não pode prescindir de temas como educação, reforma política, combate à corrupção e políticas de inclusão nas áreas de ciência, tecnologia e cultura.
Publicação
Publicação no DSF de 02/11/2006 - Página 33307
Assunto
Outros > ELEIÇÕES. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • REGISTRO, PRETENSÃO, CANDIDATO ELEITO, DIALOGO, LEGISLATIVO, JUDICIARIO, MELHORIA, GOVERNO.
  • NECESSIDADE, DEBATE, RELEVANCIA, IGUALDADE, PODERES CONSTITUCIONAIS, RESPEITO, FUNÇÃO, INSTITUIÇÃO DEMOCRATICA, SOLICITAÇÃO, DIALOGO, CONGRESSO NACIONAL, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ERRADICAÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, MISERIA, POBREZA, DEFESA, ORADOR, EDUCAÇÃO, MELHORIA, SITUAÇÃO SOCIAL, POPULAÇÃO.
  • DEFESA, DEBATE, REFORMA POLITICA, EXTINÇÃO, REELEIÇÃO, CORRUPÇÃO, SUGESTÃO, POSSIBILIDADE, POLICIA FEDERAL, SUBORDINAÇÃO, LEGISLATIVO, NECESSIDADE, SENADO, ORÇAMENTO, OBJETIVO, MELHORIA, APRECIAÇÃO, PROJETO DE LEI ORÇAMENTARIA.
  • EXPECTATIVA, CANDIDATO ELEITO, REALIZAÇÃO, DEBATE, PROPOSTA, BENEFICIO, POPULAÇÃO.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como acontece comumente, logo depois das eleições presidenciais, o Presidente Lula fez um discurso propondo uma convivência, o que nem deveria ser necessário, porque faz parte da vida republicana e da vida democrática a convivência entre os três Poderes. Falo em meu nome, mas estou certo de que posso falar em nome do meu Partido, no sentido de dizer que não temos nada contra dialogar, mas nós não queremos fazer reverência.

Para dialogar, Senador Garibaldi Alves Filho e Senadora Heloísa Helena, o Presidente da República tem acesso a tudo que nós dizemos aqui, tem acesso a tudo que propomos aqui, e, se ele reagir positivamente a qualquer das nossas falas, nós não teremos por que repudiar o que nós próprios defendemos. Além disso, se não gostar de algumas das coisas que propusemos, claro que estamos dispostos a ouvir a opinião de Sua Excelência, que foi eleito com uma votação expressiva, embora, como lembrou a Senadora Heloísa Helena, não pela maioria do universo total de eleitores.

Se existe a intenção real de provocar um debate, isso não pode ser apresentado como se fosse uma concessão do Presidente nos ouvir e, sim, como se fosse uma responsabilidade das pessoas de vida e atividade pública neste País conversar. E, nesse sentido, eu creio que a primeira coisa seria o Presidente da Republicar dizer qual é a agenda, qual é a pauta sobre a qual ele quer conversar. Por exemplo, ele quer, sim, conversar sobre a garantia das instituições democráticas durante os quatro anos de Governo dele? Eu acho que seria um momento importante de as diversas lideranças partidárias, junto com o Presidente, discutirem o que precisamos fazer para que os três Poderes sejam igualmente respeitados e funcionem harmonicamente.

E aí eu digo um primeiro ponto desse diálogo: as eleições para Presidente das duas Casas. Ele quer dialogar? Vamos dialogar para que a eleição do Presidente da Câmara e do Presidente do Senado não termine transformando essas duas Casas em anexos do Palácio do Planalto, porque temos motivo para temer que isso aconteça, Senador. Da maneira como ouvimos ou lemos na imprensa, a sensação é de que não se trata de eleger o Presidente de cada uma dessas Casas com autonomia, e, sim, com submissão.

A sensação, hoje, é de que o Governo quer tutelar as duas Casas a partir do Presidente de cada uma delas. Mas não basta isso. Vamos ver se o Presidente, de fato, assume o compromisso de que nenhum aloprado ao lado dele vai propor um terceiro mandato. Muitos acham que é uma loucura pensar nisso, mas em outros países também se pensava que era uma loucura pensar em um terceiro mandato, e houve terceiro mandato em alguns países latino-americanos. Quem garante que isso não está na cabeça de alguns dos aloprados neste momento? E há uma maneira simples de fazer isso. Basta mandar para cá um projeto de lei propondo o fim da reeleição. Aprovado o projeto, alguém pode dizer: “Bem, a partir de agora, começa tudo de novo. Então, o Presidente Lula não foi eleito nenhuma vez ainda nessas condições de não ter reeleição”. E não vai faltar Poder Judiciário que aprove isso. Ou seja: há, sim, coisas a dialogar. Vamos dialogar, em primeiro lugar, a garantia das instituições democráticas.

Existe outro ponto. O próprio Presidente Lula falou que tem a intenção de fazer com que as famílias que usufruem o Bolsa-Família encontrem uma porta para sair da pobreza. Vamos discutir isso, vamos discutir como derrubarmos o muro da desigualdade neste País - duvido que aqui alguém reaja a isso -, mas não vamos dialogar com a ilusão de que alguns centavos a mais, alguns reais a mais ou algumas dezenas de reais a mais no Bolsa-Família tiram as famílias da pobreza.

O Senador Garibaldi é de um Estado que visitei, que conheci, que mostra que não são alguns reais a mais que os tirarão da pobreza. O que os tirará da pobreza são medidas estruturais. Eu defendo que seja a educação, mas alguns podem defender que são outras. Vamos fazer um diálogo entre os três Poderes, se necessário, ou, inicialmente, entre os dois Poderes políticos, o Congresso Nacional e o Executivo, para sabermos como criar uma porta no muro da desigualdade, como fazer com que saiam da pobreza tantos milhões de brasileiros.

Não é só isso. Vamos fazer um debate, sim, mas concreto, cuidadoso, sério, para a retomada do crescimento. Como vamos tratar o sistema financeiro no Brasil nos próximos quatro anos? Qual será a taxa de investimento que construiremos neste País nos próximos quatro anos? A quanto vamos conseguir trazer a taxa de poupança, sem o que um país não cresce? Vamos trabalhar como derrubar o muro do atraso, que não nos deixa chegar do outro lado do mundo desenvolvido.

O Presidente Lula falou que tem como sonho, nestes quatro anos, fazer do Brasil um país desenvolvido. Mas como? Com crescimento? Mesmo que seja 5%, 6%, 10% ao ano, não vamos ser desenvolvidos apenas com o aumento da produção nas nossas indústrias, na nossa agricultura, na nossa mineração. Algo mais é preciso. Por que não discutirmos isso? Vamos discutir. Vamos discutir se ele quer colocar na mesa um plano sério neste País para a gente garantir o patrimônio natural e desenvolver o patrimônio cultural do Brasil, que está sendo depredado. A gente fala muito da depredação da natureza, mas está esquecendo a depredação cultural deste país. A gente fala muito, e com razão, preocupados todos nós com os milhares de hectares que são destruídos por meio das queimadas das florestas da Amazônia, mas esquece a queimada dentro dos cérebros das pessoas que não adquirem educação. É uma queimada também. Existe a queimada das florestas e existem as queimadas dos neurônios. A gente está destruindo a cultura deste País ao não proteger a atividade cultural no Brasil.

O Presidente quer discutir um programa para isso? Discutamos. Não precisa que ele venha aqui, nem precisa que a gente vá lá. Mas, se for preciso até, temos mecanismos de encontro, mas encontro respeitoso, não beija-mão, como havia no tempo do Império, em que uma vez por semana, uma vez por mês, o imperador dizia que estava pronto para receber todos os súditos e punha a mão para ser beijada pelos Senadores vitalícios - vitalícios, mas submissos. Nós não somos vitalícios, e não podemos ser submissos.

Ele quer dialogar? Vamos dialogar, sim, sobre a reforma política, uma reforma política que faça com que candidatos a Presidente neste País tenham os mesmos recursos para levar adiante a sua campanha e não a desigualdade brutal que a Senadora Heloísa Helena atravessou, que eu atravessei e que outros atravessaram. Vamos fazer uma reforma política séria - vamos nos sentar para isso -, uma reforma política que acabe a reeleição, porque não é possível conviver com um processo eleitoral em que um dos candidatos tem tudo de facilidade na sua reeleição e outros têm tudo de dificuldade para sua eleição. Vamos discutir também o fim da reeleição, para impedir, inclusive, o sofrimento que o próprio Presidente Lula vai passar de já chegar lá com um débito muito grande, em vez de um capital, como é o caso do candidato quando ganha pela primeira vez e chega lá com esperança e não com denúncia. Essa é a diferença do processo da reeleição. O Presidente Lula, em vez de esperança, como no primeiro mandato, chega com denúncia. É um peso que ele carrega ao assumir o mandato, obviamente pelas falhas do seu governo.

Vamos discutir, sim, um programa de luta contra a corrupção. Vamos! Ponha na mesa, Presidente, um programa para acabar com a corrupção, garantindo, por exemplo, que não vai tentar impedir nenhuma CPI, que não vai deixar servidores sob suspeita continuarem nos cargos. Vamos fazer com que a Polícia Federal não responda apenas ao Poder Executivo, mas que, no momento de uma CPI, possa responder também ao Poder Legislativo. Vamos fazer uma agenda em que se inclua o desenvolvimento da ciência, da tecnologia e da cultura neste País, e vamos fazer com que isso não se limite a quatro anos. Vamos fazer com que esse projeto, esse debate, esse diálogo seja para vinte anos, para que os próximos Presidentes já saibam alguns compromissos que assumimos em nome do povo, e que ele, se eleito, vai ter que cumprir; que os próximos Presidentes saibam também que aqueles compromissos assumidos não serão interrompidos apenas pela má vontade da Oposição, de 2011 em diante.

Se o Presidente quer um diálogo, acho que nós todos estamos dispostos a esse diálogo. Agora, se ele quer reverência, acho que nenhum político sério, nenhuma política séria fará isso com o Presidente, porque ele não é um monarca. Aos monarcas se dá a prerrogativa do beija-mão; aos Presidentes se dá a possibilidade do diálogo.

Finalmente, trazendo um pouco a fala do Senador Efraim, quero dizer que, se o Presidente quer um diálogo, vamos começar pelo Orçamento. Vamos abrir, até o mês de dezembro, o Orçamento que ele mandou para cá, e não aprová-lo, como em geral tem sido feito, a partir de pequenas discussões e mudanças de recursos de um rubrica para outra, mas, sim, discutir toda concepção do Orçamento de 2007.

O Sr. Efraim Morais (PFL - PB) - Senador Cristovam, vamos aprovar o projeto do Senador Antonio Carlos Magalhães, do orçamento impositivo. Vamos começar esse diálogo.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Vamos. Pessoalmente, sou francamente favorável, e meu Partido também.

O Sr. Efraim Morais (PFL - PB) - E convocamos também o Governo para discutir.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Convocamos e faremos um verdadeiro diálogo. Ele traz as coisas deles e nós colocamos as nossas, dos nossos Parlamentares, dos nossos Partidos. Vamos discutir o orçamento impositivo e ter o apoio dele para isso e para tantos outros projetos que temos circulando nesta Casa, que duram dezenas de anos, às vezes, para serem aprovados. Se ele adquire, traz para o Poder Executivo e manda outra vez para cá, isso pode passar em poucos meses.

Não podemos nos negar ao diálogo e não temos o direito, diante do povo, de aceitar a reverência pura e simples. Diálogo, sim; beija-mão, não. O Presidente fez a abertura da idéia de diálogo. Estou trazendo aqui uma posição que posso dizer que é do meu Partido. Agora, que ele faça o gesto seguinte, diga qual é a agenda, qual é a pauta, a que objetivo ele quer chegar. Estamos dispostos a, daqui mesmo, sem precisar ir lá, sem precisar que ele venha aqui também, fazer esse diálogo perfeitamente e chegarmos a um conjunto de idéias e propostas que beneficiem o povo brasileiro.

Era isso que eu tinha a dizer, Sr. Presidente. Agradeço a sua generosidade pelo tempo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/11/2006 - Página 33307