Discurso durante a 189ª Sessão Especial, no Senado Federal

Abertura da Segunda Semana de Valorização da Pessoa com Deficiência.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Abertura da Segunda Semana de Valorização da Pessoa com Deficiência.
Publicação
Publicação no DSF de 22/11/2006 - Página 34890
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • AVALIAÇÃO, DESENVOLVIMENTO, PAIS, QUALIDADE, JUSTIÇA, TRATAMENTO, PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA, REGISTRO, INICIO, EVOLUÇÃO, BRASIL, NECESSIDADE, REFORÇO, COMPENSAÇÃO, DEFICIENCIA, ERRADICAÇÃO, DISCRIMINAÇÃO.
  • EXPECTATIVA, APROVAÇÃO, SENADO, OBRIGATORIEDADE, TELEVISÃO, CODIFICAÇÃO, LINGUAGEM, ATENDIMENTO, SURDO, MUDO.
  • DEFESA, PRIORIDADE, COMBATE, DESIGUALDADE SOCIAL, AGRAVAÇÃO, DISCRIMINAÇÃO, BRASIL.
  • COMPARAÇÃO, ANALFABETISMO, DEFICIENCIA FISICA, DEFESA, PRIORIDADE, EDUCAÇÃO, FORMA, INCLUSÃO, PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA.

           O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Renan Calheiros, senhores e senhoras que compõem a Mesa - caro amigo Skaf, Marcos Frota, todos os demais - minhas senhoras e meus senhores, não há qualquer indicador melhor de uma civilização do que o tratamento correto, justo e eficiente aos portadores de deficiência. Muito mais do que o tamanho dos prédios, o número de automóveis, o Produto Interno Bruto, muito mais do que indústria, o que realmente define um País, uma sociedade com civilização, é o fato de conseguir que as pessoas sejam tratadas igualmente, sem discriminação e com suas deficiências intrínsecas compensadas pelas diversas formas de que o mundo hoje já dispõe e que a ciência e a tecnologia hoje já oferece.

Alegro-me por estar aqui e sentir uma marcha pela civilização no Brasil, mas é preciso reconhecer que ainda estamos muito longe. Estamos muito longe, porque ainda não conseguimos fazer com que as deficiências sejam compensadas com apoios nem conseguimos fazer com que a discriminação seja eliminada.

O Brasil vai ser um País civilizado no dia em que ninguém deixar de andar por falta do apoio de um equipamento que permita o seu deslocamento, quando ninguém deixar de ver por falta de cirurgia ou de óculos, quando ninguém deixar de ouvir por falta de um aparelho ou de uma cirurgia, e quando nenhum adulto portador de deficiência auditiva deixar de entender o que é dito por falta de uma linguagem como esta utilizada na sessão especial de hoje.

Sabemos que está muito distante esse tempo. Para se ter uma idéia, temos tradução hoje porque se trata de uma sessão especial, mas todas as sessões do Senado já deveriam ter traduções para os portadores de deficiências auditivas. A Câmara dos Deputados já deveria ter isso. A TV Senado deveria fazer essa tradução simultânea. Já temos projeto de lei andando nesse sentido. É preciso aprová-lo.

Mas não quero falar apenas da deficiência de uma maneira geral. Quero lembrar que, no caso do Brasil, não dá para trabalhar nenhum ente social de maneira global sem analisar que ele se divide em duas partes: pobres e ricos. Quando falamos das mulheres, com todas as discriminações que sofrem, com toda desigualdade, temos ainda que fazer a diferença: as pobres e as não pobres. Quando falamos dos negros, com todas as características específicas de todos os negros, pela discriminação e pelos séculos de escravidão que os mantêm até hoje diferenciados, temos que lembrar que há ainda mais uma diferença: pobres e ricos. E, entre os portadores de deficiência, também existe essa diferença. É preciso quebrar isso. É preciso reconhecer não apenas que os portadores de deficiência precisam de ajuda, mas também que aqueles que são pobres além de portadores de deficiência exigem mais atenção ainda do que aqueles que, com seus recursos, conseguem às vezes compensar suas deficiências.

Esse é um ponto para o qual queria chamar a atenção. Não há no Brasil nada geral; tudo é dividido em duas partes. Crianças: ricas e pobres; negros: pobres e ricos. Cada um está dividido entre ricos e pobres. Temos que trabalhar a quebra da diferença dentro da diferença. A diferença dos que têm deficiência e a diferença entre os que têm deficiência.

Quero lembrar também uma diferença invisível, uma deficiência invisível que às vezes esquecemos, como se não fosse deficiência. Falo da falta de escolaridade.

Uma pessoa sadia que enxerga, que anda, que ouve, mas que é analfabeta carrega uma deficiência que temos que compensar. A deficiência de não saber ler torna a pessoa de certa forma cega para muitas coisas, impossibilita-a de ouvir, pela leitura, muitas coisas, impede a pessoa de locomover-se, porque não é capaz de fazer viagens lendo um romance.

A educação não apenas é um instrumento para corrigirmos a deficiência intrínseca da falta de educação, mas ela é também o melhor instrumento para incluir os portadores das deficiências físicas e mentais.

Por isso, falando hoje aqui na semana das pessoas com deficiência, não podemos esquecer que, dentro desse mesmo universo, estão as pessoas sem acesso à educação. Elas são portadoras de deficiência e merecem ser lembradas, merecem que procuremos compensar essa deficiência da falta da educação, para que elas usem a escola como a melhor de todas as cadeiras de rodas, porque é uma forma de libertar as pessoas; para que elas usem a escola como os melhores óculos, porque permite ver o mundo através do estudo. Vejamos a escola como o instrumento principal da quebra das duas deficiências, a deficiência tal qual é chamada e a deficiência daqueles que são, além disso, pobres.

A escola é o berço da deficiência e o berço da desigualdade quando comparamos os que têm e os que não têm. Portanto, a escola é também o berço da igualdade e da quebra da deficiência para aqueles que têm acesso a ela, principalmente se ela for feita olhando com os olhos, com os ouvidos, com as pernas dos que precisam ter pernas, ouvidos e olhos.

Parabéns, Sr. Presidente, por esta sessão.

Espero que daqui saia uma lição: sociedade civilizada é aquela em que não há ninguém que não tenha a compensação das suas deficiências. Esse é o nosso desafio como Senadores. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/11/2006 - Página 34890