Discurso durante a 197ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem aos evangélicos pela comemoração, hoje, do Dia do Evangélico.

Autor
José Sarney (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: José Sarney
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem aos evangélicos pela comemoração, hoje, do Dia do Evangélico.
Aparteantes
Edison Lobão.
Publicação
Publicação no DSF de 01/12/2006 - Página 36416
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, DIA, MEMBROS, IGREJA EVANGELICA, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), ELOGIO, ATUAÇÃO, LIDERANÇA, IGREJA, BENEFICIO, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA, REGISTRO, PENSAMENTO, RELIGIÃO, CRISTÃO.

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, eu quero juntar-me a todos os pronunciamentos que aqui foram feitos sobre a data de hoje, em que em Brasília se comemora O Dia do Evangélico. Sou católico praticante, mas tenho presente na minha formação aqueles ideais fundamentais que foram consagrados por Jefferson quando ele foi o autor da Declaração dos Direitos Humanos sobre a liberdade do homem de crença, de raça e de religião. Quero assinalar o trabalho que realmente os evangélicos têm feito em nosso País um trabalho notável, não só da pregação dos princípios morais do Evangelho, como também em obras sociais a que eles estão dedicados nas suas missões em quase todos os lugares do País.

Quero lembrar que, quando eu exercia a Presidência da República, recebi uma comissão de evangélicos. Se me recordo bem, eram da Assembléia de Deus. Eles me pediam que fizéssemos um gesto no qual o Governo pudesse lembrar diariamente a todas as pessoas a presença de Deus em nossas vidas. Então nasceu aquele desejo e aquela ordem, que em seguida determinei à Casa da Moeda, que em todas as cédulas do Brasil colocássemos a expressão “Deus seja louvado” para que, realmente, o lado espiritual, a transcendência estivesse sempre presente em todos os nossos atos. Desde o tempo de Cristo, Ele recomendava quando olhava a moeda, “A César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.

Os evangélicos têm, de certo modo, representado aquilo que era a Igreja primitiva, a Igreja dos pobres, a Igreja das catacumbas, a Igreja que ainda não tinha sacerdotes formados e na qual ainda ninguém tinha especulação filosófica ou de natureza teológica maior sobre as práticas e a existência de Deus, mas se reunia em torno de coisas simples, que eram do entendimento fácil das pessoas e que, de certo modo, refletiam o ensinamento de Cristo, porque a revolução que Ele fez no pensamento humano, desde que chegou e começou a pregar, foi realmente a de coisas muito simples. Por exemplo, naquele tempo em que Ele viveu não se tinha noção senão de castas, de escravos, de senhores, e Ele veio com uma mensagem extremamente renovadora para todas as pessoas. Era uma mensagem muito simples e de bom entendimento. Ele dizia: todos somos irmãos, porque todos somos filhos de Deus. A partir daí, incorporamos essa mensagem de que todos nós somos irmãos, porque todos nós somos filhos de Deus.

Depois, Ele também vem e prega outra coisa simples, de entendimento muito fácil: “Amai-vos uns aos outros”. Não precisa nenhuma pessoa ter formação teológica, nenhuma especulação filosófica para sentir que essa mensagem tem uma profundidade extraordinária. “Amai-vos uns aos outros e ao próximo como a ti mesmo”. Ele não fala em amar a humanidade, Ele fala em amar o próximo, quer dizer, aquele que está mais próximo.

São ensinamentos muito simples. “Rezai pelos vossos inimigos”. Como se podia pensar que, naquele tempo, viesse uma pregação dessa natureza; que num tempo de tamanha violência, de ódio, que se pedisse às pessoas que rezassem pelos inimigos e que, quando fossem ofendidas, oferecessem a outra face. Foram esses ensinamentos simples que surgiram no princípio do Cristianismo, na Igreja dos pobres, na Igreja das catacumbas.

Ao longo da minha vida pública no interior do Brasil, tenho presenciado que os evangélicos, de certo modo, buscam o renascimento dessa Igreja primitiva, dessa Igreja dos pobres, dessa Igreja simples, na qual os pastores são gente simples, de família bem constituída, de família exemplar. Eles fazem isso. E o Padre Vieira, no Sermão da Sexagésima, já dizia que devemos pregar pelo exemplo mais do que pelas palavras.

Muitas vezes, nas pregações de grande concentração das Igrejas Evangélicas que testemunhei, aquela gente simples dava o exemplo da formação familiar, da pregação moral, dos programas sociais de recuperação dos jovens e de como colocar na juventude esses ideais, que são os ideais das leis morais, que são fundamentais.

Voltaire era um homem que não acreditava em Deus. Ele tinha uma obra extraordinária, mas não acreditava em Deus. Ele dizia que o melhor código moral que temos é o código de Moisés, é o código que Deus entregou a Moisés, quando ele trazia o povo de Israel do Egito. E esse código está resumido em dez mandamentos. “Amai a Deus sobre todas as coisas” é o primeiro mandamento. Esse primeiro mandamento também está ligado ao problema das virtudes teologais, da fé, da esperança, da caridade, que estão juntas a esse mandamento de amar a Deus sobre todas as coisas, porque não se pode amá-Lo sem que se tenha fé, sem que se tenha esperança, que é a esperança que São Paulo falava, que é a esperança da ressurreição. São Paulo dizia que sem ressurreição não há cristianismo. E não se pode amá-Lo sem a caridade, que é justamente o exercício dessa virtude do amor ao próximo.

Estou vendo aqui a nossa Senadora Patrícia Saboya Gomes e estou me lembrando de um tratado sobre os Dez Mandamentos do Monsenhor Quinderé, do Ceará. E me lembro de que, no meu tempo de colégio, líamos, nos Maristas, esse tratado sobre os Dez Mandamentos, que fala justamente nas virtudes teologais.

Portanto, penso que, por tudo isso, devemos hoje associar-nos e ressaltar o da Igrejas Evangélicas no Brasil, extraordinário, grande, sobretudo nas periferias. Elas, hoje, vêm trabalhando de maneira fantástica.

Presenciei, nessa campanha eleitoral, como eles se reuniam. Participei de muitas reuniões, muitas marchas da juventude. Assisti a um culto de oração com mais de cinco mil pessoas presididas pelo Pastor Lucifrance, em Santana, no Amapá. Foram cinco dias de orações e de extrema meditação. Ficávamos tocados quando víamos aquela gente simples acreditando em Deus e tendo fé. Sentíamos que algo de sobrenatural estava naquela missão deles todos.

Trago, sobretudo, uma palavra aos pastores. Pergunta-se por que eles dedicam toda a sua vida, do princípio ao fim, à pregação, a fazer o bem, a pregar os ideais morais, ideais de bondade e, ao mesmo tempo, de convivência humana. Por amor a quem? Por amor a Deus. Sentimos que esse amor de Deus é profundo nos evangélicos, como nos nossos sacerdotes, missionários e padres católicos. Estendemos essa comparação a todos eles, não somente às nossas religiões, à minha religião.

Há muitos e muitos anos, no Maranhão, quando era Governador do Estado, há 40 anos, conheci o Pastor Estevão, um homem santo. Se havia um homem santo, era aquele homem. Toda sua vida era dedicada à sua igreja, a Assembléia de Deus. Ele morreu em um acidente, fato que comoveu a cidade inteira, todas as correntes, todas as religiões, todos, de qualquer credo. S. Sª era, realmente, a expressão de uma pessoa boa. Era uma dessas pessoas que a gente sente que transmitem algo de sobrenatural. Recordo-me do Pastor Estevão.

Recordo-me, também, de que conheci recentemente o trabalho feito pelo Bispo Sérgio. Aqui mesmo temos um homem que é um exemplo: o Senador Crivella. O seu rosto já transmite bondade. S. Exª se dedicou durante dez anos à evangelização da África. Quaisquer que sejam as nossas diferenças religiosas temos que reconhecer o que significa um gesto dessa natureza em termos de renúncia. Falo desses que são dedicados à igreja evangélica e do que representam.

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Com muita honra, Senador Edison Lobão.

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - Senador José Sarney, é reconfortante ouvir, em uma tarde de quinta-feira, V. Exª se valer de sua ampla, de sua vasta cultura, para nos trazer a palavra de Cristo e homenagear o Dia do Evangélico. Em verdade, a partir de Jesus Cristo, operou-se uma transformação no mundo. Tem V. Exª toda a razão quando alude à violência que se praticava durante o império romano. Jesus, levado à presença de Pilatos - este na tentativa de salvar Jesus Cristo -, em dado momento, já levado à exasperação, chama Jesus a uma sala e lhe pergunta: “Você não se defende? Afinal, quem você é?” Jesus responde-lhe: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida.”

Foi aí que Pilatos perguntou a Ele: “E o que é a verdade?” Jesus não respondeu e, por conta disso, nunca mais se soube o que é definitivamente a verdade. Daquele momento em diante, de fato, houve transformações profundas no comportamento das pessoas. Jesus tinha a capacidade imantadora em relação às pessoas que o cercavam. Conta a história que Pedro, que foi o Seu primeiro apóstolo, saindo de Roma, perseguido pelo Império Romano, em dado momento, encontrou-se com a imagem de Jesus, que havia sido crucificado. Jesus lhe perguntou: “Para onde vais?”. Pedro, então, contou que estava saindo dos muros de Roma, para escapar da perseguição do Império Romano. Jesus, então, se propôs a entrar em Roma em lugar de Pedro, para ser outra vez crucificado. Foi neste momento que Pedro disse: “Não, senhor, entro eu”. Então, voltou Pedro e pediu que fosse crucificado de cabeça para baixo, porque ele não podia ser igual a Jesus. Quanto a nossos evangélicos, V. Exª dissertou tanto sobre eles, lembrando a figura do Pastor Estevão. E eu aqui falo também da figura da viúva do Pastor Estevão, Dona Giseuda, que prossegue na luta evangelizadora e de assistência social dele. É uma senhora admirável. V. Exª lembrou o nosso Bispo Crivella, Senador Marcelo Crivella, que tanto nos ajuda aqui com a sua orientação religiosa. Lembro também o Bispo Edir Macedo, que criou essa igreja extraordinária, a Igreja Universal, que tantos e tão bons serviços tem prestado à Humanidade - digo à Humanidade porque está em quase todos os países, na Europa inteira. Em 135 países já se encontra a Igreja Universal. Também o Missionário R. R. Soares é outro grande líder evangélico em nosso País. Enfim, Senador Sarney, cumprimentos a V. Exª por trazer, nesta tarde, um tema de tão grande importância, e que os evangélicos prossigam na sua luta em benefício de todos. Quando V. Exª mandou inscrever nas cédulas brasileiras essa expressão “Deus seja louvado”, lembro-me de que alguns brasileiros não gostaram, como se este País não tivesse nascido sob o signo da religiosidade. Aí está a memória dos nossos padres: Anchieta, Nóbrega, todos eles vieram na gênese do Brasil, na criação do Brasil. Portanto, o que fez V. Exª foi até um ato de justiça para com a religião que ajudou a criar este nosso País. Muito obrigado a V. Exª.

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Senador Lobão, eu que agradeço pela oportunidade de ouvir um aparte de tamanha beleza e tão substancial como o feito por V. Exª, que só vem enriquecer o meu discurso; também vem me recordar das leituras da minha vida, quando V. Exª se refere à frase de Pilatos: “O que é a verdade?”. Dom Miguel de Unamuno, no seu livro “Sentimento Trágico da Vida”, ele diz que essa frase é a pergunta mais misteriosa de todo o Evangelho.

Ele diz que só essa pergunta “o que é a verdade?” é a mais importante de todas que se encontram no Novo Testamento. Só que a verdade - ele mesmo diz - é Deus, era o próprio Jesus porque São João diz no seu Evangelho que Deus é luz, e ele chega com essa idéia da luz. Ele diz que, no princípio, era o Verbo, para dizer que a palavra é que criava porque antes de tudo vem a palavra. E ele então disse, quando falamos assim: a palavra. A palavra era isso que São João dizia: no princípio era o Verbo, e o Verbo era luz. Ele diz isso. Essa palavra que vem, que cria, que ilumina e que dá a todos nós a revelação dos mistérios da vida.

Portanto o aparte de V. Exª só faz enriquecer o meu discurso. E mais uma vez, associo-me também à lembrança dos nomes. Citei poucos - e V. Exª junta aqui - todos engajados na luta dos evangélicos no Brasil todo. Exemplo do Bispo Edir Macedo e do nosso, repetindo uma vez mais, Crivella.

Quero dar um testemunho. Eu vi o Crivella Senador, eu vi o Crivella debatedor político, eu vi o Crivella candidato, mas assisti a um culto no qual tínhamos mais de cinco mil pessoas - infelizmente V. Exª não estava lá - e vi o Crivella pregar. De repente, Sr. Presidente, eu vi um homem transformado, eu vi um homem transfigurado. Eu vi um homem inteiramente diferente daquele que nós estamos acostumados a ver aqui. Foi como se, de repente, descesse sobre ele alguma coisa de sobrenatural, que fazia uma sublimação das suas palavras. Ele fez uma pregação extraordinária, que me impressionou profundamente pelo que ele demonstrou, pelo que ele falou, pelo que ele ensinou e - esta palavra que é tão profunda - pelo que ele pregou, pelo que ele evangelizou.

Eram estas as palavras que eu queria proferir nesta tarde, congratulando-me com todos os evangélicos do Brasil pelo que têm feito pelo País, pelo trabalho religioso, pelo trabalho moral, pelo trabalho social que têm realizado pela nossa Pátria, sobretudo pelos jovens que eles têm trabalhado para encaminhar, para retirar da violência, do vício, do niilismo. Hoje, de certo modo, sem esperança, grande parte da juventude cai nesse niilismo, que é a falta de esperança, a falta de crença, e então desbanda para o vício, o alcoolismo, todas essas formas de degradação da própria vida que são os tóxicos.

Portanto, vamos encerrar a nossa palavra nesta tarde para homenagear não só os evangélicos mas também a todos os cristãos, pedindo a Deus que proteja o nosso País, sobretudo a nossa juventude, e que reconheça, como tem reconhecido, aqueles a quem Ele entregou essa missão de evangelizar, tão bem representada por todos aqueles que no Brasil fazem as Igrejas Evangélicas.

Muito obrigado.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/12/2006 - Página 36416