Discurso durante a 200ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro da posse ocorrida na semana passada, do jurista e Professor Celso Lafer, na Academia Brasileira de Letras.

Autor
Marco Maciel (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Registro da posse ocorrida na semana passada, do jurista e Professor Celso Lafer, na Academia Brasileira de Letras.
Publicação
Publicação no DSF de 07/12/2006 - Página 37284
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, CELSO LAFER, EX MINISTRO DE ESTADO, ITAMARATI (MRE), PROFESSOR, ESCRITOR, JURISTA, POSSE, ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS (ABL), DETALHAMENTO, BIOGRAFIA, VIDA PUBLICA, INTELECTUAL, ELOGIO, ATUAÇÃO, EFICACIA, REPRESENTAÇÃO, BRASIL, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMERCIO (OMC).

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, ilustre Senador João Alberto, da representação do Estado do Maranhão do Senado Federal, ao cumprimentá-lo quero estender meus cumprimentos às Srªs e aos Srs. Senadores aqui presentes.

Sr. Presidente, venho à tribuna para registrar a posse, ocorrida sexta-feira da semana passada, do jurista, professor e escritor Celso Lafer, na Academia Brasileira de Letras.

Como se sabe, Celso Lafer tem uma rica biografia, não somente no campo da Universidade, posto que é titular da Faculdade de Direito da Universidade do Largo São Francisco, que pertence à USP, mas também foi em três oportunidades Ministro de Estado, representou o Brasil no exterior, inclusive na OMC, na sua sede na Suíça e, como disse, tem uma vida muito rica no campo da Academia.

Devo dizer que a Faculdade de Direito pela qual ele se formou, a do Largo São Francisco, foi criada na mesma ocasião em que foi criada a Faculdade de Direito da hoje Universidade Federal de Pernambuco. Ambas foram produto de um projeto do Visconde de São Leopoldo que foi sancionado no dia 11 de agosto de 1827. Antes, como sabemos, qualquer pessoa que pretendesse fazer curso de Direito teria que ir para Lisboa ou procurar outra universidade européia. Portanto, nós não podemos deixar de reconhecer a significação que teve para todos nós a criação dos cursos jurídicos no Brasil, um sediado em São Paulo, na Região Sul-Sudeste do País e outra na Região Norte-Nordeste, que foi o caso da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco, que começou suas atividades em Olinda, então cidade mais importante do que o Recife.

Celso Lafer, Sr. Presidente, nasceu em uma família de mestres. Seu pai era advogado pela Faculdade Paulista e a mãe, D. Bete, professora de curso primário, na época do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova de 1932, que, como se sabe, foi redigido por Fernando de Azevedo.

Já na ocasião, Celso Lafer, como estudante, extremamente aplicado. Conta inclusive uma história de que certa feita a mãe dele procurou o Professor Antônio Cândido, que era seu professor e fez um apelo: “Eu gostaria que o senhor falasse com o meu filho para ele não estudar tanto, porque ele fica o dia todo estudando”. O Professor Antônio Cândido disse: “Não posso atender a esse apelo da senhora, porque a maioria das mães que aqui vêm é pedindo para que eu faça um apelo no sentido de que eles estudem mais. E a senhora, pela primeira vez, faz um pedido heterodoxo no sentido de que eu faça um apelo para que ele estude menos”. Isso demonstra bem como era e é bem aplicado o Celso Lafer.

Sr. Presidente, na Academia Brasileira de Letras, ocorrem coincidências desde a fundação há mais de um século. No próximo ano, em julho, a Academia vai fazer 110 anos de existência, e a cadeira que será ocupada por Celso Lafer, a de nº 14, tem uma característica - uma coincidência feliz: todos os seus integrantes, a partir do seu fundador, são professores. São mestres, portanto. E o mesmo ocorre agora, com todos os títulos, com Celso Lafer.

Ele é um intelectual, desde muito jovem dedicado à vida da cultura, praticada com fecundidade num longo itinerário. Em todos os cargos que exerceu, ele permaneceu sempre um intelectual.

Celso Lafer foi aluno e sucessor do Professor Miguel Reale na Faculdade de Direito da USP, a que já me referi. Há também algo extremamente significativo e que não deixa de ser uma coincidência: ele vem justamente suceder a uma grande figura da cultura jurídica brasileira, o professor Miguel Reale. Ele foi seu aluno, foi depois seu assistente e, finalmente, seu sucessor.

Falar em Miguel Reale é falar em alguém que deu uma relevante contribuição como jus-sociólogo, como um grande filósofo, autor, inclusive, da Teoria Tridimensional do Direito e também como um grande doutrinador, sem contar que Miguel Reale fez incursões - e não foram poucas - no campo da literatura e, inclusive, no campo da poesia. Ele era um grande admirador de Dante Alighieri.

Sr. Presidente, prossigo, observando que Miguel Reale nos deixou no passado e agora tem a ocupar sua cadeira o Professor Celso Lafer. Aliás, uma das últimas contribuições de Miguel Reale ao Direito brasileiro e ao aprimoramento das nossas instituições jurídicas foi certamente o novo Código Civil, que veio em substituição ao anterior, de 1916, coordenado, sobretudo, por Clóvis Bevilacqua, que também pertenceu à Academia Brasileira de Letras.

Miguel Reale, inclusive, chamava esse Novo Código Civil de a Constituição do Cidadão, pela universalidade de temas de que trata o Código e também pela compreensão de novos institutos que surgiram em função da evolução da sociedade.

Gostaria de lembrar, voltando a Celso Lafer, que ele fez o seu doutoramento na Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, onde conheceu Hannah Arendt, que foi a orientadora da sua tese. Trata-se de uma grande filósofa e também doutrinadora no campo da ciência política. Hannah Arendt era alemã, naturalizada americana, e Celso Lafer, talvez, se tornou como a pessoa que mais conhecia a sua obra em nosso País. Aliás, ele começa o seu discurso na Academia fazendo uma citação de Hannah Arendt, dizendo que o conhecimento cabe à pessoa, mas o reconhecimento é algo que não lhe pertence.

E também, lá, na ocasião, Celso Lafer teve a oportunidade de conviver com Octávio Paz, o extraordinário ensaísta mexicano, que, inclusive, recebeu o Prêmio Nobel de Literatura. Ambos, Hannah Arendt e Octávio Paz, vieram a exercer profunda influência no pensamento de Celso Lafer. Uma outra personalidade depois - por que não dizer? - passou a exercer uma grande influência na obra de Celso Lafer. Refiro-me ao grande cientista político italiano Norberto Bobbio, recentemente, falecido.

Celso Lafer, como disse no início da minha exposição, serviu, representando o Brasil, na Organização Mundial do Comércio, onde defendeu nossos interesses com ardor, com competência.

Sua passagem pelo Itamaraty marcou a nossa política externa - ele que é também um discípulo de Rio Branco. E quando se fala em política externa brasileira, uma referência inevitável é Rio Branco. Porque ele não somente formulou os grandes paradigmas da política externa brasileira, mas também foi uma figura excepcional nas negociações que concluíram por definir as fronteiras do Brasil. O Brasil tem muitos Países vizinhos, mas não tem problema com seus vizinhos, posto que as fronteiras são rigorosamente delimitadas pelo talento de Rio Branco, que para isso recorreu a ações políticas e ao arbitramento, sempre com reconhecido êxito. Por isso, podemos dizer que Rio Branco é uma personalidade que, de alguma forma, tem um papel muito destacado na formulação da política externa brasileira, que se revelou também na ação de Celso Lafer como Ministro das Relações Exteriores.

À frente do Ministério das Relações Exteriores em duas oportunidades, ele exerceu uma política pragmática sem preconceitos ideológicos, política aberta que nos levou à mais ampla e profunda diversificação das nossas exportações e importações. Sem se envolver em polêmica, preferiu a discrição e operou tranqüilamente rumo ao êxito por todos conhecido.

Sr. Presidente, de volta à cátedra, depois de relevantes funções públicas exercidas, Celso Lafer prosseguiu seu trabalho como advogado e como mestre. Sua tese de doutoramento nos Estados Unidos foi o desenvolvimento da Presidência Juscelino Kubitschek. Ainda sobre a época de Cornell dedicou também um estudo clássico à antiga mestra, sob o título Hannah Arendt (Pensamento, Persuasão e Poder). Em seguida, escreveu A Reconstrução dos Direitos Humanos (Um Diálogo com o Pensamento de Hannah Arendt). É Celso Lafer, portanto, um intelectual humanista, ao lado de um grande negociador, quer como advogado quer como homem público. Na sua posse, ele pronunciou um modelar e denso discurso, cheio de cultura e demonstrador de sua grande inteligência. Nas suas palavras, como eu disse, ele lembrou Hannah Arendt, quando ela dizia que “o conhecimento está ao nosso alcance. O reconhecimento, não”.

Ao encerrar o seu discurso, Celso Lafer lembrou Bobbio, numa frase muito expressiva. Bobbio, num dos seus últimos livros, disse: “A política divide, a cultura une, pois a política vive do conflito e a cultura vive do diálogo”.

Celso Lafer, portanto, agora passa a ocupar uma cadeira para a qual ele foi eleito à unanimidade pelos membros da Academia, a cadeira de nº 14. Desejo, portanto, aproveitar a ocasião para felicitá-lo pela posse na Academia, onde foi saudado - é bom também mencionar - pelo excelente advogado e escritor Alberto Venancio Filho, que fez também um discurso de saudação extremamente compatível com o discurso de Celso Lafer. E, portanto, não posso deixar de aproveitar a ocasião para cumprimentar a Academia Brasileira de Letras pela posse de Celso Lafer em seus quadros, na certeza de sua contribuição ao desenvolvimento cultural do nosso País.

Quero ainda estender os meus cumprimentos ao Ministro Marcos Vilaça, Presidente da Academia, pela cerimônia de posse de Celso Lafer, e cumprimentar de modo particular o Professor, Jurista e Escritor, Alberto Venancio Filho, pelo discurso de saudação que fez a Celso Lafer.

Sr. Presidente, concluo, portanto, as minhas palavras agradecendo o tempo que V. Exª me destinou e pedindo que considere como lidos trechos a que não me referi na minha oração verbal.

Muito obrigado a V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/12/2006 - Página 37284