Discurso durante a 62ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração do centésimo quadragésimo segundo aniversário de nascimento do Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon.

Autor
Flexa Ribeiro (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PA)
Nome completo: Fernando de Souza Flexa Ribeiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Comemoração do centésimo quadragésimo segundo aniversário de nascimento do Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon.
Publicação
Publicação no DSF de 04/05/2007 - Página 12437
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, CENTENARIO, COMISSÃO, CONSTRUÇÃO, LINHA DE TRANSMISSÃO, TELEGRAFIA, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), ESTADO DO AMAZONAS (AM), OPORTUNIDADE, HOMENAGEM, ANIVERSARIO, CANDIDO MARIANO DA SILVA RONDON, MARECHAL, ELOGIO, TRABALHO, DEFESA, REGIÃO AMAZONICA, AMPLIAÇÃO, CONHECIMENTO, TERRAS, POPULAÇÃO, COMUNIDADE INDIGENA, BRASIL, INCENTIVO, RESPEITO, VALORIZAÇÃO, GRUPO INDIGENA.

            O SR. FLEXA RIBEIRO (PSDB - PA. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, celebrar o centenário da “Comissão Construtora de Linhas Telegráficas e Estratégicas de Mato Grosso ao Amazonas”, que passou a ser conhecida como Comissão Rondon quando o então Major Cândido Mariano da Silva Rondon assume seu comando, é celebrar um dos maiores feitos do último século. Não é por acaso que o nome de Rondon está inscrito em letras douradas, ao lado dos de outros grandes exploradores, na Sociedade Geográfica de Nova Iorque, que lhe concedeu, em 1914, o Prêmio Livingstone. De fato, até hoje Rondon é considerado um dos maiores - se não o maior - exploradores de terras tropicais do planeta. Durante o meio século que passou nas selvas, percorreu cerca de 70 mil quilômetros, num espaço que corresponde aproximadamente ao território de um país como a França.

            Para nós, brasileiros, no entanto, a importância da expedição chefiada por Rondon vai muito além da aventura, do feito de um grande explorador. A expedição de Rondon representou, de fato, um desses momentos cruciais em que tomamos consciência de nós mesmos, do que somos. Rondon abriu e revelou para os brasileiros um País profundo, desconhecido, isolado. Abrindo caminhos - o percurso de sua expedição definiu o traçado da atual BR-364 -, instalando linhas telegráficas e nos ensinando a olhar para a cultura indígena com olhos mais compreensivos, Rondon ajudou a ampliar o conhecimento que temos de nosso próprio País.

            Na década anterior à partida da Comissão Rondon, outra expedição ao Brasil profundo e desconhecido também nos ajudou a criar nova consciência de nós mesmos. Refiro-me, Sr. Presidente, às diversas expedições que constituíram a campanha de Canudos, tão intensamente descrita pelo grande Euclides da Cunha - contemporâneo de Rondon, apenas um ano mais novo. Nada mais revelador da grande obra de Rondon do que o contraste entre essas duas expedições: a que resultou no massacre de Canudos e a que abriu a Amazônia para os brasileiros. Rondon mostrou que a marcha do Brasil moderno em direção aos seus rincões mais afastados não precisa ser violenta. Mostrou que a integração não implica coerção. É significativo que, no mesmo ano em que o exército norte-americano massacrou os últimos índios Sioux remanescentes da revolta de 1890, Gomes Carneiro e Rondon, que então construíam a linha telegráfica Cuiabá-Araguaia, tenham mandado afixar uma placa, em Mato Grosso, que anunciava que quem perseguisse os índios Bororo seria punido pelo Exército Brasileiro.

            Não foi por menos que o Congresso Universal das Raças e o 18º Congresso Internacional de Americanistas, reunidos em Londres em 1912, reagindo às atrocidades cometidas no Peru contra índios, apelaram para que os países que têm populações indígenas em seus territórios adotassem métodos protecionistas como os defendidos e praticados por Rondon no Brasil. Também não foi por acaso que, até às vésperas de sua morte, o nome de Rondon tenha sido diversas vezes lembrado para receber o Prêmio Nobel da Paz.

            Por tudo o que resultou das expedições de Rondon no comando da Comissão que levou seu nome, Sr. Presidente, quase podemos dizer que a instalação das linhas telegráficas, sua motivação inicial, empalidece. Além de militares e engenheiros, a Comissão contou também com cientistas. As várias expedições contribuíram largamente para o conhecimento etnológico, antropológico, lingüístico, geológico, botânico e zoológico do interior do Brasil, e ajudaram a numerosos cientistas nas suas pesquisas. Só para citar alguns nomes mais célebres, entre os cientistas que participaram de alguma das expedições, estavam Edgar Roquette Pinto, antropólogo, Alípio Miranda Ribeiro e Adolfo Lutz, zoólogos, Gastão Cruls, naturalista, Frederico Hoehne e João Geraldo Kuhlmann, botânicos, além de geógrafos, geólogos e mineralogistas. No final das contas, a Comissão Rondon encaminhou ao Museu Nacional 3.380 artefatos indígenas, 8.837 espécies de plantas, 5.676 espécimes animais, além de identificar rios - foram 12, ao todo -, acidentes geográficos - foram duzentas novas coordenadas geográficas - e descobrir diversas jazidas minerais.

            Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, Rondon nos deixou diversas heranças - e um desafio. Dele herdamos uma visão mais rica de nosso País e uma postura mais humanista com relação às populações originárias do Brasil. A ele devemos o início da integração efetiva da Amazônia ocidental ao restante do País.

            O desafio que nos lega Rondon é o de permanecermos fiéis ao seu espírito de pacificador. Hoje, não se fala mais de pacificação, mas de inclusão. O exemplo de Rondon é ímpar - tanto para sua época quanto para a nossa: de aceitação, respeito e valorização da diferença.

            Mais ainda, permanecer fiel ao espírito da obra de Rondon é ir além: é garantir que os caminhos que ajudou a abrir através da selva levem prosperidade e justiça para todos os povos que habitam o norte de nosso País. Essa é uma obra que, cem anos depois de sua expedição, permanece inacabada. Cabe a nós, lembrando de seu exemplo, concluí-la.

            Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/05/2007 - Página 12437