Discurso durante a 83ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Voto de pesar pelo falecimento da Sra. Dolores Garcia Rodrigues, mãe da Deputada Federal Rebecca Garcia. Presença de 78 alunos da Escola Comunitária de Campinas em audiência com S.Exa. e o Senador Eduardo Suplicy. Apelo ao Líder do Governo no Senado, pela manutenção do acordo para garantir benefícios fiscais a empresas da Zona Franca de Manaus.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. SENADO. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Voto de pesar pelo falecimento da Sra. Dolores Garcia Rodrigues, mãe da Deputada Federal Rebecca Garcia. Presença de 78 alunos da Escola Comunitária de Campinas em audiência com S.Exa. e o Senador Eduardo Suplicy. Apelo ao Líder do Governo no Senado, pela manutenção do acordo para garantir benefícios fiscais a empresas da Zona Franca de Manaus.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Flexa Ribeiro, Garibaldi Alves Filho, Mão Santa, Sergio Guerra.
Publicação
Publicação no DSF de 01/06/2007 - Página 17445
Assunto
Outros > HOMENAGEM. SENADO. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, MÃE, DEPUTADO FEDERAL, EX-DEPUTADO, ESTADO DO AMAZONAS (AM).
  • SAUDAÇÃO, ESTUDANTE, MUNICIPIO, CAMPINAS (SP), ESTADO DE SÃO PAULO (SP), VISITA, ORADOR, EDUARDO SUPLICY, SENADOR, DEBATE, ETICA, CIDADANIA.
  • COMENTARIO, TRAMITAÇÃO, PROJETO DE LEI, BENEFICIO, ZONA FRANCA, ESTADO DO AMAZONAS (AM), ACORDO, RETIRADA, EMENDA, MOTIVO, INCLUSÃO, MATERIA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI DE CONVERSÃO (PLV), EXPECTATIVA, SANÇÃO, COMPROMISSO, APOIO, LIDER, GOVERNO.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, OFICIO, AUTORIA, ENTIDADE, INDUSTRIA DE MATERIAL ELETRICO, ELETRONICA, DESTINATARIO, CASA CIVIL, APOIO, AUSENCIA, VETO (VET), MATERIA, BENEFICIO, ZONA FRANCA, ESTADO DO AMAZONAS (AM).
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE MORTE, CARLOS LACERDA, JORNALISTA, EX-CONGRESSISTA, EX GOVERNADOR, ESTADO DA GUANABARA (GB), ELOGIO, VIDA PUBLICA, DETALHAMENTO, PARTICIPAÇÃO, HISTORIA, BRASIL.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, antes de mais nada, comunico à Casa que requeri voto de pesar pelo falecimento da Srª Dolores Rodrigues, avó da Deputada Federal, Rebecca Garcia, do meu Estado, e mãe do ex-Deputado Federal, Francisco Garcia. Falecimento este ocorrido no dia 26 de maio de 2007 em Manaus.

Requeiro que esse voto seja por intermédio da Deputada Rebecca Garcia e levado ao conhecimento de todos os seus familiares, a começar do pai, meu querido amigo, ex-Deputado Federal, Francisco Garcia. A Srª Dolores Garcia Rodrigues, viúva do Sr. José Garcia, era comerciante em Manaus, muito estimada, muito respeitada, tanto quanto estimados e respeitados são seus 9 filhos, seus 21 netos, seus 21 bisnetos. Entre os filhos, repito, o ex-Deputado Federal, figura ilustre no meu Estado, Vice-Governador do Estado, Francisco Garcia, e entre os netos, a jovem e promissora Deputada Federal, Rebecca Garcia, da Bancada do Amazonas.

Sr. Presidente, hoje recebi, junto com o Senador Eduardo Suplicy, 78 estudantes da Escola Comunitária de Campinas, que debateram conosco o tema ética e cidadania. Trata-se de um projeto dessa escola. Compareceram cerca de seis professores a mais e os 78 estudantes. Eu fiquei muito orgulhoso porque o processo de escolha foi dos próprios estudantes. Eles optaram por ouvir a mim e ao Senador Eduardo Suplicy. Nós fizemos, em parceira, uma palestra para os estudantes ao mesmo tempo em que eles interagiram conosco fazendo perguntas, ponderações e observações.

Entendo que esse é um bom caminho de levarmos a juventude a separar o joio do trigo. Não é possível que a juventude e a população inteira lá fora entendam que esta Casa é apenas joio. Uma minoria, joio; a maioria, trigo. É preciso separar bem o joio do trigo.

Sr. Presidente, quero abordar um terceiro assunto que, aliás, diz respeito ao Senador Flexa Ribeiro, que, neste momento, não preside mais a sessão.

Defendi, ontem, em plenário, a aprovação da emenda do Senador Flexa Ribeiro ao Projeto de Lei nº 124, Senador João Pedro, beneficiando a Zona Franca de Manaus. No curso dos debates, porém, concordei com a sua retirada ao receber do Líder do Governo, Senador Romero Jucá, a garantia de que seu objetivo já está atendido pelo Projeto de Lei de Conversão resultante da Medida Provisória nº 352, ontem aprovada, conforme relatório de minha autoria, e ora aguardando a sanção presidencial. Essa garantia foi repetida pelo Presidente da sessão, Senador Tião Viana, do PT do Acre, e está registrada nos Anais, embora esse registro não fosse necessário, porque confio, pura e simplesmente, no que me disseram os Senadores Tião Viana e Romero Jucá.

Na sua intervenção de ontem, instado pelo Senador Flexa Ribeiro, o Líder do Governo não garantiu que o dispositivo daquele Projeto de Lei de Conversão não será vetado. Conforme registram os Anais do Senado, Jucá disse: “Quero registrar que não posso garantir, sem conversar com o Governo, que a emenda não será vetada, mas posso garantir que vou trabalhar e vou agir no sentido de evitar qualquer possibilidade de veto. Portanto, vou levar isso ao Governo. Faço esse compromisso com o Senador Flexa Ribeiro”.

A despeito do empenho do ilustre Líder Romero Jucá, hoje chegou-me uma informação de fonte responsável de que o Presidente Lula vetaria esse dispositivo. Confio e continuo confiando na palavra do Líder e no seu empenho contra o eventual veto.

Por se tratar de assunto de alta relevância, entendi que deveria, aqui, transmitir aos dois ilustres Parlamentares a informação que me chegou nesta manhã. A emenda do Senador Flexa Ribeiro fora proposta ao Projeto de Lei nº 124, garantindo a dedução no imposto de renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido dos investimentos feitos em pesquisa e desenvolvimento por meio de projetos executados por instituições científicas e tecnológicas.

O dispositivo que a base governista assegurou - e já está contemplado - permite também a utilização do critério de amortização acelerada nos gastos efetuados com bens tangíveis, como equipamentos e máquinas, e intangíveis, como royalties, voltados para a execução de atividades de pesquisa e desenvolvimento de inovação tecnológica do lucro líquido para fins de determinação do lucro real.

Flexa Ribeiro propusera a revogação da parte da chamada Lei do Bem que impede as empresas de informática e automação da Zona Franca de Manaus que já se beneficiaram com a redução de 70% do Imposto sobre Produtos Indutrializados - IPI - incidentes sobre a sua produção, de acumular os incentivos e a inovação tecnológica. Isso é que, no entendimento da liderança governista, já está contemplado em lei.

Ainda a propósito, tenho viva a manifestação do Senador Tião Viana, que, inclusive, me transmitiu cumprimentos pela constante defesa que, com a Bancada da Amazônia, sempre faço quando estão em jogo interesses do Amazonas e particularmente da Zona Franca de Manaus.

O digno representante do Acre enalteceu ainda a sensibilidade demonstrada por Flexa Ribeiro ao reconhecer a importância da Zona Franca de Manaus. Então, por acordo, retirou-se a emenda.

Tenho aqui, Sr. Presidente, ofício da Abinee - Associação Brasileira de Indústria Elétrica e Eletrônica -, um dos ramos ou associações, endereçado à Ministra Dilma Rousseff. Nesse ofício, que faço questão de encaminhar e de pedir inserção nos Anais da Casa, aqui a Abinee pede, em suma, que não se vete a emenda aprovada pela Casa.

A emenda de iniciativa do Senador Flexa Ribeiro, que é de interesse para o meu Estado. Todos nós, da Bancada do Amazonas, estamos alertas e confiantes de que o líder haverá de conseguir que o Presidente Lula não vete o que foi aprovado, mantenha, portanto, a perspectiva de nós podermos trabalhar com mais tranqüilidade o desenvolvimento da minha região.

Sr. Presidente, não usarei o tempo todo. Apenas gostaria de dizer a V. Exª que, há trinta anos, e, nesse sentido encaminhei ontem voto de pesar à Mesa, voto de lembrança à Mesa, há trinta anos, Senador João Pedro, faleceu aquele que foi um dos maiores Parlamentares e seguramente o maior tribuno brasileiro de todos os tempos, Sr. Carlos Frederico Werneck de Lacerda.

Adversário político de minha família - sou de uma família com raiz trabalhista, meu pai foi líder do Governo Goulart no Senado -, mas ainda assim, examinando as qualidades em si, não antes a do administrador, primeiro a do Parlamentar, administrador que, sem dúvida alguma, talvez o maior governante que o Rio de Janeiro já conheceu, mas a do Parlamentar extraordinário, o homem dos repentes brilhantes na tribuna, o orador inigualável e insuperável, o debatedor ferino, o homem público que se dedicava vinte e quatro horas por dia a sua missão, o homem de quem eu discordava, alguém que me pilhou abrindo os olhos para a vida pública, dele discordando por entender que representava posição conservadora, que não era a posição que eu adotava como estudante, como alguém que teve alguma participação de liderança estudantil, mas um homem fascinante, extraordinário, uma figura que deixou alguns dos discursos mais memoráveis que o Congresso Nacional conheceu, a começar por aquele em que se defendeu por nove ou dez horas sem parar de falar na Comissão de Justiça, quando, no governo Juscelino Kubitschek, quiseram lhe cassar o mandato.

Carlos Lacerda havia lido um documento secreto do Itamaraty, sigiloso, e foi esse o pretexto que tiveram os governistas de então para tentar, por aquela via, silenciar a sua voz.

Se alguém me pergunta pelo seu lado golpista, esse lado não me agradava. A sua frase talentosa, porém inimiga da democracia, essa é imortal, mas eu, imortalmente, contra ela me insurjo. A frase, Senador Edison Lobão, é esta: “Juscelino não deve ser candidato. Se for, não deve ser eleito. Se for, não deve tomar posse. Se tomar posse, não deve governar, deve ser deposto”.

Lacerda conseguiu, pelo lado do golpismo, uma proeza que só o seu talento propiciaria alguém fazê-lo. Conseguiu, ainda pelo lado do golpismo, o lado que condeno nele, desestabilizar o governo constitucional de Vargas sem ter mandato, sem tribuna; escrevendo e falando, fazendo conferências, comícios pelo País. Depois, lutou muito para impedir a posse de Juscelino Kubitschek. Estava por trás daquele levante de Jacareacanga e Aragarças. Tinha uma liderança muito grande no meio da chamada oficialidade jovem. Foi muito importante naquela tentativa de se dar posse ao Presidente Goulart. Foi relevantíssimo

Foi relevantíssimo na derrubada do Presidente Goulart, ou seja, foi dos responsáveis pela instauração da noite ditatorial de 21 anos neste País, mas terminou a sua vida reconciliado com a democracia, ele que havia sido um jovem líder comunista que não concluiu o curso de Direito, membro do Partido Comunista que era não concluiu por uma razão bem parecida ao seu temperamento. Ele foi pilhado pelos bedéis da faculdade com gasolina, ele queria atear fogo no bloco da Faculdade Nacional de Direito, hoje UFRJ;

Foi expulso da faculdade, não se interessou por estudar e isso não impediu que ele constituísse uma vastíssima cultura. Ele tinha telex na sua casa e telex nas redações que só os grandes jornais brasileiros já tinham àquela altura. Ele tinha telex na sua casa, o que fazia quase uma antecipação do que representa hoje para todos nós a Internet. Ele recebia notícias durante a madrugada inteira.

Jornalista de mão cheia, farejava o fato político, uma figura absolutamente controvertida, amada por muitos, odiada por tantos, uma figura extraordinária que neste momento gostaria, relatando dos seus defeitos e qualidades, aqui admirar. Figura com a qual trabalhou o Senador Sérgio Guerra profissionalmente. Sérgio Guerra já passou muitas noites e muitos dias me contando das atitudes, das contradições e do eterno brilho de Carlos Frederico Werneck de Lacerda. Mas sobretudo o que me fascinava - e sou uma pessoa fascinada pela palavra escrita e pela palavra dita sobretudo - ouvir, como faço até hoje, os seus pronunciamentos.

Diria que Carlos Lacerda, de longe, é o maior orador que este País já teve e abaixo dele vinha, bem longe mais abaixo dele e na frente dos outros, Affonso Arinos e depois uma leva de inúmeros oradores brilhantes como Paulo Brossard, quero até ter a petulância de incluir meu pai, Almino Afonso, Jarbas Passarinho, Vieira de Melo... Uma leva de pessoas que eu diria, compõem com muita honra um terceiro escalão de oradores excelentes que esse país já conheceu. Mas em primeiro lugar, eu vejo bem longe de todos, Carlos Lacerda, culto, corajoso, ousado e eu dizia que no final de sua vida se reconciliou com a democracia. Teve o gesto nobre de ir buscar no aeroporto o seu adversário, Governador da então Guanabara, Eloi Dutra. Então ele foi buscá-lo e foi com Eloi Dutra ao DOPS e ficou ao lado de Eloi enquanto ele prestava depoimento.

Depois disso foi o grande articulador da Frente Ampla. Erradamente, a meu ver, Brizola e Arraes não aceitaram fazer parte da Frente Ampla e, com isso enfraqueceram a luta contra o regime militar. Brizola e Arraes ficaram fora, mas João Goulart e Juscelino superaram todas as mágoas que tinham de Carlos Lacerda e com ele se juntaram, não fazendo política com fígado e procurando olhar a junção de forças - o povo estava nas ruas naquele momento - passeata de cinqüenta mil, depois passeata dos cem mil de estudantes e intelectuais. A repressão tentando garantir uma ditadura que só se garantiria pelo Ato Institucional nº 5, fora disso a ditadura não teria mais forças de se manter. E a Frente Ampla assustava muito porque juntava as três maiores lideranças populares do país àquela altura. Carlos Lacerda, a meu ver, morreu reconciliado com o democrata que combatera a ditadura de Vargas - aquela de 37 a 45 -, foi importantíssima a participação dele na queda de Vargas, com a entrevista que ele, jornalista Carlos Lacerda fizera de José Américo de Almeida, publicada já nos estertores do Regime Estado Novista. Eu ouço o Senador Mão Santa, em seguida o Senador Sérgio Guerra e em seguida o Senador Flexa Ribeiro.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Arthur Virgílio, V. Exª é um extraordinário líder das forças oposicionistas da época que vivemos e traz aqui a vida de Carlos Lacerda. Eu, com mais idade que V. Exª, quero dizer que, nos anos de 1958 e 1959, lá na Parnaíba, ao som daqueles rádios grandes, paravam a casa de meu pai e os vizinhos. “Raul Brunini apresenta Carlos Lacerda”, às 21 horas, na Rádio Globo, às quintas-feiras. Parava o País. Mas, como V. Exª já dissertou, ele era um Parlamentar extraordinário, o melhor discurso. Recentemente, o Presidente Sarney fez uma retrospectiva de 55 anos que ele presenciou, taxando Carlos Lacerda como o melhor orador que ele ouviu. Davam-se até nomes aos seus discursos, como esse que V. Exª citou. Eu vivi aquele tempo. Eu já era universitário quando ele governava o Rio de Janeiro. Seus ensinamentos são muito atuais. Ele dizia: “Governar é fazer o que faço”. Ele não procurava ladrão, porque, se fosse assim, ele não teria tempo para trabalhar. Mas, quando descobria, ele punia. Ele punia! Não era essa impunidade! Mas o maior exemplo foi como ele transformou o Rio de Janeiro. “De dia falta água, de noite falta luz”. Era samba! E ele acabou com aquilo tudo. Nós não vamos descrever, mas Aterro do Flamengo, o túnel Rebouças, luz, energia, água... E o maior ensinamento que ele deu - e está aqui Cristovam Buarque que tem de saber - é que estava escrito em todas as escolas: Há vaga! Há vaga! Há vaga! E essa é a mensagem que ele deixa a todos os governantes.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Muito obrigado, Senador Mão Santa.

Ouço o nobre Senador Sérgio Guerra.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Muito oportuno o discurso de V. Exª, como sempre, e a sua lembrança do ex-Governador Carlos Lacerda. Eu o conheci menino ainda. Meu pai era Deputado Federal no Rio de Janeiro; ele também o era. Depois, na juventude, e um pouco depois dela, criamos uma relação pessoal. Tão logo meu irmão José Carlos Guerra foi cassado - era Deputado Federal aqui, com o Presidente Sarney e outros,...

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Colega de meu pai no Congresso.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - inclusive o pai de V. Exª -, o Carlos Lacerda convidou-me para trabalhar com ele na Datamec, uma empresa de processamento de dados. Na época, era a empresa mais importante de processamento de dados da América do Sul. Depois, trabalhei na Novo Rio, uma empresa de crédito e de financiamento, que fazia crédito ao consumidor direto. Enfim, trabalhei por oito anos na companhia dele e de pessoas que conviviam com ele e trabalhavam nas suas empresas ou em empresas próximas à dele. Acho que a lembrança do Senador Mão Santa é fundamental para se compreender não apenas o polêmico Carlos Lacerda, mas o estadista Carlos Lacerda. Há um livro recente, do qual agora me esqueço o nome, com prefácio de Rafael de Almeida Magalhães, que analisa a obra do Governo Lacerda na sua extensão. Por exemplo, falando de educação, quando Lacerda era Governador, havia escola para todas as crianças da Guanabara, com a garantia de oito horas de aula. Mais ainda: quando pais não levavam os alunos para o colégio ou para a escola, eram processados. Advogados do Estado tomavam iniciativa jurídica para que os pais levassem seus filhos para as escolas da Guanabara. Fez uma obra de estadista e de administrador sem igual, redesenhando o Estado do Rio de Janeiro, o Estado da Guanabara. Trouxe, na época, quem mais entendia de planejamento urbano no mundo, um grego chamado Constantino Doxiadis. Seu escritório, que era uma grande empresa de planejamento, tinha feito a reforma de Detroit. Foi trazido para redesenhar o Rio de Janeiro e atribuir-lhe possibilidade de expansão e de equilíbrio social. Fez uma obra que foi uma antecipação para governos que, agora, tomam iniciativas conservadoras. Não tenho nada contra programas de proteção social, esses programas que garantem que a população ou parcela dela não morra de fome, mas não há contrapartida na educação. Populações inteiras do Nordeste do Brasil estão assistidas por programas de proteção social, de uma maneira especial pelo Programa Bolsa-Família. Nessas cidades, as feiras livres, para onde flui a produção local, ao invés de se fortalecerem, ficaram enfraquecidas, porque a produção local caiu, ficou reduzida. Que desenvolvimento é esse que faz o cidadão, o brasileiro, depender mais do Estado do que antes? É a espécie de recuperação de um quadro semelhante ao dos coronéis de antes da revolução da Sudene, de antes da eleição de Tasso Jereissati, de antes da eleição de Cid Sampaio em Pernambuco, de antes da eleição de Miguel Arraes em Pernambuco, com seu caráter revolucionário, mas recuperar aquela velha prática de um Estado que protege, protege, protege e submete e ganha as eleições. Ganhava antes pelos coronéis; hoje ganha por meio de ONGs, que são subsidiadas pelo dinheiro público, em grande quantidade. Ainda agora quem dirigia o Incra de Pernambuco foi afastado porque usou dinheiro público, em grande quantidade, para instituições, essas tais ONGs, dominadas não pelo MST, mas pelo MLST, cujo principal dirigente é meu amigo Bruno Maranhão, que não tem a menor responsabilidade política no sentido construtivo.

(Interrupção do som.)

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Estamos falando sobre alguém que - este foi um grande equívoco - a avaliação política brasileira indexou como sendo um homem da Direita, um conservador. Convivi com Carlos Lacerda e não conheci ninguém mais disposto a mudar estruturas e a quebrá-las do que ele. Contradições? Ele próprio era a expansão pública de contradições enormes. Erros? Sem dúvida, muitos. Injustiças? Sempre as praticou. Avaliações equivocadas, sempre as fez, mas nunca deixou de pensar, e, principalmente, quando as fez, fez como devia fazer. É uma fraude a afirmação de que ele estava olhando para a Direita. Ele nunca fez isso. Olhou para a revolução social mesmo, na sua integridade. De direita é essa política que está aí, tanto que as alianças que mantém o Governo, que fazem a sua maioria aqui, são todas, sem exceção - evidentemente, não incluo nisso nem o PT, nem o PSB, nem o PDT, nem partidos que são de caráter progressista -, mas as alianças que seguram este Governo são conservadoras demais, têm práticas conservadoras, são os coronéis de antes atualizados pelas emendas parlamentares, com os mesmos vícios e as mesmas práticas. Enfim, ando à procura da esquerda. Encontro longos cabelos, alguma barba, mas a esquerda mesmo, a que é capaz de construir mudanças, eu não vejo. Ao invés disso, o preconceito. Desta vez, contra a democracia, porque o que hoje se está desenvolvendo no Brasil é um amplo preconceito contra a democracia, que tem uma causa, a impunidade, e que tem uma liderança, o Presidente da República.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Obrigado, Senador Sérgio Guerra, pelo seu aparte tão profundo sobre uma figura que V. Exª conheceu tão bem.

Peço a V. Exª, Sr. Presidente, algum tempo para atender aos Senadores que me solicitaram aparte: Flexa Ribeiro, Cristovam Buarque e Garibaldi Alves. Peço aos aparteantes que sejam breves. Em seguida encerrarei o discurso.

Agradeço.

O Sr. Flexa Ribeiro (PSDB - PA) - Senador Arthur Virgílio, quero, primeiro, parabenizá-lo pelo brilhante pronunciamento. Não vou entrar no mérito do discurso, mas quero apenas avisar a V. Exª que o acordo que aqui se tentou fazer com o Líder do Governo com relação à emenda que atende às empresas produtoras de equipamento de informática, para que sejam beneficiadas com incentivos para pesquisa e desenvolvimento, também foi feito pelo Deputado Júlio Semeghini na Câmara dos Deputados, com o Governo, com o Deputado Beto Albuquerque. Então, existem dois acordos, o da Câmara dos Deputados e o do Senado Federal.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O Sr. Flexa Ribeiro (PSDB - PA) - Todos esperamos que o Presidente honre esses acordos feitos pela sua base política no Congresso Nacional não vetando a emenda que foi aprovada.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Em nome do Amazonas, agradeço a V. Exª pela enorme ajuda que prestou à economia do meu Estado com sua intenção. Tenho certeza absoluta de que teremos força para cobrar do Presidente da República o compromisso assumido.

Concedo um aparte ao Senador Cristovam Buarque.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Fico satisfeito, Senador Arthur Virgílio, de trazer este assunto aqui. Sou de uma geração que tinha tudo para ver Carlos Lacerda como o grande demônio daquela época, mas tive oportunidade de conhecê-lo na casa do Senador Sérgio Guerra. Pouco antes da morte de Carlos Lacerda, tive o privilégio de conhecê-lo. Vi ali, talvez influenciado pela minha juventude de então, o que era um homem que tinha uma visão do mundo, do seu País, e que tinha um compromisso.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - E essa visão do mundo e esse compromisso, além de seus méritos pessoais, é que faziam dele o tribuno que ele era. Além de sua vocação de tribuno, era um tempo de causas. Isso é que nos está faltando hoje. O que impede que haja hoje grandes oradores não é só um fracasso técnico de cada um de nós, mas a falência das grandes causas nacionais,

que permitem o confronto, não, como fazemos hoje, em torno de quem rouba mais e quem rouba menos - este é um debate que, lamentavelmente, tem que se fazer também -, mas um debate em torno de para onde se deve conduzir o País.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - De preferência não roubando nada.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - E isso Lacerda, Almino Afonso e tantos outros que V. Exª citou tinham naquela época. Precisamos recuperar causas. E as causas estão nas nossas mãos, penso que nós é que não estamos querendo agarrá-las.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Obrigado, Senador Cristovam Buarque, pelo aparte oportuno e que engrandece o meu discurso.

Senador Garibaldi Alves.

O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Senador Arthur Virgílio, eu pretendia fazer um aparte mais prolongado, mas estou vendo que o tempo de V. Exª está esgotado. V. Exª está falando de um dos homens públicos por quem tive e ainda tenho grande admiração, que é o ex-Governador e ex-Deputado Carlos Lacerda. Apesar de não ter convivido com ele, tenho presente sua memória, sua história, sua luta por conta do também jornalista e político Aluízio Alves. Aluízio, meu tio, falecido no ano passado, contava-me histórias incríveis de Carlos Lacerda, da sua genialidade. Aluízio considerava Carlos Lacerda um gênio, um gênio político. Mas é evidente que o discurso é de V. Exª e eu não vou, de maneira alguma, frustrar aqueles que querem ouvir o depoimento de Arthur Virgílio. Quem sabe depois eu não me encorajo e vou à tribuna. Aliás, eu cobrava do próprio Aluízio falar sobre Carlos Lacerda. E falar sobre Carlos Lacerda é também falar sobre Aluízio Alves. Muito obrigado.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Senador Garibaldi Alves, V. Exª deveria mesmo vir à tribuna, e eu terei o maior prazer em ouvi-lo, porque sei da ligação de Aluízio Alves com Carlos Lacerda e sei da sua admiração por esse homem tão controverso, tão polêmico e tão genial. Eu não diria gênio político, mas gênio mesmo.

Sr. Presidente, peço a V. Exª um pouco mais de tempo e encerro dizendo três coisas sobre Carlos Lacerda. Primeiro, sobre o seu caráter obsessivo. Item um do caráter obsessivo de Carlos Lacerda, em história que me foi contada pelo Senador Sérgio Guerra. Ele vai a Recife, se encanta com um quadro que acaba comprando sem ouvir as advertências - e V. Exª compreenderão quais foram elas - que foram feitas pelo Senador Sérgio Guerra, à época seu auxiliar. Depois, o quadro dele não entrava no apartamento nem por fora. Simplesmente, o quadro não passava nem pela porta nem pelas janelas do apartamento. E Carlos Lacerda teve de doar o quadro para não sei quem.

Ainda sobre o seu caráter obsessivo, item dois. De madrugada ele saia percorrendo as obras, os trabalhos e os postos de serviço da Guanabara. E saia demitindo quem não estava...Em função daquilo que ele via de errado, no dia seguinte, a demissão “comia mesmo”. Ele não tinha a menor contemplação com a figura da incompetência.

Terceiro, e sei que isso comoverá a Casa. A história me foi contada pelo ex-ministro e Deputado Almino Afonso. Carlos Lacerda, que era imbatível como orador, encontrava alguns adversários a sua altura no choque de idéias. Talvez o mais notável deles, no choque de idéias, como orador excelente, mas não do nível do Lacerda, mas no nível do Lacerda, sim, ao debater com ele - Vieira de Melo .

Mas foi um Deputado modesto, inteligentíssimo, autodidata, chamado Ultimo de Carvalho, quem protagonizou com ele uma cena, talvez a única que tenha levado Lacerda a certa prostração num momento de debate.

Ele, do jeito que era, com aquele temperamento arrebatador, disse que Ultimo de Carvalho era um palhaço. Ultimo de Carvalho pediu a palavra, pela ordem. O Presidente a concedeu imediatamente, com base no artigo que permitia o direito de defesa. Ele disse:

Mas eu não estou aqui para me defender. Estou aqui para agradecer ao Deputado Carlos Lacerda, porque só um homem inteligente como ele, só um homem capaz, sensível como ele foi capaz de perceber que tenho sangue de palhaço nas veias. Meu pai, meu avô, meus tios eram todos palhaços. E eu me criei no picadeiro. Evidentemente, meus pais me deram de comer melhor do que comeram, deram-me de vestir, de estudar, e eu pude, então, seguir outra carreira e aqui estou, neste momento, sendo homenageado pelo Deputado Carlos Lacerda, que me chamou de palhaço. Mas eu não tive a honra, a alegria, a emoção de efetivamente ter sido um palhaço, porque meu pai conseguiu que eu estudasse e me endereçou para outra profissão. Mas só a genialidade do Deputado Carlos Lacerda poderia ter pressentido que eu tinha, sim, não só o sangue de palhaço nas veias, como a alegria e honra de ser filho de quem fui.

Lacerda não teve como reagir diante disso. Ficou emburrado em sua Bancada de Líder da UDN, cabeça baixa, em dúvida sobre o que fazia e o que não fazia. A Casa inteira se comoveu com o discurso do Deputado Ultimo de Carvalho, e ficou perplexa com a capacidade de reagir, diante de Lacerda, que ele teve. Aí, Lacerda pede a palavra, pela ordem, e diz, muito pura e simplesmente: “Sr. Presidente, eu peço desculpas ao Deputado Ultimo de Carvalho”.

Muito obrigado.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ARTHUR VIRGÍLIO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matérias referidas:

“Carta da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica à Ministra Dilma Rousseff”;

“Nota sobre a MP 352/2007 - Emenda nº 54 - Artigo 63”.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/06/2007 - Página 17445