Discurso durante a 114ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a falsificação de alimentos e remédios, que fere de morte a saúde pública.

Autor
Papaléo Paes (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AP)
Nome completo: João Bosco Papaléo Paes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Preocupação com a falsificação de alimentos e remédios, que fere de morte a saúde pública.
Aparteantes
Adelmir Santana, Gerson Camata, Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 18/07/2007 - Página 25165
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • ANALISE, PROBLEMA, CRIME HEDIONDO, FALSIFICAÇÃO, MEDICAMENTOS, FALTA, CONTROLE, ALIMENTOS, NOCIVIDADE, SUBSTANCIA, COMENTARIO, INSETICIDA, RISCOS, VENENO, AUSENCIA, ESCLARECIMENTOS, POPULAÇÃO.
  • REGISTRO, DADOS, ESCRITORIO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), GRAVIDADE, FALSIFICAÇÃO, MEDICAMENTOS, ESPECIFICAÇÃO, PAIS EM DESENVOLVIMENTO, FALTA, QUALIDADE, CONTROLE SANITARIO, INEFICACIA, COMBATE, DOENÇA, RISCOS, MORTE.
  • COMENTARIO, DADOS, AGENCIA NACIONAL DE VIGILANCIA SANITARIA (ANVISA), APREENSÃO, PRODUTO, FALSIFICAÇÃO, COMBATE, DOENÇA, SEXO, EXPECTATIVA, AUMENTO, CONTROLE, CRIME, FISCALIZAÇÃO, COMERCIALIZAÇÃO, CONSCIENTIZAÇÃO, POPULAÇÃO, ATENÇÃO, AQUISIÇÃO, MEDICAMENTOS, RISCOS, DISPENSA, PRESCRIÇÃO MEDICA.

O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, duas são as palavras-chaves quando falamos de saúde: prevenção e terapia. Dentro do espectro da prevenção a boa alimentação se destaca como pré-requisito básico de uma vida saudável. Por sua vez, quando a saúde falha, entra em campo a terapia, cuja principal ferramenta são os medicamentos, substâncias exaustivamente pesquisadas pela ciência e que se destinam a curar as doenças que nos atormentam, males típicos da condição humana.

O mundo moderno tem sido assolado por uma verdadeira praga, muito pior do que muitas mazelas que presenciamos diariamente nos noticiários. Trata-se da falsificação de alimentos e remédios, mal silencioso que vitima, a cada ano, milhares de seres humanos sem que, muitas vezes, seja possível comprovar a relação entre óbitos e a ingestão de substâncias adulteradas.

A falsificação fere de morte a saúde pública, pois abala dois de seus pilares básicos a que já me referi: a prevenção e a terapia. Ao ingerir alimentos e/ou remédios falsificados, o cidadão introduz em seu organismo substâncias por ele ignoradas, muitas vezes nocivas a sua saúde. No caso dos remédios, a situação é ainda pior: o paciente pode vir a ingerir uma substância inerte que nenhum efeito surtirá sobre a doença para a qual o medicamento foi prescrito.

É por ser um ato vil e covarde que, no Brasil, a falsificação de remédios é considerada crime hediondo. A alteração no arcabouço legal foi introduzida pelo Parlamento no ano de 1998 como resposta à descoberta de uma máfia que falsificava 220 medicamentos vendidos no País.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP) - Com muita honra, Senador Gerson Camata.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Senador Papaléo Paes, V. Exª, como médico, e médico conceituado, tem muita autoridade para abordar esses dois problemas graves que o Brasil enfrenta. O tráfico de drogas é muito grave, assim como a existência de organizações criminosas, mas a falsificação de medicamentos e alimentos talvez seja um dos crimes mais graves, porque, como V. Exª acentuou, é feita sub-repticiamente. Sem que a pessoa saiba, vai-se envenenando. Talvez as conseqüências venham no futuro e as pessoas não saberão de onde vieram. Outro assunto que eu gostaria que V. Exª abordasse, porque também é muito perigoso, diz respeito aos defensivos agrícolas. Não sabemos a quantidade e as doses exageradas de defensivos sistêmicos, principalmente os mercuriais, que são jogados nas batatas, nas verduras, em todos os alimentos que comemos. Há poucos dias, ouvi um agricultor que cultiva morango dizer que não permite que seus filhos comam o morango que ele cultiva - os filhos deles, claro, os nossos podem -, dada a quantidade de defensivos que ele usa. Para os filhos, ele compra do vizinho que não utiliza defensivos. Esse é um problema muito grave. Devemos incentivar os receituários de defensivos para que seja feito o controle. E descobrimos uma coisa mais grave, Senador Papaléo Paes: o Paraguai, que nos manda a maconha, que nos manda drogas, que nos manda armas que alimentam as quadrilhas de assassinos do Rio de Janeiro e das grandes cidades, agora está mandando toneladas de defensivos agrícolas contrabandeados para dentro do Brasil sem receituário, sem conceito, sem nenhuma regra, que são vendidos mais barato. Outro dia, caiu um avião lotado de defensivo agrícola na beira de um rio lá no Estado do Paraná. Então, veja V. Exª que tudo isso merece de nós uma reflexão profunda, e das autoridades uma atuação profunda. Parabéns a V. Exª.

O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP) - Senador Romeu Tuma.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Se eu entendi bem, Senador Papaléo Paes, V. Exª começou a falar sobre remédios falsificados. Quando tivemos aqui a CPI do roubo de cargas, um dos maiores objetos de furtos de roubo de cargas era medicamento - misturados, falsificados e roubados. É uma corrente tão negativa e perigosa que, às vezes, eu me assusto. Certo dia, estava conversando com o Dr. Fúlvio Pileggi, que, até então, era Diretor do Incor, e ele me disse que o diurético que ele receitara a um doente não estava surtindo efeito. Senador, talvez o nosso Presidente Sarney saiba mais do que eu sobre esse problema. Ele ficou assustado e mandou o medicamento para a perícia. Concluíram que não tinha o sal necessário para que tivesse o resultado desejado. Então, não era um remédio falsificado, mas continha sal em quantidade menor do que o especificado na fórmula original do diurético. Na semana passada, dois chineses foram condenados à morte. Há um contrabando enorme de medicamentos da China para cá e até agora não conseguiram interromper. A televisão mostrou sendo vendidos na Praça da Sé, em caixinhas, remédios de uso diário, para pressão e outros. V. Exª é médico, o Presidente da sessão é médico e conhecem melhor do que eu. Mas dois membros do Governo da China foram condenados à morte: um deles porque chefiava o setor de fiscalização de medicamentos e autorizou, mediante pagamento de US$800 mil, a venda de medicamentos sem nenhum teste, sem nenhuma avaliação. O outro ajudava a vender medicamentos falsificados, sendo o responsável pelo controle de medicamentos. Aqui, se acontece isso, nem cadeia dá, Senador! Nem cadeia dá! Lá, dá condenação à morte. E a China é reconhecida, hoje, como um dos países de maior contrabando em todos os setores. Só que eles começaram a ficar com medo, porque foram verificadas mais de dez mortes por causa desses medicamentos vendidos sem autorização da entidade que esse chinês condenado à morte chefiava. Causou dez mortes, reconhecidas em exame feitos a posteriori, fato que o levou à condenação à morte. Aqui, se ocorrer, nem cadeia dá. Duvido que haja algum inquérito por venda de remédio falsificado.

O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP) - Muito obrigado, Senador Romeu Tuma. É muito importante seu aparte porque, realmente, chama a atenção para a gravidade do que estamos denunciando aqui.

Também o Senador Gerson Camata fez uma referência aos defensivos agrícolas: não sabemos a quantidade de substâncias ativas que contêm aqueles defensivos.

Chamo a atenção ainda mais para um problema doméstico. Quase todos os dias lidamos com isso. Refiro-me aos inseticidas em spray. Antigamente, quando usados os inseticidas, todos sabíamos. “Olha, não entra no quarto, que está fedendo” - dizíamos assim - “a Detefon ou a Baygon”, que eram os mais populares. Eles deixavam um odor repulsivo, impedindo de irmos ao quarto até aquele cheiro passar.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP) - Hoje são disfarçados esses odores, inclusive muitos inseticidas têm aromas agradáveis, o que faz com que sejam usados junto de crianças sem nenhum critério. Por quê? Porque não se sente mais cheiro nenhum, e vai-se usando aquele veneno, sem termos o que chame a atenção porque até o odor, que era um chamativo para isolar as pessoas daquele veneno, hoje não existe mais. E ficamos cada vez mais expostos e submetidos à agressão desses inseticidas.

Sr. Presidente, peço a V. Exª tempo necessário para que eu possa concluir.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Mais cinco minutos a V. Exª. Com os dez, ficam quinze, o número do PMDB, para V. Exª voltar para o nosso Partido.

O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP) - Muito obrigado, Sr. Presidente. Eu preferiria que fossem 45 minutos, que seria um pouquinho além do tempo e seria o número do PSDB.

Então, como disse anteriormente, 220 medicamentos foram considerados falsos. Até aquele momento a indústria farmacêutica não admitia a existência de falsificação e as autoridades faziam vistas grossas em face do problema. O verdadeiro prejudicado, o povo, amargava os efeitos dos medicamentos falsos ou a falta desses efeitos. Passados quase dez anos do endurecimento da lei, é inegável que a falsificação diminuiu, mas está longe de acabar. Estudo da Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecente, a Jife, órgão independente que trabalha para o Escritório contra Drogas e o Crime, da ONU, dá conta de que de 25% a 50% dos medicamentos que circulam nos países em desenvolvimento são falsos ou ilegais. A pesquisa, divulgada em março deste ano, se baseou em dados da Organização Mundial da Saúde.

De acordo com a Jife, a falsificação também afeta a Europa e os Estados Unidos, fazendo com que um em cada dez medicamentos que circulam no mundo sejam falsificados. E os maiores alvos dos criminosos são os antibióticos, amplamente vendidos em feiras e em farmácias clandestinas nos países mais pobres.

Os remédios falsificados têm em comum a qualidade inferior, a eficácia muitas vezes nula e a ausência de controle sanitário, uma combinação de fatores com alto potencial de levar seres humanos à morte.

Nos anos 90, xaropes causaram a morte de centenas de crianças em Bangladesh, Índia e Nigéria. Em 1995, em vários países da África, 2.500 crianças morreram depois de tomar vacinas falsas. Mais recentemente, em 2005 e em 2006, centenas de pessoas morreram na China por causa de medicamentos veterinários recondicionados ilegalmente para uso humano.

De acordo com a Anvisa, os medicamentos mais falsificados no Brasil são aqueles destinados a combater a disfunção erétil, seguidos de remédios para o combate do câncer e da infecção causada pelo vírus HIV, por causa, claro, do seu alto custo. Somente em 2007, foram feitas três apreensões referentes aos medicamentos Viagra, Cialis e Levitra, drogas para o combate da impotência sexual.

Acredito que tais exemplos sejam suficientes para acender a luz amarela no controle sanitário nacional. É preciso que o Governo, por intermédio da Anvisa, aja com rigor no controle aos medicamentos utilizados pela população brasileira. Em um país como o nosso, de dimensões continentais, em que as estruturas fiscalizadoras são mal-aparelhadas e mal-estruturadas, seria por demais pretensioso achar que a falsificação de medicamentos é um crime inexistente. Claro que não é.

Ao lado de uma urgente ação governamental para o combate a esse crime hediondo, é preciso que a população brasileira se conscientize da importância de observar bem os medicamentos dos quais se utiliza, assim como da importância de agir em estrita consonância com a recomendação dos médicos que a assistem.

Um dos fatores que alimenta a comercialização de remédios falsos no Brasil é o hábito, deveras absurdo, porém arraigado, que o brasileiro possui de automedicar-se. A automedicação precisa ser combatida a todo custo, uma vez que traz consigo consideráveis riscos de reação alérgica, que pode ser fatal, bem como a quase certeza de haver superdosagem ou dosagem insuficiente para o adequado combate à doença.

Seria demais, entretanto, esperarmos da população que, em um lampejo, pare com o hábito de se automedicar, contrariando um costume que persiste no País desde o tempo de nossos avós. É preciso que o Governo interfira por meio de insistentes campanhas de esclarecimento contra a automedicação, coisa que, infelizmente, não tem sido feita.

A falsificação de alimentos e remédios é uma chaga que tem crescido, e muito, no mundo moderno. Sabemos que não é diferente no Brasil. Sendo assim, gostaria de cobrar do Governo Federal uma postura enérgica contra a comercialização desses produtos que tanto mal fazem à saúde dos brasileiros e das brasileiras.

É preciso investir no aparelhamento das estruturas de fiscalização da Anvisa, bem como combater a entrada, no Brasil, de alimentos e remédios falsos vindos de outros países.

Necessário se faz, também, esclarecer à população para que possa identificar as diferenças entre os produtos originais e os falsificados.

            Está mais do que na hora de o Governo agir para acabar com essa praga da falsificação.

           Concedo um aparte ao Senador Adelmir Santana.

           O Sr. Adelmir Santana (PFL - DF) - Senador Papaléo, a preocupação de V. Exª deve ser, naturalmente, uma preocupação de todos nós. Ela vem bem a propósito da necessidade de se fortalecerem as agências reguladoras e, neste caso específico, a Anvisa, que, apesar de muitas vezes extrapolar a sua capacidade de legislar, é a responsável pelo acompanhamento do controle dos medicamentos desde a produção até o consumidor final. É necessário, portanto, que tenhamos isto em mente: a valorização das agências reguladoras, em especial, neste caso, a Anvisa. Na semana passada, fizemos aqui um pronunciamento e comentamos uma visita que fizemos ao Professor Medina, no Rio de Janeiro, e tecíamos considerações da necessidade de se incluir na assistência mediante o do SUS a questão dos medicamentos. Não há um rincão deste País que não tenha uma ou duas drogarias ou farmácias. Entretanto, muitos deles não dispõem de um posto de saúde, e a gente vê, inclusive, o crescimento de populações que se deslocam de pequenos Municípios para Municípios pólos na busca do atendimento médico. É preciso que tudo isso esteja inserido para que o paciente ou o que procura a necessidade de tratamento não se desloque de seu pequeno Município e chegue a Municípios maiores em busca de assistência médica. Necessário se torna, portanto, que se faça uma total revisão no atendimento do SUS, dotando esses Municípios de unidades mínimas para atendimento do paciente nas suas necessidades básicas, mas também que se insira nesse...

(Interrupção do som.)

            O Sr. Adelmir Santana (PFL - DF) -...atendimento a assistência de medicamentos para aqueles que não têm acesso à aquisição. Estudos recentes indicam que mais de 55% da população brasileira não têm acesso a medicamentos. V. Exª fez referência à procura pela automedicação, que existe em razão dessa dicotomia. Não há médicos, existem farmácias; não há farmacêuticos, existem balconistas. É necessário rever toda a questão da assistência médica, incluindo-se no atendimento médico também o atendimento de medicamentos, por meio de um sistema em que entra a parte técnica, tal qual se faz hoje com a farmácia popular, mas ainda nos grandes centros. É preciso que isso chegue ao pequeno Município, e não criando estruturas novas, mas dotando as drogarias de atendimento aos pacientes, ao atendimento feito pelo SUS...

(Interrupção do som.)

O Sr. Adelmir Santana (PFL - DF) - Eu me congratulo com V. Exª. Nem tudo é falsificação. O importante é que dotemos a Anvisa para que haja, dentro dos limites da sua competência, limites que envolvam a questão dos medicamentos, desde a produção até a dispensação. Parabenizo V. Exª pela preocupação, e me associo a ela, naturalmente incluindo a necessidade de se rever todo o atendimento do SUS para que todos tenham acesso também a medicamentos.

O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP) - Agradeço a participação de V. Exª e incorporo seu aparte ao meu pronunciamento, principalmente porque V. Exª é conhecedor do assunto e sugere, realmente, uma solução para a maioria dos problemas relacionados à automedicação.

Sr. Presidente, está mais do que na hora de o Governo agir para acabar com essa praga da falsificação, que, ano após ano, afeta a vida de milhares e milhares de cidadãos brasileiros.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/07/2007 - Página 25165