Discurso durante a 130ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre o caos da saúde no Brasil, especialmente na Paraíba, onde foi a óbito uma jovem de 28 anos por falta de assistência médica.

Autor
Cícero Lucena (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PB)
Nome completo: Cícero de Lucena Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Reflexão sobre o caos da saúde no Brasil, especialmente na Paraíba, onde foi a óbito uma jovem de 28 anos por falta de assistência médica.
Publicação
Publicação no DSF de 22/08/2007 - Página 28256
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • REITERAÇÃO, DEBATE, SAUDE PUBLICA, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, ESTADO DA PARAIBA (PB), MORTE, CIDADÃO, CARDIOPATIA GRAVE, PERIODO, PARALISAÇÃO, MEDICO, DENUNCIA, CRISE, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), INSUFICIENCIA, ATENDIMENTO, DEMANDA, DEFASAGEM, VALOR, PAGAMENTO, PROCEDIMENTO, EXAME, SALARIO, ESPECIFICAÇÃO, CIRURGIA, FALENCIA, HOSPITAL.
  • DENUNCIA, DESRESPEITO, ESTADO, DIREITO CONSTITUCIONAL, ACESSO, SAUDE, DESVIO, ARRECADAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF).
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, DIVULGAÇÃO, INTERNET, PROTESTO, MORTE, CIDADÃO, ESTADO DA PARAIBA (PB).

O SR. CÍCERO LUCENA (PSDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Volto a um assunto que foi palco de matérias no Jornal Nacional, no Fantástico e no Bom Dia Brasil, sobre o caos da saúde no Brasil, e que foi objeto também de pronunciamentos aqui por vários Senadores.

A Medicina da Paraíba pede socorro. A nefasta situação ocorrida no último domingo, que levou a óbito uma jovem de 28 anos, era esperada por todos que trabalham com o atendimento oferecido pelo SUS em João Pessoa, independentemente da paralisação dos Médicos, que ora ocorre. Infelizmente, foi necessário uma jovem vir a óbito, após ter feito um apelo na imprensa local exprimindo todo o seu pavor, fragilidade e total impotência ante a situação, restando-lhe apenas aquilo de que dispunha, a fraca voz do seu clamor, que já não mais ecoará. Porém, a falta de socorro sucede cotidianamente nos corredores dos nossos hospitais. E a classe médica pleiteia salários condizentes com a atividade que exerce, pois lida com vidas, e qualquer engano pode levar à fatalidade.

Ocorre que as 35 cirurgias cardíacas disponibilizadas pelo SUS para a população de João Pessoa, que tem mais de 600 mil habitantes e é a capital do Estado, indubitavelmente são insuficientes e não atendem a demanda da população, levando pacientes graves a esperarem em longas filas para fazer uma cirurgia cardíaca.

V. Exª, Sr. Presidente, que é médico, sabe o quanto isso é triste e doloroso para uma família que tem um ente que precisa passar por uma cirurgia.

Um fator agravante, em se tratando de João Pessoa, é que a cidade, por ser capital, também recebe pacientes de todo o Estado. Ora, se as 35 cirurgias são insuficientes para os pessoenses, imagine-se para todos os paraibanos.

Atualmente, os hospitais não têm o devido interesse, e os médicos sentem-se impotentes e desestimulados em realizar cirurgias cardíacas. Estas requerem de seis a oito horas de minuciosa atenção, sendo grande a responsabilidade. E a remuneração oferecida pelo Sistema Único de Saúde é irrisória - o que, inclusive, já foi motivo de muitos pronunciamentos de V. Exª aqui, Sr. Presidente.

Esse foi um dos principais motivos que levaram um dos hospitais pioneiros na cardiologia da Paraíba, que há quarenta anos prestava serviços à população carente pelo SUS, a não mais realizar cirurgias cardíacas, sobrecarregando os que, ainda que de forma precária, realizam essas cirurgias.

Faz-se mister que o Governo entenda que esses hospitais são empresas, que precisam honrar seus compromissos, pagar a seus fornecedores, bem como a seus funcionários e outras despesas.

Essa celeuma só será resolvida quando o SUS remunerar dignamente médicos e hospitais. Se a situação permanecer como está, outras pessoas continuarão morrendo. A vida é um bem indelével, indisponível e ninguém possui a faculdade de dispor ou não dela, de escolher quem deve ser operado ou não. O direito à vida e à saúde é a consagração da dignidade da pessoa humana, direito assegurado pela Constituição Federal em diversos dispositivos.

Quando se destaca a necessidade de o Estado democrático assegurar o bem-estar da sociedade, neste deverá estar inserido a saúde, consagrada como direito de todos e dever do Estado, garantido por intermédio de políticas sociais e econômicas que vislumbrem a redução do risco de doença e o acesso igualitário aos serviços de saúde pública para prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúde. Este tem que ser um interesse primordial do Governo.

Uma reforma em caráter de urgência se faz necessária. Quando o nobre Ministro da Saúde, Dr. Adib Jatene, instituiu naquela época a CPMF, foi como uma luz no fim do túnel para a saúde brasileira. Contudo, esses recursos arrecadados tomaram outros rumos, bem distantes das calçadas daqueles que varam madrugada aguardando atendimento.

Aqui lembro que a receita da CPMF, no ano em que foi criada, foi de, aproximadamente, R$6 bilhões; hoje, ela está projetada para R$34 bilhões. E o que vemos é o agravamento do sistema de saúde.

A população carente paraibana clama pela sensibilidade dos membros desta Casa, para que, juntos, possamos cobrar do Governo amenizar a situação caótica do sofrido Estado paraibano.

Sr. Presidente, quero ler artigo escrito pelo jornalista Luis Torres, num portal do Estado da Paraíba chamado Click PB. No final de semana, faleceu também um ex-deputado estadual daquele Estado. O artigo tem o título “O coração e o erro de todos” e diz:

O coração é a pauta da semana. Teve o coração de Gervásio que parou sem avisar. Teve o de Elizângela que avisou muito antes de parar. Um coração que foi enterrado sem carro de bombeiros, sem batedores da Polícia Militar, sem luto oficial. Mas que repercutiu nacionalmente pela futilidade da causa mortis: a insensibilidade.

A coisa mais asquerosa em casos como o de Elizângela é o esforço das partes em garantir a isenção da culpa. Ninguém pensou em resolver o problema antes. Mas todos são extremamente dinâmicos, sagazes e inteligentes em defenderem-se. Elizângela queria dinamismo e soluções na madrugada do sábado.

Só encontrou insensibilidade. E de todos. Porque todos são culpados. E, se mexerem um pouco mais, até nós jornalistas temos conta da responsabilidade porque não fizemos, como costumamos, o terrorismo necessário quanto à greve dos cardiologistas.

Como diria Shakespeare, tem algo muito podre na tentativa da prefeitura de João Pessoa em responsabilizar, unicamente, os médicos em greve. Eles têm culpa sim, porque, se reivindicam melhores salários, devem fazê-lo com base no juramento profissional de salvarem vidas. E não de tirá-las.

Sabem que uma paralisação desse porte é mais delicada de que uma greve de motoristas de ônibus.

Mas, se analisarmos friamente, os médicos estão no segundo estágio da escala de responsabilidades. A primeira, como está bem claro na Constituição, é do Poder Público.

E, neste caso, da prefeitura de João Pessoa, que detém a gestão da saúde após municipalização do setor, recebendo para isso recursos no valor de R$ 12 milhões mês do Sistema Único de Saúde.

Constitucionalmente, não são os médicos os obrigados a garantir o serviço de saúde à população. Eles são profissionais. É o patrão deles, neste caso o Poder Público, que tem que lhes dar chicotadas, se for o caso, para garantir o tal serviço público de qualidade.

Mas é engraçado ler os jornais hoje e ver, em todos eles, que além de Elizângela, a coitadinha da prefeitura de João Pessoa também foi vítima dos médicos. Ora, vamos deixar de hipocrisia. A prefeitura e os jornais.

É o Poder Público, em primeiro lugar, que tem que garantir serviço de saúde. E que seja debaixo de pau e pedra. Com greve, paralisação, jogo de seleção brasileira, furacão, tornado [...]. Tem que garantir.

Tem de saber que, se os médicos insensíveis - "monstruosos no seu direito de melhores salários" - vão parar, vai ser preciso um plano emergencial, enviando pacientes para outros Estados, contratando médicos, colocando polícia para que 30% da categoria trabalhe ou, se nada disso der certo, atender submissa à reivindicação dos médicos.

É a prefeitura que deveria, se considera que os médicos estão sendo intransigentes, buscar médicos de Londres ou de Cuba, onde o prefeito adora passear. Quem sabe da Áustria, onde o prefeito foi receber (?) prêmio pela qualidade na administração. Ah, se a Fundação Harmonia soubesse da morte de Elizângela! Aliás, a prefeitura gastou por volta de R$100 mil na viagem do prefeito à Áustria. Teria feito, a conta própria, cinco cirurgias em Elizângela.

Em suma, os médicos foram a segunda categoria a omitir socorro à Elizângela. A prefeitura, esse título ninguém poderá contestar, foi a primeira.

É o artigo do jornalista Luis Torres, no ClickPB.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SR. SENADOR CÍCERO LUCENA.

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O SR. CÍCERO LUCENA (PSDB - PB. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a medicina da Paraíba pede socorro. A nefasta situação ocorrida no último domingo, que levou a óbito uma jovem de 28 anos, era esperada por todos que trabalham com o atendimento oferecido pelo SUS em João Pessoa, independentemente da paralização dos médicos.

Infelizmente foi necessário uma jovem vir a óbito após ter feito um apelo na imprensa local exprimindo todo o seu pavor, fragilidade e total impotência ante a situação, restando-lhe apenas o que dispunha a fraca voz do seu clamor, que já não ecoará mais.

Porém, a falta de socorro ocorre cotidianamente nos corredores dos nossos hospitais, a classe médica pleiteia salários condizentes com a atividade que exercem, lidam com vidas onde qualquer engano pode levar fatalmente à letalidade, o que ocorre é que as 35 cirurgias cardíacas disponibilizadas pelo SUS para a população da Paraíba são indubitavelmente insuficientes, e não atende a demanda da população, levando pacientes graves a esperar em longas filas uma cirurgia cardíaca.

Um fator agravante, e se tratando de João Pessoa, é que a cidade recebe pacientes de todo o interior do Estado.

Ora, se as 35 cirurgias já são insuficientes para os pessoenses, imaginem para todos os paraibanos.

Atualmente, os hospitais não têm o devido interesse e os médicos sentem-se impotentes e desestimulados em realizar cirurgia cardíaca, esta requer seis a oito horas de minuciosa atenção sendo grande a responsabilidade, e a remuneração oferecida pelo Sistema Único de Saúde é irrisória, esse foi um dos principais motivos que levaram um dos hospitais pioneiros na cardiologia da Paraíba, que há 40 anos prestava serviço à população carente pelo SUS, a não mais realizar cirurgias cardíacas.

Sobrecarregando os que ainda de forma precária realizam essas cirurgias. Faz-se mister que o Governo entenda que esses hospitais são empresas e que precisam honrar seus compromissos, pagar fornecedores bem como seus funcionários, etc.

Essa celeuma só será resolvida quando o SUS remunerar dignamente médicos e hospitais, se a situação permanecer como está outras pessoas continuaram morrendo. A vida é um bem indelével e indisponível, ninguém possui a faculdade de dispor ou não dela.

O direito à vida e à saúde são a consagração da dignidade da pessoa humana. Direito assegurado pela Constituição Federal em diversos dispositivos.

Quando se destaca a necessidade de o Estado democrático assegurar o bem estar da sociedade, neste deverá estar inserido a saúde, consagrada como direito de todos e dever do Estado, garantindo por intermédio de políticas sociais e econômicas, que vislumbrem a redução do risco de doença e o acesso igualitário aos serviços de saúde pública para prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúde. Esse tem que ser um interesse primordial do Governo.

Uma reforma em caráter de urgência se faz necessária, quando o nobre Ministro da Saúde Dr. Adib Jatene instituiu a CPMF surgiu uma luz no túnel para a saúde brasileira. Contudo, esses recursos arrecadados tomaram outros rumos.

Bem distantes das calçadas daqueles que varam madrugada aguardando atendimento.

A população carente paraibana clama pela sensibilidade dos membros desta Casa no empenho de amenizar a situação caótica do sofrido povo paraibano.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/08/2007 - Página 28256