Discurso durante a 16ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre o respeito aos parlamentares na destinação de recursos orçamentários por meio de emendas.

Autor
Papaléo Paes (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AP)
Nome completo: João Bosco Papaléo Paes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODERES CONSTITUCIONAIS. ORÇAMENTO.:
  • Reflexão sobre o respeito aos parlamentares na destinação de recursos orçamentários por meio de emendas.
Publicação
Publicação no DSF de 27/02/2008 - Página 3702
Assunto
Outros > PODERES CONSTITUCIONAIS. ORÇAMENTO.
Indexação
  • CRITICA, CONDUTA, EXECUTIVO, IRREGULARIDADE, DELIBERAÇÃO, EMENDA, ORÇAMENTO, REGISTRO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, DIARIO DO AMAPA, ESTADO DO AMAPA (AP), DENUNCIA, MANIPULAÇÃO, LIBERAÇÃO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, PRIORIDADE, SEMELHANÇA, PROJETO, GOVERNO FEDERAL, DISCRIMINAÇÃO, ESTADOS, REGIÃO NORTE, REGIÃO NORDESTE, ESPECIFICAÇÃO.
  • APREENSÃO, DESRESPEITO, GOVERNO FEDERAL, NORMAS, FEDERAÇÃO, AUTONOMIA, PODERES CONSTITUCIONAIS, PREJUIZO, ATIVIDADE, LEGISLATIVO, CRITICA, EXCESSO, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), IMPEDIMENTO, TRABALHO, CONGRESSO NACIONAL.

O SR PAPALÉO PAES (PSDB - AP. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma das bases do federalismo é o tratamento equânime dispensado pela União aos diversos entes que integram a Federação. E esse será apenas um dos preceitos que reclamam, compulsoriamente, observância nas múltiplas relações que se desenvolvem no campo institucional de cada Estado. Mas será talvez o fator determinante na manutenção da coesão política e do equilíbrio entre as unidades. No caso do Brasil, a realidade tem demonstrado que é a forma racional e civilizada de induzir o desenvolvimento e evitar que as ponderáveis assimetrias e dessemelhanças que caracterizam nosso País coloquem em questionamento a própria existência da Federação.

            O Governo Lula, que há mais de cinco anos detém legitimamente o poder central, abençoado pelas urnas, parece que ainda não conseguiu aprender as lições elementares do constitucionalismo. Um constitucionalismo, aliás, que nos vem orientando desde os primórdios da República. E o preço, altíssimo, desse não-aprendizado, filho da indiferença ou da má deliberação, vem sendo suportado por largas porções da sociedade brasileira. Isso porque, na medida em que o protecionismo sem-cerimônia, o filhotismo impudico, o interesse rasteiro contemplam esta ou aquela unidade ou cidade em desfavor de outras, impõe-se danos às diversas comunidades que não têm a “sorte” de estar estacionadas nos estados-membros que merecem a especial e continuada atenção do Palácio do Planalto.

Convenhamos que mesmo para os padrões éticos e políticos do Partido dos Trabalhadores tal atitude -- de privilegiar descaradamente os amigos e aliados e deixar à própria sorte os adversários -- é uma inominável indignidade. Além disso, serve de tosco exemplo para eventuais recidivas nos âmbitos estadual e municipal, onde não faltará a vocação imitativa de alguns políticos de ocasião para acompanhar o gesto que emana do Planalto.

Tudo isso vem abalar ainda mais a precária imagem da política e dos políticos junto à população, comprometendo o instrumento mais admirável que a humanidade concebeu para a condução dos assuntos de interesse coletivo, ou seja, exatamente a Política, mas a Política em sua melhor expressão, com “P”, maiúsculo.

Na verdade, faço tais observações com muita tristeza, porque essa realidade medíocre e discriminatória tem prevalecido, nos últimos anos, nas relações entre o Governo central e certas unidades federadas. E ela não deve, não pode permanecer. Depois, como um dos representantes do Estado do Amapá no Senado Federal, a chamada Casa da Federação, não poderia silenciar diante da ignominiosa discriminação que vem sendo infligida ao meu Estado.

Cumpre-me, portanto, trazer ao conhecimento desta Casa e do Brasil que o Amapá é um dos estados que obteve pior desempenho na liberação de verbas por emendas parlamentares no ano de 2007. Conforme denúncia publicada no final de janeiro, pelo jornal Diário do Amapá, houve liberação de apenas 19,91 % das emendas aprovadas, em um total de R$246 milhões.

Não bastasse o descalabro da profusão de medidas provisórias com que o Executivo entope e compromete a pauta do Congresso, subtraindo-nos de uma das mais precípuas e óbvias funções do Poder Legislativo -- a atividade legiferante, verifica-se uma mitigação irresponsável e inexplicável na liberação das emendas parlamentares. Assim, um instrumento legítimo e importante na confecção e execução do orçamento nacional fica comprometido pelo contingenciamento imposto por um Governo que se nega, sistematicamente, a dar explicações ao Congresso e à sociedade.

Evidentemente, o Amapá não é um caso isolado. Outros Estados do Norte e do Nordeste, em menor medida, também vêm sendo lesados de maneira drástica. Veja-se o caso de Roraima, Sergipe e Espírito Santo, este no Sudeste, todos com menos de 24% de suas verbas liberadas. Há ainda aqueles, como aponta o Diário do Amapá, que ficaram em uma situação melhor -- se este for o termo --, mas ainda assim não tiveram sequer 30% das emendas aprovadas liberadas. Em tal situação encontram-se Alagoas, Amazonas, Mato Grosso do Sul, Paraíba e Rondônia.

Para que se tenha uma noção mais clara do quadro que nos impõe o Poder Executivo, tome-se os resultados de pesquisa, realizada no período de 2003 a 2007, divulgada pela CNM -- Confederação Nacional dos Municípios. O que se observa é que a maioria dos municípios brasileiros, ou 59,35% (em números absolutos 3.301 municípios) não recebe sistematicamente recursos oriundos de emendas parlamentares. Dados da mesma pesquisa revelam que são os estados mais ricos, dotados de bancadas maiores, aqueles que conseguem carrear mais recursos. São Paulo, por exemplo, principal motor econômico do País, recebeu 56,87%, ou R$3,769 bilhões das emendas aprovadas nos últimos cinco anos. Minas Gerais, outro portento da economia nacional, conseguiu liberar 51,13% das emendas, enquanto o Rio de Janeiro foi beneficiário de R$2,34 bilhões, ou 46,08%.

Proporcionalmente, o valoroso estado do Acre foi a segunda unidade da Federação a conquistar mais liberações a partir das emendas aprovadas entre 2003 e 2007. Os acreanos tiveram a “sorte” de receber 53,07% das emendas, logo abaixo de São Paulo que, como salientei, marcou 56,07%.

De acordo com avaliação do presidente da Confederação Nacional dos Municípios, Paulo Ziulkoski, citado pelo Diário do Amapá, os números estão a evidenciar que “o Governo dá prioridade à liberação de recursos de emendas que têm afinidade com os projetos do próprio Executivo”.

Essa postura, digo eu, é uma absurda e intolerável deturpação das prerrogativas do Governo. Além disso, evidencia, uma vez mais, o desrespeito, a indiferença e a inequívoca intenção que o Executivo tem de trabalhar pela desmoralização do Poder Legislativo nacional.

Nosso Presidente, o eminente Senador Garibaldi Alves Filho, no pronunciamento por ocasião de sua posse na chefia do Legislativo, salientou, com extrema correção, visão realista e elevado senso público, a necessidade de o Congresso Nacional reposicionar-se em sua relação com o Executivo. Sem dúvida, é preciso que retomemos a autonomia que a Constituição da República nos assegura; sem dúvida, é preciso que o Executivo respeite as deliberações adotadas no Senado e na Câmara.

Respeitar os Parlamentares na destinação de recursos orçamentários, por meio de emendas, não seria um mau começo para essa virtual nova etapa do relacionamento institucional dos Poderes.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/02/2008 - Página 3702