Discurso durante a 56ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Homenagem a Aimé Césaire, ao Professor Candido Mendes e ao Sr. Amadou-Mahtar M'Bow, pessoas que simbolizam a idéia do diálogo.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA PARTIDARIA.:
  • Homenagem a Aimé Césaire, ao Professor Candido Mendes e ao Sr. Amadou-Mahtar M'Bow, pessoas que simbolizam a idéia do diálogo.
Publicação
Publicação no DSF de 19/04/2008 - Página 10191
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, POETA, NEGRO, PAIS ESTRANGEIRO, FRANÇA, ELOGIO, PROMOÇÃO, DIALOGO, CULTURA, CONTINENTE, AFRICA, EUROPA, COMENTARIO, OBRA LITERARIA.
  • HOMENAGEM, PROFESSOR, BRASIL, ORGANIZAÇÃO, REUNIÃO, REALIZAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, MARROCOS, PROMOÇÃO, DIALOGO, PAISES ARABES, PAIS, MUNDO, ESPECIFICAÇÃO, AMERICA LATINA, DEBATE, RELIGIÃO.
  • HOMENAGEM, EX-DIRETOR, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO), NACIONALIDADE ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, SENEGAL, ELOGIO, ATUAÇÃO, DEFESA, DIALOGO, CIVILIZAÇÃO, MUNDO, COMBATE, GUERRA, BUSCA, INTEGRAÇÃO, PAZ, RELAÇÕES INTERNACIONAIS.
  • DEFESA, IMPORTANCIA, DIALOGO, INTEGRAÇÃO, DIVERSIDADE, CIENCIAS, ETICA, ECONOMIA, POLITICA, ESTADO, DEMANDA, NECESSIDADE, JUVENTUDE, IDOSO, PROFESSOR, ALUNO, GARANTIA, EVOLUÇÃO, PROGRESSO, ATUALIDADE.
  • SAUDAÇÃO, JUVENTUDE, ESTADO DO CEARA (CE), PARTIDO POLITICO, PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA (PDT), PRESENÇA, PLENARIO, PARTICIPAÇÃO, ENCONTRO, DIRETORIO NACIONAL, POSTERIORIDADE, MORTE, LEONEL BRIZOLA, LIDER, REPRESENTAÇÃO PARTIDARIA, IMPORTANCIA, DEFESA, IDEOLOGIA, BENEFICIO, EDUCAÇÃO, DEMOCRACIA.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, fico feliz que seja V. Exª que esteja ocupando a cadeira da Presidência durante esta minha fala, porque venho tratar de um assunto com o qual V. Exª tem tudo a ver duplamente ou triplamente.

Venho aqui, Senador Mão Santa, prestar uma homenagem ao diálogo, mas não ao diálogo apenas de algumas conversas, como costumamos fazer. Venho prestar aqui uma homenagem ao diálogo no seu sentido maior possível: entre idéias, propostas e visões do mundo. Mas vou estender esta homenagem a três pessoas e fatos que simbolizam, para mim, entre outros obviamente, a idéia do diálogo.

E o primeiro, Senador Paim - e é por isso que eu disse que fico satisfeito com a sua presença aqui -, é o diálogo simbolizado numa pessoa que ontem faleceu, aos 93 anos, chamado Aimé Césaire. Aimé Césaire, até ontem, era o poeta mais importante, e não apenas - e aí entra a idéia do diálogo - o mais importante poeta vivo da língua francesa, mas um poeta negro, filho da Martinica, onde nasceu e onde faleceu ontem.

Aimé Césaire foi um símbolo do diálogo entre as culturas africana e européia, entre a cultura que podemos chamar de negra e a cultura que podemos chamar de branca, embora cada uma delas tenha características que não devem ser citadas de acordo com a cor da pele.

Ontem, aos 93 anos, Aimé Césaire faleceu na Martinica, onde nasceu. Um homem nascido aqui no continente americano, um homem da cor negra, mas que vai receber no seu enterro, amanhã, a presença, por exemplo, do Presidente Sarkozy e do Presidente da África do Sul, Thabo Mbeki. E espero que alguma comitiva importante do Governo brasileiro represente o nosso povo nessa homenagem final a esse grande homem.

Aimé Césaire não apenas foi um grande poeta, mas quero aqui citá-lo como homem do diálogo, na própria vida e não apenas nos seus livros, como, por exemplo, o seu livro sobre colonialismo, o seu belo livro sobre o retorno dele do exílio ao seu país, o retorno que é não apenas do ponto de vista geográfico, mas do ponto de vista cultural. Esse é o primeiro nome que trago aqui para homenagear a idéia d o diálogo.

O segundo é um brasileiro. Um brasileiro que anda pelo mundo e, a cada ano, realiza em algum país um encontro de personalidades, de intelectuais, na defesa do diálogo, o diálogo fundamental que hoje é preciso entre o que ele chama Islã e a latinidade.

Esse homem, que quero homenagear aqui, é o Prof. Candido Mendes. Todos os anos ele propõe uma reunião - e este ano já é a 17ª reunião - em países diferentes, com representantes do mundo islâmico, a maior parte de árabes, mas não apenas árabes, e representantes do mundo ocidental, sobretudo do mundo latino, para debater, dialogar, discutir e encontrar caminhos de convergência.

Então, quero aqui prestar esta homenagem a Candido Mendes pela sua luta incansável pelo diálogo, que é a razão principal deste meu discurso de homenagem.

Mas há uma outra pessoa, que, além de representar a negritude, também representa o diálogo com o lado branco, e que, além de ser um homem de cultura africana, também é um homem de cultura européia. Refiro-me ao Sr. Amadou-Mahtar M’Bow, um senegalês formado na cultura européia francesa, mas que representou, ao longo da sua vida, um forte compromisso com o diálogo. E peço paciência para falar um pouco mais sobre esses diálogos que ele trabalhou.

Antes mesmo de se falar em guerra de civilizações, como se fala sobretudo a partir do 11 de setembro - e já se falava antes com o livro do Sr. Huntington sobre a guerra de civilizações do oriente com o ocidente, mas o oriente simbolizado como a cultura islâmica -, antes disso, o M’Bow, na posição que tinha, naquele momento, de Diretor-Geral da Unesco, lutou pelo diálogo entre as civilizações. Antes de todos, ainda no começo dos anos 80, ele simbolizou, ele agiu no sentido de procurar encontrar um caminho, que, no mundo da globalização que então se iniciava, pudesse ser, não uma globalização de conflitos, mas de diálogo, e por intermédio desta, encontrar um caminho único para o futuro da humanidade.

Ele representou também, já naquele momento, um diálogo, Senador Mão Santa, que já estava em discussão hoje aqui nesta tribuna, quando falávamos do problema das fronteiras brasileiras entre países, da fronteira entre nações e da fronteira de tribos com nações. Ele já tentava encontrar um diálogo, um diálogo que está faltando termos aqui para esclarecermos em detalhes as fronteiras que existem entre globo e nações e entre nações e tribos.

O mundo ficou globalizado, mas não deixamos de ser nações. Somos uma comunidade mundial global, mas não somos uma comunidade unitária. Somos uma comunidade de nações, com interesses, com conflitos, com diferenças, mas todos no mesmo mundo.

Só diálogo vai permitir que a globalização continue, porque é inevitável, sem que uma nação exerça sobre as outras o poder de dominação e de negação da mais fraca. Esse diálogo está faltando entre nações.

M’Bow foi um dos homens que levantou, já no começo dos anos 80, a necessidade do diálogo e não da guerra como o caminho da convivência, que tem dois caminhos: o caminho da guerra, com uma nação impondo sobre a outra o caminho a ser escolhido; ou o diálogo, em que ambas as nações procuram encontrar o caminho único. M’Bow procurou isso.

E, aqui, hoje, nós vimos a dificuldade que encontramos para fazer o diálogo entre a Nação brasileira e as tribos indígenas ou etnias, como alguns gostam de chamar. É difícil. Como vamos encontrar um caminho para escolher entre dividir uma nação ou uma tribo indígena em dois pedaços, pelo fato de que ali, por uma linha imaginária, estabeleceu-se a fronteira entre a Nação brasileira e outras nações, e, ao mesmo tempo, como é que a gente vai negar à Nação brasileira traçar uma linha separando-a das outras nações vizinhas? Só o diálogo. Só o diálogo vai permitir que encontremos um caminho.

Elucidar o que a gente discutiu hoje aqui sobre aonde passa a linha que divide o Brasil com outras nações ou a linha que divide uma parte de uma nação indígena com a outra parte dela própria, só com muito diálogo. E o Amadou-Mahtar M’Bow foi um dos defensores desse diálogo, muito antes de a gente falar nele.

E, graças ao Cândido Mendes - que eu estou homenageando -, eles estarão reunidos em Rabat, capital do Marrocos, durante três dias, discutindo como é que se faz o diálogo entre o Islã e a latinidade. E também o diálogo entre religiões. Como é que a gente pode ainda, no século XXI, imaginar que uma religião tem o poder de dominar a outra religião?

Senador Eurípedes Camargo, a colonização brasileira caracterizou-se pela conversão, o contrário do diálogo. Converter é trazer o outro para o seu lado, mas de uma maneira que nega o outro. E a forma como a religião no Brasil foi imposta às tribos indígenas foi a da conversão, não a do diálogo. Conversão que pode ter sido de maneira fraterna, não necessariamente de maneira brutal, mas, ao mesmo tempo, não se fez respeitando as duas religiões; foi achando que uma era superior à outra. E esse debate, esse diálogo entre religiões é uma homenagem que quero prestar aqui ao Sr. M’Bow.

A outra, fundamental para os tempos de hoje, é o diálogo entre ciências. Até aqui - e o Senador Mão Santa, como médico, sabe muito bem disto -, tratávamos as ciências separadamente. Alguém nascia para ser médico, alguém nascia para ser engenheiro. Não dá mais para ser assim, Senador Mão Santa, porque uma parte da Medicina é feita hoje com base na Engenharia. Os equipamentos que usam hoje os cardiologistas e a convivência dos cardiologistas com esses equipamentos é completamente diferente da de trinta anos atrás.

A comparação que faço entre Medicina e Engenharia serve para quase todas as outras profissões. O tratamento das profissões como caixinhas, onde a gente mete ali os alunos que vão virar profissionais, é uma maneira atrasada de fazer universidade. Hoje, o diálogo entre as ciências é um caminho necessário para que a ciência avance. A Neurobiologia hoje não é mais uma ciência biológica apenas; é uma ciência que se envolve com o uso de instrumentos da Informática, da Microeletrônica, da Computação. E a gente resiste ainda, no século XXI, a fazer esse diálogo entre as ciências, que o Sr. Amadou M’Bow fazia, tentava fazer, sobretudo, trinta anos atrás.

Por isso, hoje ele está sendo homenageado por Cândido Mendes, e, ao homenagear Cândido Mendes por ocasião dessa reunião Islam et Latinité, eu estou homenageando esses dois grandes homens de cujas realizações nos ocupamos hoje.

Depois, vem isto que hoje foi falado também aqui pela Senadora Serys, que é o diálogo entre os seres humanos e a natureza, tema sobre o qual não se falava até pouco tempo atrás. Os seres humanos eram os donos do planeta, que, Senadora Kátia, estava aí para ser usado sob duas formas: como a despensa dos recursos naturais que a gente usava na economia e o depósito dos resíduos que o processo econômico produzia. Nenhum diálogo com o vale, com a terra, com a natureza, apenas a dominação técnica dos seres humanos sobre a natureza. Não há mais possibilidade disso.

Hoje, quando a gente fala em biodiesel, tem de dialogar com a natureza para saber se o biodiesel é a saída para manter o equilíbrio ecológico ou se é a saída que vai levar à destruição ainda maior das florestas. Isso porque, se a gente quiser colocar álcool ou biodiesel em todos os tanques de gasolina de um bilhão de automóveis que há no mundo, de propriedade de 800 milhões de seres humanos, vai faltar comida para colocar no estômago dos 800 milhões de seres humanos que passam fome.

Claro que a gente terá de encontrar uma saída, e é o diálogo. É o diálogo dos seres humanos com a natureza para saber até que ponto a aritmética da civilização permite que a gente avance sem destruir o lugar onde a gente mora, o ar que a gente respira.

E isso vai exigir outro diálogo, que M’Bow também tentava desenvolver décadas atrás: o diálogo entre ética e economia. E esse é um diálogo inexistente, porque o que menos se estuda no curso de Economia é a palavra ética. Onde nasceu a economia há duzentos anos? Da ética. Hoje, a gente nega a ética. O grande pai da economia foi um professor de ética, Adam Smith. A evolução científica da Economia fez com que a gente abandonasse a ética, e o resultado é a economia destrutiva, é a economia degradadora, é a economia desigualizadora. Desigualizadora entre os seres humanos, depredadora da natureza.

Tem de haver um diálogo entre a ética e a economia. M’Bow fazia esse diálogo, promovia esse diálogo, como também o diálogo que está faltando hoje. E o Senador Heráclito, de certa forma, falou nisso de uma outra maneira: é o diálogo entre política e estadismo. Popularidade é política, não é necessariamente estadismo. Os estadistas, em alguns momentos, tomam decisões que são antipopulares para construir o futuro. A popularidade é medida por uma pesquisa de opinião naquele instante, Senador Mesquita; não é medida por uma pesquisa de opinião 20, 30 ou 40 anos depois, quando uma decisão tomada hoje por um estadista, embora às vezes dura - no sentido de ser dura, não de durar no tempo -, é uma decisão incômoda, mas a decisão correta no longo prazo.

O diálogo entre política e estadismo está faltando hoje, não só no Brasil. O mundo inteiro, hoje, faz política com base na pesquisa de opinião daquele instante, com base no marqueteiro, que vai definir o que se dizer naquele instante, para ganhar o voto daquela eleição. O estadista fala pensando na próxima geração e, às vezes, diz coisas que o marqueteiro diria: “Não diga isso”. O que a pesquisa de opinião diz é o contrário do que a população - eu não disse o povo - quer. Há uma diferença entre população e povo. População é o contingente de pessoas que está vivo hoje; povo é a população que virá depois também, dando-nos continuidade. O povo é eterno; a população é circunstancial.

O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Senador Cristovam Buarque, permita-me, neste momento, V. Exª que foi reitor e cuja vida está muito vinculada à Educação, fazer o registro da presença, nas galerias do plenário, dos estudantes do Colégio Soma, de Paracatu, Minas Gerais.

Sejam bem-vindos! Vocês estão assistindo ao pronunciamento de um Senador que é um ícone na Educação, não só no Congresso, mas também no Brasil.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Agradeço a lembrança porque esse é o próximo diálogo de que vou falar: o diálogo entre gerações.

O diálogo entre política e estadismo tem tudo a ver com o diálogo entre gerações. E falta esse diálogo, Senador Mão Santa; e o M’Bow foi um promotor do diálogo entre gerações, que se faz de duas formas: uma, entre esses meninos que aqui estão e nós - é o diálogo entre gerações de hoje; a outra, o diálogo até desses meninos com as gerações que virão depois deles, com os filhos, netos, bisnetos e todos depois.

Hoje, falta um diálogo entre gerações. Falta um diálogo entre as gerações de hoje e falta um diálogo das gerações de hoje com as gerações do futuro. As gerações de hoje tentam consumir tudo que a natureza é capaz de produzir, mesmo que as próximas gerações passem fome. Falta um diálogo desta geração de hoje com a futura e falta um diálogo da geração dos velhos de hoje com os jovens de hoje.

M’Bow tentava levar adiante esse debate. Nos cargos pelos quais ele passou, ele defendeu, sim, o diálogo entre as gerações de hoje - os velhos e os jovens - e entre as gerações ao longo da história - dos de hoje com os do passado.

Falta um diálogo de algo que é a principal causa da continuidade da pobreza; um diálogo, Senador Eurípedes, entre demanda e necessidade. Nós tratamos como diferentes. Necessidade está naquele que precisa, mas não tem dinheiro para comprar; demanda está naquele que precisa e tem dinheiro para comprar. Necessidade está aquele que está com fome do lado de fora do supermercado; demanda está naquele que está com fome dentro do supermercado, com dinheiro no bolso. A gente não faz esse diálogo. A economia trabalha a demanda; o humanismo trabalha a fome da necessidade. Neste País, uma criança fora da escola necessita; uma criança dentro da escola demanda. A gente só trabalha com as que estão dentro da escola.

O diálogo entre necessidade e demanda passa pelo diálogo, também, entre a economia e a ética. Mas como a economia não dialoga com a ética, a necessidade não dialoga com a demanda. E a gente tolera as necessidades com a indiferença de quem acha que só vale considerar quem demanda e não quem necessita. Está precisando haver esse diálogo entre demanda e necessidade, que passa pelo diálogo entre ética e economia, que passa pelo diálogo entre os seres humanos de hoje e a natureza que a gente depreda, que passa pelo diálogo entre as gerações de hoje e as do futuro.

Para concluir, Sr. Presidente, quero dedicar o último diálogo que a gente precisa mencionar. E é um diálogo que eu tive, pessoalmente, com esse Sr. Amadou-Mahtar M’Bow, que hoje homenageio, juntamente com a homenagem a Cândido Mendes: é o diálogo entre professor e aluno.

Nós nos acostumamos a que o professor ensina e o aluno aprende. Nós não nos acostumamos a que professor e aluno dialogam, num processo de aprendizagem em que os dois são partes quase iguais. Isso sempre houve, mas agora mais que tudo, porque, com os novos sistemas e métodos de divulgação de informações, o aluno que navegou, na véspera, pela Internet pode chegar em sala de aula sabendo mais do que o professor em relação àquele assunto, não em relação a tudo nem em relação à experiência. O aluno atento, hoje, é capaz de saber mais, na sala de aula daquele dia, do que o seu professor.

O professor que não dialogar com o aluno não é um professor compatível com o tempo de hoje. Não é mais tempo de transmissão de conhecimento apenas; é tempo de diálogo entre quem quer aprender e quem tem o que ensinar.

Estou concluindo, Senador Paulo Paim, apesar do tempo que ainda resta.

Eu tive a sorte de o primeiro encontro que tive, quando reitor da Universidade de Brasília, a primeira audiência, numa segunda-feira, às 8 horas da manhã, fosse com esse Sr. Amadou-Mahtar M’Bow. Ele veio ao Brasil e, no meio da sua agenda, obviamente, reservou um lugar para conservar com a universidade, não comigo especialmente - nem sabia que eu era o reitor. Eu tinha dois minutos de reitoria quando recebi esse senhor no meu gabinete. E, ali, eu tive oportunidade de começar a desenvolver essas idéias que eu tenho sobre a importância do diálogo, porque todos os diálogos de que eu falei aqui, apesar de eu estar com a perspectiva de mais de 20 anos de distância, eu tenho certeza de que discuti com aquele senegalês, com aquele homem elegante, que fazia o diálogo da sua África com a Europa onde estudou, que fazia todos esses outros diálogos que eu defendi e que eu aprendi, provavelmente, com ele.

O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Senador Cristovam, permita-me registrar, já que está dentro do seu tempo, que a palavra “diálogo”, com certeza, está, neste momento, com muito carinho, sendo ouvida por todo o País. Como seria bom se nós ampliássemos também o diálogo entre o Executivo e o Legislativo.

Que a sua mensagem seja ouvida por todos!

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Muito bem. Há muitos outros diálogos. Eu poderia até dizer que esse está incluído no diálogo entre o estadismo e o político, mas é importante salientar a falta desse diálogo entre os Poderes da República brasileira.

Mas eu concluo, Sr. Presidente, dizendo que eu vim aqui prestar uma homenagem e fiz três homenagens. Eu prestei uma homenagem, necessária de ser feita, porque ontem faleceu o Aimé Césaire. Essa homenagem eu preferia que a gente não estivesse fazendo hoje, aqui, sobretudo post mortem, como está sendo. É verdade que talvez com menos de 24 horas da morte dele, mas dessa homenagem eu fiz questão.

A outra, ao nosso querido professor, Senador Paulo Duque, do seu Rio de Janeiro, que é Cândido Mendes, essa figura incansável na luta para manter a continuidade da sua universidade, mas também, no mundo inteiro, caminhando, caminhando e realizando, além dessas caminhadas, esses encontros anuais fora do Brasil, a um custo, provavelmente, muito alto de energia, saúde e de dinheiro para ele, entre a sociedade, a parcela da civilização do Islã e a parcela da civilização ocidental. E, também, a homenagem àquele que está sendo homenageado hoje, no encontro que ele faz lá no Marrocos, que é o ex-Diretor-Geral da Unesco, Amadou-Mahtar M’Bow.

Mas, para concluir, e já passando não do tempo, mas do tema, quero prestar uma outra homenagem, que tem a ver com o diálogo, aos jovens que estavam aqui mais cedo, que além de serem do Ceará, como o Presidente Paulo Paim disse, são representantes do PDT. E estão aqui porque, nesses próximos três dias, vamos fazer o encontro do PDT. É o primeiro encontro nacional desde que não temos mais Leonel Brizola como nosso líder. É o primeiro encontro nacional que faremos sendo parte do Governo Lula. É o primeiro encontro desse momento de crise que vive o Brasil. Eu espero que esse encontro seja de grande diálogo - palavras que estão juntinhas. Encontro e diálogo são palavras juntas. Embora o encontro possa ser feito sem diálogo, o diálogo não pode ser feito sem o encontro.

Espero que desse nosso congresso surja vivo, como o deixaram, o pensamento de Brizola e Darcy, e que fique vivo o sonho. Não podemos transformar um congresso em um simples debate sobre relação ou não com o Governo, sobre o que fazer no dia-a-dia, sobre defender e acusar. Temos que fazer um congresso que mantenha o sonho. O sonho de que é possível ter todas as crianças em uma escola boa, gratuita, de qualidade, com professores bem remunerados, em prédios bonitos e bem equipados; o sonho da defesa da nacionalidade brasileira; o sonho da quebra da desigualdade social e regional deste País; o sonho da garantia da democracia.

Se para isso for preciso criticar o Governo, temos que ter a coragem de criticar o Governo, porque o sonho está acima de todos os outros aspectos de um partido que quer ter uma causa e não apenas ser uma sigla, até porque, para concluir, entre os diálogos, é preciso ter um entre os sonhos e a realidade.

Não podemos abandonar a realidade em busca de um sonho impossível, mas não vale a pena tentar conviver com uma realidade se ela nega o sonho em que a gente quer chegar. O diálogo entre sonho e realidade, para mim, é o principal diálogo daqueles que fazem política. Sonhando aquilo que a gente tem, pela alma da gente, a obrigação de fazer e com os pés na realidade, onde, pelo sentimento de realismo, a gente tem que mantê-los caminhando.

Vim hoje, Sr. Presidente, fazer este discurso sobre o diálogo, prestando essas homenagens.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Senador Cristovam Buarque, permita-me que, em nome do Senado, cumprimentar esse primeiro encontro nacional do PDT depois da morte do inesquecível, saudoso e referência para todos nós, ex-Governador do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro, Leonel de Moura Brizola.

Parabéns a V. Exª.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/04/2008 - Página 10191