Discurso durante a 59ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre o aumento dos preços dos alimentos no mundo. Proposta de elaboração de um programa de aproveitamento de pastagens degradadas para o cultivo de alimentos.

Autor
Osmar Dias (PDT - Partido Democrático Trabalhista/PR)
Nome completo: Osmar Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • Reflexão sobre o aumento dos preços dos alimentos no mundo. Proposta de elaboração de um programa de aproveitamento de pastagens degradadas para o cultivo de alimentos.
Publicação
Publicação no DSF de 24/04/2008 - Página 10608
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • ELOGIO, PRONUNCIAMENTO, SECRETARIO GERAL, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), IMPUTAÇÃO, RESPONSABILIDADE, PAIS INDUSTRIALIZADO, CONCESSÃO, SUPERIORIDADE, SUBSIDIOS, PRODUTOR, ALIMENTOS, EMPOBRECIMENTO, PAIS SUBDESENVOLVIDO, ESPECIFICAÇÃO, PAIS, CONTINENTE, AFRICA.
  • DEFESA, NECESSIDADE, BRASIL, IMPLEMENTAÇÃO, PROGRAMA, INCENTIVO, MELHORIA, MANUSEIO, RECUPERAÇÃO, PASTAGEM, AUMENTO, PRODUTIVIDADE, GARANTIA, SUPRIMENTO, DEMANDA, MERCADO INTERNO, MERCADO EXTERNO.
  • SUGESTÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CRIAÇÃO, GRUPO DE TRABALHO, PLANEJAMENTO, RACIONALIZAÇÃO, OCUPAÇÃO, TERRITORIO NACIONAL, REALIZAÇÃO, ZONEAMENTO ECOLOGICO-ECONOMICO, GARANTIA, PRODUÇÃO, ALIMENTOS, ENERGIA, PROGRESSO, CRESCIMENTO ECONOMICO, BRASIL.

O SR. OSMAR DIAS (PDT - PR. Para comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Papaléo Paes, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, Senadora Ideli, eu apóio o voto de aplauso de V. Exª, porque a Embrapa é um orgulho para o Brasil. A Embrapa está entre as três melhores empresas públicas do Brasil e, graças a ela, o agronegócio brasileiro é o sucesso que é hoje.

Também gostaria de fazer aqui, antes do meu pronunciamento, uma homenagem ao Governador Paulo Hartung, do Espírito Santo, que foi Senador conosco e que, sem confusão, sem barulho, sem briga, está fazendo uma gestão de excelência no Estado do Espírito Santo.

Está ali o Governador Paulo Hartung, acompanhado do Senador Gerson Camata, que também governou o Espírito Santo. E eu quero destacar mesmo desta tribuna que é uma visita importante para o Senado. É a oportunidade de pensarmos que, para governar bem, é preciso ter aquilo de que falou aqui o Senador Mário Couto: humildade. E ele tem. Mas tem de ter capacidade de formar uma equipe competente, uma equipe que administre olhando o Estado no futuro e planejando o Estado.

O Governador Paulo Hartung reduziu drasticamente os índices de criminalidade do Estado, melhorou a qualidade de vida do seu povo. O IDH do Estado melhorou muito na sua gestão e, portanto, nós temos de aqui relembrar que a sua atuação no Senado também já tinha sido marcante.

V. Exª faz um governo, como eu disse, sem confusão, sem briga, sem barulho, mas de muito resultado.

Parabéns ao Governador Paulo Hartung.

O SR. PRESIDENTE (Papaléo Paes. PSDB - AP) - Permita-me, Senador Osmar.

O SR. OSMAR DIAS (PDT - PR) - Dá um descontinho depois no tempo.

O SR. PRESIDENTE (Papaléo Paes. PSDB - AP) - Vou dar muito desconto, porque já deveria ter feito anteriormente o registro da presença do Governador do Estado do Espírito Santo e ex- Senador Paulo Hartung.

É uma honra para nós ter a presença de V. Exª neste plenário, acompanhado do Senador Gerson Camata. V. Exª foi um grande Senador, aqui, e agora está cumprindo sua missão de governar o Estado do Espírito. Aguardamos o retorno de V. Exª a esta Casa.

Parabéns a V. Exª e parabéns ao Espírito Santo!

O SR. OSMAR DIAS (PDT - PR) - Sr. Presidente Papaléo, ouvi a Senadora Ideli, e é coincidência até que me tenha lembrado, depois que ela falou, de um assunto muito importante, lá nos idos de 1960, quando a China e a Índia passavam por uma fome terrível. Faltava comida, faltava alimento. Tanto a China quanto a Índia não produziam para abastecer a sua população. E aí, a ONU chamou um agrônomo chamado Norman Ernest, que, lá de Iowa, nos Estados Unidos, foi levado até a China e a Índia, para, com uma equipe de agrônomos e de técnicos na agricultura, resolver o problema da fome.

Senador Mão Santa, que gosta de História, ouça este dado: calcula-se que, hoje, 40% das pessoas que vivem na China e 40% das pessoas que vivem na Índia estão vivas graças a essa atitude tomada pela FAO, pela ONU, de mandar uma equipe de técnicos para resolver o problema da fome. Senão, elas teriam morrido de fome, na década de 60. E sabem o que aconteceu? Com o trabalho dessa equipe coordenada pelo agrônomo dos Estados Unidos, Norman Ernest, houve um aumento de produção na China e na Índia. A China dobrou a quantidade de arroz e a Índia dobrou a quantidade de trigo e a população foi abastecida.

Hoje, discute-se se nós podemos continuar apoiando a produção de biocombustível e, ao mesmo tempo, dar conta da produção de alimentos. Gostei do pronunciamento do Secretário-Geral da ONU, ontem, quando pôs um pouco de ordem na Casa. Veio aquele suíço, deu um palpite, assim como aquele francês, o Bové, que veio e deu um palpite na questão dos transgênicos. Foi embora, continuou na França tomando vinho bom, mas deixou aqui uma confusão grande, um rastro que, depois, teve que ser resolvida pela lei de biossegurança aprovada pelo Congresso Nacional.

Agora veio outro da Suíça dar palpite. Sem conhecer o Brasil, ele disse que os países como o Brasil que estão destinando grãos para produção de biocombustíveis estão cometendo um crime contra a humanidade. Além do exagero, uma absoluta ignorância e falta de conhecimento. Não conhece o Brasil e, se conhecesse, não teria feito uma afirmação tão ignorante, tão besta como essa que fez.

O que o Secretário-Geral da ONU falou ontem? Ele disse que o que fez os preços dos alimentos crescerem tanto a ponto de o trigo ter um aumento de preço do ano passado para cá de 150%, o arroz, de 150%, foram fatores tais como subsídios que são massacrantes, dados pelos países ricos. Os países ricos dão subsídios de forma generosa a seus produtores. Os excedentes são mandados para os países pobres, como a África, que não produzem porque não vale a pena produzir. Estão recebendo esses alimentos subsidiados das regiões ricas do mundo e eles se livram dos seus estoques à custa do empobrecimento de continentes inteiros, como o africano, como os países da África.

Também, com relação ao aumento dos preços, o aumento do petróleo, até parece que as pessoas não sabem que, para produzir, é preciso ter trator a óleo diesel, ter caminhão a óleo diesel, ter uma ceifadeira, uma colheitadeira a óleo diesel.

Nove anos atrás, o barril de petróleo valia US$10 e diziam os especialistas na época: “Tem tanto petróleo no mundo que daqui a pouco o barril vai valer US$5.” O barril foi, ontem, a US$120.

Então, tem gente que fala demais e tem gente que fala sem entender. O petróleo, hoje, participa do custo de produção de qualquer cultura, Senador Mão Santa, com pelo menos 5%. Ou seja, o preço do alimento, hoje, está no nível que está porque o petróleo, que antes participava com 1% do custo de produção, hoje já participa com 5%. E ninguém combate o aumento do petróleo. Todo mundo acha que é normal o petróleo ter aumentado de US$10, nove anos atrás, para US$120, ontem.

Os países que produzem petróleo é que estão promovendo uma grande campanha no mundo para impedir que haja uma concorrência dos países que podem, como o Brasil, produzir biocombustível. Nós utilizamos só 4% da área plantada no Brasil com cana-de-açúcar. Quatro por cento!

(Intervenção fora do microfone.)

O SR. OSMAR DIAS (PDT - PR) - Exatamente.

E o que estamos vendo é que se trata de uma campanha orquestrada por países ricos.

Ontem estiveram aqui Senadores franceses, nossos colegas, e tivemos um bom debate. Mostramos aos franceses que eles precisam se dar conta de que, enquanto o petróleo continuar tendo o seu preço majorado todos os dias; enquanto eles próprios, franceses e europeus, continuarem subsidiando as suas agriculturas, concorrendo de forma desigual com a nossa; enquanto eles não enxergarem que o Brasil tem 220 milhões de hectares, por exemplo, de pastagem mal aproveitada - e aí a culpa não é deles, é nossa, é dos governos...

Senador Mão Santa, V. Exª é especialista em medicina; eu estudo um pouco a parte de agricultura. Aliás, estudo muito. Posso entender pouco, mas estudo bastante. Temos 200 milhões de hectares de pastagem e plantamos de 54 a 55 milhões de hectares de grãos. Considerando os 220 milhões de hectares de pastagem, se o Brasil colocar em prática um programa de incentivo a manejar melhor essa pastagem, melhorar o rebanho, dar um aumento de qualidade na genética do nosso rebanho, vamos produzir, em 150 milhões de hectares, a mesma coisa que produzimos hoje em 220 milhões de hectares. Basta que o Governo crie um programa de incentivo para melhor manejo de pastagem, recuperação de pastagens degradadas. Cerca de 70 milhões de hectares dessas pastagens poderiam ser incorporados ao sistema produtivo de grãos, sem prejuízo nenhum à floresta e à produção de grãos para alimentos.

Vamos, então, parar de conversa fiada e vamos tomar uma atitude. O Governo brasileiro tem sim de defender, porque temos área, temos gente, temos clima, temos solo, temos tudo para produzir alimento e bioenergia, mas também temos de fazer a nossa parte: criar um programa de incentivo aos produtores para transformação dessas pastagens degradadas em regiões produtoras de alimentos.

Isso pode? Pode. Dá para acontecer? Dá para acontecer e rapidamente. Isso sem contar os 90 milhões de hectares de cerrado que estão aí disponíveis e que foram tornados produtivos exatamente pela pesquisa da Embrapa e de pesquisadores como Francisco Terazawa, um paranaense que criou variedades adaptadas ao solo do cerrado.

Sr. Presidente, Senador Mão Santa, Srªs e Srs. Senadores, não há por que o Brasil perder essa oportunidade. O Brasil tem de dar agora um grito de soberania. O ex-Presidente Fernando Collor falava do Tratado de Itaipu, e falou bem. O Brasil não pode ceder no Tratado de Itaipu. Falou de soberania. Mas falo de soberania em relação à segurança alimentar.

Estamos, hoje, ameaçados pela falta do trigo, porque dependemos do trigo argentino. Até quando o Brasil não vai ter a vergonha na cara de produzir o trigo necessário para o consumo interno, se temos gente, clima, solo, tudo pronto, estrutura, Embrapa para fazer pesquisa, institutos estaduais e privados? Por que não vamos investir no trigo nacional, em vez de ficarmos dependendo? Fechou a torneira do trigo argentino, vai faltar pão, macarrão, bolacha, derivados. E o pão, a farinha, está na alimentação do café da manhã, do almoço, da janta, em toda hora.

Sr. Presidente, sei que meu tempo está terminando e este é um assunto que demanda muito tempo. Mas eu gostaria de aqui fazer um alerta ao Presidente Lula. Ele me chamou para conversar outro dia, conversamos e, depois, ele fez um discurso muito bom, lá na Europa, fora do País, na África, dizendo o seguinte: “Vamos criar um grupo de trabalho para mostrar que nós podemos produzir alimentos e biocombustíveis, e mostrar quais são os fatores que estão fazendo com que haja crise de alimentos”.

Faço uma sugestão para o Presidente Lula: monte um grupo de trabalho e faça um planejamento para o Brasil para os próximos 40, 50 anos, e nós vamos mostrar que podemos, incorporando áreas que já estão utilizadas, sem degradar e sem devastar, e que essas áreas, incorporadas num processo produtivo, com o aumento de produtividade que pode ocorrer, podem suprir a demanda interna e também o mercado externo.

Só um dado para terminar: o Brasil produzia, há 18 anos, 57 milhões de toneladas; 140, este ano. O que aumentou de área: 25%. O que aumentou de produtividade: 125%. Houve 150% de aumento na safra, mas só 25% em cima da área. Então, essa conversa de ONGs que também são financiadas pelos concorrentes do Brasil que não querem vê-lo prosperar, esse discurso de algumas ONGs precisa ser desmentido com dados, porque palavras até podem ser desmentidas, mas os números jamais.

Sr. Presidente, faço aqui um alerta ao Governo brasileiro: monte um grupo de trabalho, sim, para responder às críticas que estão sendo feitas lá fora, mas monte um grupo de trabalho para planejar a ocupação racional do território brasileiro, fazendo um zoneamento ecológico, climático, social e econômico para ocuparmos as áreas sem colocar a cana-de-açúcar onde ela não pode entrar porque vai trazer problemas ao meio ambiente, mas colocando a cana-de-açúcar onde ela pode entrar, gerar renda e emprego e produzir biocombustível; sem colocar, Sr. Presidente, aquilo que não pode ser produzido em áreas de floresta.

Com o uso racional, podemos avançar, avançar para produzir comida e energia, para o Brasil e para o mundo, e sobretudo dar um salto de crescimento na nossa economia, que tem na base da agricultura a grande alavanca para dar esse salto. Basta planejamento e competência, que, neste momento, está ficando só no discurso.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/04/2008 - Página 10608