Discurso durante a 60ª Sessão Especial, no Senado Federal

Comemoração do centenário da fundação da Associação Brasileira de Imprensa.

Autor
Mão Santa (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PI)
Nome completo: Francisco de Assis de Moraes Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. IMPRENSA.:
  • Comemoração do centenário da fundação da Associação Brasileira de Imprensa.
Publicação
Publicação no DSF de 25/04/2008 - Página 10733
Assunto
Outros > HOMENAGEM. IMPRENSA.
Indexação
  • HOMENAGEM, CENTENARIO, ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE IMPRENSA (ABI), LEITURA, TRECHO, TEXTO, RUI BARBOSA, VULTO HISTORICO, IMPORTANCIA, FUNÇÃO, IMPRENSA, ANALISE, ORADOR, CONTRIBUIÇÃO, HISTORIA, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO PIAUI (PI), ELOGIO, JORNALISTA, EMPRESA JORNALISTICA.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Inácio Arruda, que preside e que inspirou essa justa homenagem aos cem anos da imprensa brasileira; Sr. Maurício Azêdo, presidente da Associação Brasileira de Imprensa; Sr. Fernando Tolentino Vieira, diretor da Imprensa Nacional; e encantadora Srª Julieta Cavalcanti de Albuquerque, Subprocuradora-Geral da República; demais jornalistas; brasileiras e brasileiros aqui presentes e os que nos assistem pelo sistema de comunicação do Senado, que também é muito bom. Sem dúvida nenhuma, tudo nasceu aí, na ABI.

Inácio, ali está Cristo, que disse: “Em verdade, em verdade, vos digo.” E aí está o que deve a boa imprensa buscar: a verdade. Abaixo, está Rui, o nosso patrono. Então, permita-me, Inácio, fazer minhas as palavras de Rui, que são eternas, como as de Cristo, como esta Casa, como a imprensa brasileira. Atentai bem! Rui Barbosa:

A imprensa é a vista da Nação. Por ela é que a Nação acompanha o que lhe passa ao perto e ao longe, enxerga o que lhe malfazem, devassa o que lhe ocultam e tramam, colhe o que lhe sonegam, ou roubam, percebe onde lhe alveja, ou nodoam; mede o que lhe cerceiam, ou destroem; vela pelo que lhe interessa, e se acautela do que a ameaça.

Sem vista mal se vive.Vida sem vista é vida no escuro, vida na soledade, vida no medo, morte em vida: o receio de tudo; dependência de todos; rumo à mercê do acaso. A cada passo: acidentes, perigos, despenhadeiros. Tal a condição do país onde a publicidade se avariou e, em vez de ser os olhos por onde se lhe exerce a visão, ou o cristal que lha clareia, é a obscuridade onde perde a ruim lente que lhe turva, ou a droga maligna que lha perverte, obstando-lhe a notícia da realidade, ou não lha deixando senão adulterada, invertida, enganosa.

Minhas senhoras e meus senhores, sou orgulhoso de ser do Piauí, e o Inácio Arruda, por ser vizinho do Piauí.

São cem anos. Atentai bem: esta República nascida pelo povo, o povo que não admitia o absolutismo..Os reis eram deuses na terra. Deus, imaginariamente, seria um rei no Céu, e o absolutismo... Aí, o povo sofrido, povo bravo e forte...

Quando eu governei o Piauí, eu cantava como uma reza: o povo é o poder.

Inácio Arruda, então, o povo foi às ruas e gritou: “Liberdade, igualdade e fraternidade.” Caíram os reis, a inteligência humana buscando a justiça, que é o pão de que mais a humanidade necessita - não fui eu quem disse, também não vou esconder quem disse, foi Montaigne. Todo mundo deseja a justiça. Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça. Deus pegou: “Toma, Moisés, vai melhorar o seu povo”, dando-lhe leis, que constituem a justiça.

Esta República, para chegar aqui no Brasil - nós somos retardatários, nós estamos aqui para acordar, nós devemos ser os pais da pátria. Se não for, fecha isso. São cem anos para esse grito chegar ao Brasil! Cem anos! De lá, das ruas da França, libertária. E chegou, graças ao meu Piauí.

Teresina foi a primeira capital planejada deste País, em 1852. Aí nasceram, por inspiração dela, Goiânia, Belo Horizonte, Brasília, Palmas. A primeira cidade planejada! Então, lá existia um jornal criado por um baiano, o Saraiva. O nome do jornal era A Ordem. Aí, um jornalista irrequieto, David Caldas, nascido em Barras, tida como a terra dos governadores... Eu até brinco: parece que a cidade deu cinco governadores, um deles foi Leônidas Melo, um médico. Mas Parnaíba deu três - Alberto Silva vale por dois; o Chagas, por dois; e eu por um. Então, já empatamos o jogo. Mas, lá dessa Barra - cujo Prefeito é, hoje, Manin Rêgo -, esse jornalista trocou o nome do jornal de A Ordem para Oitenta e Nove.

Inácio, “Oitenta e Nove” parece até nome de cachaça hoje, né? 

Atentai bem: meu Presidente da ABI, Maurício Azêdo... É até doce, simpático. As coisas são assim, não transmitem. Meu Maurício doce, ele escolheu o nome Oitenta e Nove para despertar neste País, porque o Hino Nacional diz: “Deitado eternamente em berço esplêndido” Então, o Oitenta e Nove circulou por 17 anos antes de 15 de novembro de 1989, para acordar o Brasil deitado em berço esplêndido.

Por dezessete anos o Oitenta e Nove instigou, motivou, foi o profeta da República. É no Piauí que nasce tudo. Ele feriu o Pedro II - e tudo era ligado a Portugal - e não deixaram ele ser enterrado no cemitério. Ele ficou enterrado fora. Ele morreu antes da República. Depois o colocaram naquele cemitério de Teresina, o primeiro que se vêm vindo do norte, de Fortaleza, de Parnaíba.

Poderiam dizer que o Mão Santa está falando coisas do passado, mas eu sei que passado são o Pai Nosso e a Ave Maria e todos os dias a gente repete e sai dessas aos Céus. Mas vou ao presente também, o orgulho do Piauí.

Nós apresentamos aqui como o maior exemplo do jornalista do Brasil: Carlos Castello Branco, o Castelinho, é nosso, piauiense. Agora é fácil. Nós já conquistamos a liberdade, mas, naquele tempo, era difícil. E aqui estavam calados, as tribunas cerceadas, a imprensa. Aí nasceu a história de anticandidatura. E, a bem da verdade, ninguém admira mais Ulysses do que eu, e eu tenho duas medalhas já no peito com o nome dele que a sociedade me deu. Mas não foi dele, foi do MDB, dos autênticos que surgiu a idéia. E o homem foi o Barbosa Lima Sobrinho, o primeiro candidato. Foi ele quem aceitou a convite dos autênticos do PMDB, um deles do Piauí, o Severo Eulálio, Deputado Federal. Tinha de ter o Piauí, nós tínhamos de estar. Então, a idéia nasceu; e o candidato era Barbosa Lima Sobrinho. Mas o nosso Ulysses, que está encantado no fundo do mar, numa visão, numa percepção, viu que o negócio era bom, e ele era o líder mesmo do MDB. Aí, a solução era botar o Barbosa Lima Sobrinho para vice da chapa.

Essa é a história verdadeira. Ô Arruda, e nós fizemos antes. Aquilo foi em 1974, Ulysses. Em 1972, na minha cidade, Parnaíba, no Piauí, nós tomávamos a prefeitura da Arena, Elias Ximenes do Prado, eu e outro, na ditadura, a maior cidade do Piauí, antes de Ulysses. Os autênticos. Daí nós estarmos aqui. Em 1972, nós vencemos a ditadura. É outra história.

Mas o que eu queria dizer era o seguinte: foi esse jornalista. E tanto é verdade que, no dia, Ulysses dirigiu bem. Eu acho que está certo, porque os autênticos achavam que ele não devia vir. Deram passaporte, sinal verde para ele despertar o País para a redemocratização, mas os autênticos não queriam que ele viesse no dia, para não dar validade, não dar festividade, não dar alegria, legalizar aquilo. E nem Ulysses... Daí, quando me falam do PMDB, eu digo: Ulysses, aqui, teve dezessete votos em branco, não levou o PMDB. Agora falam que nós temos, porque continuam os autênticos aqui. É a história. Somos Pedro Simon, Geraldo Mesquita, Jarbas e Mão Santa. Nós já tivemos até mais, mas essas coisas são assim mesmo. Estamos forjados. Mas eu acho que ele devia ver o Ulysses. Que belo discurso, Inácio Arruda. Eu já li várias vezes.

E outra vez o meu Piauí falando em nome do candidato, porque ele era o anticandidato, Barbosa Sobrinho. Era Petrônio Portella defendendo Ernesto Geisel. E que belos discursos! Eu me orgulho de Petrônio Portella.

O homem é o homem e suas circunstâncias, e eu dou o testemunho. Eu estava lá - e Deus é muito bom para mim - do lado do Petrônio, quando esta Casa... E ele é o melhor exemplo para todos aqueles que presidem. Ô Inácio! E tinha uma reforma do Judiciário. Os militares mandaram como se mandam essas medidas provisórias, mas era melhor, era decreto-lei, que só valia quando era aprovado. Agora nós nos acocoramos, nós nos acovardamos, nós nos envergonhamos. E vai ligeiro... Também o Luiz Inácio conhece. Ele passou ali e disse que tinha trezentos picaretas. Ele manda e abusa. Mas mandaram e Petrônio mandou voltar o projeto de lei. E os canhões rodearam e fecharam. Eu estava do lado. Ali é homem do Piauí. Por isso é que estamos aqui. Aí a imprensa... Eu estava do lado de Petrônio quando ele disse uma só frase - eu aprendi, Inácio Arruda, a autoridade é moral: “Este é o dia mais triste da minha vida.” Deus me permitiu estar do lado dele.

Eu tenho um retrato dele, novinho, ele me estimulou, me induziu a entrar na política. Eu não sei se foi bom, porque eu era tão feliz como médico em uma Santa Casa de Misericórdia. Deus guiava estas mãos, salvando um aqui e acolá, mas estamos combatendo um bom combate, percorrendo o nosso caminho e pregando a nossa fé. A nossa fé é na imprensa.

Aí Petrônio disse: “Este é o dia mais triste da minha vida.” Vejam que autoridade moral! Cinco dias depois, Geisel mandou abrir o Congresso e nós estamos aqui.

            Então, o que eu queria dizer é que estamos aqui e a imprensa... Eu sei que Montesquieu e o povo francês disseram que era poder. Eu tenho as minhas convicções e entendo que não tem nada de poder. Nós somos instrumentos da democracia: o instrumento Executivo - eu já fui prefeitinho e governador -, o instrumento legislativo e o instrumento judiciário.

Nós vimos ontem. Em todo o mundo é de pão de que mais necessita a humanidade, porque ele é verdadeiro. Nós sabemos que sem justiça não tem sociedade, não tem paz, não tem país, não tem democracia.

Ontem, fomos premiados com o novo Presidente Gilmar Mendes. Que ele busque também inspiração no Piauí. Não teve melhor Presidente do que Evandro Lins e Silva. Não teve. Eu vi o Miguel Arraes, meu amigo, dizer que ele já estava certo de que seria comido pelos jacarés em Fernando de Noronha. Aí Evandro Lins e Silva o mandou soltar, como dezenas. Então também o Piauí é orientação.

E nós estamos aqui, orgulhosos, agradecidos.

Fazer jornal não é meio de vida, é meio de morte. Eu sei como é, porque eu tive. Eu fico olhando assim, e penso: “Não é bem de vida, não; é meio de morte.” Eu tive um.

Arruda, eu era Deputado estadual, aí tinha um pequenininho de um monsenhor, igual ao Padre Cícero. Monsenhor Roberto Lopes, em Parnaíba, igual a Padre Cícero. E ele estava velhinho e tinha um jornal. Quando tratava de igreja era um sino, e ele entrava na política, era ação. Eu disse que ia comprar porque ele estava velhinho, tinha sido professor... Ô homem trabalhador! Fez a Igreja dos Capuchinhos, fez o Círculo Operário, abrigo de velhos, muitas coisas. E, naquele tempo, a igreja não tinha esses ganhos, estava em dificuldade mesmo. A irmã dele era minha cliente e eu disse: “Quero comprar o jornal.” Nem precisava, podia botar outro nome, mas era para dar dois salários mínimos para que ele vivesse com dignidade o final, mas isso ajuda. Eu já era Deputado, era um médico muito famoso. Naquele tempo não eram essas tabelas miseráveis do INPS, não; se ganhava bem, com dignidade. E com o propósito, depois, de fazer a sepultura dele, um homem que merecia.

Aí, depois de Deputado, eu fui Prefeito. Arruda, eu vi que esse rolo não dava certo. O meu jornal e a prefeitura? Não dava certo. Então eu me desfiz daquelas máquinas velhas, das letrinhas, aquele negócio. Mas eu dirigi, eu e a minha Adalgisa. É complicado. Eu era médico, não precisava disso. Eu tinha uma coluna: “A Política Maior”. Eu não sou mão santa, mas sou filho de mãe santa, terceira franciscana. Ela tem um livro publicado: A Vida, um Hino de Amor. Esse paramento do Senador Pedro Simon a mim é pela minha mãe - são terceiros franciscanos.

Fui buscar até Henry Ford, que disse que qualquer empreendimento dava certo. Um jornalista perguntou a ele: “E se tocarem fogo na sua fábrica e você ficar pobre?” Ele respondeu: “Não tenho medo. Vou ouvir outra necessidade da comunidade e vou fabricá-la com os seguintes princípios: maior quantidade, menor tempo e menor custo.” Por isso os carros dele eram todos pretos.

Inácio, fiz, com a minha Adalgisa, a minha mulher, o jornal funcionar, seguindo... Eu, médico-cirurgião, para testar. É difícil manter um jornal, meus amigos! Olhem os heróis! Não tinha lucro. E era preto, porque é mais barata a tinta preta. Então, são heróis todos esses que mantêm. Nós já vimos muitos falirem.

Quando estudava no Rio de Janeiro, eu lia, porque era mais barato - era médico residente - A Notícia. Havia O Dia, do Chagas Freitas e, a uma hora, saía A Notícia. Era pequenininha. Era bem mais barato. Aquilo, no fim do mês, para um médico residente, era uma economia.. Em relação ao O Globo, ele era bem mais barato. E tinha o Stanislaw Ponte Preta. Que felicidade ler Stanislaw Ponte Preta depois do almoço! E eu ia ajudar nas operações.

Então, são essas as nossas palavras.

E trago aqui a gratidão do Piauí pelos jornais que tem lá. Na minha cidade, ainda tem um, cujo pai é Mário Gomes Meireles. É difícil, e herói. Os do Piauí, dois empresários grandiosos fizeram jornais modernos: o Meio Norte, Diário do Povo, e o tradicional O Dia, e todos. Fácil ou não, eu admito, porque eu sou do tempo do Rio de Janeiro, com Carlos Lacerda, de Raul Brunini. Como é o nome daquele da pena de morte? Amaral Neto. Eu precisei aqui da ajuda do nosso Maurício “doce” para lembrar. Amaral Neto. Eu me lembro como se fazia a imprensa às nove horas da noite: Raul Brunini apresenta Carlos Lacerda. E o meu pai ouvindo o rádio. Aí o Getúlio, depois de ouvir aquele discurso: “Será mentira a viúva? Será mentira o órfão? Um mar de lama?” Afonso Arinos. Por isso, esta tribuna é forte. Quem ouviu aquele discurso...Você já ouviu, Inácio Arruda? Mas não vai fazer para ninguém lá no Ceará, não, porque o cabra, depois daquele discurso...

Então, os nossos agradecimentos. E eu quero dizer que nos considero instrumentos da democracia. O poder é o povo que trabalha e paga a conta; o poder foi isso que nasceu do povo. A voz do povo é a voz de Deus. O povo diz que a imprensa é o quarto poder. E eu quero dizer que, nos dias de hoje, com a decadência em que estamos, ela é o primeiro poder.

Os parabéns do Piauí à imprensa brasileira! (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/04/2008 - Página 10733