Discurso durante a 110ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comemora sanção do Presidente Lula a projeto de lei de autoria de S.Exa. que garante às crianças, a partir dos quatro anos de idade, o direito a vaga em escola pública. Comentário sobre projeto que propõe a criação do royalty verde. Chamada de atenção para diversas matérias referentes à educação, que gostaria de ver sancionadas.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO. POLITICA DO MEIO AMBIENTE. LEGISLAÇÃO PENAL. POLITICA SOCIAL.:
  • Comemora sanção do Presidente Lula a projeto de lei de autoria de S.Exa. que garante às crianças, a partir dos quatro anos de idade, o direito a vaga em escola pública. Comentário sobre projeto que propõe a criação do royalty verde. Chamada de atenção para diversas matérias referentes à educação, que gostaria de ver sancionadas.
Aparteantes
Eduardo Azeredo.
Publicação
Publicação no DSF de 25/06/2008 - Página 22942
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO. POLITICA DO MEIO AMBIENTE. LEGISLAÇÃO PENAL. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • CUMPRIMENTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, SANÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, GARANTIA, DIREITOS, EDUCAÇÃO PRE-ESCOLAR, IMPORTANCIA, ANTECIPAÇÃO, ENTRADA, CRIANÇA, POPULAÇÃO CARENTE, ESCOLA PUBLICA, FACILITAÇÃO, APRENDIZAGEM, ALFABETIZAÇÃO, EXPECTATIVA, CONSCIENTIZAÇÃO, COBRANÇA, APLICAÇÃO, LEGISLAÇÃO.
  • JUSTIFICAÇÃO, AGILIZAÇÃO, TRAMITAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, CRIAÇÃO, ROYALTIES, PROTEÇÃO, MEIO AMBIENTE, PRESERVAÇÃO, FLORESTA AMAZONICA, APLICAÇÃO DE RECURSOS, PARTE, TRIBUTOS, PETROLEO.
  • EXPECTATIVA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, OBRIGATORIEDADE, PREFEITURA, APLICAÇÃO, EDUCAÇÃO, RECURSOS, ROYALTIES, PETROLEO.
  • APOIO, PROPOSTA, GOVERNO, NACIONALIZAÇÃO, ROYALTIES, EXCLUSIVIDADE, APLICAÇÃO, EDUCAÇÃO.
  • CRITICA, LEGISLAÇÃO PENAL, DIFERENÇA, CRIME, CRIME HEDIONDO, PRIVILEGIO, TRATAMENTO, PRESO, ESCOLARIDADE, ENSINO SUPERIOR.
  • DEFESA, PROJETO DE LEI, DEFINIÇÃO, CRIME HEDIONDO, HOMICIDIO, AUTORIA, MOTORISTA, SITUAÇÃO, EMBRIAGUEZ.
  • DETALHAMENTO, PROJETO DE LEI, AUMENTO, RESPONSABILIDADE CIVIL, PAES, EDUCAÇÃO, FILHO, ESPECIFICAÇÃO, CONTRAPRESTAÇÃO, RECEBIMENTO, BOLSA FAMILIA, PRESENÇA, ESCOLA PUBLICA, AUTORIZAÇÃO, REDUÇÃO, IMPOSTO DE RENDA, APLICAÇÃO DE RECURSOS, ENSINO, ESTUDANTE CARENTE, AUSENCIA, PARENTE.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, DIREITOS, BRASILEIROS, RESIDENCIA, EXTERIOR, ELEIÇÃO, REPRESENTANTE, CONGRESSO NACIONAL, COMENTARIO, SESSÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, HOMENAGEM, EMIGRANTE.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Senador Collor, vim aqui cumprimentar o Presidente da República, que sancionou, na semana passada, um projeto de lei de origem desta Casa, coisa rara ultimamente. Raros projetos que saem daqui têm conseguido chegar à sanção presidencial. Mas fico feliz de saber que o Presidente, como tomei conhecimento, sancionou e publicou no Diário Oficial um projeto que dá direito a cada família de levar os filhos à escola a partir do dia em que eles fizerem quatro anos. Ou seja, aquela idéia de que os filhos dos ricos têm direito à escola a partir dos dois anos e de que os dos pobres têm esse direito só a partir dos seis anos muda no Brasil. A partir de agora, é um direito de toda família ter uma vaga na escola para o filho que completar quatro anos. Isso muda a realidade.

            Para minha surpresa, muitos perguntaram por que, para que garantir vaga a uma criança aos quatro anos, Senador Geraldo Mesquita. Todos deviam saber que é quase certo que uma criança que entra aos quatro anos na escola já sabe ler aos seis anos. A que entra na escola aos seis anos pode chegar aos nove anos sem saber ler, pode entrar na adolescência e virar, aos 15 anos, um adulto analfabeto.

            Mas não é só o fato de aprender a ler: a criança que entra aos quatro anos na escola - não só na escola, mas também no futebol, na música e em outras atividades - tem mais condições de dar continuidade aos seus estudos. É a partir da primeira infância que uma criança começa a demonstrar e desenvolver seu potencial e seu talento.

            Por isso, creio que o Brasil entra numa nova fase ao emitir esse direito para as famílias, mas isso não se vai transformar automaticamente em realidade. Haverá um tempo para que os pais tomem conhecimento disso. Os pais pobres não vão saber disso. É preciso tempo para que tomem conhecimento do que parece uma ousadia para eles: reivindicar um novo direito que surgiu.

            Vai tomar tempo também para que as escolas se adaptem. Não podemos esperar que essas escolas comecem a ter espaço suficiente. Algumas vão reagir, vão dizer que é preciso esperar, mas vão ser cobradas, de tal maneira que, ao longo de um, dois, três, cinco anos, talvez até mesmo dez anos, as crianças das famílias mais pobres terão o mesmo direito das crianças das famílias mais ricas: entrar em uma escola a partir da primeira infância.

            Mas, se esse projeto já está sancionado, quero chamar a atenção para o fato de que outros estão caminhando aqui. E era preciso que a gente combinasse, se fosse o caso, com as autoridades governamentais, para que Executivo e Legislativo, juntos, avançassem nessa questão.

            Há um projeto também de minha autoria, como esse da criança na escola a partir dos quatro anos, que acabei de citar, Senador Collor - e falo para o senhor, porque o senhor foi o Presidente que trouxe para o Brasil o problema do meio ambiente -, que propõe a criação do royalty verde. O objetivo do projeto é levar uma parte do royalty que hoje é recebido pelo petróleo para a Amazônia, transformar aquele recurso que se está esgotando em fonte de dinheiro, para proteger os recursos que a gente quer que não se esgotem jamais. Com esse royalty verde, o dinheiro do petróleo seria usado para gastar com a proteção da floresta amazônica, incluindo pagamento às famílias que viviam onde as florestas fossem protegidas, incluindo transferências ao governo estadual, cada um deles, com base nas fotos dos satélites que indicassem onde houve pequena queima de florestas. Esse projeto está circulando. Vai levar quatro ou cinco anos para ser sancionado, como ocorreu com aquele que diz que as crianças com quatro anos têm direito à escola, salvo se o Governo decidir fazê-lo logo.

            Há outro também, Sr. Presidente, muito parecido com o que, nesses dias, li e que o Governo pensa em mandar para cá. Fiquei feliz. Ele obriga que todo royalty do petróleo que vai para uma cidade seja aplicado na educação. Fica naquela cidade. Não vou comprar briga com os Prefeitos, embora pessoalmente eu ache que a lei de royalties deveria ser substituída com uma visão nacional, não com uma visão estadual e municipal, como é hoje.

            O petróleo não pertence à cidade, mas, sim, à Nação brasileira. É uma dádiva geológica, não histórica, nada tem a ver com o tempo de descoberta do Brasil, muito menos com o tempo de formação dos Estados e da criação das cidades. Mas não quis entrar nessa disputa. Meu projeto é simples: o royalty fica na cidade, mas é aplicado obrigatoriamente em educação. É uma maneira de o Brasil dar um recado aos Prefeitos: “Respeitamos que vocês dirijam cidades que têm petróleo e que, com isso, usem o recurso do royalty que deveria ser nacional, mas o Brasil exige que vocês gastem com suas crianças, para que elas tragam retorno para o País”.

            Pelo que vi nos jornais, o Governo está pensando em um projeto de royalty que nacionalize os royalties para a educação. Eu o acho corretíssimo e até mais avançado que minha proposta. Terei o maior prazer em substituir o meu por esse, se for o caso, mas que ele seja encaminhado rapidamente, para que funcione aqui, circule aqui, como os projetos que vêm do Governo, que têm uma velocidade muito diferente da dos projetos que nascem aqui dentro.

            Quero chamar a atenção também para um projeto que está circulando aqui e que considera como crime hediondo todo assassinato - essa é a palavra certa - provocado por motoristas embriagados ou sob efeito de drogas. Hoje, o motorista que comete um assassinato por dirigir embriagado um automóvel é tratado como um criminoso comum, quando acredito que seja criminoso de uma gravidade muito maior. Reconheço que deveríamos acabar com essa história de crime hediondo; todo crime deveria ser hediondo. O Brasil é um dos raros países que põem um adjetivo na criminalidade. Existem crimes e crimes hediondos; essa é uma coisa raríssima. Existem crimes contra a pessoa e crimes contra a humanidade; há uma distinção de qualidade entre esses dois crimes. Mas diferenciar crime de crime hediondo é algo muito especial do Brasil, como também é especial do Brasil o fato de preso com título superior ter tratamento diferente daquele que é dado ao criminoso que não tem título superior. Talvez, isso seja fruto da aristocracia, da monarquia, quando havia leis especiais para os aristocratas; estas eram leis diferentes das que chegavam ao povo. A incompleta República brasileira importou da monarquia esses privilégios à parcela de nível superior ou rica, que é quase a mesma coisa no Brasil, e os mantém. É preciso acabar com isso. Então, há esse projeto.

            Há um projeto simples, Senador Adelmir Santana, que prevê a obrigatoriedade de os pais que recebem o Bolsa-Família irem pelo menos uma vez à escola de seus filhos. O Bolsa-Família já descaracterizou muito a responsabilidade com a educação ao fazer a fiscalização da freqüência de maneira tímida, sem rigor, como era feito quando era administrado pelo Ministério da Educação. Ao passar pelo Ministério da Assistência Social, do Desenvolvimento Social, como é chamado, naturalmente, conceitualmente, filosoficamente, já diminui a obrigatoriedade da educação, porque, vamos falar com franqueza, a obrigação do Ministério do Desenvolvimento Social é dar comida, não educação. Eles até estão corretos, do ponto de vista filosófico, na administração pública. Mas pelo menos obriguemos os pais a irem à escola de seus filhos uma vez por mês. Não é muito. Esse projeto está andando muito devagar aqui. Se o Governo abraçasse essa idéia, tenho certeza de que ele tramitaria de maneira muito mais rápida.

            Também há um projeto que defendo, sim: que todos os pais neste País tenham o direito a um dia por ano de falta ao trabalho, desde que compareçam à escola do filho, não para ficar flanando, não para ficar se distraindo, mas para ver como anda o seu filho! Esse é um projeto que traz a responsabilidade ao pai na educação do filho. Da mesma maneira, está correndo aqui um projeto de minha autoria que dá responsabilidade total aos pais, de tal maneira que um pai, se tiver um filho fora da escola, poderá ser responsabilizado criminalmente. Há gente assustada com esse projeto. Dizem que é um absurdo, que fere os direitos civis e os direitos humanos, que a liberdade é o maior bem que se tem e que ninguém pode tirar; dizem que se criminaliza o fato de uma criança não estar na escola. Creio que a liberdade de alguém não mandar o filho à escola deve ser uma liberdade negada. Cada um de nós não tem liberdade de matar o outro, de roubar do outro, ou seja, a liberdade tem seus limites. Por que ter a liberdade de roubar o futuro do filho, ao negar-lhe uma escola, ao não ser responsável pela freqüência da criança à escola? Esse projeto está avançando devagar.

            Finalmente, Sr. Presidente, para terminar o tempo, quero chamar atenção para um projeto de lei que também apresentei e que permite a redução no Imposto de Renda, Senador Pedro, para gastos com crianças carentes. É muito interessante: os ricos podem descontar do Imposto de Renda o que gastam com seus filhos, mas, se um cidadão sem filhos quiser investir na educação de uma criança pobre, ele não pode pedir o desconto no Imposto de Renda. Tenho minhas dúvidas sinceras se esse desconto do Imposto de Renda deveria existir. Tenho minhas dúvidas sinceras se a gente deveria dar desconto do Imposto de Renda para pagar escolas particulares para os filhos dos ricos, se esse dinheiro não deveria ir todo para o Estado, para investir na escola pública dos filhos dos pobres. Mas, já que existe, não vamos criar confusão e briga com isso. Pelo menos que se dê direito ao desconto àquele que quer gastar com a educação do filho ou com a educação de seus trabalhadores em casa ou de algum trabalhador na sua empresa de nível mais baixo de renda. Aquele que não tivesse filhos poderia fazer o desconto se gastasse esse dinheiro na educação dos filhos dos pobres.

            São alguns projetos, Sr. Presidente, que trago aqui, apenas para lembrar a satisfação que tive na semana passada de ver meu primeiro projeto de lei sancionado pelo Presidente da República. Diante do desânimo que, muitas vezes, toma conta da gente nesta Casa e que faz a gente se perguntar “o que é que estou fazendo aqui, neste frio, no meio de gripes?”, quando a gente vê um projeto de lei nosso sancionado pelo Presidente da República, quero dizer que a gente pensa “vale a pena continuar insistindo”.

            Vou continuar insistindo nesses outros projetos, mas pedindo ao Presidente da República que tente ver qual desses casa com as intenções do Governo e que o abarque, de preferência respeitando a paternidade. Do contrário, que pelo menos faça com que o projeto não espere quatro, cinco, seis anos ou até mais para ser sancionado!

            Dá-me tristeza, às vezes, ver projeto de lei de Senador que já morreu. E isso é comum. Procurem ler a lista, que verão a quantidade que há. O Governo poderia apressar isso, se houvesse vontade, mas também os líderes desta Casa poderiam fazê-lo.

            Sr. Presidente, era o que tinha a falar, mas, de qualquer maneira, há um pedido do Senador Azeredo para apartear, a quem concedo o aparte com muito prazer.

            O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Gostaria apenas de complementar o que V. Exª disse: há outro projeto de autoria de V. Exª muito importante, que é o que dá direito aos brasileiros que moram no exterior de terem representantes no Congresso, a exemplo do que acontece na Itália. Esse projeto está na pauta do plenário, aprovado em Comissões, e seria outro projeto muito importante para ser viabilizado.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Agradeço-lhe muito, Senador Azeredo, por ter trazido esse projeto. Eu quis ater-me a alguns que dizem respeito a aspectos sociais, sobretudo à educação, mas considero que esse seja um projeto importante. Na semana passada, a Câmara fez uma sessão, e as televisões fizeram programas referindo-se ao “outro Estado” brasileiro, o 28º Estado brasileiro. E é um Estado maior do que muitos dos Estados que o Brasil tem dentro do seu território. Hoje, nossos emigrantes são mais de cinco milhões; de Brasília, são 2,5 milhões de emigrantes. Ou seja, é um novo Estado que surgiu, e não há ninguém que o represente aqui.

            O projeto de lei de reforma da Constituição está sobre a mesa há meses, não é, Senador Eduardo Azeredo? O Senador Azeredo foi o Relator e agregou, criativamente, mudanças ao projeto. O projeto está sobre Mesa e não é aprovado. São cinco milhões de brasileiros que não têm o direito de terem representantes aqui dentro. Seria fácil fazê-lo; bastaria copiar o que fizeram a Itália, a França e Portugal. A Assembléia Nacional de Portugal tem deputados eleitos por portugueses que moram no Brasil. Por que os brasileiros que moram no exterior não têm um deputado eleito por eles para representar seus interesses, sobretudo eles, que mandam US$5 bilhões por ano para o Brasil? Creio que esse seria também um projeto que mereceria nosso esforço, para que o fizéssemos avançar.

            Sr. Presidente, essas eram minhas palavras, agradecendo a sanção do projeto ao Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, que terá essa marca positiva na História - e eu disse isso ao Ministro da Educação -, podendo dizer que, no Governo dele, com a assinatura dele e do Ministro, as crianças de quatro anos de idade, filhas dos mais pobres, a partir de agora, terão direito a uma vaga na escola mais próxima de sua casa.

            Por fim, reitero meu pedido de que apoiemos os demais projetos positivos que circulam nesta Casa.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/06/2008 - Página 22942