Discurso durante a 130ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Avaliação dos trabalhos do Senado Federal durante o primeiro semestre deste ano.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. POLITICA DE TRANSPORTES. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Avaliação dos trabalhos do Senado Federal durante o primeiro semestre deste ano.
Aparteantes
Heráclito Fortes.
Publicação
Publicação no DSF de 12/07/2008 - Página 27316
Assunto
Outros > SENADO. POLITICA DE TRANSPORTES. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • AVALIAÇÃO, EFICACIA, TRABALHO, COMISSÃO, MESA DIRETORA, PLENARIO, SENADO, ELOGIO, SERVIDOR.
  • QUESTIONAMENTO, INCOERENCIA, DECISÃO JUDICIAL, INCITAMENTO, UTILIZAÇÃO, HABEAS CORPUS, DESVALORIZAÇÃO, LEGISLAÇÃO, EXIGENCIA, TESTE, MOTORISTA, CONSUMO, BEBIDA ALCOOLICA.
  • IMPORTANCIA, LEI FEDERAL, AMPLIAÇÃO, PUNIÇÃO, MOTORISTA, CONSUMO, BEBIDA ALCOOLICA, APOIO, POPULAÇÃO, SIMILARIDADE, LEGISLAÇÃO, CRIAÇÃO, FAIXA, PROTEÇÃO, PEDESTRE, INICIATIVA, ORADOR, GESTÃO, GOVERNADOR, DISTRITO FEDERAL (DF), REDUÇÃO, ACIDENTE DE TRANSITO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, CONFIANÇA, OPINIÃO PUBLICA, ATUAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, IMPORTANCIA, DECISÃO, PRESIDENTE, SENADO, OPOSIÇÃO, CRIAÇÃO, CARGO PUBLICO, ASSESSOR, SENADOR, SUGESTÃO, ORADOR, DEBATE, ASSUNTO, PLENARIO.
  • EXIGENCIA, GOVERNO FEDERAL, REDUÇÃO, GASTOS PUBLICOS, IMPEDIMENTO, AGRAVAÇÃO, INFLAÇÃO.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente João Durval, dificilmente ocuparei os vinte minutos. Concluirei muito antes - espero.

Vim aqui fazer um discurso sobre um assunto, mas vou ter de mudar. Vim aqui fazer um discurso de avaliação desse semestre do Senado Federal, porque tenho a impressão de que raros semestres pudemos comemorar tanto quanto esse último, em primeiro lugar ao compará-lo com os anteriores, que foram muito conturbados, sofridos, e pouco eficientes quanto ao trabalho. Nesse semestre, com o Senador Garibaldi, com a atual Mesa - porque não se administra um Senado só com o Presidente -, demos um salto muito grande.

Não vou fazer, hoje, esse relatório e explicarei o porquê, mas vou dar alguns dados. Nós realizamos 51 sessões ordinárias, 43 não-deliberativas, três deliberativas extraordinárias e 18 especiais. São muitas sessões. Nós tivemos - acho que, talvez, nenhum Senador tenha feito esse trabalho - 536 matérias aprovadas. Aproveito para parabenizar a equipe técnica que, por trás da gente, faz com que esse trabalho aconteça nas Comissões e aqui na Mesa: todos os secretários, as secretárias e os funcionários.

Tenho aqui uma lista imensa das atividades que o Senado, Senador Heráclito, fez nesse semestre e também das Comissões. A Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, de que participo, e a que presido, são as duas de que estou mais perto e são exemplos de relatório.

Lamentavelmente, dois fatos me chamam a atenção porque são mais imediatos, da mesma maneira que o Senador Heráclito pegou algo mais imediato.

Primeiro, é uma decisão judicial tomada ontem, e não tem nada a ver com essas que aparecem nos jornais. É a decisão de um juiz de que a pessoa vai carregar o habeas corpus no bolso, porque se um policial pedir para ela usar o bafômetro, ela tem direito a não usar o bafômetro - eu não entendo que Justiça é essa -, com o argumento de que ninguém pode acusar a si próprio. Com esse argumento, qualquer um pode pedir um habeas corpus para não passar pelo detector de metais antes de entrar em um avião, porque ele está se pré-acusando de terrorista.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - É a intenção do crime premeditado.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - É a intenção do crime premeditado.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Claro! Se vou beber, eu tenho um habeas corpus; se tenho um habeas corpus, eu bebo e não me prendem.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - É, é isso.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Durma-se com isso!

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - É a impunidade legalizada por um juiz.

Isso é algo que a gente não pode tolerar, porque se há uma lei que caiu no gosto do povo, foi essa lei chamada “seca” e que eu chamo, na verdade, de “lei cheia de vida”.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Senador Cristovam, desculpe-me interrompê-lo. Só falta se descobrir, amanhã, que por trás disso tem um lobby de fabricante de bebidas. Aí é o fim da picada!

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Mas a pessoa que o pegou é presidente de uma associação de bares. Ele o pegou para dar o exemplo, e sugeriu a todos os clientes que façam o mesmo. Não vai demorar e vai haver juiz dando plantão em bar, em boteco.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Aliás, é preciso que esse juiz veja um fato interessante. O que essa lei, Senador João Durval, tem gerado de empregos V. Exª não imagina! Eu, ontem, fui ao Piantella e vi que aqueles freqüentadores que gostam de tomar o seu vinho, a sua bebida à noite - aliás, fui a dois restaurantes ontem -, hoje estão com motorista. Estão empregando gente. Tem mais esse benefício.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Eu vou dizer mais: é possível que diminua o número dos grandes bares, mas que surjam pequenos perto de casa.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Claro!

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - E, aí, sabe o que vai acontecer neste País graças a essa lei, sem ninguém buscar isso? Mais convivência das vizinhanças. Em vez de você beber com o amigo longe, você vai beber com os vizinhos perto, para poder ir andando para casa.

Essa lei caiu no gosto do povo.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Faríamos um programa: o “trago solidário”.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - O “trago solidário”, é verdade, em vez do “trago solitário” dos poetas.

Pois bem, essa lei é uma daquelas que têm tudo para dar certo, porque ela tem as duas coisas de que uma lei precisa - eu tenho o orgulho de ter patrocinado uma dessas aqui, no Distrito Federal -, pois é a lei que cai no gosto do povo, mas que tem polícia para fiscalizar quem não quer se sintonizar com o gosto do povo.

Eu patrocinei uma dessas: a lei das faixas de pedestres no Distrito Federal. Essa lei das faixas de pedestres - quem vem de fora fica surpreso com como, no Brasil, os carros param para qualquer pessoa que quiser atravessar, na hora que chegar na calçada - não teria dado certo se fosse apenas uma lei sem o gosto do povo. O povo pegou gosto, mas não pegaria se a gente não tivesse multas, se a gente não tivesse uma campanha muito forte para barrar o que é contravenção, como, hoje, é contravenção beber e dirigir.

No Brasil, não é contravenção beber, nem estou aqui com moralismo algum de pedir às pessoas que parem de beber. O que eu estou querendo é que parem de dirigir e a lei está conseguindo isso.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Eu quero dar mais um pitaco no seu discurso. Quero-lhe dizer que, no meu modo de ver, a maior obra do seu Governo, em Brasília, foi o respeito ao sinal de trânsito, porque poupou vidas e mostrou ao Brasil que, havendo boa vontade e havendo método, você educa. V. Exª deixou o Governo há quantos anos?

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Quatro anos.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Quatro anos. Vá lá, eu nunca vi essa campanha ser realimentada, mas ainda hoje se respeita.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Se respeita.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - De maneira religiosa. Eu observo muito, aqui nessa rua de acesso ao Senado, que, quando os funcionários que trabalham aqui e no Palácio do Planalto querem atravessar a rua, todos os motoristas obedecem.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Todos, todos.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Eu não discuto as obras físicas, não. Eu sou favorável aos exemplos. Esse é um exemplo fantástico, que mostra ao Brasil que quando se quer é possível.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - É verdade. Eu o disse no final do meu Governo.

“Qual foi a sua maior realização?” Eu disse: “Eu mudei a cultura do povo, no que se refere ao trânsito”. E gerou, no primeiro momento, desemprego, porque a redução de acidentes - não da faixa de pedestres, mas de toda a campanha - fez com que houvesse tão poucos acidentes que as oficinas de lanternagem começaram a fechar. Nós tivemos de abrir uma linha de crédito para que mudassem de ramo e fossem fabricar carro de mão, enxada e outras coisas. Ninguém ficou desempregado, mas teve de mudar de ramo.

Os hospitais passaram a ter leitos vazios, e é isso que vai acontecer com essa chamada “lei seca”, a “lei cheia de vida”. Agora, não com a Justiça sem colaborar. Se houver um afrouxamento que seja no bafômetro, na fiscalização e na punição, a gente perde, porque o gosto do povo sozinho não vai adiante. Então, por isso eu não vou falar das realizações. Temos a próxima semana.

O outro fato, Senador - eu acho que nos toca aqui, diretamente -, está em todos os jornais. A Mesa do Senado, que eu respeito profundamente - são pessoas pelas quais eu tenho, inclusive, carinho e respeito -, tomou a decisão de aumentar o número de assessores para nós. Eles não tomaram essa decisão sem pensar muito, sem refletir, sem levar em conta que, para que o nosso trabalho funcione melhor, é necessário mais um assessor, mas eu acho que eles não levaram em conta duas coisas.

Primeiro, o fato de que, hoje, isso cai na opinião pública, desmoralizando o Senado. Ainda que seja necessário - eu acredito que seja -, vai contra a austeridade de que falava o Senador Heráclito Fortes há pouco. Vai contra a austeridade e isso gera um desgaste. O que a gente vinha fazendo para se recuperar - e eu vim aqui ler um relatório que foi feito no último minuto - traz uma mancha que, mesmo certa, parece errada na opinião pública. E, se parece errada na opinião pública, eu acho que a gente não deve fazer, porque não se trata dessas leis para salvar o País, que às vezes o povo pode não querer, mas os líderes têm obrigação de tomar. Não podemos governar pela popularidade. Nós temos de governar pela credibilidade.

E o segundo fato, oportunidade, é que nós estamos vivendo um período de inflação aparecendo, com sua boca imensa, diante de nós. Nós temos de exigir do Governo Federal reduzir gastos, porque os gastos públicos estão pressionando a inflação. Não adianta dizer que a inflação é apenas importada, porque não é verdade. Ela é importada do petróleo e do alimento, mas ela vem dos gastos públicos, ela vem de uma cultura inflacionária, ela vem, se a gente não cuidar bem, da taxa de juros e ela vem, se a gente não cuidar bem, da taxa de câmbio. Mas o gasto público do Poder Executivo é uma das causas.

E que autoridade a gente terá de falar em reduzir gastos públicos se, neste momento, aumentarmos o gasto público, mesmo sendo necessário? Eu não estou pondo em xeque, eu não estou pondo em dúvida a correção técnica da decisão. Os membros da Mesa continuam merecendo a minha confiança, o meu respeito, e devem ter pensado muito, tanto que isso era para ser feito três meses atrás e não foi, por causa da pressão popular. Houve um recuo e se segurou; agora, se aprovou.

Mantenho o respeito à Mesa, mantenho a credibilidade aos Senadores que ali estão, agora, eu creio que nós precisamos evitar fechar o semestre com essa medida, que quebra um pouquinho da credibilidade que a gente vinha recuperando. Como fazer isso?

Falei com o Presidente Garibaldi, agora de manhã, e ele disse, com a maior clareza, que ele próprio não é a favor dessa decisão, que ele próprio considera que ela não é positiva neste momento. Ele defende que a gente tente conversar com outras pessoas, com outros Senadores, com os membros da Mesa - e aí a minha proposta, não é dele - e traga o assunto para o Plenário. Vamos debater esse assunto em Plenário. Vamos debater, porque aí a gente convence a opinião pública de que isso é necessário. Ou, se a gente não convence a opinião pública, a gente percebe que isso não está na hora de ser feito. Não por ser errado, não por ser imoral, não por ser indecente - essas acusações não estou fazendo a ninguém -, mas por não ser oportuno, na medida em que não está merecendo a credibilidade na opinião pública, que a gente precisa para exercer o nosso trabalho.

Sr. Presidente, Senador João Durval, disse que não gastaria os vinte minutos, e não vou.

Concedo o aparte ao Senador Heráclito Fortes.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Senador Cristovam Buarque, gostaria de parabenizá-lo pelo pronunciamento que faz. Veja como repercute o que diz V. Exª. Rapidamente, chega-me à mãos um folder bastante interessante. Vou lê-lo aqui, depois o entregarei:

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É o começo. Está aqui uma solução para os candidatos a pinguços nas noites de Brasília. Que o Brasil todo copie!

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Claro!

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Podemos ter alegria sem colocar em risco a vida dos outros.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Claro!

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - O juiz faria melhor se estimulasse esse tipo inclusive de geração de emprego do que tentar desmoralizar uma lei que beneficia o cidadão, que não tem sequer o direito de se proteger nas ruas do Brasil. Muito obrigado a V. Exª.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT- DF) - Agradeço o senhor pela confirmação. Eu só temo, Senador Heráclito, que o motorista desta van entre também na Justiça e assuma o direito de não ser parado para usar o bafômetro, porque aí vai ser pior; vai ter acidente com muita gente.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Não é van, não. É apenas o motorista. O motorista leva o seu carro.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Espero que esse motorista não entre na Justiça para ter o direito de se negar a usar o bafômetro.

Sr. Presidente, concluí dentro do tempo.

Ainda virei aqui na próxima semana fazer um discurso - e gostaria de ver outros Senadores fazendo o mesmo - sobre o que foi este semestre. Foi um bom semestre para o Senado. Começamos a recuperar a credibilidade perdida, por uma série de fatos, que todos nós somos responsáveis.

Não vou fazê-lo ainda, porque surgiu este fato, a decisão de um juiz, que eu quis comentar aqui, para pedir que não deixem continuar essa proliferação de bafômetro tapado - é isso que vão fazer; vão tapar os bafômetros -, por meio de habeas corpus no bolso. Antigamente, Senador Heráclito, já que estamos numa sexta-feira, brincando, as pessoas precisavam de habeas corpus da esposa para ir ao bar. Agora vão precisar de habeas corpus do juiz para voltar do bar.

Portanto, ficam aqui meus apelos: em relação à não proliferação de habeas corpus e à discussão - respeitando a Mesa, respeitando todos os membros da Mesa; e não tenho nenhuma critica a nenhum deles - sobre a oportunidade dessa medida da Mesa, diante dos gastos públicos, pelos quais brigo com o Poder Executivo pela sua redução. E o faço em nome da austeridade e também da credibilidade. Nada pode ser feito aqui, mesmo se necessário para nós, sem o apoio popular. Pelo visto, não está havendo esse apoio popular.

É isso, Sr. Presidente.

Agradeço a V. Exª o tempo que me foi dado para a minha fala.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/07/2008 - Página 27316