Discurso durante a 182ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão sobre as eleições municipais que se realizarão no próximo domingo, em todo o País. Apelo no sentido de que os eleitores fiquem atentos aos candidatos que se interessam pelo futuro das crianças do Brasil.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES.:
  • Reflexão sobre as eleições municipais que se realizarão no próximo domingo, em todo o País. Apelo no sentido de que os eleitores fiquem atentos aos candidatos que se interessam pelo futuro das crianças do Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 03/10/2008 - Página 38689
Assunto
Outros > ELEIÇÕES.
Indexação
  • EXPECTATIVA, REALIZAÇÃO, ELEIÇÃO MUNICIPAL, BRASIL, ADVERTENCIA, ELEITOR, ATENÇÃO, ESCOLHA, CANDIDATO, COMPROMISSO, EDUCAÇÃO, REGISTRO, AUSENCIA, DIFERENÇA, IDEOLOGIA, IMPORTANCIA, PROPOSTA, LONGO PRAZO, MELHORIA, ENSINO FUNDAMENTAL, CRECHE.
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, PREFEITURA, CAMARA MUNICIPAL, GARANTIA, ENSINO FUNDAMENTAL, CRECHE.
  • SOLICITAÇÃO, ELEITOR, CONSCIENTIZAÇÃO, VOTAÇÃO, ESCOLHA, PREFEITO, VEREADOR, CONFIANÇA, INTERESSE, DEFESA, FUTURO, CRIANÇA, IMPLANTAÇÃO, PISO SALARIAL, PROFESSOR.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Gim Argello, Presidente da Mesa, vim aqui, com a convicção de que não firo lei eleitoral alguma, de que não vou pedir voto para candidato algum, de que não vou pedir voto para partido algum. Mas vou falar sobre as eleições que acontecerão dentro de três dias.

Dentro de três dias, vocês que me estão assistindo vão eleger 52.137 Vereadores - é um número significativo - e 563 Prefeitos. Logo, vão eleger os futuros líderes deste País, porque é de vereador que se vem, é de prefeito que se vem, até se chegar aos níveis superiores da liderança nacional. Mas, mais que isso, vocês vão eleger aqueles que, nos próximos quatro anos, vão cuidar das ruas onde vocês moram; vão cuidar, em parte, da água que bebem; vão cuidar do saneamento na casa de vocês; vão cuidar da regulamentação das feiras, do comércio. Vocês vão eleger aqueles, sobretudo, que vão cuidar das crianças de vocês e do Brasil inteiro. No Brasil, são os prefeitos, são as câmaras municipais, é o governo local que cuida do ensino fundamental; que cuida, onde há, das creches; onde não há creches, são eles que cuidam do apoio às mães que têm filhos.

Por isso, a eleição do dia 5 tem uma importância muito maior do que a maior parte dos eleitores percebe. Há uma tradição de se dar mais importância ao Presidente, aos Governadores, aos Senadores, aos Deputados Federais e aos Deputados Estaduais do que àquele que está na ponta, em contato com vocês, que é o Vereador, e do que àquele que está na ponta como executivo, que é o Prefeito.

Nesses últimos dias, Senador Gim, rodei boa parte deste País, defendendo nomes que aqui não vou falar, obviamente. E o que percebi, em primeiro lugar, foi o caos partidário que há no Brasil. Tenho o meu Partido; meu Partido tem um número. Fiz campanha para os mais diversos Partidos e números coligados com o meu. Fiz campanha, vendo juntas no mesmo palanque pessoas que, até pouco tempo atrás, eram adversárias e que vão continuar sendo adversárias daqui a pouco, como se os Partidos tivessem se transformado em clubes eleitorais de acordo com a conveniência do momento. Vi a falência dos Partidos nesse processo eleitoral que acompanhei como militante de um deles, fazendo campanha para seus candidatos.

Por isso, vim aqui fazer um apelo aos eleitores brasileiros, aos 130 milhões de eleitores que vão escolher 52.137 Vereadores e 563 Prefeitos: primeiro, procurem votar naqueles que merecem confiança; olhem nos olhos deles na hora de conversar, quando eles nas ruas os encontram, quando na televisão eles aparecem; olhem o passado deles, vejam até que ponto esse passado é coerente com o que eles falam para o futuro, tanto do ponto de vista ético, quanto do ponto de vista da proposta que eles fazem ou que ele faz, o seu candidato. Preste atenção, porque há candidatos que já o enganam quando olham para você - e dá para perceber - e há outros até que passam uma idéia incompatível com o passado; logo, não vale a pena confiar.

Este é o primeiro ponto: o ponto da confiança. Essa é uma coisa subjetiva que você vai ter de escolher conforme sua experiência, conforme seu gosto. A outra coisa, ao escolher seu candidato, seja para Prefeito, seja para Vereador, seja para Prefeita ou para Vereadora, é a seguinte: olhe as propostas que eles fazem. É claro que todos eles prometem mais ou menos o mesmo em relação ao asfalto e aos jardins, em relação a acabar com a poeira - isso todos falam. Mas eu queria pedir que olhassem um aspecto das propostas dos seus candidatos: o compromisso deles com suas crianças, o compromisso deles com a educação das crianças no ensino fundamental e o cuidado com as crianças nas creches - mesmo que hão haja creche, olhem o apoio que será dado àquelas famílias que precisam.

Quando for votar, não vou pedir que você ignore o presente nem a si próprio. Mas não fique só no presente e em si próprio, olhe o futuro e o conjunto da cidade. E tanto o futuro como a cidade dependem das crianças, pois são elas que vão fazer a sua cidade, são elas que vão construir o futuro. E é na escola que as crianças e o futuro se encontram. A escola é uma espécie de esquina onde a criança, a pessoa, o futuro e um projeto se encontram, porque é ali que a criança adquire os instrumentos necessários para servir a ela própria, no seu futuro, e se colocar à disposição da sociedade no futuro da sua cidade.

Por isso, não vim fazer apelo por um partido específico, mas por esse partido que existe hoje no Brasil e que pertence a todas as siglas, que é uma espécie de partido das crianças ou partido da educação. Há pessoas em todas as siglas partidárias que têm esse conteúdo, e, em todos os partidos e siglas, há pessoas que não têm esse conteúdo.

Vim aqui como Senador do Distrito Federal, mas também como um Senador que, nesses anos, terminou ganhando uma espécie de apelido de “Senador da educação”. Eu vim falar nessa qualidade, na qualidade de alguém que gostaria de ver o Brasil cheio de Vereadores educacionistas; cheio de Vereadores comprometidos com o educacionismo; cheio de Prefeitos educacionistas comprometidos com o educacionismo; cheio de Prefeitos e Vereadores que entendessem que o futuro da cidade depende, sobretudo, da escola. Já o presente da cidade depende também de cadeias, o que nem sempre é de responsabilidade do Prefeito; depende de a água estar limpa; depende de se cuidar do meio ambiente; depende de se fazerem programas de geração de emprego; depende de asfalto. Depende de muitas coisas o presente, mas o futuro depende de uma coisa, que é a escola. Até a saúde é uma questão do presente; no futuro, ela depende da educação.

Daí meu apelo, Sr. Presidente Gim Argello, com a convicção de que não estou ferindo lei eleitoral alguma, porque não trouxe nenhum número, não trouxe nenhum nome, não defendi nenhuma sigla. Defendi essa espécie de partido abstrato chamado educacionista. Da mesma maneira, se eu estivesse aqui há 130 anos ou há 140 anos, eu defenderia o partido abolicionista, independentemente da sigla à qual pertencessem os Senadores daquela época, no Império.

Acredito que, nesse caos ideológico em que hoje vive o Brasil, em que as siglas estão significando tão pouco, em que todos ficaram praticamente iguais, continua havendo o lado de lá e o lado de cá. Nem sempre o lado de lá e o lado de cá dependem da sigla, como antes. Sabia-se claramente: Arena defendia o regime militar; MDB defendia a democratização. Não havia dúvida: o corte entre o lado de cá e o de lá era definido pela sigla. Até pouco tempo atrás, até mesmo a proposta revolucionária do socialismo tinha clareza: Partido Comunista, Partido Socialista e os outros. Hoje, todos esses passaram a ter uma espécie de generalização das idéias. Todo mundo defende o mesmo, todo mundo é contra o mesmo. Mas, ainda assim, existem o lado de lá e o lado de cá. Peço que você vote do seu lado! E espero que o seu lado seja o que chamo “lado de cá”, aquele lado ao qual eu me julgo pertencer, que não é melhor nem pior do que o outro, mas que é diferente: é o lado que não se preocupa apenas com o presente, mas que olha o futuro; que não se preocupa apenas com os eleitores, mas que se preocupa com aqueles que não votam por que têm menos de dezesseis anos de idade, e estes serão os construtores da sua cidade.

Nos próximos quatro anos, quem vai conduzir sua cidade é o Prefeito que você escolher, mas, daqui a 20 anos, quem vai conduzir a cidade em que você mora são aqueles que hoje não têm dezesseis anos de idade. Então, ao votar no Prefeito que vai conduzir sua cidade nos próximos quatro anos, preste atenção no que é que ele vai fazer para essas crianças que hoje não votam por que têm menos de dezesseis anos, pois, entre elas, estão os futuros Vereadores, os futuros Prefeitos, os futuros Presidentes, Senadores, Deputados e Governadores.

Essa é a fala que quero fazer, supondo que esta, talvez, seja a nossa última sessão antes do domingo. Mas, se amanhã houver sessão aqui, vou repetir o que estou falando. Não vou repetir ipsis litteris, como se diz, com as mesmas palavras, porque não leio discursos, salvo muito raramente - não me lembro qual foi a última vez. Então, minha fala não será exatamente igual, mas será com o mesmo objetivo, o de fazer um apelo a você que faz parte desses 130 milhões de eleitores, que faz parte desse conjunto. A democracia tem um poder inusitado, porque é na ponta do dedo que está o poder. É a ponta do dedo que aperta o botãozinho da urna, e, nisso, talvez, o Brasil seja praticamente único. Alguns países estão tentando mudar, apertando o dedo assim, por meio de guerrilhas que ainda existem pelo país afora; outros tentam mudar, escrevendo ou fazendo “xis”; raríssimos conseguiram dar poder à ponta do dedo do eleitor. Esse é o caso do Brasil.

Aproveite a ponta do seu dedo! Vote no número que você achar ser de um Vereador e de um Prefeito que corresponda ao seu anseio, não só ao seu egoísmo pessoal e imediato, mas ao anseio da cidade onde você mora, ao que você quer que ela seja no futuro. Olhe, sobretudo, para aqueles que não vão poder votar: as crianças com menos de dezesseis anos. Eu até me lembro de dizer, Senador Gim: as crianças e nós, de Brasília, porque, no Distrito Federal, não haverá eleição no dia 5. Mas não peço que olhem por nós, os eleitores do Distrito Federal, que não votaremos; peço que olhem pelos moradores de sua cidade com menos de dezesseis anos. E votem naqueles que oferecem para essas crianças e para esses jovens aquilo de que eles precisam: cuidado, cuidado especial para aqueles que têm menos de quatro anos e escola para aqueles que têm mais de quatro anos.

Veja se seu candidato está disposto a defender o piso salarial. Veja se seu candidato está disposto a defender uma lei aprovada e sancionada pelo Presidente Lula que diz que toda criança tem direito a uma vaga na escola mais perto de sua casa no dia em que fizer quatro anos. Veja se seu candidato está disposto a defender isso. Se não estiver disposto a isso, procure outro que tenha esses objetivos. Não vote só por amizade ou por parentesco e, muito menos, não vote por que ele lhe ofereceu alguma coisa no presente. Vote naquele que lhe oferece algo no futuro. Esse algo no futuro é um tesouro, e esse tesouro está escondido nas escolas; esse tesouro que está longe, no futuro, esconde-se nas escolas, pois é lá que a criança aprende como achar esse tesouro.

Vote de forma correta, porque, daqui a alguns anos, as crianças vão cobrar de nós, eleitores; vão cobrar que votamos de forma errada; vão cobrar pelo sofrimento delas, porque não escolhemos o certo no momento em que era possível.

No dia 5 de outubro, use a ponta do seu dedo para escolher alguém - Prefeito, Prefeita, Vereador, Vereadora - que tenha compromisso com as crianças e com a educação. E o resto, obviamente, todos eles serão obrigados a fazer, porque você vai estar de olho no que ele faz no calçamento, no que ele faz nos jardins, no que ele faz na saúde. Na educação, a gente costuma não prestar atenção, a gente costuma não ver. Por isso, é preciso ver antes do desastre feito, é preciso ver antes de ele começar os quatro anos, nos quais você vai estar contente, usufruindo, ou triste, condenado.

Vote de forma certa. Vote nos educacionistas que são candidatos. Vote em um deles, porque há muitos educacionistas em qualquer partido. Entre os 52 mil Vereadores, há um bom grupo de educacionistas capazes de pensar o futuro e construí-lo com base na educação de nossas crianças.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/10/2008 - Página 38689