Discurso durante a 192ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Encaminhamento de pronunciamento analisando a situação da segurança pública nos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro, e suas atuais correlações.

Autor
Romeu Tuma (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. MOVIMENTO TRABALHISTA.:
  • Encaminhamento de pronunciamento analisando a situação da segurança pública nos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro, e suas atuais correlações.
Publicação
Publicação no DSF de 17/10/2008 - Página 39941
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. MOVIMENTO TRABALHISTA.
Indexação
  • ANALISE, DADOS, SEGURANÇA PUBLICA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DIFICULDADE, REDUÇÃO, CRIME, PRECARIEDADE, SISTEMA PENITENCIARIO, EXCESSO, DETENTO, PRISÃO.
  • COMENTARIO, REIVINDICAÇÃO, AUTORIDADE POLICIAL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), GREVE, MELHORIA, SALARIO, SOLICITAÇÃO, GOVERNADOR, BUSCA, ACORDO, GREVISTA.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DIVULGAÇÃO, DADOS, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, PRESIDIO, PRISÃO PROVISORIA, DETENTO, EXPECTATIVA, JULGAMENTO.

O SR. ROMEU TUMA (PTB - SP. Pela ordem. Sem revisão do orador.) - Vou ser bem rápido, Sr. Presidente.

Eu queria que V. Exª autorizasse a dar como lido o pronunciamento que deixei sobre a mesa, com referência à área de segurança de São Paulo e Rio de Janeiro. Faço uma análise sobre os índices que estão sendo apresentados e as dificuldades na diminuição da criminalidade naqueles dois Estados.

Com relação a São Paulo, cito a reivindicação que levou ao estado de greve as autoridades policiais paulistanas, que recebem o penúltimo salário do Brasil, o vigésimo sexto. Com isso, apelo ao Governador para que faça uma reunião para que se possa chegar a um acordo para diminuir essa tensão dentro da Polícia, que leva prejuízo à sociedade.

            Então, eu agradeceria se V. Exª autorizasse a dar como lido o meu pronunciamento.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SR. SENADOR ROMEU TUMA.

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O SR. ROMEU TUMA (PTB - SP. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, embora eu tenha abordado o tema durante a sessão de ontem, já se passa algum tempo desde que ouvimos desta tribuna, com veemência e profundidade adequadas, um alerta sobre a insegurança imperante na maioria das cidades brasileiras. Isto pode ser sinal de perigoso otimismo, induzindo-nos a crer que a situação da segurança pública ganhou confiabilidade. Ao contrário, devemos devotar-lhe permanentemente toda a atenção possível, sem esperar por trágicos acontecimentos que, vez por outra, motivam atitudes e providências emergenciais, como já aconteceu em muitos episódios de triste memória.

Hoje, trago notícias boas e ruins sobre o setor ao qual dedico grande parte de minhas energias e de meu conhecimento desde a juventude. Começo pela menção de importante fato apontado no 2.º Anuário que o Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgou dia 8 do corrente. De acordo com essa publicação, São Paulo gastou R$7,6 bilhões com segurança pública em 2007, o que representa um crescimento de 7,1% em relação ao ano anterior.

Ainda segundo o Anuário, a União aplicou R$34,9 bilhões em segurança no mesmo período, em todo o País, com crescimento de 13,1% em relação a 2006. Rio de Janeiro e São Paulo receberam a maior parte dos recursos federais, que somaram R$4,4 bilhões no primeiro caso, e R$32,3 bilhões no segundo. Entretanto, a própria publicação incumbiu-se de lançar uma ducha fria sobre o leitor, ao revelar que, apesar da grandiosidade desses números, somente 0,4% dos gastos do País destinam-se à área da segurança.

Com relação a São Paulo, há índices estatísticos, alheios àquele Anuário, apontando correspondência entre o emprego de tais recursos e uma melhora da segurança pública. Por exemplo, a comparação entre os totais de homicídios dolosos, latrocínios, mortes em confrontos com a polícia e de policiais assassinados no primeiro semestre de 2007 com o que ocorreu em igual período deste ano resulta em 345 delitos a menos. Foram 3.031 ocorrências em 2007, contra 2.686 neste ano, ou seja, houve diminuição de 11,3%. Na capital paulista, conforme os dados oficiais relativos ao último trimestre, os roubos, furtos e latrocínios concentram-se no centro da cidade e nos bairros mais ricos.

No Rio de Janeiro, o número de latrocínios aumentou 110% em um ano, segundo análise do Instituto de Segurança Pública (ISP). Os dados sobre a situação em julho último, publicados no Diário Oficial do Estado pelo Núcleo de Pesquisa em Justiça Criminal e Segurança Pública (Nupesp), abrangem 33 tipos de crimes. Registraram queda em 17 tipos de ocorrências, aumento em 15 e igualdade de incidência quanto a um delito, em cotejo com os números dos sete primeiros meses do ano passado.

Todavia, embora tenha crescido 2,7% em julho com relação a junho, o número de homicídios dolosos foi 9,6% menor do que o verificado em julho de 2007. Ou seja: houve 44 vítimas a menos em comparação com os 3.592 delitos dessa natureza ocorridos no ano passado. A análise do ISP destaca a tendência da diminuição de homicídios intencionais naquele Estado. O período de janeiro a julho de 2008 totalizou o menor número de vítimas desses crimes em toda a série histórica, desde 1991. O acumulado do ano (janeiro a julho de 2008) apresentou o maior número de vítimas de lesão corporal culposa no trânsito desde 1997.

Dos sete tipos de delitos considerados prioritários pela Secretaria de Estado de Segurança, isto é, Homicídios Dolosos, Latrocínios, Roubos e Furtos de Veículos e Crimes de Rua (Roubos a Transeuntes, Roubos de Celulares e Roubos em Coletivos), quatro apresentaram diminuição e três aumentaram, em comparação com os índices de janeiro a julho do ano passado.

Mas esses números não retratam a trágica realidade imposta pelo crime organizado, especialmente o narcotráfico, em várias comunidades fluminenses. Melhor seria prestar atenção, por exemplo, nas cenas de guerra que continuam a se repetir nos morros cariocas, onde a população se vê comumente em meio ao fogo cruzado, seja nos tiroteios entre facções rivais, seja quando a polícia se aventura pelas ruelas, durante o cumprimento de mandados de prisão, e é recebida a bala.

No caso de São Paulo, como eu disse ontem, perdura um fato complicador que está a me preocupar ainda mais. Trata-se da insensibilidade governamental demonstrada com referência à lastimável situação dos policiais paulistas, servidores do mais rico Estado brasileiro, mas que percebem a penúltima remuneração na escala de vencimentos em termos nacionais. Nunca imaginei que algum dia veria centenas de policiais civis precisando sair em passeata pelas ruas paulistanas para tentar sensibilizar governantes. Nem assim o conseguem e quem ousa dedicar-lhes solidariedade recebe a pecha de oportunista. Aliás, o ilustre Presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo, Dr. Sergio Marcos Roque, publicou uma “Nota de Repúdio” da entidade nos seguintes termos:

            “A Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo vem, de forma veemente, repudiar as palavras do Secretário de Gestão Pública, ofendendo Senadores da República. O Senador Aloizio Mercadante esteve na sede da Associação dos Delegados de Polícia preocupado com a situação da segurança pública de nosso Estado, em virtude da greve da Polícia Civil paulista. O presidente da ADPESP recebeu ainda manifestações, no mesmo sentido, dos outros Senadores por São Paulo, Romeu Tuma e Eduardo Suplicy, também preocupados com o delicado momento da segurança pública. Os Senadores tiveram a sensibilidade de perceber a gravidade da situação, sentimento que até o presente momento o Governo do Estado não teve.

            Os Delegados de Polícia de São Paulo na defesa do Senado Federal e do Estado Democrático de Direito repudiam as ofensas dirigidas ao Senador Aloizio Mercadante pelo Secretário de Gestão Púbica chamando-o de “o senador dos aloprados”.

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, o movimento dos policiais civis do meu Estado alcança todas as carreiras. São servidores que, por vocação, escolheram funções capazes de lhes tirar a vida em troca da segurança dos cidadãos e suas famílias, mas vêem-se obrigados a recorrer à greve em busca de um reconhecimento que deveria ser natural e permanente. A proposta apresentada ao Governo do Estado, por meio da Associação dos Delegados de Polícia, Associação dos Funcionários da Policia Civil, Associação dos Investigadores e Associação dos Escrivães de Policia, tem o seguinte teor:

            “1. Adoção da Aposentadoria Especial com recepção integral da Lei Complementar 51/85 para todas as carreiras;

            2. Exclusão dos ALE 1 e 2, mantendo-se apenas o de maior valor para todas as carreiras;

            3. Extinção das 5.ª e 4.ª Classes com a criação de investidura temporária na 3.ª Classe, para todas as carreiras;

            4. Adoção da diferença de 20% nos vencimentos percebidos entre cada Classe para todas as carreiras;

            5. Plano de Incorporação gradual do ALE ao salário base, com início em 2008 e término em 2010, para todas as carreiras, incluindo ativos e aposentados;

            6. Aumento linear de 15% para todas as carreiras e os aposentados.”

Pois bem, não houvessem tais fatos sinalizado a gravidade da situação em meu Estado, bastaria um rápido exame do que sucede nos estabelecimentos prisionais para termos noção do verdadeiro barril de pólvora em que se assenta a segurança da população paulista. Conforme o censo penitenciário realizado em junho pelo Departamento Penitenciário Nacional - DEPEN, do Ministério da Justiça, aquele sistema está operando com uma população carcerária 50% acima de sua capacidade. Existem apenas 96.540 vagas para um total de 145.096 presos.

O levantamento do Depen compreende as unidades administradas pela SAP - Secretaria da Administração Penitenciária, órgão responsável pelas penitenciárias, prisões de segurança máxima, CDPs - Centros de Detenção Provisória, CRs - Centros de Ressocialização, manicômios judiciários, hospitais penitenciários, institutos penais agrícolas e CPPs - Centros de Progressão Penitenciária.

Em junho deste ano, a população prisional do Estado chegou a 158.447 pessoas, considerando-se os 13.351 presos que eram custodiados em delegacias e cadeias públicas. Naquele mês, somados os sistemas da Administração Penitenciária e da Segurança Pública, o déficit era de 62.107 vagas. Caso os presos da Secretaria da Segurança Pública estivessem sob custódia da Secretaria da Administração Penitenciária, este órgão operaria com uma população prisional 64% maior do que o número de vagas oferecidas, ainda segundo o censo penitenciário.

Observa-se paulatino crescimento do déficit quando são cotejados os números desde 2006. De acordo com o noticiário de imprensa, o Governo paulista pretende criar 35 mil vagas com 45 novas prisões até 2010. Também prevê que o Orçamento de 2009 destinará R$2,37 bilhões à Secretaria da Administração Penitenciária, isto é, haverá acréscimo de 24% em comparação com o corrente ano. Mesmo assim, o panorama continuará contristador.

Em junho último, São Paulo tinha 43.862 presos provisórios, cerca de 30% do total recenseado, segundo o Depen. Na semana passada, o jornal Folha de S.Paulo obteve dados que demonstram ser os Centros de Detenção Provisória - CDPs, destinados a detentos à espera de julgamento, as prisões mais superlotadas atualmente. São autênticas fábricas de celerados, pois favorecem a promiscuidade entre bandidos perigosos e os de menor periculosidade. A situação mais grave é do CDP 1 de Pinheiros, localizado na zona oeste da capital. Dia 10 último, confinava 1.516 detentos em um espaço construído para 520. Isto é, tinha 191,5% de ocupação a mais do que sua capacidade original.

O CDP de Santo André (ABC), com 512 vagas, abrigava 1.477 presos, o equivalente a 88% a mais do que o espaço disponível.

Por sua vez, os dois CDPs do Belém, na zona leste, possuem somados uma capacidade nominal de 1.536 vagas. Mas abrigavam 2.301 detentos, ou seja, 149% acima do que deveriam suportar em conjunto. Um dos presos - segundo informou o Departamento Jurídico da Pastoral Carcerária Cristã - é o lavador de carros David Gedison de Oliveira, de 30 anos, pai de cinco filhos e acusado de roubar R$0,80. Não tinha antecedentes criminais.

A missionária católica Margaret Gaffney, de 68 anos, 36 deles dedicados aos presos, disse à Folha de S.Paulo:

            “Na cela projetada para 12 pessoas, sempre encontramos pelo menos 50 nos CDPs. E quase sempre é gente que não foi julgada, jovem, mas que já é vítima do descumprimento da lei por parte do Estado. A situação é bem pior nos CDPs porque, na maior parte dos casos, o Estado não consegue nem mesmo dar itens de higiene pessoal para esses detentos.”

Ainda de acordo com pessoas que acompanham de perto o desenrolar desse drama perigoso e preocupante, a falta de vagas do sistema penitenciário em todo o País possui relação direta com o excesso de presos provisórios à espera de julgamento, a demora na concessão de progressões de regime, a morosidade do Judiciário e, principalmente, a falta de estrutura do Poder Executivo para garantir a aplicação das penas alternativas.

Por exemplo, as informações prestadas à imprensa pelo Dr. Matheus Guimarães Cury, Presidente da Comissão de Política Criminal e Penitenciária da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em São Paulo, deixam patente a fragilidade dos resultados alcançados por esta Casa desde o final da década de 90, no sentido de implantar um sistema de penas alternativas. Diz ele ser a falta de concessão dessas penas “uma das principais reclamações dos diretores de presídios, pois os presos por crimes menores convivem com outros criminosos sem necessidade".

Segundo o Departamento de Reintegração Social Penitenciário de São Paulo, a reincidência de presos que cumprem penas alternativas é de 4,7%, contra quase 60% entre os mantidos em regime fechado. Mas, conforme avaliação do Dr. Mauricio Zanoide de Moraes, Professor de Direito Penal da USP, “os juízes muitas vezes não se sentem seguros para aplicar a pena substitutiva, uma vez que faltam órgãos do Poder Executivo para fiscalizar o cumprimento delas.”

Devido a tais fatos, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, renovo desta tribuna o alerta aos nossos governantes para que dediquem sempre o melhor dos esforços e a máxima atenção à segurança pública, pois constitui um alicerce do Estado Democrático de Direito. No caso de São Paulo, que tenho a honra de representar no Senado da República, enfatizo meu apelo ao Governo para que demonstre sensibilidade com as justas reivindicações dos policiais civis, concedendo-lhes remuneração realmente condigna.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/10/2008 - Página 39941