Discurso durante a 205ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração do quadringentésimo aniversário de nascimento do Padre Antônio Vieira.

Autor
Mão Santa (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PI)
Nome completo: Francisco de Assis de Moraes Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Comemoração do quadringentésimo aniversário de nascimento do Padre Antônio Vieira.
Publicação
Publicação no DSF de 05/11/2008 - Página 43919
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, CENTENARIO, NASCIMENTO, ANTONIO VIEIRA, SACERDOTE, IGREJA CATOLICA, ESCRITOR, ELOGIO, VIDA PUBLICA, FORMAÇÃO, IDENTIDADE, BRASIL.

  SENADO FEDERAL SF -

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O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Marco Maciel, que preside esta sessão do Senado da República, dedicada a assinalar a passagem dos 400 anos de aniversário de nascimento de Padre Antônio Vieira; Excelentíssimo Sr. Embaixador de Portugal, Francisco Seixas da Costa; Reverendíssimo Padre Aleixo; Parlamentares presentes; brasileiras e brasileiros que nos assistem aqui pelo fabuloso sistema de comunicação do Senado da República, quis Deus que presidisse esta sessão o Senador Marco Maciel.

Brasil e Portugal.

Portugal, mãe e pai de muitas pátrias. Entendo que somos o filho maior e melhor de Portugal. Mas, se revivermos a história, temos que ter gratidão ao nosso Portugal. E eu queria dizer que, sem dúvida nenhuma, começa com Pedro Álvares Cabral.

É lógico que, antes de agigantar-se, Portugal, na conquista dos mares, na globalização mesmo, tinha seus reis, a Escola de Sagres e tudo. Mas foi Pedro Álvares Cabral, em 1500.

E, lá para 1614, adentra aqui Padre Antônio Vieira - vamos em uma ordem, assim, minha, de importância.

Depois, saltamos para ter uma vida mesmo de grandeza e começar esta Pátria em 1808, quando adentrou aqui o D. João VI, continuador daquele D. João IV, que foi o amigo, o rei, de quem o Padre Vieira gozou da intimidade. Como isso era muito comum na nossa civilização. Na nossa França, onde nasceu a democracia, foi a intimidade de Richelieu e Mazzarino com Luiz XIII, que deu isso.

Então, o Padre Antônio Vieira foi para D. João IV o que foi Richelieu e Mazzarino para o Rei Luiz XIII da França e, com a bênção de Deus, adentrou aqui.

Então, ninguém, ninguém, ninguém melhor escreveu, Marco Maciel - só se o Marco Maciel for escrever um livro ainda -, sobre a verdadeira formação do povo brasileiro do que o Senador Darcy Ribeiro, que foi aquele intelectual brilhante, mundo afora, que, moribundo de câncer, fugiu de um hospital, mas Deus ainda lhe deu dois anos, e ele teve vários livros, e o mais importante, o filho melhor, essa verdadeira formação do Brasil, do povo. E diz o Senador Darcy Ribeiro, nesse seu livro, que é essa grandeza, que ele fracassara, porque ele sonhava um país sem analfabeto, mas não conseguiu; sonhava uma universidade que formasse a pesquisa, mas não conseguiu; sonhava uma igualdade social que não conseguiu. Mas a gente via a grandeza pelo nascer, pela alegria que trazemos da nossa raça negra. Para os que são como São Tomé, está aí a alegria negra do Obama irradiando. Então, Darcy Ribeiro já disse que somos grandes. E não precisava ir lá. Ninguém melhor do que o Senador Paulo Paim para interpretar a raça negra.

O amor à natureza dos índios, dos bravos, e a coragem dos índios. E a intelectualidade, a civilização, a estrutura política, que nos foi trazida de verdade, em 1808, por D. João VI. Por motivos alheios à vontade dele, fugindo de Napoleão Bonaparte, mas, aqui, com a benção de Deus e esse era um país de 200 anos. Foi aí então que tivemos um grande choque de civilização. Já tinha passado, mas, historicamente, o Padre Antônio Vieira e outros, nas capitanias hereditárias, degradaram os governadores gerais. Mas o grande choque já tinha aguado essa civilização... os jesuítas, símbolo maior no Padre Antônio Vieira, José Anchieta, e o Padre Manuel da Nóbrega.

De tal maneira que a minha geração toda foi educada, e bem educada, porque tinham essas ordens religiosas que nos preparavam muito bem, embora entendamos que era uma elite privilegiada. Ou estudamos todos nos colégios jesuítas, nos salesianos ou nos maristas. Quer dizer, trouxeram também esse espírito cristão para o Brasil e a grandeza deles ninguém pode subestimar.

Olhai o mapa das nossas Américas, todas divididas. Aqui eles plantaram. D. João VI deixou seu filho português, herói, bravo, que V. Exª, de Portugal, tem que enaltecer, porque foi o único homem que foi rei nas Américas e rei na Europa. Ele é o Pedro IV de vocês, como decantam Napoleão e Simón Bolívar. Vamos estudar melhor e valorizar o português que foi o único rei nas Américas e rei em Portugal. Foi o D. Pedro IV, lá na Praça do Rossio de vocês.

Embaixador, é boa a civilização portuguesa e melhor ainda naquela praça tomar uma ginja. O senhor já tomou? É bom. É um licorzinho deles, de cereja nativa.

Aí D. João VI e seu filho foram dos quatro grandes portugueses que fizeram isso aqui.

E o brasileiro lá, Marco? Nós devemos muitos. Todos os nossos universitários se formaram lá, principalmente em Coimbra. Lá na minha cidade de Parnaíba, na Universidade de Porto, estudou um dos maiores brasileiros, Simplício Dias da Silva, filho de português. Foi ele que financiou a batalha do Jenipapo para não ter aquela divisão, porque é notório que o Sul ficaria com o Brasil. E Portugal era justo, queria o Norte. Isso foi lá, mas, quer dizer, foi esse que estudou em Porto, Simplício Dias da Silva, que conhecia, mas o fato é que estamos orgulhosos aqui ao prestar esta homenagem.

Todos nós, todos os brasileiros, e esta Casa, temos o respeito ao Padre Antonio Vieira, que é o símbolo maior do cristianismo puro e da oratória. E o nosso ex-Presidente da República, que presidiu esta Casa, o nosso José Sarney... Há um museu no Maranhão - e eu o conheço pessoalmente -, para eternizar aquele a quem, sem dúvida nenhuma, nós devemos tanto. E eu queria dizer algo, e não iria dizer nada, porque já foi dito tudo por Marco Maciel, Arthur Virgílio, simbolizando toda a vida e obra de Vieira. E ninguém melhor do que ele, do que Marco Maciel, que é pernambucano, além de ser o grande político do Nordeste, onde viveu o Padre Antônio Vieira, que viveu na Bahia, sufocado pelos holandeses. Mas ele gostava tanto que chegou a pedir ao Governo português, Dom João IV, para comprar logo o Pernambuco dos holandeses, e depois ele foi para o Maranhão. Mas eu sou do Piauí.

Acontece que esse Padre Antonio Vieira andava, Marco Maciel, a pé, de São Luís a Fortaleza, naqueles rios secos do Ceará. E, entre o Ceará e o Maranhão, como está na Bíblia, está a virtude, o nosso Piauí. Então, para ele ir de Fortaleza a São Luís, ele passava pelo Piauí, e ele passou, Marco Maciel. É preciso que saibam até, a estrada dos rios secos do Ceará passava pelo Piauí. Ele passou, Marco Maciel, e é preciso que saibam que a estrada eram os rios secos do Ceará; naquele tempo, era Parnaíba, era Cocal, Frecheira. Tem uma igreja lá construída por Padre Antônio Vieira. É ignorância dizer que o Piauí se colonizou do interior para a capital. Houve essa colonização, houve, e ninguém vai negar que os ricos baianos, pernambucanos compravam terras e tinham fazendas no Piauí. Mas houve colonização simultânea, quer dizer, não tinham um sinal de trânsito impedindo de aportar no Piauí; se chegava um navio em Fortaleza ou em São Luís, tinham que chegar no litoral do Piauí. Ele andou a pé, construiu uma igreja pouco depois de 1600, de tanto que ele andava. Hoje Cocal é Frecheira, onde eles paravam para descansar. O trajeto era feito a pé de Fortaleza. E ele o fez, e tem uma igreja lá indo por terra. O Piauí teve a colonização no interior e teve a do litoral, inclusive da cabeça iluminada, santa do nosso Padre Antônio Vieira, abençoando essa igreja em Frecheira.

O que queríamos dizer é o seguinte: no Brasil, quem mais dignificou e engrandeceu Portugal? Olha, eu ousaria dizer que foi um Senador da República, Juscelino Kubitschek, mostrando o tormento da vida política que ele próprio sofre - ele é preso. Por conseqüências políticas, ele foi arrancado, humilhado e exilado destas cadeiras. Ele representava Goiás.

Quis Deus, há poucos dias - eu sou médico, cirurgião, como Juscelino foi da Santa Casa, Prefeito, Governador -, eu comprara um livro de Juscelino, a última viagem a Portugal. E presenteei. Primeiro, comentei com Marco Maciel. E presenteei, porque Jarbas Vasconcelos, um Senador querido do meu Partido, outro dia, eu, conversando com ele, lhe perguntei: “Qual é o país que você mais gosta de viajar?” Aí, o Jarbas, com aquele jeitão dele, disse “Portugal”. Aí eu presenteei o livro a ele, mas mostrei para, depois, ele dar ao Marco Maciel.

Por que Juscelino Kubitschek ainda Senador, ainda Senador, ainda Senador? Todos nós estamos orgulhosos da perfomance do nosso Presidente Luiz Inácio no mundo; mas nunca dantes, Luiz Inácio, um homem foi tão homenageado, tão prestigiado, tão respeitado, tão adorado como Juscelino como Senador. Antes de ser cassado - ele foi cassado mais ou menos em junho de 1964, e o Marco Maciel falou sobre 1964 -, quando entrou a ditadura militar, em janeiro, ele foi homenageado. Que coisa bela. Ele, na avenida da liberdade, flores, papéis picados. Homem nenhum... Então, ele restituiu esse amor paternal e maternal que nós temos e devemos ter. Sei que ele é homenageado em todas aquelas cidades, Porto... Em Coimbra, onde passaram enormes, enormes, enormes vultos brasileiros que lá se formaram... E Juscelino, antes de ser cassado como Senador da República deste Senado.

Então, eu lembrava ao Marco Maciel, que fica tão bem na Presidência... E esta Casa tem uma tradição, e temos que ter tradição como Portugal tem: o Presidente é da maior bancada, mas, se meu partido recusar, a segunda bancada é do partido de V. Exª, e meu candidato é Marco Maciel, que fica tão bem aí na Presidência. Que possamos, Senadora Marina... Feche esse livro. E eu queria uma comissão para sair tomando ginja por aí - ginja é o licor deles. Marina, aquele trajeto que Juscelino fez, ninguém, ninguém... Agora, Juscelino, saibam vocês, se Padre Antonio Vieira nos cativou - “És eternamente responsável pelo que cativas”, está em O Pequeno Príncipe -, Juscelino também cativou. Fez renascer o amor e o respeito entre pai, mãe e filhos, que somos nós. Foi Juscelino. E eu li o livro. Eu nunca vi.

Pouco tempo depois, ele sofre o golpe da ditadura e vai para Portugal. Ele vai também para Paris, onde ele estudara. Ele vai para os Estados Unidos, onde ganhara a vida dando palestras sobre a democracia, sempre falando bem do Brasil. Mas passou os dias em Portugal. Escolheu Portugal para casar sua filha. E o povo português a rezar.

Mas, no livro, final, mostra que a gratidão que nós temos é ao Padre Antonio Vieira, porque aqui ele veio. Aqui ele não deixou entrar a inquisição. Aqui ele veio, o Padre Antonio Vieira, e mandou que se respeitassem os judeus. Então, nós temos essa formação. Daí não sermos muito pombalinos como vocês são, porque atiraram em Jesus. Então, está aqui. Eles foram bem. Mas isso faz parte da história.

Então, Juscelino não era uma espécie normal, não, ô Marco Maciel. Eu tenho uma admiração por V. Exª. Mas todos nós... Ô Luiz Inácio, és muito feliz. Não precisas buscar exemplo em outros países, em outra história. O exemplo está aqui: Juscelino Kubitschek.

Olha, quando governei o Piauí, Marina Silva, minha maior obra foi a expansão do ensino universitário. Eu realizei a maior expansão do ensino universitário no Brasil, com o advento da Uespi, com 400 faculdades e 36 campi.

         Marco Maciel, em uma das últimas idas, fui fazer um intercâmbio com Coimbra e vi lá as homenagens que receberam os brasileiros: o próprio Juscelino, Sarney, V. Exª, Fernando Henrique Cardoso, o nosso Itamar.

Fui até Óbidos. Minha mulher, Adalgisa, foi fazer compras de artesanato. Eu disse: “Não vou, não. Vou tomar é uma ginja ali”. Óbidos é uma cidade a uns 60 quilômetros, antiga, murada ainda. Fui tomar minha ginja, ia tomar a ginja. Mas, Marco Maciel, quando ia pedir minha ginja, vi dois quadros de Juscelino Kubitschek. Eram duas cartinhas. Fiquei lendo, nem tomei a ginja. Ele agradecia... Imaginemos nós aquele que é o maior dos brasileiros, no exílio, o que deve ser ruim, impedido de voltar à Pátria, mandando uma carta para o dono do barzinho, que tinha um sobradinho em cima, agradecendo pelos momentos felizes que tinha passado lá, tomando um scotch. Está escrito na letra dele: “scotch”. Aí eu mudei e pedi um scotch para viver Juscelino.

Em outra carta, Marina, olha... O Marco Maciel eu não sei, mas eu sou assim como o Luiz Inácio: a gente sai tomando umas aí, ele toma, eu tomo. Eu entro muito em bar e nunca agradeci a ninguém. A gente entra, é bem tratado, de forma cortês e amigável, não é verdade? E havia outra carta de Juscelino, cumprimentando pelo Natal e pelo Ano Novo, desejando boas festas e bom ano ao dono do bar e a sua família. Aí eu disse: “Olha, moço, esse é o maior homem do Brasil, homenageado por Portugal”. Eu disse: “Coloque o retrato dele, que todo brasileiro vai querer vir ler essas cartas”. Ainda quero voltar lá, Embaixador. Convide-me! Estou um garoto aqui.

         Terminando o livro de Juscelino... Acho que Juscelino foi, sem dúvida alguma... Citei quatro grandes portugueses. Sei que há muitos na história, assim como há muitos brasileiros também, mas o maior, Juscelino, que nos fez respeitar, amar e conhecer Portugal, termina o livro, dizendo assim: “É o último bom povo do mundo”.

Então, quero crer que isso é da cultura dele, essa impressão dele é toda nossa, porque ninguém pode falar mais por essa Pátria do que Juscelino Kubitschek.

         Faço das palavras de Juscelino minhas palavras, em nome do povo do Brasil, que represento. Esse é o último bom povo do mundo, e Padre Antônio Vieira era um ícone dos portugueses no Brasil.

Era o que tinha a dizer. (Palmas.)


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/11/2008 - Página 43919