Discurso durante a 231ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Leitura da Carta de Boa Vista, documento síntese das questões tratadas durante o primeiro Encontro dos Magistrados Estaduais da Região Norte e III Encontro de Aperfeiçoamento dos Magistrados de Roraima, realizados em Boa Vista.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PARTIDARIA. JUDICIARIO. SENADO.:
  • Leitura da Carta de Boa Vista, documento síntese das questões tratadas durante o primeiro Encontro dos Magistrados Estaduais da Região Norte e III Encontro de Aperfeiçoamento dos Magistrados de Roraima, realizados em Boa Vista.
Aparteantes
José Nery, Valter Pereira.
Publicação
Publicação no DSF de 06/12/2008 - Página 50025
Assunto
Outros > POLITICA PARTIDARIA. JUDICIARIO. SENADO.
Indexação
  • REGISTRO, EVOLUÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO (PTB), CRESCIMENTO, PARTICIPAÇÃO, POLITICA NACIONAL.
  • SAUDAÇÃO, OCORRENCIA, MUNICIPIO, BOA VISTA (RR), ESTADO DE RORAIMA (RR), ENCONTRO, MAGISTRADO, ESTADOS, REGIÃO NORTE, REALIZAÇÃO, BUSCA, APERFEIÇOAMENTO, LEITURA, DOCUMENTO, AUTORIA, PARTICIPANTE, SOLICITAÇÃO, INCLUSÃO, ANAIS DO SENADO, GARANTIA, SOBERANIA NACIONAL, REGIÃO AMAZONICA, DEFESA, POVO, TRADIÇÃO, PROTEÇÃO, BIODIVERSIDADE, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, PRESERVAÇÃO, INDEPENDENCIA, MAGISTRATURA, REFORÇO, DEFENSORIA PUBLICA, MELHORIA, EXERCICIO PROFISSIONAL, REFORMA JUDICIARIA, PARTICIPAÇÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ), REPUDIO, EFEITO VINCULANTE, APOIO, SUMULA, IMPEDIMENTO, RECURSOS, DETALHAMENTO, MATERIA.
  • CRITICA, PARALISAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, MATERIA, APROVAÇÃO, SENADO, ALTERAÇÃO, TRAMITAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), OBRIGATORIEDADE, EXECUÇÃO ORÇAMENTARIA, REPUDIO, MANIPULAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, LIBERAÇÃO, RECURSOS, ORIGEM, EMENDA, CONGRESSISTA.
  • ANALISE, IMPORTANCIA, FUNÇÃO, SENADO, COMBATE, DESEQUILIBRIO, PODERES CONSTITUCIONAIS.
  • PROTESTO, EXCESSO, TRIBUTAÇÃO, TRABALHADOR, EMPRESARIO, REITERAÇÃO, DEFESA, MELHORIA, SITUAÇÃO, APOSENTADO, PENSIONISTA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Eu agradeço a V. Exª, Senador Mão Santa, que preside esta sessão, as palavras elogiosas, principalmente a referência ao meu Partido, o PTB, Partido Trabalhista Brasileiro, que, como V. Exª disse, fundado por Getúlio Vargas, foi banido da vida pública durante o regime militar; mas, depois, esse mesmo regime, ao final, deu condições para que ele voltasse à vida pública dentro das normas estabelecidas.

E hoje o Partido realmente vem se recuperando, se consolidando no país todo. Ganhamos a prefeitura de duas importantes capitais do norte - Manaus e Belém. Aumentamos o número de vereadores e de prefeitos de outras cidades e esperamos crescer mais ainda nas eleições de 2010 para Deputado Estadual, Federal, Senadores. Hoje somos sete Senadores no Senado e esperamos - quem sabe? - duplicar esse número.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, venho à tribuna para fazer o registro do I Encontro de Magistrados Estaduais da Região Norte e o III Encontro de Aperfeiçoamento dos Magistrados de Roraima. Esses dois eventos foram realizados ao mesmo tempo em Boa Vista, capital do meu Estado.

É realmente um evento que tem um significado muito grande para a magistratura da Região Norte, região que, sob todos os ângulos, é sempre esquecida, relegada ao segundo plano, eu diria até mais, ao quinto plano, já que há cinco regiões do Brasil e a nossa é a última a ser lembrada. Quero, Sr. Presidente, aqui fazer a leitura da Carta de Boa Vista, que foi justamente o documento síntese daquilo que foi tratado durante este encontro, que passo a ler:

CARTA DE BOA VISTA

Os magistrados estaduais da Amazônia, reunidos na cidade de Boa Vista, Roraima, no período de 26 a 29 de novembro de 2008, durante o I Encontro de Magistrados Estaduais da Região Norte e o III Encontro de Aperfeiçoamento dos Magistrados de Roraima promovido pelo Tribunal de Justiça do Estado, pela Associação Nacional de Magistrados Estaduais - Anamages e pela Associação dos Magistrados de Roraima - Amar, considerando o momento nacional, aprovam o presente documento denominado Carta de Boa Vista e resolvem:

Reconhecer o “Direito Amazônico” como conceito jurídico interdisciplinar necessário à prestação jurisdicional, em âmbito regional, conforme as concepções de valor na Amazônia, por forma de garantir a segurança jurídica de seus povos.

Alertar os Poderes da República que a Amazônia é uma questão soberana e de estado e conclamá-los a somar esforços para assegurar a soberania nacional sobre a Amazônia brasileira, visando a defesa dos povos da região, a proteção da biodiversidade, do patrimônio genético e o desenvolvimento sustentável.

Lutar contra os recentes ataques às instituições, sobretudo à magistratura, ao patrimônio público e às autoridades constituídas dos poderes da República na preservação do Estado de direito.

Repudiar o controle ideológico de qualquer manifestação legítima dos magistrados, dentro e fora dos autos.

Reconhecer, como instrumento útil para a Justiça, para uma justiça célere, sem perda de substância jurídica e das liberdades públicas, a tecnologia da informação.

Defender a estatização dos serviços auxiliares à Justiça nos Estados.

Promover o associativismo dos magistrados estaduais em torno de suas associações locais e da Anamages, para manter viva, presente e atuante a luta pela recuperação dos seus direitos e prerrogativas no conserto da magistratura nacional.

Postular por uma reforma do Judiciário que envolva a participação nas composições do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça e de todos os segmentos da magistratura nacional, respeitando a disposição geopolítica das regiões do País, bem como pela exigência de composição mínima de nove Membros nos Tribunais de Justiça; e ainda pela humanização do sistema prisional, pela implantação do regime previdenciário próprio e o fortalecimento da Defensoria Pública.

Lutar pela instituição do regime jurídico de remuneração comum para o Judiciário brasileiro, assim também pela uniformização constitucional da política de entrâncias no máximo de três classes e pela revisão anual dos subsídios por meio de resolução, bem como do retorno do adicional por tempo de serviço.

Repudiar o instituto da súmula vinculante e incentivar a adoção da Súmula Impeditiva de Recurso.

Ao fim, os magistrados estaduais da Amazônia colhem desta oportunidade para manifestar irrestrita solidariedade ao povo e à Justiça catarinenses, nesse momento de sofrimento, em decorrência dos acontecimentos naturais que assolam o Estado de Santa Catarina.

Boa Vista, 29 de novembro de 2008.

Sr. Presidente, eu quero também detalhar alguns tópicos que aqui foram abordados e que constam, portanto, da Ata dessa reunião - não vou lê-la toda, mas peço a V. Exª que a considere na íntegra como parte do meu pronunciamento. Eu quero aqui ler:

2. Amazônia, uma questão de soberania e de desenvolvimento sustentável. O conclave entende que os poderes da República devem somar esforços para assegurar a soberania nacional sobre a Amazônia brasileira, impedindo a invasão de entidades estrangeiras e seu domínio sobre os povos indígenas, coibindo com todo rigor a biopirataria e a subtração ilegal de nossas riquezas naturais, exercendo efetivo controle sobre as organizações não-governamentais atuantes na região, em especial para manter livre de influências alienígenas a cultura indígena e a língua pátria, e dos diversos povos indígenas que habitam a região e, ainda, exercendo, com emprego das Forças Armadas, um rígido controle de nossas fronteiras. A mais, devem buscar solução para os graves e constantes conflitos fundiários em toda a região, causadores de incertezas e inibidores de investimentos e impeditivos do desenvolvimento regional da Região Norte. Impõe-se aos três Poderes da República e aos Poderes Estaduais a busca célere por um plano de desenvolvimento regional bio-sustentável amplamente discutido com as comunidades locais [locais da amazônia], cujas peculiaridades e diferenças ora se proclamam livres de interferências externas e capazes de promover o desenvolvimento socioeconômico dos seus povos.

3. Direito Amazônico.

Os Estados da região Norte somam mais de 60% do território nacional, tendo como meio de comunicação basicamente o transporte aéreo e fluvial, ambos precários, sendo mal servidos por rodovias e pelos modernos meios de comunicação, exigindo das autoridades e de seus agentes um conhecimento mínimo de seu ambiente e de sua cultura, sob pena de pôr em risco a própria integridade física e a vida dos que, destacados para prestar seus serviços na região, não conheçam suas peculiaridades.A mais, a prestação jurisdicional deve respeitar as condições locais, em especial quanto aos prazos muitas vezes impossíveis de serem cumpridos dentro do quanto fixa a lei, exatamente pelas longas distâncias, a precariedade dos meios de comunicação.Portanto, não se pode impor à Amazônia, de forma unitária e igualitária, as mesmas regras elaboradas para os grandes centros do País, havendo urgente necessidade de estabelecer normas para implantação e aplicação de um direito amazônico como forma de estabelecer a segurança jurídica, reduzir as desigualdades, garantir a preservação dos atos e costumes dos seus povos, tudo como forma de dar efetividade às normas legais, propiciando uma verdadeira justiça social com meios capazes de garantir a soberania nacional em toda a região.

         E segue-se a preservação do Estado do Direito, a Reforma do Judiciário, que - é bom dizer - o Senado já fez em grande parte, mas eles reclamam, dizendo:

Somente se terá uma justiça célere e de boa qualidade quando se enfrentarem as graves deficiências da organização institucional e de funcionalidade existentes”.

a) Supremo Tribunal Federal - sua composição deve ser alterada para nela se inserir um representante da magistratura de carreira, por região geopolítica.

b) Superior Tribunal de Justiça -à sua composição deve se incorporar um representante da magistratura estadual, por Estado.

c) Conselho Nacional de Justiça - sua competência deve ser estabelecida de forma clara, impedindo a invasão às áreas de competência dos tribunais e, até mesmo, do Poder Legislativo. Reclama-se a inserção de um magistrado estadual, por Estado, em sua composição.

d) Tribunais de Justiça - o número minímo de desembargadores deve ser fixado em nove, atendendo-se à sua organização funcional.

e) Normatizar a permuta e remoção de magistrados entre tribunais.

f) Humanização do sistema prisional e o fortalecimento das Defensorias Públicas, enquanto organismos essenciais à efetiva prestação jurisdicional dos carentes.

E aí fala sobre informatização, infra-estrutura do Poder Judiciário, que é muito precária.

É importante que tenhamos em mente, Sr. Presidente, que a República é constituída por três Poderes. O Executivo, no momento atual, age como se fosse o poder imperial, porque manieta, encurrala, submete o Legislativo, por meio de medidas provisórias, inibindo e praticamente cassando o direito do Poder Legislativo de legislar, de fiscalizar, de se aprofundar nos debates nacionais.

Falou-se aqui que a população tem aprovado o Senado. O Senado aprovou aqui uma norma para mudar a tramitação das medidas provisórias, Senador Nery.

Está na Câmara. Não se aprova na Câmara, e não dá para entender por quê. Da mesma forma, a reforma política. O Senado já fez a sua parte, mandou para a Câmara. E não se aprova na Câmara.

Quanto às emendas, o Senado aprovou o orçamento impositivo, que significa o quê? Que, uma vez aprovado, o Poder Executivo tem que executar esse orçamento. É assim em todos os países sérios. Aqui no Brasil, não. O Orçamento é aprovado, é uma peça autorizativa do Poder Legislativo para o Poder Executivo, que faz o que quer do Orçamento, aliás, está fazendo o Orçamento por medidas provisórias, Senador Nery. Ontem, vi aqui aprovar, de novo, crédito suplementar toda hora. Quer dizer, na verdade, é uma brincadeira.

Ontem, o jornal Correio Braziliense publicou: “Começa de novo a farra das emendas.” Por que isso? Porque o Governo tem interesse nessa história, o Governo tem interesse em manter a maioria dos Parlamentares submissos às suas ordens, aos seus desejos. E, portanto, quem não se submete, Senador Nery, não tem suas emendas liberadas, porque, ao arrepio da lei... Bastaria ver quais são os princípios da administração pública, que são justamente a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência, para dizer que tudo o que o Poder Executivo faz em relação às emendas contraria, frontalmente, esses princípios básicos da administração pública.

E não vejo a Câmara se debruçar e resolver essa questão. O Senado já fez, mas o Senado, sozinho, não decide.

Essa questão do Orçamento tem que ser votada, ele tem que ser impositivo, pelo menos no que tange às emendas parlamentares, para tirar dessa generalização de que todo parlamentar aqui vive puxando saco do Governo para ter emendas liberadas. Quer dizer, o trabalho que se faz de auscultar os Municípios, os prefeitos, de auscultar os reitores das universidades, das outras entidades várias, hospitais etc., para colocar nas emendas para o Orçamento, por exemplo, do ano seguinte, o trabalho que é feito e aprovado aqui é como se não fosse nada, não valesse nada, porque vai depender de quanto o parlamentar puxa o saco ou não puxa o saco do Presidente da República e dos seus ministros.

Senador Nery, ouço V. Exª com muito prazer.

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Senador Mozarildo, ontem tive oportunidade de falar, da tribuna, no final da sessão do Congresso Nacional, de duas questões que o senhor aborda em seu pronunciamento. Primeiro, da necessidade de tornarmos, de criarmos o orçamento impositivo, para acabar de vez com esse sistema de pressão, de contrapressão e, muitas vezes, chantagens para transformar o posicionamento dos Deputados e Senadores em moeda de troca para apoio a esta ou àquela posição. O orçamento impositivo vai impedir que isso ocorra. Será uma decisão de Estado compartilhada entre o Executivo, que envia a proposta orçamentária, e o Legislativo, que a aprova, sendo esta missão uma das principais tarefas do Legislativo, que é aprovar o Orçamento da União para o Governo trabalhar, executar as políticas públicas em todas as áreas da administração. Cabe ao Congresso aprovar, mas aprovamos, como o senhor mesmo disse, como prevê a lei hoje. É um orçamento apenas autorizativo, que dá margens aos governos o utilizarem da forma como bem entenderem. Então, é necessário que essa questão esteja na Ordem do Dia, para que as relações entre Executivo e Legislativo se dêem de forma mais transparente, mais clara, sem qualquer tipo de interferência motivada por questões de natureza de recursos orçamentários. Um outro ponto que o senhor aborda é a reforma política. O Senado fez, eu diria, parte da sua tarefa. Outras questões precisamos discutir em profundidade e definir como, por exemplo, a decisão que precisamos tomar em relação ao financiamento público de campanhas eleitorais, a tarefa importante, a meu ver, de rediscutirmos o princípio da reeleição para os cargos do Poder Executivo. Ontem, quando falei dessas questões, Senador Mozarildo, disse que elas deveriam fazer parte dos compromissos, Sr. Presidente Mão Santa, do futuro Presidente da futura Mesa do Senado e do Congresso Nacional, sob pena de não contribuirmos efetivamente para a transparência das ações do Poder Público, notadamente em duas questões fundamentais: questões de natureza orçamentária e questões de natureza política, em especial a reforma política. Creio que devemos insistir que na agenda do Senado, no ano de 2009, estejam previstos os tratamentos, as discussões e votações de projetos que tratem desses dois temas, naquilo que precisamos aperfeiçoar. Aquilo que já aprovamos e encaminhamos à Câmara, temos que ficar aqui exigindo, cobrando e fazendo o diálogo necessário para mostrar aos Srs. Deputados, à Câmara dos Deputados, que é preciso consolidar uma legislação que confira maior independência entre os Poderes, como é o caso do orçamento impositivo, e maior transparência nas relações políticas institucionais, como é o caso dos vários aspectos que compõem a reforma política. Parabéns a V. Exª por essa determinação de debater e de cobrar esses temas. Devemos nos juntar para fazer disso mote da campanha dos eventuais candidatos à direção a Casa, para que isso seja compromisso para a agenda política do Senado em 2009. Parabéns a V. Exª.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Senador José Nery, fico muito feliz com o aparte de V. Exª e, ouvindo V. Exª, lembrei-me da sua companheira e nossa ex-colega Heloísa Helena, que, lógico, tem um modo próprio, mais aguerrido, mais agressivo, vamos dizer assim - agressivo no bom sentido -, porque é resultante de uma indignação que ela tem e todos nós temos, mas cada qual manifesta ao seu modo. Ela dizia, repetida vezes aqui, que tinha que se acabar com esse “balcão de negócios” escusos entre o Executivo e o Legislativo. E realmente ela tem razão, porque esse Orçamento autorizativo é a arma que o Poder Executivo tem para deixar o Legislativo de joelhos, submisso a ele, porque aquele que resolve cumprir um mandato como manda a Constituição realmente não consegue liberar emendas...

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - É perseguido.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - É perseguido, usa-se até a estrutura de Estado para perseguir.

E aqui a minha visão de médico: temos que tratar a causa. A causa está aí: medidas provisórias de um lado, e Orçamento entregue na mão do Governo, de seus Ministros, do Presidente da República, para só contemplar aqueles que se curvam à sua vontade.

Eu acho que é por isso que é oportuno que nós aprofundemos essa reforma do Judiciário, pregada aqui na Carta de Boa Vista, fruto dessa reunião dos magistrados estaduais da região norte da Amazônia, porque o Judiciário, com certeza, é o ponto onde termina o próprio Legislativo, indo se valer para poder ter respeitados os seus direitos. E temos tido vários casos em que o Judiciário decidiu, inclusive, caçando medidas provisórias já aprovadas aqui e que foram contestadas por partidos políticos, mas temos que fazer nossa parte. E percebemos claramente que há um interesse velado de alguns setores que vêem no Senado uma relativa independência ou uma independência muito maior do que a Câmara tem de extinguir o Senado. Este assunto, aqui e acolá, volta à tona.

Agora mesmo, o Relator da reforma política na Câmara propõe a redução do mandato dos Senadores para cinco anos, como o dos Deputados. Em tese, Senador Nery, não seria nada demais, mas o que está por trás disso é um caminhar para se extinguir o Senado. E não é que eu seja contrário, eventualmente, a um sistema unicameral, mas temos que ver em que lugar vivemos e em que momento estamos. O Senado tem sido, ao longo da nossa vida pública, desde o Império, justamente este Poder de equilíbrio da Federação, porque aqui estão representados igualmente todos os Estados. O meu Estado pequenininho de Roraima tem três Senadores, o Estado “maiorzão” da República, que é São Paulo, também tem três.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Sófocles já dizia que as maravilhas da natureza são muitas, mas a mais maravilhosa é a gente. E, atentai bem, a gente do Piauí é muito importante.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Pois é, todos os Estados estão aqui representados igualmente. Isso dá realmente a garantia de que a Federação não seja pior, porque ruim está. Não há um respeito ao pacto federativo, não há respeito às regiões do País, não há, de forma alguma, por parte do Executivo, um interesse de ter realmente uma Federação de fato. Somos a República Federativa do Brasil, mas, na prática, não somos uma Federação.

Ouço, com muito prazer, o Senador Valter Pereira.

O Sr. Valter Pereira (PMDB - MS) - Senador Mozarildo Cavalcanti, prestando atenção na fala de V. Exª, não posso deixar de aplaudir o tema que aborda nesta manhã. Indiscutivelmente, a Federação jamais existiria se não houvesse o Senado Federal para preservá-la. A Constituinte, ao consolidar o princípio federativo no texto da Carta de 1988, teve, inclusive, a preocupação de ampliar, incluindo o Município dentro de toda a representação federativa. E o Senado é o representante da Federação, indiscutivelmente. Aquela história que se contou - aliás, surpreendentemente, até abalizados comunicadores entraram naquela onda - de que tinha que se extinguir o Senado, que o Senado não tinha serventia, que atendia aos interesses de quem imagina um Estado centralizador, um Estado unitário e um Estado totalitário também. Felizmente, na opinião pública, não viceja esse tipo de convicção; está só na cabeça daqueles que agem ou por ingenuidade ou de má-fé, porque o equilíbrio que o Senado tem produzido nas relações entre os Poderes é inquestionável. E veja V. Exª: nos momentos mais difíceis, quando os clamores populares são mais pronunciados e que se espera uma ação do Legislativo, às vezes, cria-se até aquela expectativa de que não vão encontrar eco no Senado. Por quê? Porque no Senado os representantes são mais idosos, os representantes estão em uma idade mais provecta e, nesta fase da vida, tenderiam a agir com conservadorismo. E, surpreendentemente, Senador Mão Santa, o que nós estamos verificando - e na discussão e votação da CPMF ficou muito claro isso - é que o Senado está na vanguarda do Poder Legislativo. O Senado consegue livrar-se das pressões dos poderosos e, às vezes, até mesmo das críticas mais contundentes dos meios de comunicação para preservar a independência entre Poderes e respeitar o princípio federativo. Agora mesmo, Senador Mozarildo Cavalcanti, nós temos um grande desafio pela frente: a reforma tributária. Se V. Exª começar a prestar atenção no texto que está sendo gestado na Câmara dos Deputados, V. Exª vai enxergar ali mais um atentado à representação federativa, V. Exª vai encontrar, de forma muito clara, um viés de centralismo, um viés de autoritarismo. Basta prestar atenção no fato de o Governo estar retirando a capacidade dos Estados de formular a sua política tributária, concentrando tudo na União, retirando de pequenos Estados, de pequenas unidades federativas, daquelas que têm uma economia mais anêmica e um nível de desenvolvimento mais retardado, a possibilidade inclusive de criar incentivos fiscais, de se inserir no processo de desenvolvimento, que mais do que uma aspiração e um direito, é um dever de cada Estado para propiciar o bem-estar das famílias que nele habitam. Eu não tenho dúvida, Senador Mozarildo Cavalcanti: pode ser aprovado na Câmara dos Deputados o texto que está em gestação, mas, do jeito como está, duvido que vá passar aqui, no Senado Federal. A se manter esse viés centralizador e autoritário, eu não tenho dúvida de que, aqui no Senado, vai haver resistência. E a resistência, Senador Mozarildo Cavalcanti, não vai ser de parte da oposição. A Oposição não vai ficar sozinha com essa bandeira. V. Exª não vai ter esse privilégio de ficar com essa bandeira sozinho, nem o Senador José Nery. Nós, da Base, eu o Senador Mão Santa, e os demais Senadores do PMDB, vamos estar na resistência, sim. Não na resistência contra o Governo. O Governo quer uma reforma tributária, a sociedade também quer uma reforma tributária, e nós, aqui no Senado, entendemos que ela é mais do que uma vontade; é uma necessidade da Nação para se desenvolver. Mas que venha aqui, sim, uma reforma tributária que alivie a carga de tributos que pesa sobre o setor produtivo, que pesa sobre o consumo, que amplie a base contributiva a fim de que, ao mesmo tempo em que possa fomentar a produção e o consumo, possa propiciar também a felicidade do povo. O povo brasileiro é um dos que mais padece em todo o planeta com tantos impostos. Se o cidadão acordar de manhã e começar a prestar atenção nas obrigações que ele tem naquele dia, naquela semana, naquele mês, naquele ano, é perigoso cometer um desatino contra a própria vida. São mais de 70 tributos, mais de 70 tributos, Senador Mão Santa, que são cobrados do povo brasileiro. Então a reforma tributária que queremos, que almejamos, é uma reforma tributária que induza o cidadão, induza aquele que está na informalidade a vir para a luz do dia, a ter vontade de ser um contribuinte e não aquele que tem medo da fiscalização. Aliás, veja V. Exª: hoje já está cunhado em todos os cantos que o símbolo da Receita é o leão; e todos nós estamos diante do leão; um leão com a boca desse tamanho, querendo abocanhar a todos. Ora, Senador Mozarildo, é hora de aposentar esse velho leão, de colocar no lugar dele uma criatura que seja mais generosa um pouco; não generosa no sentido de abrir mão, porque a sociedade tem plena consciência de que o tributo é necessário, de que o impostos são indispensáveis para promover o desenvolvimento, construindo as obras, atendendo as expectativas e as demandas da sociedade, mas é preferível que haja uma base contributiva ampla - e aí, sim, aumentando os impostos, porque todos contribuem - a concentrar as obrigações tributárias nas mãos de uma minoria e sagrá-la; sangrá-la, sangrá-la até o ponto que ela não suporta. E quem mais sangra, Senador Mozarildo? Quem mais sangra é exatamente o assalariado, porque sobre o assalariado não há como sonegar; é descontado na folha de pagamento de cada mês, ali é descontado, do assalariado e do empresário, é descontada ali a contribuição tributária, que é necessária e de que o Governo não abre mão. E realmente tem que cobrar. Ninguém está preconizando aqui um Estado sem posse, porque isso seria mais para o campo da ficção, aliás, absolutamente no campo da ficção. Mas o que nós temos que defender é que haja uma reforma tributária profunda que alivie a carga tributária, que libere as forças produtivas deste País para produzir, que induza efetivamente, não só com o discurso, mas com as condições para o cidadão de consumir. Parabéns a V. Exª pelo pronunciamento que faz.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Muito obrigado, Senador Valter Pereira. O aparte de V. Exª enriquece e completa o meu pronunciamento. E V. Exª colocou aí, ao final das suas observações, uma coisa que é realmente o cerne da questão: o Governo Federal... - e eu lamento que alguém que faz uma observação, uma crítica construtiva a alguma idéia do Governo é visto como inimigo. Eu aprendi desde pequeno que duas cabeças pensam melhor do que uma só. Então, parece que neste Governo tem ali alguns colegas de Deus que sabem mais do que todo mundo e quando botam uma medida provisória - que o comum é medida provisória - ninguém pode aqui discutir, não pode emendar porque tudo vem com prazo esgotado da Câmara etc. Não se quer mudar o rito porque isso não é bom para o governo, porque senão ele não impõe as coisas dele. E pior, como V. Exª disse ao final, é que, na verdade, imposto realmente quem paga mais é o assalariado. E Imposto de Renda? Eu pergunto: salário é renda? Ou salário, como o nome diz, que, na origem, era pago em sal, naquela época, é fruto do trabalho; é exatamente o pagamento pelo trabalho que a pessoa fez. Então, não é renda. Renda é quando alguém investe o dinheiro que tem e obtém desse investimento um lucro advindo percentualmente dessa aplicação. Isso, sim, é renda. Mas salário não pode ser contabilizado como renda. Infelizmente, quem é mais taxado é justamente o assalariado. E quanto aos empresários? O Governo é sócio das empresas, porque 40%, em média, do preço dos produtos industrializados é de imposto. E quem paga esse imposto que o governo diz cobrar do empresário? É quem compra a mercadoria, ao final. Então, o consumidor paga para o Governo ser sócio dos empresários. E tanto o Governo é sócio dos empresários que está aí, preocupadíssimo em salvar as empresas. Em parte, de maneira muito justa, porque não vamos deixar o País quebrar por causa dessa crise que o Presidente disse que chegaria aqui como uma marola. Imaginem se fosse a Tsunami!

Eu realmente fico pasmo de ver essas coisas que o PT combatia tanto quando era Oposição. Chamava todos os governos anteriores, até o do Fernando Henrique de governo entreguista, de governo de ditadura, que usava e abusa; e, no entanto, está fazendo pior.

V. Exª colocou aqui: nós, no Senado, temos, ao invés do que poderia parecer que devia ser, como disse, nós, para sermos Senadores, temos de ter, no mínimo, 35 anos de idade, e a média aqui é de 50 anos, na verdade. E aqui temos ex-governadores, ex-presidentes da República, ex-deputados, ex-ministros, então nós, que poderíamos ser os mais acomodados, é que temos sido os mais ousados. Vejam aí o caso dos aposentados. Nós estamos lutando por justiça. E aí o Governo entra por intermédio de parlamentares que ficam presos a ele com argumentação de que não tem dinheiro. Mas tem dinheiro para tanta coisa e não tem para fazer justiça aos aposentados.

O Sr. Valter Pereira (PMDB - MS) - V. Exª me dá mais um pequeno aparte sobre este assunto que também foi largamente debatido e nós participamos das históricas vigílias cívicas aqui em defesa dos aposentados e pensionistas deste País. E veja V. Exª, vigília cívica, varar a noite, entrar a madrugada, para pessoas, às vezes até de idade realmente provecta, como aconteceu aqui no Senado, é atitude revolucionária, é atitude viril, é atitude juvenil, é própria do jovem a vigília cívica, a passeata, a carreata, as mobilizações de rua, e nós fizemos isso aqui, Senador Mão Santa, aqui no Senado e V. Exª estava presente! Em defesa do quê? V. Exª fala em justiça. Eu acrescentaria em busca da justiça e do direito. Por quê? Porque nem tudo que é justo está no Direito. Mas no caso dos aposentados, está na Justiça e no Direito. Por quê? Porque o aposentado, aquele pelo qual estamos brigando, é exatamente o cidadão que contribuiu anos e anos, anos a fio em cima de uma base. No momento em que ele foi para a inatividade, ele estava contribuindo, por exemplo, com seis salários mínimos. Portanto, a contribuição previdenciária dele foi descontada na folha tendo como parâmetro, como base os seis salários mínimos. E, de repente, aquele benefício de seis salários mínimos que ele recebeu no primeiro mês da aposentadoria começa a emagrecer, começa a desidratar. Vai desidratando aos poucos, até que aquele benefício de seis salários mínimos chegue ao piso, um salário mínimo. Conheço casos assim. Então, o que se está fazendo é uma verdadeira fraude contra o direito do trabalhador que se aposenta. E essa fraude ocorre no momento em que ele mais precisa, no momento em que ele está indefeso, no momento em que, com idade avançada, começa a enfrentar o problema das patologias, das enfermidades, o problema da pressão alta, o problema do diabetes, o problema do mal de Parkinson. É exatamente nessa hora que ele, efetivamente, sofre um injusto confisco que fere, sim, o direito. Fere o direito porque ele contribuiu sobre uma base maior e de repente foi surrupiado. É essa luta. Veja o que V. Exª está suscitando aí: onde é que está ocorrendo esta mobilização? Quem deflagrou essa mobilização? O Senado Federal, a Casa dos velhinhos. Foi aqui que se deflagrou essa luta em defesa dos aposentados. E veja que essa luta aí - é preciso a gente ser justo também - é uma luta que ganhou tanto as ruas, que ganhou tanto as praças, que ganhou tantos lares de aposentados, que hoje nós podemos dizer aqui que houve uma evolução mesmo no Congresso. Eu li, há poucos dias, não sei se ontem ou anteontem, uma notícia segundo a qual a Bancada do PT, a Bancada do Partido do Presidente Lula, está aguardando o momento da votação para votar junto com o Senado e em favor do aposentado. Nós tomamos atitude de vanguarda. É bem verdade que a iniciativa foi de um Senador do PT, do Senador Paulo Paim - justiça seja feita -, mas ela contagiou todos os Parlamentares do Senado, tanto é verdade que a medida foi aprovada pelo Senado. Mas a medida vai depender da aprovação na Câmara, onde o Partido do Governo entrou em acordo. Espero que o Presidente da República, que tem compromissos efetivos, que tem compromissos arraigados com a classe trabalhadora, neste momento decisivo, faça justiça e faça cumprir os fundamentos da lei e acabe concordando com aquilo que é pleiteado, com justa razão, por todos os aposentados e pensionistas deste País. No momento em que o Presidente não opuser resistência, em que o Presidente abraçar esta causa - ele já a abraçou no passado e nunca fez um pronunciamento contrário a ela -, no momento em que seu Governo assumir de fato e de direito essa postura, teremos, Oposição e Situação, que subir nesse púlpito, como está fazendo V. Exª, para aplaudir o Presidente. E eu estou aguardando ansiosamente pelo momento em que poderei subir a essa tribuna para dizer “o Presidente Lula está sendo coerente com a sua história e os seus compromissos com os aposentados e pensionistas deste País”.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Apesar, Senador Valter Pereira, de faltarem apenas dois anos para terminar o segundo mandato do Presidente e ele não ter tomado a iniciativa - toma tanta iniciativa por meio de medida provisória e podia ter corrigido isso de maneira muito rápida -, espero que agora ele não se oponha a esse movimento iniciado no Congresso Nacional...

O Sr. Valter Pereira (PMDB - MS) - Mas talvez ele queira, na verdade, prestigiar o Senado.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - V. Exª realmente é um homem muito bondoso, porque, ao longo dos seis anos, ele nunca prestigiou esta Casa, haja vista a forma como ele se referiu ao Senado inúmeras vezes, durante a votação da CPMF, chamando os Senadores de irresponsáveis e dizendo que ia botar na rua o nome daqueles que iam votar contra a contribuição. Na verdade, ele não tem prestigiado o Senado, não. Quero, independentemente do que ele vá fazer ou não, independentemente do que ele já vem comentando ou não, dizer que o Senado fez e fará a parte que lhe cabe, com relação aos aposentados, à CPMF, à reforma do Judiciário, ao orçamento impositivo e à reforma tributária.

         Quero encerrar porque sei que o Senador Nery, que vai me suceder na tribuna, tem hora marcada para viajar, e reiterar, Sr. Presidente, o pedido de inserção, nos Anais, dos documentos da reunião do I Encontro de Magistrados Estaduais da Região Norte e do III Encontro de Aperfeiçoamento dos Magistrados de Roraima.

Muito obrigado.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

***************************************************************************************Matérias referidas:

Associação Nacional dos Magistrados Estaduais;

Carta de Boa Vista;

Ata nº 002/2008;

Magistrados exigem condições de trabalho.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/12/2008 - Página 50025