Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Necessidade de medidas para garantir a segurança nas escolas. Defesa da aprovação de Projeto de Lei do Senado, que cria uma Agência Federal de Segurança Escolar no Brasil.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. EDUCAÇÃO. :
  • Necessidade de medidas para garantir a segurança nas escolas. Defesa da aprovação de Projeto de Lei do Senado, que cria uma Agência Federal de Segurança Escolar no Brasil.
Aparteantes
Valter Pereira.
Publicação
Publicação no DSF de 12/02/2009 - Página 1573
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. EDUCAÇÃO.
Indexação
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, CIDADE SATELITE, DISTRITO FEDERAL (DF), JULGAMENTO, ACUSADO, HOMICIDIO, PROFESSOR, DIRETOR, RESPONSAVEL, TRABALHO, CONSCIENTIZAÇÃO, ALUNO, COMBATE, TRAFICO, DROGA, ESTABELECIMENTO DE ENSINO.
  • APRESENTAÇÃO, DADOS, PESQUISA, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO), GRAVIDADE, VIOLENCIA, FACILIDADE, ACESSO, ARMA DE FOGO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, BRASIL, COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, ZERO HORA, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), OPINIÃO, PROFESSOR, AGRAVAÇÃO, PROBLEMA, AUSENCIA, SEGURANÇA, EXISTENCIA, GRUPO, DELINQUENCIA JUVENIL, INFORMAÇÃO, METADE, CORPO DOCENTE, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), VITIMA, AGRESSÃO.
  • REGISTRO, URGENCIA, ADOÇÃO, PROVIDENCIA, COMBATE, SITUAÇÃO, PROJETO DE LEI, TRAMITAÇÃO, COMISSÃO DE EDUCAÇÃO, CRIAÇÃO, AGENCIA NACIONAL, SEGURANÇA, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, BRASIL, EXPECTATIVA, APROVAÇÃO, MATERIA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, muito perto daqui, Senador Valter, na cidade de Sobradinho, dentro do Distrito Federal, realiza-se nesse exato momento, desde as nove horas da manhã de hoje, o julgamento de quatro réus, acusados do assassinato do Professor Carlos Mota, de uma escola do Distrito Federal.

O Professor Carlos Mota era não apenas uma professor, mas um professor muito especial que conseguiu mudar a escola onde ele estava como diretor, que conseguiu trazer para dentro das escolas as famílias dos alunos, que conseguiu fazer programas que ensinavam os alunos a enfrentar os problemas da contemporaneidade, Senador Augusto Botelho, inclusive o problema das drogas, e, por isso, foi assassinado às 4 da madrugada, na frente da sua casa, depois de o terem chamado e ele ter levantado da cama e ido atender a quem o chamava, e recebeu os tiros que o mataram. Meses atrás isso aconteceu, e os réus, hoje réus, foram presos e chegaram a confessar que tinham feito o assassinato porque o Professor Carlos Mota tentava impedir a venda de drogas dentro da sua escola.

O que está em julgamento hoje na cidade de Sobradinho é muito mais do que o assassinato de um professor. O que está em julgamento é a demonstração deste País e da nossa Justiça se queremos ser tolerantes ou não com a violência nas nossas escolas. Não estamos percebendo a hemorragia que o País vive pelo fato de que os nossos jovens fogem da carreira do magistério pelo medo da violência, pelas más condições de trabalho, pelos baixos salários. E se há algo que é preciso enfrentar para reverter essa hemorragia, ao lado da formação dos professores, dos bons salários, é um basta na violência que toma conta das nossas escolas.

Uma pesquisa recente da Unesco, feita pela Srª Miriam Abramovay, mostra dados absolutamente alarmantes, Senadores, a que nós estamos assistindo de uma maneira pouco séria: 55% dos alunos sabem que existem armas na escola ou ao redor da escola - 55%, Senador Mão Santa; 70% dos alunos dizem que têm acesso às armas - se necessário for, 70% dos nossos alunos, nas escolas de nível médio e fundamental, dizem que têm acesso; 36% dos estudantes de Brasília já ouviram tiros dentro ou ao redor de suas escolas - 36% dos nossos alunos já ouviram tiros! Essa é uma percentagem maior do que em países em guerra, porque, mesmo em países em guerra, esta fica localizada em alguns pontos. Não há 36% dizendo que ouviram tiros. Mas, nas escolas brasileiras, 36% dizem que já ouviram tiros dentro da escola. Os tiros dados dentro ou tiros dados fora, mas eles ouviram desde o interior da escola. Quarenta por cento dos professores consideram que o problema mais grave hoje na educação brasileira, o xis da questão, como diz o jornal Zero Hora, num seriado muito interessante que tem feito sobre a educação, 40% dizem que o mais sério problema é a existência das gangues. Metade dos professores, ½, que anotei, 50% dos professores de São Paulo já sofreram algum tipo de agressão na escola.

Senadores, reflitam um pouco sobre o dado que estou formulando; parem de pensar na depressão da economia apenas; parem de pensar apenas em quanto diminuiu a venda de automóveis.

Cinquenta por cento dos professores da cidade de São Paulo dizem que já sofreram algum tipo de agressão dentro da escola onde trabalham. Que futuro vai ter esse País? Que futuro, Senador Valter Pereira?

Pois bem, há mais dados. Quarenta por cento, em Brasília, dos diretores admitem drogas nas escolas. Quarenta por cento dos diretores admitem drogas nas suas escolas, no Distrito Federal. Cinquenta e três por cento sabem que se vendem bebidas alcoólicas nas proximidades das escolas.

Que quadro é esse? Que Brasil está nascendo daí?

Hoje, esse julgamento que se está realizando, neste momento, em Sobradinho, tem um simbolismo, tem uma imagem que vai dar um recado ao Brasil inteiro. Vai dar o recado de que assassinos de professores que tentam impedir o tráfico de drogas dentro das escolas, os assassinos dos que tentam impedir, matando diretores, a venda de drogas nas escolas ficarão soltos ou serão soltos? Isso é um recado para o Brasil. Sendo soltos, está dado o recado da total possibilidade de que, em nosso País, professores sejam assassinados porque lutam para que seus alunos não caiam nas drogas. É isso que está em julgamento neste momento, aqui muito pertinho de onde estamos, dentro do Distrito Federal, ao lado da residência onde foi assassinado o professor Carlos Mota.

         Nós - e passo daqui a pouco a palavra ao Senador Valter Pereira, até com muito prazer, porque o projeto está nas suas mãos e espero que em breve tenhamos o parecer - precisamos dar um basta nisso.

É claro que o verdadeiro basta nisso é encantar a escola, que começa pelo encantamento dos dirigentes políticos deste País para o problema das crianças e da educação. Nós não somos líderes encantados com a educação neste País. Há exceções, mas são exceções. Nossos Governadores, nossos Prefeitos, nossos Presidentes, nós, Senadores, nós, Parlamentares, não somos pessoas encantadas delirantemente em função da educação. Até brigamos por escolas técnicas, porque dá voto; até brigamos por universidades novas, porque dá voto, mas nós não somos encantados com o problema da educação e com a tarefa fundamental de educar as crianças.

Segundo, é encantar os professores, é encantar os alunos, é encantar os pais, é encantar a mídia, para que, juntos, tenhamos um esforço neste País para resgatar o que está em plena degradação no País, que é a escola. Degradação dos prédios quebrados. Eu não vejo bancos quebrados, eu não vejo shoppings quebrados, não vejo cinemas quebrados, eu não vejo nem as estações de metrô quebradas. Mas as escolas estão quebradas, e não nos revoltamos com isso. E há degradação de também de escolas, que não são escolas, porque não têm os equipamentos necessários para o mundo de hoje.

Se qualquer um de nós tivesse ido dormir 20, 30 anos atrás, acordasse agora e entrasse num shopping center, não saberia o que era; se entrasse num supermercado, não saberia como comprar; se entrasse numa loteria, não saberia como jogar; se entrasse em um banco, 30 anos depois de ter dormido, não saberia como tirar dinheiro nas máquinas, não saberia que aquilo era um banco.

Mas, se tivéssemos ido dormir cem anos atrás, acordássemos agora e entrássemos em uma escola, nós saberíamos que era uma escola, porque elas não mudaram nada nesse período! É preciso encantar as escolas.

Agora, além disso, é preciso de imediato ter um programa que cuide da violência. Há um programa, há um projeto na Comissão de Educação - e o Senador Valter Pereira deve estar em fase final da elaboração do parecer - que cria a agência federal para a segurança escolar no Brasil.

Não dá! Não dá para deixar o problema da segurança escolar nas mãos dos Prefeitos, dos Governadores, com os poucos recursos que eles têm. Não dá!

Nós precisamos ter uma instituição com a força da Presidência da República, com os recursos do Governo Federal, precisamos ter uma instituição que seja capaz de trazer para o colo do Presidente e do Governo Federal a preocupação com a segurança das nossas crianças, com a segurança dos nossos professores, dos servidores das nossas escolas, para parar essa sangria, essa hemorragia, essa evasão de cérebros que hoje ocorre, seja pelo assassinato, como o que aconteceu com o professor Carlos Mota,...

(Interrupção do som.)

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) -... em que a sangria foi até o final da sua vida, seja obviamente evitando que mais professores abandonem a carreira.

Hoje, aqui pertinho, na cidade de Sobradinho estamos julgando mais do que quatro réus que mataram um professor. Estamos tomando a decisão - a Justiça, os jurados ali presentes -, e hoje estive pela manhã no Fórum. Assisti ao julgamento, assisti ao depoimento das testemunhas, e ali toda a sensação que eu tive é a de que estávamos julgando o futuro da escola brasileira, pelo menos no que se refere a trazer ou não paz para dentro delas.

Vamos - nesta madrugada, provavelmente, sairá o resultado do julgamento - dar o recado: “Continuem matando professores”; ou daremos o recado: “Basta!”.

Neste País, os professores e as crianças, portanto,...

(Interrupção do som.)

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Neste País, os professores e as crianças, os alunos, portanto, vão ter a Justiça ao lado deles. É pouco, é muito pouco, mas é fundamental para evitarmos a tragédia que está em marcha, sob os olhos da gente, e a gente não está enxergando.

Sr. Presidente, era isso que eu tinha a falar, mas eu não posso deixar de passar a palavra ao Senador Valter para ouvir o seu aparte que muito me honra.

O Sr. Valter Pereira (PMDB - MS) - Senador Cristovam, eu sou testemunha de que a luz vermelha que V. Exª está acendendo dessa tribuna neste instante não está sendo acionada agora. Há muito tempo V. Exª já vem alertando a Nação para esse grave perigo que está rondando cada escola pública deste País...

(Interrupção do som.)

O Sr. Valter Pereira (PMDB - MS) - E eu digo a escola pública. Por quê? Porque a escola privada tem a segurança privada que lhe dá uma certa proteção, embora também a violência esteja rondando tais estabelecimentos. Eu gostaria aqui, no pronunciamento de V. Exª - e atestando o que estou dizendo -, de lembrar o PLS nº 191, de autoria de V. Exª, que cria essa agência.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Obrigado.

O Sr. Valter Pereira (PMDB - MS) - E eu o estou examinando porque alguns óbices precisam ser contornados e, sobre esses óbices, depois vamos conversar pessoalmente. Mas o que eu gostaria, referendando tudo o que V. Exª fala e corroborando toda a inquietação que tem, de lembrar aqui um episódio. Quando fui Secretário de Educação do meu Estado de Mato Grosso do Sul, lá pelos idos de 1989, o dia que mais me chocou foi quando a agente de ensino me trouxe uma diretora com a seguinte decisão: “Secretário, pedi demissão porque um aluno fora esfaqueado na frente do estabelecimento que dirijo e, naquele instante, quando vi o aluno caído no chão, fui socorrê-lo. Esse gesto de socorro custou-me uma ameaça à minha vida. Hoje estou jurada de morte porque prestei socorro a um aluno que estava ameaçado de perder a vida”. Veja a que ponto que chegamos, e foi muito difícil convencer a diretora que ela tinha que continuar dirigindo a escola e que eu iria garantir a segurança dela. Pois bem, isso foi em 1989. De lá para cá, não dá nem para comparar o que vem acontecendo em termos de deterioração da segurança das escolas. V. Exª está de parabéns, está coerente com a conduta que vem adotando em defesa do aluno e da escola.

E realmente nós temos que adotar uma política, nós temos que criar mecanismos, nós temos que envolver o Governo nessa questão, porque se não for feito, se não for adotada uma medida eficaz o que vai acontecer? Aliás, já está acontecendo. Alguns professores, alguns diretores, hoje, diante da insegurança e do perigo já começam a fechar os olhos diante da delinquência. Há diretores hoje que já estão se silenciando diante do tráfico que ocorre na frente dos seus olhos. Mas diante do perigo acaba tendo que ficar calados, tendo que se silenciar. Então, V. Exª faz um discurso oportuno. Acho que tem que ter, sim, uma política prioritária. Nós temos que adotar medidas urgentes e medidas eficazes para combater a delinquência que ocorre nas escolas. E o mais grave, a impunidade. Porque já há sentença de juízes mandando aluno voltar para a escolar de onde ele foi excluído por ameaçar os seus colegas, por colocar em risco a vida de diretores e de seus colegas e que de repente volta à escola protegido por uma liminar, quer dizer, colocando novamente em risco, aquele risco que já esperava o diretor ou professor ter afastado com a exclusão do aluno. Então, medidas urgentes têm que ser feitas e ser adotadas. E eu aqui estou para aplaudir a iniciativa, o discurso de V. Exª e me somar a essa luta que V. Exª está deflagrando em favor da segurança nas escolas.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Muito obrigado a V. Exª, Senador Valter Pereira.

Sr. Presidente, peço a V. Exª mais um minuto de tempo, além dos 20 segundos que ainda tenho, para dizer que a morte de um dos melhores diretores de escola que já tivemos no Distrito Federal, o Professor Carlos Mota, não recupera mais a sua vida, o seu esforço, o seu papel. Mas pelo menos não deixemos que tenha sido em vão. Despertemos para a realidade que nós estamos enfrentando, lembrando que ele foi despertado, retirado da cama e assassinado na porta da sua casa por ser um Diretor de escola, competente e preocupado, capaz de lutar contra o tráfico de drogas dentro das salas de aula, e que por isso foi assassinado. Despertemos pelo menos. Que a morte dele não seja em vão e que saia daqui desta Casa uma preocupação. O Presidente da República, nos seus seis anos, nunca fez, ao que saiba, um pronunciamento sobre o problema da violência nas escolas. Que nós façamos nossa parte, aprovando, também, esse PLS que cria uma Agência Federal de Segurança Escolar no Brasil. Deveria ter partido do Governo Federal, mas eles não tomaram a iniciativa, e a nós fizemos, aqui. Que seja aprovada, nem que seja como uma homenagem ao Professor Carlos Mota.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/02/2009 - Página 1573