Discurso durante a 33ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre histórico de tolerância com a violência no Brasil.

Autor
Gerson Camata (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Gerson Camata
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Considerações sobre histórico de tolerância com a violência no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 25/03/2009 - Página 6541
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • CRITICA, EXCESSO, TOLERANCIA, VIOLENCIA, AMBITO NACIONAL, LIMITAÇÃO, ATUAÇÃO, ESTADO, EFEITO, AMPLIAÇÃO, CRIME, SOCIEDADE, COMENTARIO, DADOS, ENTIDADE, ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES), DEMONSTRAÇÃO, AUMENTO, DELINQUENCIA JUVENIL, REGIÃO, REGISTRO, DECLARAÇÃO, MÃE, DELEGACIA, JUVENTUDE, CAPITAL DE ESTADO, APREENSÃO, LIBERDADE, FILHO, POSSIBILIDADE, VITIMA, HOMICIDIO, RELATORIO, AGENCIA BRASILEIRA DE INTELIGENCIA (ABIN), DIVULGAÇÃO, ALICIAMENTO, ADOLESCENTE, TRAFICO, DROGA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).
  • COMENTARIO, DECLARAÇÃO, PROFESSOR, UNIVERSIDADE, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), NECESSIDADE, MELHORIA, PUNIÇÃO, BRASIL, EFETIVAÇÃO, COMBATE, VIOLENCIA, REGISTRO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DETALHAMENTO, SITUAÇÃO, POLICIA, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), REPUDIO, TOLERANCIA, CRIMINOSO, ALEGAÇÕES, VITIMA, DESIGUALDADE SOCIAL.

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O SR. GERSON CAMATA (PMDB - ES. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nosso País tem um histórico de tolerância com a violência que vem de muito tempo, amparado na concepção equivocada de que, diante das grandes desigualdades sociais, a atuação do Estado no combate ao crime deve submeter-se a limites - e não me refiro àqueles que a lei estabelece, e que devem ser obedecidos, mas a outros, a limites que beiram a conivência.

Trata-se de um equívoco monumental, pois essa indulgência é que vem deteriorando algumas de nossas metrópoles, já que, onde o crime se estabelece, toda atividade econômica legal se reduz ao ponto de desaparecer. O paradoxo é que esses padrinhos da transigência acabam contribuindo para a marginalização daqueles que dizem defender. O esvaziamento econômico decorrente do crescimento da criminalidade resulta em desemprego, marginalização, miséria e fome, tudo menos justiça social.

No ano passado, um levantamento do Iases, o Instituto de Atendimento Sócio-Educativo do Espírito Santo, indicou um envolvimento cada vez maior de adolescentes em assassinatos, roubo, tráfico de drogas e outros crimes. Nos primeiros 7 meses de 2008, foram detidos no Estado 1.010 adolescentes, contra 870 no mesmo período de 2007.

Em Vitória, na Delegacia do Adolescente, todos os dias mães de jovens detidos, envolvidos com o tráfico de drogas, confessam seu temor de que os filhos, quando soltos, sejam assassinados tão logo ponham os pés na rua, pois muitos tiveram sua morte “decretada” pelos traficantes. No município da Serra, a polícia encontrou no ano passado um adolescente de 16 anos que trabalhava para quadrilhas, identificando vítimas marcadas para morrer, em troca de 50 reais. Em apenas um dia, ele teria participado de 2 assassinatos.

No Rio de Janeiro, descobriu-se que o tráfico estava investindo no treinamento de menores em táticas de guerrilha, realizado em áreas de Mata Atlântica. E um relatório da Abin, a Agência Brasileira de Inteligência, divulgado em 2008, mostrava que traficantes ofereciam 300 reais por semana para que jovens ingressassem nas Forças Armadas e depois instruíssem as quadrilhas em técnicas de guerrilha, tiro e manutenção de armas.

Ao contrário do que muitos acreditam, o medo e a insegurança disseminam-se entre todos os grupos sociais, não apenas entre a classe média e os ricos. E provavelmente quem os sente com maior intensidade são os pobres, forçados muitas vezes a conviver com bandos de traficantes e assaltantes, que exercem domínio absoluto sobre favelas, impõem suas próprias leis e criam seus tribunais.

Steven Levitt, professor do Departamento de Economia da Universidade de Chicago e estudioso dos impactos econômicos da violência, entende que a estratégia mais indicada para o combate à violência é a punição. No Brasil, ele acredita que tanto a punição esperada como o tempo real da pena são muito reduzidos. Sem contar que são limitadas as probabilidades de o autor de um crime ser capturado. E, mesmo se isto ocorrer, a pena que receberá será pequena, em comparação com a média de outros países.

Fatos como esses fazem relembrar um raro chamado à imparcialidade e à lucidez na análise do combate à criminalidade, de autoria do poeta e jornalista Ferreira Gullar, publicado na Folha de São Paulo, no ano passado. Ele se referia especificamente ao Rio de Janeiro, mas a análise que fez aplica-se a qualquer cidade ou contexto. No artigo, intitulado “E você, chamaria o ladrão?”, Gullar mencionava os episódios em que, durante perseguições a bandidos, pessoas inocentes foram mortas por policiais cariocas.

É evidente que nenhuma polícia está imune a erros, e que esses erros merecem apuração rigorosa, para que se detectem e eliminem suas causas. Mas o fato é que os acontecimentos como aqueles ocorridos no Rio de Janeiro reforçaram também uma perspectiva distorcida, aquela que recomenda o recuo no combate ao crime organizado, como se fosse inevitável e, o que é pior, aceitável a convivência com as suas atividades e a sua expansão.

Ferreira Gullar lembrava em seu artigo que, no Rio, entre 2003 e o primeiro semestre de 2008, os bandidos já tinham matado 646 policiais, dos quais 504 fora de serviço. Ressaltava que esses bandidos “impõem seu poder de vida e morte sobre os moradores das favelas, a ponto de obrigá-los a deixar as portas das casas abertas para que possam nelas se esconder e escapar das batidas policiais”. Daí decorre que, muitas vezes, os confrontos entre policiais e bandidos aconteçam dentro dessas casas. E, quando algum morador morre, a polícia é sempre acusada de matá-lo.

            Os bandidos, assinalava Gullar, exercem seu terror também sobre os policiais, que sequer se atrevem a sair de casa fardados. Se forem identificados como policiais, são mortos na hora. E ele indagava: “Se você tivesse que viver sob semelhante ameaça, como se comportaria ao se defrontar com um bandido?”

Vale transcrever o penúltimo parágrafo do artigo, por traduzir com fidelidade o pensamento distorcido daqueles que se empenham em dificultar o combate à criminalidade: “Não pega lá muito bem reconhecer a legitimidade da polícia; pega muito melhor ser tolerante com os bandidos, tidos como vítimas da sociedade. Inventou-se que a pobreza é a mãe do crime, quando alguns dos maiores ladrões deste país são ricos”.

Era o que tinha a dizer.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/03/2009 - Página 6541