Discurso durante a 44ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Manifestação sobre a adesão da Venezuela ao Mercosul.

Autor
Gerson Camata (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Gerson Camata
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL.:
  • Manifestação sobre a adesão da Venezuela ao Mercosul.
Publicação
Publicação no DSF de 03/04/2009 - Página 9033
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • CRITICA, AUTORITARISMO, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, IMPOSIÇÃO, FERIADO NACIONAL, ANIVERSARIO, DIA, POSSE, GOVERNO ESTRANGEIRO, DISCORDANCIA, COMPARAÇÃO, SIMON BOLIVAR, VULTO HISTORICO, LUTA, INDEPENDENCIA, AMERICA LATINA, REPUDIO, REFERENDO, RETIRADA, LIMITAÇÃO, REELEIÇÃO, APREENSÃO, APROVAÇÃO, EXTINÇÃO, DEMOCRACIA.
  • LEITURA, DECLARAÇÃO, ARCEBISPO, CRITICA, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, DEMONSTRAÇÃO, ORADOR, CARACTERISTICA, DITADURA, GOVERNO ESTRANGEIRO.
  • DISCORDANCIA, POSSIBILIDADE, ENTRADA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), APREENSÃO, DIFICULDADE, ESTABELECIMENTO, ACORDO, COMERCIO EXTERIOR.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. GERSON CAMATA (PMDB - ES. Sem apanhamento taquigráfico.) Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores,dez anos depois de sua ascensão ao poder por vias legais, o Presidente da Venezuela, Hugo Chávez, parece prestes a completar a tarefa a que se entregou desde que assumiu o cargo: destruir a democracia, fazendo uso, para cumprir sua meta, dos instrumentos proporcionados pelo regime democrático.

Não se pode atribuir ao coronel sequer o mérito do ineditismo. Hitler e Mussolini também empregaram o mesmo método para eliminar as liberdades. Arrancaram do Legislativo a autorização para governar por decreto. Recorreram a plebiscitos e referendos para acumular poder, ignorando o Congresso. Criaram milícias armadas, verdadeiras tropas de choque, formadas em sua maioria por marginais violentos, destinadas a intimidar e, quando preciso, massacrar os adversários - sempre tratados como “inimigos da pátria”. E subjugaram o Poder Judiciário, promovendo expurgos que só pouparam os magistrados dispostos à concordância incondicional com as vontades do Executivo.

Em sua última demonstração de estilo centralizador e vocação ditatorial, na tarde do último domingo, 10 horas antes da segunda-feira, Chávez decretou que 2 de fevereiro seria feriado nacional - em comemoração, é claro, aos 10 anos de seu Governo.

Foi outro ato que nada teve de inédito. No século 19, o ditador José Tadeo Monagas, que invadiu o Congresso venezuelano, transformou em feriado o dia 24 de janeiro, data em que tomou o poder. Depois dele, no século 20, outro ditador, Marcos Pérez Jiménez, criou a “Semana da Pátria”, que começava em 2 de dezembro, dia em que se apossou da presidência da Venezuela.

Tomada de surpresa por um feriado decretado com apenas algumas horas de antecedência, a população enfrentou transtornos de toda espécie. Pais encontraram fechadas as escolas em que seus filhos estudam, operários que esperavam cumprir um dia normal de trabalho tiveram que voltar para casa, milhares de comerciantes perderam toneladas de produtos perecíveis.

Em meio ao caos generalizado, tropas da Guarda Nacional forçavam os lojistas a fecharem as portas, chegando a invadir clínicas particulares e farmácias, para garantir que apenas o atendimento de emergência funcionasse.

A megalomania presidencial custou caro ao país, mas Chávez ignorou a confusão provocada por seu capricho. No Panteão Nacional, onde está sepultado Simón Bolívar, atreveu-se a dizer que o libertador do país, “incorporado na vontade do povo, voltou à vida 10 anos atrás”. Ou seja, ele tem a firme convicção de ser a reencarnação do herói nacional, reverenciado por sua contribuição decisiva para a independência de vários territórios da América Espanhola.

São tantas as incompatibilidades entre a figura do libertador e a do coronel-ditador que seria tedioso enumerá-las. Elas começam, entretanto, pelo fato de que o chefe das revoluções que promoveram a independência da Venezuela, Colômbia, Equador, Peru e Bolívia, embora tenha eventualmente sucumbido a tentações autoritárias, venerava a democracia. Quando Napoleão se autoproclamou imperador da França, passou a considerá-lo um “traidor dos ideais republicanos”.

A moderna perversão do culto a Bolívar, concebida por Hugo Chávez, não contempla o menor respeito pelos ideais republicanos que o libertador admirava. Faltam menos de 15 dias para a realização do referendo sobre uma emenda constitucional que permitirá a reeleição presidencial sem limites. É a segunda tentativa que ele faz de perpetuar-se no poder. Derrotado na primeira, em 2007, não desistiu, e nada indica que desistirá se o povo da Venezuela rejeitar novamente sua pretensão.

É significativo que o vice-presidente da Conferência Episcopal da Venezuela, arcebispo Roberto Luckert, tenha dito na segunda-feira que não vê razões para celebrar os 10 anos de governo de Chávez. “Não tenho nada o que celebrar hoje, nada mesmo, e me sinto mal, por acreditar que este senhor atentou contra a constitucionalidade do país”, afirmou o religioso.

Merecem transcrição as declarações de uma das principais autoridades da Igreja Católica da Venezuela, pela precisão com que descrevem as atuais condições do país e pelo que revelam sobre a personalidade e os propósitos de Chávez:

O que podemos celebrar hoje? Um homem que nos desqualifica, dizendo que somos conspiradores, que estamos contra a Venezuela. Ele já disse que entrou para a Academia Militar com o objetivo de dar um golpe de Estado. É a única pessoa a quem o país concedeu o diploma de golpista. Diz que quer prolongar seu modelo até 2049. Seu modelo é o do presidente eterno, o de Cuba, o mesmo da Coréia do Norte e do Zimbábue.

O modelo de Hugo Chávez é, com certeza, o de uma ditadura, em que ele governará até a morte. E seu “socialismo do século 21” nada mais é do que o velho e fracassado socialismo do século 20, misturado ao caudilhismo do século 19. Nele, o Estado controla tudo, e não admite divergências. O populismo assegura a continuidade da miséria - uma piada diz que o presidente gosta tanto de seus pobres que tratou de multiplicá-los... Quanto à economia de mercado, aos poucos, desaparece, sob o poder opressor das regras ditatoriais.

Quem duvida dos propósitos totalitários de Chávez deve ler o chamado “Plano da Nação 2007-2013”, que estabelece as metas do governo federal para o período. Nele, está escrito que “o Estado conservará o controle total das atividades produtivas que sejam de valor estratégico para o desenvolvimento do país”. Acontece que, para Hugo Chávez, tudo é estratégico: os setores de alimentos, telecomunicações, bancário, energético, supermercados e até shopping centers, a julgar pela recente desapropriação de um, em Caracas.

Quanto ao futuro da economia de mercado, declarações feitas 2 anos atrás pelo ministro de Planejamento e Desenvolvimento deixam poucas dúvidas. Em dezembro de 2006, ele disse que “os empresários dispostos a assumir a agenda socialista deverão cumprir compromissos para ter acesso a estímulos estatais. Os que se negarem (...) receberão do Estado um tratamento conforme a legalidade vigente, que não será cordial, muito menos preferencial”.

São regras como estas que vigoram no país que pretende integrar o Mercosul. Instituição que, na concepção de Chávez, precisa ser “descontaminada”, ou seja, deve conformar-se aos seus ditames ideológicos. Seu propósito é ingressar no Mercosul para transformá-lo numa frente beligerante, que só arrecadará inimizades e será incapaz de firmar acordos comerciais.

A adesão da Venezuela só tende a emperrar as negociações com blocos e a inserção competitiva de seus integrantes na globalização. Transformado em instrumento da “política bolivariana”, o Mercosul enfrentará dificuldades sem conta, provavelmente insuperáveis, para concretizar seus propósitos, caso este sócio indesejável seja admitido.

Era o que eu tinha a dizer.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/04/2009 - Página 9033