Discurso durante a 65ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexões sobre os rumos do País, nos planos político, econômico e social.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA NACIONAL.:
  • Reflexões sobre os rumos do País, nos planos político, econômico e social.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Geraldo Mesquita Júnior.
Publicação
Publicação no DSF de 06/05/2009 - Página 14786
Assunto
Outros > POLITICA NACIONAL.
Indexação
  • CONCLAMAÇÃO, CONGRESSISTA, TRABALHO, LONGO PRAZO, CORREÇÃO, DIRETRIZ, FUTURO, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, AMBITO, POLITICA, OCORRENCIA, PREJUIZO, DEMOCRACIA, DESEQUILIBRIO, PODERES CONSTITUCIONAIS, PERDA, RESPEITO, REGISTRO, NECESSIDADE, RECUPERAÇÃO, CONFIANÇA, PUNIÇÃO, IRREGULARIDADE, COMPROMISSO, ETICA.
  • NECESSIDADE, CORREÇÃO, LIMITAÇÃO, PROGRAMA, BOLSA FAMILIA, PARALISIA, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, URGENCIA, TRANSFORMAÇÃO, SITUAÇÃO, EXCESSO, DESIGUALDADE SOCIAL, FALTA, FLEXIBILIDADE, DEFESA, IGUALDADE, ACESSO, QUALIDADE, SERVIÇOS PUBLICOS, QUESTIONAMENTO, NEGLIGENCIA, PROCESSO, DISTRIBUIÇÃO, MEIO AMBIENTE, ALTERAÇÃO, CLIMA, PLANETA TERRA, CONCLAMAÇÃO, MOBILIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL.
  • NECESSIDADE, CORREÇÃO, MODELO, ECONOMIA, APROVEITAMENTO, GRAVIDADE, CRISE, REESTRUTURAÇÃO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, ANALISE, PERDA, PRIORIDADE, EDUCAÇÃO, SAUDE, APREENSÃO, OMISSÃO, CLASSE POLITICA.
  • COBRANÇA, PROVIDENCIA, PUNIÇÃO, VICIO, ADMINISTRAÇÃO, SENADO, AMPLIAÇÃO, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA.
  • QUALIDADE, SENADOR, DISTRITO FEDERAL (DF), ANUNCIO, DIVULGAÇÃO, UTILIZAÇÃO, PASSAGEM AEREA, VIAGEM, ORADOR, TERRITORIO NACIONAL, PROPOSIÇÃO, INTERESSE NACIONAL.
  • QUESTIONAMENTO, PROPOSTA, FERNANDO COLLOR, SENADOR, RENOVAÇÃO, MANDATO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, COMPROVAÇÃO, DESEQUILIBRIO, PODERES CONSTITUCIONAIS.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, em primeiro lugar, agradeço ao Senador Gilvam Borges pela cessão.

Srªs e Srs. Senadores, Senadora Fátima Cleide, nós temos estado tão voltados para essas denúncias relacionadas à Câmara e ao Senado que são publicadas dia após dia, dia e noite, que nós estamos perdendo a perspectiva do nosso papel de dirigentes deste País. Nós estamos deixando de perceber que nós não estamos em um rumo bom.

O Brasil não está em um bom rumo. Temos uma sociedade aglutinada graças ao Presidente Lula, que consegue essa capacidade mágica de juntar a todos. Temos uma economia cuja crise não se aprofundou tanto e que vai retomar o crescimento. Temos uma política de proteção à pobreza que é capaz de fazer com que os nossos pobres continuem pobres, mas não entrem na fome. Mas nós não vamos em um bom rumo. O Brasil, Senador Mão Santa, não está indo num bom caminho. E eu vou tentar colocar os diversos itens que me fazem temer o futuro do País, não nas próximas semanas ou meses ou anos, mas no longo prazo, para o qual nós, desta Casa, devemos trabalhar.

Comecemos pela política. Nós não vamos bem na política. Não é possível uma democracia na qual o Congresso não seja o poder mais respeitado ou pelo menos respeitado igualmente como os outros dois. E hoje nós não estamos sendo um poder respeitado. Isso é muito grave para o Brasil, não apenas para o futuro de cada um de nós. Se vai ser ou não vai ser eleito na próxima eleição, isso é um detalhe insignificante na história do País; agora, é bastante significante com relação à democracia na nossa sociedade. Nós vivemos num País cuja democracia está ameaçada sem que a gente perceba, não por tanques de guerra lá de fora, mas pelo descrédito daqui de dentro.

Nós não vamos num bom rumo quando hoje vejo o Senador Collor, segundo eu soube, propondo um terceiro mandato para o Presidente Lula. Não pode ir bem um País e uma democracia em que acontece uma coisa desse tipo, duas aberrações, eu diria: uma, a ideia do terceiro mandato; a outra, vinda de quem vem, por todo o passado de conflito que houve entre o atual Presidente e o anterior.

Nós não vamos num bom rumo político. Nós estamos caminhando para um Poder Executivo tão desmoralizado e apequenado que ficaremos irrelevantes. E, nesse sentido, a democracia fica absolutamente desfeita, porque hoje ela existe na aparência; ela não existe na sua concretude plena, que requer um Poder Legislativo eficiente, transparente, sobretudo muito respeitado.

Nós não vamos bem no social. E não vamos bem no social porque somos um País que descobriu, é verdade, a generosidade de criar um programa como o Bolsa Família, mas não descobriu ainda a necessidade de transformações sociais. Continuamos adiando, depois de 500 anos de história, 120 anos de República, as reformas capazes de pegar uma casta superior e uma plebe inferior e transformar os dois em um povo com desigualdades, mas um povo. Hoje não somos apenas um País com desigualdade social; somos um País com diferenças nas características na posição social de cada um. Nós não vamos num bom caminho se limitamos a sociedade brasileira a uma rede de proteção em vez de construirmos uma escada de ascensão. Isso só virá por um processo revolucionário, que não tem que ser mais na economia, que não tem que tocar mais na propriedade, mas que tem, sim, que tocar nos serviços essenciais da população iguais para todos. Nós não vamos bem no social, porque continuamos fugindo da ideia da palavra de transformação social.

Nós não vamos bem no ecológico, primeiro, em parte, porque somos pedaço do planeta que está em franco processo de aquecimento global, levando a todas as consequências que a gente já vê de redução na produção agrícola em diversos países, da elevação do nível do mar. Nós estamos vivendo um momento em que o rumo que seguimos é o de uma catástrofe, de uma sociedade sem futuro, e parecemos não ver isso.

Nós não vamos bem na economia, porque, mesmo que a crise aqui fosse apenas uma “marolinha” e mesmo que a gente saísse dessa crise - como nós e todos os outros países vamos sair -, do ponto de vista do crescimento, Senador Geraldo Mesquita, o crescimento que se está definindo é o mesmo do passado, e esse já mostrou o seu esgotamento, Senador Augusto Botelho.

Não há futuro para um País cuja indústria é baseada na mecânica, na depredação ambiental, na concentração da renda para vender os seus produtos, no excesso de endividamento para financiar a venda dos produtos caros. O Senador Mão Santa foi um dos primeiros a denunciar aqui - eu me lembro disso -, quando criticava o nível de endividamento do brasileiro. Não vamos bem na economia, mesmo que, nas aparências, estejamos bem. Mesmo que a taxa de crescimento volte, ela não vai indicar um crescimento bom. Ela vai ser a repetição do mau crescimento que tivemos nessas últimas décadas todas.

Nós vamos mal nessa economia. Basta ver que a base da sua retomada do crescimento é a isenção do IPI para a indústria automobilística. A redução do IPI para a indústria automobilística significa mais carro nas ruas, que significa mais engarrafamento, mais dióxido de carbono na atmosfera, que significa mais endividamento. Mas esse é o caminho. Redução do IPI significa menos recurso nas mãos do Poder Público para ser utilizado nos programas sociais. Significa inclusive as exigências maiores de PACs, PACs e PACs para fazer com que os automóveis continuem andando graças a viadutos e toda a infraestrutura do setor viário, e não do setor educacional, do setor de saúde, daqueles que serviriam para o rumo social.

Nós não vamos bem. Mas, para mim, o pior indicador de que não vamos bem, o de maior gravidade, é, ao lado da falta de credibilidade que vivemos hoje, a omissão desta Casa diante do rumo equivocado em que o Brasil está continuando. Um rumo equivocado sob as aparências de bom rumo. Nós não estamos desnudando a realidade, que é o nosso papel, para alertar as próximas gerações de que o nosso rumo, mesmo quando na aparência é bom, no substancial, é um rumo que não tem permanência ao longo da história.

Outro ponto, além dessa credibilidade que falta, é a nossa omissão diante das necessidades de mudanças de rumo neste País.

É nesse sentido, Sr. Presidente, que a gente precisa tomar algumas decisões. A primeira é em relação à retomada da credibilidade. Essa é a mais urgente. Hoje a democracia está tão falida, nós políticos estamos tão mal que eu creio, pelo que eu converso aqui, que a maioria de nós tem medo de aparecer nos jornais. O que um político mais deseja é aparecer nos jornais, é aquilo que faz dele um líder, é aquilo que faz dele um candidato com chance de eleição. Hoje a gente tem medo, porque, quando aparece no jornal, ou é porque fez uma denúncia, ou é porque levou uma denúncia em cima. Hoje tenho a impressão - posso estar enganado - de que a maior parte de nós lê os jornais e respira fundo quando diz: “Hoje eu não apareci”. Quero dizer que, se os outros não sentem isso, eu ultimamente tenho sentido o prazer de não aparecer, o que é a contradição mais absoluta de um político.

Não podemos continuar assim. E só tem um jeito: é termos a coragem de nos desnudarmos diante da opinião pública, mostrarmos todas as nossas fragilidades, todos os nossos equívocos, todos os nossos erros e dizermos que não vamos mais cometer isso. E punirmos aqueles que saíram da linha no que foi, de fato, ilegal. Pedir desculpas por aquilo que era legal, mas não era moral. Mas não podemos continuar fazendo de conta que as coisas não estão acontecendo.

Neste final de semana, eu li uma entrevista em uma revista em que um dos mais altos dirigentes desta Casa - na administração, não entre nós Senadores - acusa o outro grande dirigente desta Casa de verdadeiros crimes; não podemos ficar calados, fazer de conta que não houve nada. Já fizemos de conta que não houve nada depois do discurso do Senador Jarbas Vasconcelos aqui nesta tribuna. Deve fazer mais de três meses, e não fizemos nada. Agora nós vemos dirigentes acusando os outros de enriquecimento ilícito, de apropriação de recursos do Senado, de manipulação, e a gente não vai fazer nada?

Quero, Sr. Presidente, que o senhor tome como uma sugestão minha que façamos uma sessão em que os dirigentes desta Casa que se acusaram mutuamente por revista venham fazer o mesmo aqui diante de nós, passando pela televisão, ou que venham dizer que tudo isso não foi verdade, que assumam que gostam de brincadeiras e que não fizeram a denúncia verdadeira; assumam que são mentirosos ou assumam que os outros são ladrões, porque uma dessas duas coisas existe. Ou assumam que o povo todo é besta e que fizeram uma grande brincadeira com todos nós um pouco depois do 1º de abril.

Deixo aqui esta sugestão, que trarei por escrito, para que haja uma sessão, não sei se no plenário, se em alguma comissão, se na Mesa, mas aberta a todos os Senadores que quiserem. Muitos nem vão querer, mas o que cada um tiver a dizer sobre o outro que diga para nós Senadores, mas transmitido ao público, não para nós guardarmos; não temos esse direito.

Outra coisa é que mostremos as nossas coisas. Eu confesso que fico constrangido quando ouço aqui numa rádio um desafio para que os Senadores mostrem a lista de passagens. Fico constrangido quando vejo um jornalista do porte de Alexandre Garcia “desafiando”, esse foi o verbo, que os Senadores mostrem as listas de passagens que autorizaram. Eu gostaria que todos nós fizéssemos isso juntos, mas quero dizer que vou atender ao desafio dele e vou entregar a minha lista de todas as passagens que usei aqui no Senado. Porque ele fez o desafio. Eu não posso ficar calado. É verdade que ele fez o desafio dirigido sobretudo aos três Senadores do Distrito Federal. Então, vocês todos estão livres disso. Mas ele fez o desafio aos Senadores do Distrito Federal, com o argumento de que um Senador do Distrito Federal não precisa viajar para fora do Distrito Federal.

Eu sou Senador da República, meus cem projetos de lei dizem respeito ao País inteiro. O piso salarial do professor não foi para o Distrito Federal, porque o daqui é quatro vezes o piso salarial que foi criado. E dei a minha contribuição para que o salário do professor fosse desse tamanho quando fui Governador. Mas não foi o meu. O Governador Roriz deu aumento de salário, o Governador Arruda deu aumento de salário. Nós conseguimos que o salário aqui seja quatro vezes o piso nacional. Mas esse foi um projeto meu, do Senador Severiano, que colocou isso na Constituição. Ele e eu tivemos de viajar pelo Brasil.

Eu estou viajando pelo País para defender, porque sei que não vai passar aqui, a obrigatoriedade de que nós Parlamentares coloquemos nossos filhos em escolas públicas, daqui a sete anos - dou até um prazo. Isso não é para o Distrito Federal. Isso é para o Brasil. Ele fez o desafio e vou atender. Mas seria bom que todos fizéssemos isso, que mostrássemos tudo. Esse é um ponto de partida, sem o qual não vamos retomar a credibilidade.

Mas não vai bastar isso, Presidente. A credibilidade na omissão não serve de nada. Aquele que não tem nenhuma falha porque não usou nenhuma passagem porque não fez nada, não traz credibilidade. A credibilidade vem de você ter usado decentemente, mas ter usado para mudar o Brasil, para construir o Brasil.

Ficar deitado na cama, sem fazer nada, pode não merecer nenhuma crítica, mas não merece, nem ao menos, a referência, a chamar-se de Senador. Senador tem de estar na luta, tem de estar na briga.

         O segundo ponto, depois deste de a gente mostrar tudo o que acontece aqui ao povo inteiro, depois de pedir desculpas por aquilo que foi legal, mas indecente, e depois de punir aquilo que foi, além de indecente, ilegal: nós temos de mudar a maneira...

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - V. Exª já dobrou o tempo, mas nós vamos conceder mais tempo para que V. Exª atenda aos Senadores Geraldo Mesquita e Eduardo Suplicy, pela seriedade que o tema exige.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Com o maior prazer.

Foi trinta por cento a mais dos dez minutos. Vamos ver... Não dobrou, não.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Não, foi cem por cento a mais. E agora, pela seriedade que o tema exige...

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

A segunda coisa, antes de passar ao aparte...

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - ...V. Exª terá a participação de Geraldo Mesquita e...

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - A segunda parte, antes de passar ao aparte, é ganhar credibilidade. Nós temos de mudar isto aqui.

Falando em viagem, eu não consigo entender o Senador Suplicy não ter viajado o Brasil inteiro e o mundo inteiro para defender a Renda Mínima. O senhor fez muito bem em viajar, tanto quanto foi possível, porque o senhor lutou por um Brasil melhor. Como lutou Dante de Oliveira, viajando pelo Brasil inteiro, defendendo as “Diretas”; como Ulysses, defendendo a democracia. Eles lutaram por um Brasil melhor, não ficaram omissos, acomodados.

A segunda coisa é agirmos conforme uma pauta das mudanças que este País precisa. Nós vamos fazer aqui, no começo de junho, em homenagem ao Dia do Meio Ambiente, uma vigília pela Amazônia. Mas a gente vai precisar fazer vigília pelas crianças; pelos velhos, a gente fez até muitas, e o Senador Paim coordenou. Nós precisamos fazer vigílias aqui. Não no sentido da noite, mas no sentido de, durante o dia, ficarmos aqui e discutirmos que o rumo não vai bem e qual é o rumo que a gente quer para o futuro. Precisamos discutir qual é o rumo que a gente quer para o futuro do Brasil; quais são as mudanças que a gente quer para que a economia retome seu crescimento, mas distribuindo renda, e não concentrando, distribuindo qualidade de vida, e não concentrando, respeitando o meio ambiente, e não destruindo; fazendo com que a nossa sociedade produza bens de alto conteúdo de conhecimento, que são os bens do futuro, e não os bens apenas do passado, que são os bens chamados primários, sem conteúdo de inteligência dentro deles.

Nós temos que retomar a credibilidade e nós temos que debater o rumo que nós queremos para o nosso País. Se não fizermos isso, estaremos dando uma contribuição terrível para que o rumo, de fato, não apenas seja mau, pelo fim da democracia, mas, pior ainda, para que esse rumo mau chegue mais depressa ao seu destino. E que, em vez de décadas, a gente conte apenas em anos o fim de um processo tão suado, o processo de este País acreditar na democracia que este País está deixando de acreditar.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - É o aparte aí...

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Eu dei a minha contribuição, mas agora vou passar aos dois apartes, começando pelo Senador Geraldo Mesquita, que foi o primeiro.

O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - AC) - Senador Cristovam, primeiro faço referência às passagens, que V. Exª mencionou. Eu também não tenho o menor constrangimento em mostrar a lista de passagens que eu autorizei ao longo do meu mandato, porque o fiz dentro de um entendimento de que aquilo era possível e autorizado. Eu fui criticado recentemente pelo fato de levar a minha mulher cinco vezes, segundo os jornais, a Montevidéu. Sou membro do Parlamento do Mercosul, e ela me acompanhou. Às vezes, fico triste com a cobertura jornalística, porque você fala, e eles colocam apenas o que querem. Eu disse ao repórter o seguinte: “Olha, a minha mulher participa do meu mandato. Ela foi coordenadora da minha campanha. Ela vai a Montevidéu comigo, assim como vai ao interior do Acre empurrar carro na lama das péssimas estradas rurais que há lá, porque ela anda comigo em todo canto. Ela é a minha principal conselheira”. Nada disso foi divulgado. Eu não tenho o menor constrangimento, Senador, em divulgar, para quem quer que seja, a relação de passagens que eu concedi, porque, ao fazê-lo, eu estava cônscio de que aquilo era legítimo e ético também. Esse é um episódio, Senador Cristovam Buarque. Este Congresso Nacional vem se desmoralizando é por outras coisas muito maiores. Vou lhe dar um exemplo: medidas provisórias. Este Congresso há muito tempo deixou de legislar. E vou lhe dar outro exemplo. No dia em que este Congresso Nacional aprovar o orçamento impositivo, este Congresso resgata a dignidade que outrora teve e que precisa continuar tendo. Senador Cristovam Buarque, uma das funções principais do Congresso Nacional, que é a apreciação e votação do Orçamento da União, há muito tempo virou uma bela brincadeira aqui no Congresso Nacional. O Congresso Nacional finge que emenda, finge que vota, finge que tem grande influência no Orçamento da União, quando, na verdade, não tem nenhuma mais, nenhuma mais. E precisa tê-la.

(Interrupção do som.)

O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - AC) - Eu faço um desafio -nós vivemos um tempo de grandes desafios: que o Congresso Nacional delibere e adote o orçamento impositivo. Assim fazendo, o Congresso resgata a competência que lhe é própria de, junto com o Poder Executivo, determinar aonde vai um centavo, um tostão do imposto que o brasileiro paga, porque dessa competência, há muito tempo, o Congresso Nacional abdicou, não tem mais. Isso é que é uma vergonha. Isso é que é uma grande vergonha, Senador Buarque. O Congresso Nacional vem se desmoralizando é principalmente por causa disso, e por baixar-se, e por ficar de quatro aqui neste País, deixando o Executivo legislar a torto e a direito, sem que tome uma reação à altura do fato. O Congresso Nacional precisa reagir fortemente a isso.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Muito bem,Senador.

O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - AC) - Entende? É isso que desmoraliza o Congresso Nacional. Esses episódios lamentáveis, nós precisamos corrigi-los. Como diz o próprio Senador Mão Santa, são fatos administrativos que o Congresso tem, sim, o dever de se voltar para eles e corrigir aquilo que é distorção, mas, em suma, dois grandes fatos fazem com que este Congresso tenha se desmoralizado nos últimos anos perante os olhos da opinião pública brasileira: deixar o Executivo legislar no País a torto e a direito e abdicar da sua competência de influir decisivamente no Orçamento da União.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Senador, eu concordo inteiramente e há tempo venho insistindo. Sem desculpar qualquer erro meu ou de qualquer outro, a grande falha nossa não está na superfície...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - O grande defeito nosso não está na superfície, chamemos de ilegalidade ou de podridão: está na parte debaixo da sociedade, na engrenagem que nós não estamos lubrificando neste País. Venho dizendo há tempo. Estou de acordo com o senhor.

         Quanto ao constrangimento, quero dizer que o constrangimento que sinto é de ouvir um jornalista desafiando a isto, quando, talvez, fosse melhor que isto já fosse público há muito tempo, como eu sugeri em uma carta ao Presidente Sarney: todos os dias dizer as passagens que foram emitidas no dia, a pedido de tal, para tal pessoa, com tal destino e a tal custo, transparentemente. Todos os dias publicar isso.

         Quanto ao que a gente precisa fazer, estou de acordo. Mas vou até mais longe do orçamento impositivo: eu creio que nós deveríamos nos reunir e definir quais são as prioridades que a gente quer que o Poder Executivo ponha na LDO, que eles vão mandar daqui a um ou dois meses para cá. Por que nós ficamos esperando que o Poder Executivo...

(Interrupção do som.)

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - ...diga, na sua LDO - Lei de Diretrizes Orçamentárias, o que ele quer fazer? Por que nós não começamos aqui dizendo quais são as nossas prioridades, ainda que eles não as cumpram? Porque, quando chegar a LDO aqui com base nas prioridades definidas por nós, a gente pode perfeitamente mudar esse orçamento. A gente não tem mudado. Estou de acordo com o senhor: há uma crise muito mais profunda, que chamo de omissão.

A omissão tem o mesmo nível da corrupção. É menos visível, é mais cômoda, mas não é um nível para mim menor de gravidade da irresponsabilidade de um líder. Não aceito a idéia de líder corrupto, tampouco de líder omisso. E nós estamos sendo omissos como Casa, apesar do esforço insano de cada um de nós, e, eu diria, de todos nesta Casa, tentando agir. Mas, no conjunto, a gente não consegue. No conjunto, a gente não consegue funcionar.

Passo a palavra ao Senador Suplicy e garanto que vou usar o mesmo tempo que ele usar na fala dele ou menos para responder e não incomodar mais o Presidente.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Primeiro, Senador Cristovam Buarque, meus cumprimentos pela defesa da transparência em tudo aquilo que acontece no Senado Federal, inclusive no que diz respeito às passagens. Que tornemos sempre transparente toda e qualquer vantagem ou direito que porventura os Senadores tenham. No que diz respeito à primeira parte de seu pronunciamento, quando comentou a reflexão do Senador Fernando Collor de Melo, ex-Presidente, no jornal Valor Econômico, que expressou

(Interrupção do som.)

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - ...sua avaliação, ele diz: “Já acreditava, e continuo acreditando, que o Presidente Lula terá um terceiro mandato consecutivo. Ainda acho isso”. Para pouco depois dizer: “A única pessoa capaz de vetar uma nova reeleição seria o próprio Lula. Ele só não terá o terceiro mandato se não quiser”. Na verdade, V. Exª nos reportou aquilo que eu mesmo também ouvi do próprio Presidente Lula. Já faz acho que dois anos, mais de dois anos, no início de 2007, acredito, em uma reunião, em um jantar na minha residência, para a Bancada dos Senadores do PT, ele disse que não seria próprio para nós do Partido dos Trabalhadores defendermos um novo direito de reeleição. Para o PDT, V. Exª nos relatou, inclusive em plenário, que ele foi categórico em dizer que não seria adequado. Ele não tomou essa iniciativa, e inúmeras vezes reiterou sua posição. Como eu avalio que seja interessante, ele pode perfeitamente, na sua equipe, dentro do Partido dos Trabalhadores, estar preparando alguém, como assim o fez e está realizando, como a Ministra Dilma, por exemplo, para ser a candidata sucessora. Isso é saudável, é salutar, é dos princípios da democracia que o Presidente Lula defende. Seria interessante, em algum momento, dialogar aqui sobre isso com o próprio Senador Fernando Collor, porque, de um lado, se ele defende o direito à terceira reeleição, entre os fatores que ele considera para dizer que não seria bom a Venezuela entrar no Mercosul, está o direito indefinido de reeleição do Presidente Hugo Chávez. Esse é um assunto para debater com ele, mas eu avalio que V. Exª coloca como saudável que o Presidente Lula tenha dito a nós que não seria adequada uma terceira reeleição. Quem sabe noutra ocasião, em 2014, quando o direito constitucional potencialmente ele terá.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Eu não tenho a menor dúvida de que o Presidente Lula não está pensando em terceiro mandato. O que me preocupa também não é que o Senador Collor defenda um terceiro mandato para o Presidente Lula. O que me preocupa é que ele diz que, se o Presidente Lula quiser, vai ter. Isso é o reconhecimento da falência do Congresso, porque, “se ele quiser”, ele vai ter que fazer uma reforma constitucional. Significa que ele vai ter que ter maioria expressiva do Congresso. Dizer que, “se ele quiser”, ....

(Interrupção do som.)

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Peço a V. Exª que dê o mesmo tempo que ele, mas nem vou precisar de tanto.

Dizer que “se ele quiser, ele vai ter”, o pior é que pode ser até verdade. Pior é que é verdade. Mas é o reconhecimento da falência do Congresso. O Chávez, que todo mundo critica, pelo menos teve de fazer um plebiscito inteiro. Mas, segundo dizem aqui, se o Presidente Lula quiser, ele tem. Significa que o Poder Judiciário e o Poder Legislativo são poderes secundários diante do carisma, da força e da liderança do Presidente Lula.

Por isso, volto a insistir, Presidente, para concluir: nós não estamos em bom rumo no Brasil; estamos em um rumo muito perigoso; e esta Casa tem obrigação de parar esse rumo e fazer uma inflexão na História do Brasil.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/05/2009 - Página 14786