Discurso durante a 95ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Expectativas de adoção de medidas na Casa contra atos denunciados pela imprensa. Considerações a respeito de reportagem da revista Veja sobre o desejo do PSDB e do PT de haver uma eleição plebiscitária, não uma eleição democrática, da qual todos possam participar. Defesa da reforma política, da alteração da política econômica, do enfrentamento da guerra civil no País e de uma revolução da educação.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. ELEIÇÕES. :
  • Expectativas de adoção de medidas na Casa contra atos denunciados pela imprensa. Considerações a respeito de reportagem da revista Veja sobre o desejo do PSDB e do PT de haver uma eleição plebiscitária, não uma eleição democrática, da qual todos possam participar. Defesa da reforma política, da alteração da política econômica, do enfrentamento da guerra civil no País e de uma revolução da educação.
Aparteantes
Adelmir Santana, João Pedro.
Publicação
Publicação no DSF de 16/06/2009 - Página 23585
Assunto
Outros > SENADO. ELEIÇÕES.
Indexação
  • COMENTARIO, NOTICIARIO, IMPRENSA, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, LEGISLATIVO, IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, CONGRESSISTA, MELHORIA, REPUTAÇÃO, SENADO, NECESSIDADE, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DIVULGAÇÃO, INTERESSE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), REALIZAÇÃO, PLEBISCITO, ELEIÇÃO, MANUTENÇÃO, MANIPULAÇÃO, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, INSTITUIÇÃO DE PESQUISA, PRIMEIRO TURNO, ESCOLHA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DEFESA, PROPOSIÇÃO, AUTORIA, ORADOR, REGULAMENTAÇÃO, CANDIDATURA, POLITICO, AUSENCIA, VINCULAÇÃO, SUGESTÃO, ADOÇÃO, REFERENDO, REVOGAÇÃO, MANDATO PARLAMENTAR, SENADO.
  • IMPORTANCIA, REALIZAÇÃO, REFORMA POLITICA, ESPECIFICAÇÃO, EXTINÇÃO, NUMERO, REELEIÇÃO, CONGRESSISTA, CRIAÇÃO, FUNDO PARTIDARIO, DOMINIO PUBLICO, NECESSIDADE, MANUTENÇÃO, DIRETRIZES E BASES, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, REORGANIZAÇÃO, SETOR, PRODUÇÃO, GARANTIA, AUMENTO, EMPREGO, COMPROMISSO, PRESERVAÇÃO, EQUILIBRIO ECOLOGICO, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO, ADOÇÃO, PROVIDENCIA, COMBATE, CRIME ORGANIZADO, TRAFICO, DROGA, REVOLUÇÃO, EDUCAÇÃO, MELHORIA, EDUCAÇÃO BASICA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é impossível não subir a esta tribuna, nesta segunda-feira, sem tocar no noticiário que, todos esses dias, tem caído sobre o Senado em relação às suspeitas sobre nosso comportamento. Não é possível que a gente deixe passar mais tempo sem algumas decisões, sem algumas ações que permitam à opinião pública saber que esta Casa do povo tem de se comportar com respeito ao povo. E respeito ao povo significa, em primeiro lugar, total e absoluta transparência. Esta não é uma Casa que serve ao público, se o público não sabe do que aqui acontece. Em segundo lugar, esta Casa tem de tomar em sua mão o poder que lhe foi dado para agir a favor do povo. E a ideia hoje é a de que a gente age a favor de nós próprios. Precisamos mostrar que esta Casa tem o poder que o povo lhe deu, não que esta Casa age apenas por meio de submissão, de um lado, às medidas provisórias do Poder Executivo e, de outro lado, às medidas judiciais do Poder Judiciário. Hoje, temos de reconhecer isso. Se não agirmos, caminharemos para o abismo. Temos de enfrentar a imagem que hoje se faz desta Casa: nada de transparência, com decretos secretos; nada a favor do povo, mas, sobretudo, a favor da própria locupletação - essa é a imagem que se passa -; e de irrelevância. São três pontos fundamentais em relação aos outros Poderes.

Eu não poderia subir aqui sem tocar nisso. Espero que, nesta semana - a partir de amanhã, a esta Casa voltarão seus Senadores -, tomemos algumas medidas, procedamos a algumas ações.

Ao mesmo tempo em que o noticiário trouxe essas ideias, que, creio, devem ser debatidas com a presença de mais Senadores, também trouxe, Senador João Pedro - e fico feliz que o senhor esteja aqui -, uma notícia da revista Veja sobre o desejo do PSDB e do PT de haver uma eleição plebiscitária, não uma eleição democrática, da qual todos possam participar.

A verdade é que, hoje, desde as últimas eleições, não há dois turnos. O primeiro turno quem faz é a mídia. Quem faz o primeiro turno são os institutos de pesquisa. Então, desde um ano e meio antes da eleição, só existem dois candidatos. Ignoraram que a Constituição prevê esse instituto maravilhoso dos dois turnos, para que surjam, floresçam ideias, até dos menores partidos.

Defendo - o Senador Paim apresentou projeto de lei nesse sentido, e, há mais tempo, dentro de um complexo, apresentei um projeto muito maior - a possibilidade de as pessoas serem candidatas sem partidos. Todo mundo diz que isso enfraquece os partidos. Mas, hoje, com o caos ideológico neste País, não há partidos. Temos de deixar que alguém possa ser candidato por si próprio e tenha os votos pequenos, mas que traga suas idéias, mostre o que defende. Hoje, a gente não consegue fazer isso. Hoje, dois grandes partidos, cada um deles, chupam todas as forças políticas e apresentam dois candidatos. O resto fica, como se diz por aí, a ver navios. Quantas ideias estamos perdendo por que outros candidatos, pré-candidatos, não podem participar? O Senador Mão Santa mesmo tem sempre insistido nisso. Quanto a gente perde de ideias por não haver primárias! Mas o mais grave é que, a meu ver, essa ideia plebiscitária se dá entre duas forças muito parecidas.

Hoje, fala-se muito contra o terceiro mandato do Presidente Lula. A sensação que tenho, Senador João Pedro, é a de que estamos caminhando para o quinto mandato de uma mesma ideia: dois mandatos do Fernando Henrique Cardoso, dois mandatos do Presidente Lula e um próximo mandato, seja do Serra, seja da Ministra Dilma. É a mesma concepção. É a mesma concepção nas coisas boas, como a responsabilidade fiscal; é a mesma mentalidade numa coisa boa, chamada rede de proteção social, mas é a mesma mentalidade negativa do mesmo rumo do projeto do sistema produtivo, depredador da natureza, concentrador da renda. A gente não vê um discurso propondo mudanças. Deve haver candidatos que apresentem a necessidade de este País mudar de rumo. Não acabou a ideia de direita e de esquerda. As definições podem ser diferentes, mas têm aqueles que querem continuar no mesmo - e acho que tanto a candidata Dilma quanto o candidato Serra querem continuar naquilo que foi implantado a partir de Itamar Franco, na verdade -, apenas ampliando. A rede de proteção social, hoje, é bem maior com Lula do que foi com Fernando Henrique Cardoso. A responsabilidade fiscal, talvez, seja um pouquinho menor com Lula, mas, felizmente, mantém-se. Mas, no mais, é a mesma concepção.

E aí gostaria de trazer aqui, querendo quebrar essa ideia plebiscitária, quatro pontos que significariam, Senador João Pedro, ruptura com isso.

Na reunião desse fim de semana, em Teresina, para a qual os ex-Governadores do PT e os atuais Governadores foram chamados - tive a honra de ser incluído, com muito orgulho, como ex-Governador pelo PT -, eu disse: “O que caracteriza a esquerda no Brasil de hoje - e os Governos municipais e estaduais tem feito isso - é fazer a ruptura sem revolução na política e fazer uma revolução sem ruptura no social”. Explico: na ruptura sem revolução, saem as oligarquias tradicionais e entra o novo. O que o PT tem representado nos Municípios e nos Estados e o que o Presidente Lula representa também na sua característica pessoal, tudo isso é uma ruptura, sim, com as oligarquias passadas que dominaram este País durante todos os 120 anos da República: os doutores, filhos dos ricos. Essa é uma ruptura sem revolução, porque mantém o Congresso, mantém todas as instituições; não há revolução. Agora, os governos municipais e estaduais de esquerda, quando chegam lá, costumam fazer uma revolução sem ruptura. Como? Começam a mudar as prioridades. De fato, melhora a situação social. De fato, melhora a ética nos Estados e Municípios. Mas, no nacional, não temos visto essa revolução sem ruptura. E é ai que vou colocar quatro pontos em que essa revolução poderia ser feita.

O primeiro ponto dessa revolução é no que se refere a uma reforma política. Nem os dois mandatos do Fernando Henrique Cardoso, nem os dois mandatos do Presidente Lula trouxeram para o Brasil a renovação de uma reforma política. E não vejo os candidatos falando nisso; não temos, não recebemos deles propostas duras, rupturas - sem revolução, mas rupturas - do fim da reeleição, eu diria mesmo do limite ao número de reeleições para os parlamentares, porque acho que deveria haver; da criação do fundo partidário público, para evitar que haja dinheiro privado, financiando candidatos e depois cobrando desses candidatos, também para não haver dinheiro de sindicatos nas campanhas. Não vimos uma reforma política da parte desses dois lados. Por isso, digo: será um quinto mandato.

Como disse o Governador Jorge Viana - e de uma maneira muito precisa -: “No Acre não precisamos de terceiro mandato; já estamos há três mandatos com o voto popular”. E é verdade, dois mandatos dele, e, atualmente, o Governador, uma figura excelente, ex-Secretário de Educação, está no terceiro mandato, sem necessidade de mudar nada de Constituição.

Temo que a gente vai ter o quinto mandato sem as mudanças necessárias: primeiro, na reforma política; segundo, uma ruptura, uma flexão, uma mudança de rumo que mantenha as bases da política econômica - essas não devem mudar, porque são técnicas, não são políticas -, a responsabilidade fiscal, a abertura comercial. Isso não tem que mudar, porque é técnico. Não adianta querer fechar a economia brasileira, não se consegue hoje, não se deve, estamos em um mundo global. Não adianta querer romper, acabar com a responsabilidade fiscal, porque essa foi uma conquista.

E tenho a honra de dizer que eu era militante do PT e já defendia - e defendi com vigor - o Plano Real. Eu disse: vai gerar desemprego, mas vai trazer a estabilidade monetária, e depois o País volta a crescer.

Muitos foram contra. Lembro bem que, na campanha de 1998, o nosso colega Senador Mercadante foi duríssimo contra o Plano Real! Duríssimo! Inclusive, como economista, fez análises, dizendo que aquilo ia ser um fracasso. Eu fui e defendi. Cheguei ao ponto de, no meio da campanha presidencial do Lula, dizer: se o Presidente Lula vencer, deve manter o Ministro Malan por 100 dias em 1998. Em 2002, eu já dizia: não mais o Malan, por causa da crise de 1999, mas alguém que continue essa mesma base da política econômica.

Só que, e é aqui que quero chegar, manter a base da política econômica tem que vir junto com a reorientação do parque produtivo brasileiro. Não adianta, Senador João Pedro, continuarmos no quinto mandato desse mesmo projeto, baseando a economia brasileira na industria automobilística, na indústria de bens mecânicos.

Temos de fazer uma inflexão com três pontos fundamentais: primeiro, a garantia de uma política econômica que vise a gerar emprego e não de uma política econômica que despreze emprego; segundo, uma política econômica comprometida com o equilíbrio ecológico, com incentivos aos produtos que protegem a natureza e com altos impostos para aqueles produtos que a prejudicam. Hoje é o contrário. Hoje, acabamos com o IPI para o automóvel, que a gente sabe que é um dos vetores fundamentais do aquecimento global, que é um dos produtos que infernizam a vida urbana. Estamos indo na contramão. E o terceiro é o Brasil se orientar para uma economia do conhecimento. Produção de bens de alta tecnologia.

Esses três pontos não estamos vendo nos discursos dos dois candidatos que plebiscitariamente querem fazer, já no primeiro turno, a decisão do que seria o segundo turno.

Não podemos continuar com uma economia que caminha na base daquilo que foi importante nos anos 50 e 60, mas que, a partir do final dos anos 70, começou a ser uma produção velha, superada, que é a chamada economia baseada na indústria mecânica ou nos bens primários.

É óbvio que temos que continuar com a indústria mecânica e com produtos primários, que aumentam as exportações brasileiras, porque há uma demanda lá fora. É óbvio que temos que continuar. Mas isso não pode ser a base do futuro da nossa economia. A base do futuro da nossa economia não está no suco de laranja, está no chip; não está na exportação de ferro - que é necessária -, está na exportação dos robots que hoje a gente importa; não está na exportação de soja - inclusive, já se tinha um conteúdo científico para se produzir, sobretudo em alguns lugares -, está em exportarmos, cada vez mais, bens refinados, sofisticados, de alta tecnologia.

Essa reorientação da economia não está havendo no debate dos dois candidatos que, plebiscitariamente, querem decidir qual vai ser o futuro Presidente ou a futura Presidenta.

O terceiro ponto é a guerra civil. A gente não está vendo por parte dos candidatos clareza na proposta de como enfrentar a guerra civil que o Brasil atravessa - uma guerra civil que nada tem de ideológica; uma guerra civil caótica; uma guerra civil do crime organizado; uma guerra civil do tráfico de drogas; uma guerra civil de jovens abandonados na rua, com rifles, querendo sobreviver graças ao assalto e não ao trabalho. Nós não vemos uma proposta clara de mudança de rumo em direção à paz.

A palavra “paz” tem que entrar no discurso de quem quer ser Presidente da República do Brasil. E, nessa disputa plebiscitária entre duas forças muito paralelas, caracterizada por um conjunto de idéias que se formaram a partir dos anos 90, a gente não vê a palavra “paz”; como a gente não vê as palavras “reforma política”; como a gente não vê as palavras “manutenção da política econômica como inflexão da política de produção”.

E, finalmente, a revolução na educação. A gente não vê falar nisso. A gente vê continuar o mesmo desse bloco, que começou com o Fundef, no tempo de Fernando Henrique Cardoso, e evoluiu para o Fundeb, no do Presidente Lula. É a mesma coisa, só que se ampliando um pouquinho. A gente vê o grande aumento de tudo isso: positivo, Fundef e Fundeb são coisas absolutamente positivas. Não estou contra, mas não revoluciona, não serve para criar a base educacional que a gente precisa, para fazer a inflexão da economia na direção da produção de bens de alto conteúdo científico e tecnológico, de alto conteúdo de inteligência. Não serve!

A gente vê, por exemplo, no período Fernando Henrique Cardoso, o salto - uma das grandes coisas que aconteceram neste País - de número de estudantes universitários no setor privado. Muito positivo! Uma quantidade imensa de jovens que nunca pensou em ser estudante universitário passou a pensar. Presidente Lula deu um salto e criou o ProUni. Positivo! Mas não se fez a reforma universitária, porque não há como fazer uma reforma universitária séria, sem cuidar da pré-escola.

Mas os dois candidatos que querem disputar o plebiscito, para ver qual vai ser o Presidente, vão discutir muito mais quem vai conseguir explorar o pré-sal do que quem vai conseguir implantar uma pré-escola. A gente não vê essa discussão de princípios, de reorientação, de uma revolução que o Brasil precisa fazer, sem ruptura.

Volto a insistir: é uma ruptura na política, sem revolução, e uma revolução no socioeconômico, sem ruptura. As regras têm de continuar as mesmas: do mercado, da abertura comercial, da responsabilidade fiscal, mas mudando-se o produto. E para isso qualquer governo que quiser tem os instrumentos.

Agora mesmo, há uma medida provisória na Câmara que vai ajudar um pouco a dar mais incentivos ao setor produtor de ciência e tecnologia. O Presidente Lula mesmo está fazendo isso, mas é um passo tímido. Além disso, nós não vamos, Senador João Pedro, conseguir dar o salto radical para este País se transformar em produtor de bens de alta tecnologia só com incentivos: é preciso uma educação de base de alta qualidade para todos.

Eu vou passar a palavra ao Senador João Pedro, mas, antes, quase que concluindo, eu quero dizer que esta reportagem da revista Veja, que parece que nada tem a ver com a outra parte sobre a crise do Senado, ela é, talvez, tão importante quanto a crise aparente do Senado. Aparente, não porque não existe, aparente porque aparece, que é a crise ética; a outra não aparece, mas ela é igualmente importante ou talvez até mais, porque a crise que aparece ética, a gente corrige; na hora que a gente quiser a gente corrige aqui. Na hora que punir algumas pessoas, na hora que nos unirmos para acabar, por exemplo, com decisões secretas, a gente corrige a parte ética. A outra, não, a outra é estrutural, é fruto de um Senado que começou a se acostumar a ser um Poder sem importância. O povo está preocupado porque nós parecemos um Poder com corrupção, no comportamento de alguns. Mas a gente tem que se preocupar, também, por sermos um Poder sem força, sem vigor para transformar a sociedade. Para dar uma idéia, Senador João Pedro, dos 81 Senadores, não tem nenhum Senador que seja hoje candidato a Presidente da República. Na eleição passada, a gente tinha dois, eu e a Senadora Heloísa Helena; na anterior, Fernando Henrique Cardoso, Senador, candidato a Presidente da República.

Há uma tradição na história de que, desta Casa, saem candidatos a Presidente. Aqui tem grandes nomes que poderiam ser pré-candidatos pelos seus partidos.

O Partido dos Trabalhadores tem grandes nomes que poderiam ser pré-candidatos. Tudo indica que nenhum deles venceria. Não faz mal, mas poderiam levar suas ideias. Por que tolher a chance de Suplicy, Paim, Marina Silva ou João Pedro, que representa a Amazônia, saírem por aí dizendo suas propostas. Depois seria escolhida a Ministra Dilma. Não tem problema, mas ela teria de incorporar algumas das suas ideias.

Por que os outros partidos nem ao menos sonham; propõem lançar candidatos, como se houvesse um monopólio? Creio que a gente deveria, na reforma política, colocar um item dizendo: todo partido tem de colocar candidato a todos os cargos majoritários. É para isso que tem dois turnos, para que, no segundo turno, a gente possa fazer as alianças e escolher aquele que é o menos distante de nós, porque, no primeiro turno, a gente escolhe o que é mais próximo; no segundo turno, a gente escolhe o que é menos distante. Nós precisamos fazer com que haja candidaturas que tragam sonhos, não apenas exposição de power point indicando as obras que eles vão fazer.

Temo que o debate que vamos ter, plebiscitariamente, entre a Ministra Dilma e o Governador Serra, seja um debate absolutamente sem sonhos, absolutamente técnico, até porque os dois são pessoas de esquerda. Não dá para dizer que o Governador Serra é um homem de direita. Absolutamente, não é possível dizer isso, sobretudo para quem é da geração dele, como eu, e viu a luta que ele fez sempre do lado da esquerda; como também a Ministra Dilma é uma mulher de esquerda. Mas é uma disputa que, quando você olhar, tem alianças de direita dos dois lados. Dos dois lados têm forças altamente conservadoras apoiando. Por quê? Porque nenhum dos dois significa uma mudança de rumo, nenhum dos dois significa uma postura nova em relação ao Brasil, nenhum dos dois significa um projeto diferente para o Brasil. Não há dúvida de que já é um projeto muito melhor do que o que nós tínhamos vinte anos atrás. Ah, não tem a menor dúvida disso! Um projeto que tem responsabilidade fiscal, um projeto que tem, sim, uma rede de proteção social é muito melhor do que o que nós tínhamos vinte anos atrás; mas, melhor, não diferente - não diferente.

É uma simples evolução que acontecerá qualquer que seja dos dois candidatos que vençam, porque é uma mesma tradição, é uma mesma concepção, é a mesma visão de futuro.

Nós precisamos que esta Casa comece a trazer visões novas para o futuro do Brasil, Senador Mão Santa, visões novas de como não apenas ter uma rede de proteção social, mas como ter uma escada de ascensão social. E não venham dizer que ascensão social é a universidade. Ascensão social é a educação de base. Através dela, todos poderem disputar a universidade, e aí a gente não viu um salto transformador, um salto revolucionário.

Está pior ou melhor? Está melhor. Não vamos negar que vem melhorando. Desde o Governo Itamar Franco, vem melhorando bastante o processo, vem melhorando a educação, vem melhorando a rede de proteção social. Aliás, desde o Governo Sarney que essa rede de proteção social vem sendo criada, mas não houve nenhuma transformação dela em um instrumento de vigor, transformador da sociedade.

Eu lamento que o plebiscito seja entre duas propostas muito parecidas, Senador João Pedro. A diferença vai ser sutil; não vai ser uma diferença clara. É possível que sejam essas duas propostas parecidas que terão mais apelo eleitoral. Isso é verdade. Mas candidatura a Presidente não é apenas para ganhar com apelo eleitoral; é também para trazer sonhos novos, propostas novas. Como diz o Senador Mão Santa mais de uma vez, Rui Barbosa perdeu duas, mas trouxe o seu projeto, trouxe a sua visão.

É preciso trazer uma visão nova. E é aí que eu quero concluir antes de conceder o aparte. Dizer: esta Casa está pecando por não trazer essa visão nova para o Brasil. Esta Casa não está pecando só pelo noticiário negativo do ponto de vista do comportamento, está também pecando pela ausência de propostas nas prioridades e no destino para onde conduzir o País. Por isso eu comecei analisando, de uma maneira muito simples a primeira, tratando dois temas da revista Veja. Um que está em todos os meios de produção, Senador Adelmir Santana, que são aquelas notícias sobre medidas secretas, passagens de Senadores, horas extras, tudo isso. Todos os dias isso está saindo. Mas eu fiz questão de falar de uma outra noticia que só saiu na Veja. Essa ideia da procura de fazer com que não exista primeiro turno na próxima eleição presidencial, de que o Brasil ingresse já no segundo turno, freando o debate, que, aliás, eu creio que é o único ponto em que a gente pode dizer que houve um retrocesso no Governo Lula. No resto, acho que o Governo Lula só teve avanço. Teve um ponto de retrocesso: o debate ideológico. Até pelo tamanho carismático do Presidente Lula, que é capaz de aglutinar todo mundo, envergonha quem é contra e faz com que fiquem todos tão deslumbrados, que surge aquilo que uma filósofa chamou de silêncio reverencial, como disse a grande filósofa Marilena Chauí. Creio que estamos vivendo um momento de tolerância reverencial com o Governo Lula. A própria Oposição só bate fazendo crítica; ela não faz nenhuma proposta alternativa. Eu não tenho visto propostas alternativas saírem desta tribuna da parte da Oposição. Eles sobem aqui para bater em problemas éticos do Governo, para fazerem CPIs contra o Governo, mas propostas alternativas, mudanças de rumo, eu não vejo.

Até li que os Democratas estão pensando em apresentar um programa social alternativo para o Governo Lula. Mas, só se for agora; até aqui, não apresentaram nada, tampouco na economia: não há nada de diferente. Apenas críticas. Não tem havido propostas. Estamos meio paralisados. E essa situação pode ser, Senador Adelmir - eu disse um pouco antes -, mais grave do que os equívocos de comportamento de alguns dos Senadores em relação à ética, porque a ética a gente corrige; agora, a estrutura é difícil. Aquilo que está podre na superfície, um pouquinho de creolina resolve; agora, o que está enferrujado na estrutura, não tem creolina que resolva. Nem basta colocar óleo. É preciso mudar a própria engrenagem. É isso que a gente não tem visto. A palavra estrutura não aparece nos debates.

O PAC é um programa de aceleração - significa que estava vindo bem. Não é um programa de mudança do crescimento; não é PMC. É PAC, é aceleração. Você acelera o que vem bem, você não acelera o que vem mal.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador Cristovam Buarque, permita-me interrompê-lo. Regimentalmente, a sessão terminaria às 18 horas e 30 minutos. Eu prorrogo por mais meia hora para V. Exª concluir. E chega o Senador do Distrito Federal Adelmir Santana, que vai usar da palavra.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Não vou precisar, absolutamente, de meia hora, a não ser que o Senador João Pedro queira meia hora. Eu passo já a palavra para o aparte, Senador João Pedro, com muita honra minha.

O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Senador Cristovam, V. Exª está refletindo sobre o Estado brasileiro, sobre a situação política, e apresentou quatro situações que poderiam melhorar. Mas V. Exª tem uma matriz, que é a questão do debate esquerda/direita. Eu gostaria de levantar a seguinte questão - veja se V. Exª concorda: é sobre uma constituinte. Penso que a Carta Magna de 1988 foi um grande momento do Brasil, mas a Amazônia, o agronegócio, as Forças Armadas, a estrutura do Estado brasileiro... Uma série de estudiosos fala não só do Poder Executivo, do Legislativo, do Judiciário e de outros mecanismos. Eu quero concordar com V. Exª, mas penso que o momento já não é mais... Eu defendo a reforma política, mas nós precisamos ir além da reforma - os mandatos, o financiamento, o referendo revogatório. Se o Senador vai bem, por que não analisar no meio do mandato? Uma coisa rápida, com participação. O referendo revogatório é um mecanismo importante. Penso que ajuda ao Prefeito, ao Governador, ao Senador, ao Deputado ter um mandato mais participativo, mais cuidadoso, mais comprometido. Esse é um mecanismo que nós precisamos pensar em adotar no Brasil. Quer ver uma coisa? Já vi V. Exª fazer críticas sobre alguns detalhes do comportamento do Senado. E se a gente pensar em um Brasil unicameral? E se nós tivermos uma eleição, não no mesmo dia, mas no mesmo mês, para os mandatos de Prefeitos, Vereadores, Deputados e Presidente da República? Estou trabalhando um pouco isso, e não reeleição. Mandato de cinco anos, unicameral, referendo revogatório. Está indo bem o mandato? Num Brasil com os jornais, com a mídia que tem hoje, enfim, acho que nós precisamos disso. Nós estamos precisando. E eu estou defendendo isso, além da reforma tributária que está empacada e não sai por conta da visão que têm os Governadores sobre a questão tributária. Essa é a verdade. Está na Câmara. Então, um debate para uma Constituinte, para pensar o Estado brasileiro, a nova economia internacional, nacional, o Mercosul, a Amazônia. Quem sabe não é esse o caminho? Estou colocando isso para V. Exª, que é um pensador, um estudioso, um intelectual e um militante político. Estou enxergando um rumo para essas contradições, a angústia, o Senado. Enfim, nós precisamos de um momento em que a sociedade civil possa participar. Penso que o momento é uma Constituinte.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Veja como, se a gente fizesse este debate todos os dias nesta Casa, a gente avançaria. Por exemplo, eu já avancei um ponto, graças ao senhor. Eu já não vou mais falar em reforma política apenas. Vou falar em reforma política e do Estado. Eu não falei do Estado. Graças à sua sugestão, eu acho que um dos quatro pontos é a reforma política do Estado. Agradeço já a sua sugestão.

Agora, quanto aos detalhes. Eu sou favorável, sim, ao referendo revogatório. Mas eu proponho...

O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM. Fora do microfone.) - Para todos nós. Para todo mundo.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Não. Sobretudo para todos nós. Mas eu proponho mais. Proponho a possibilidade de se fazerem dois referendos revogatórios: um, do mandato individual de cada parlamentar e; dois, da Casa inteira. Eu não sou favorável ainda ao plebiscito, mas, às vezes, quando eu vejo uma crise dessas, até tenho vontade de um plebiscito. Mas, mesmo sem o plebiscito, deveríamos criar um instituto por meio do qual - não o Presidente da cabeça dele, como é possível no Parlamentarismo - se pudessem convocar eleições no meio do mandato para renovar tudo. Eu acho que hoje um plebiscito desses seria muito positivo para o Brasil. Fui muito criticado quando disse que, em um plebiscito sobre fechar-se ou não o Congresso, ganharia talvez - eu até disse - fechar. Talvez eu fosse menos criticado se dissesse que, com um plebiscito para convocar novas eleições, antes de 2010, poderíamos ter uma renovação dos quadros políticos.

Sobre mandato coincidente. Eu não defendo, porque eu acho que cada eleição é uma aula, é uma escola, é um momento pedagógico. Então, é bom que haja muitas eleições, embora isso seja muito cansativo. Eu acho que não é ruim; sobretudo, isso sim, que jamais seja com prorrogação de mandato. Com prorrogação de mandato, não pode.

Mas finalmente, ainda pegando o gancho do que falou o Senador João Pedro, eu acho que a grande diferença entre o debate plebiscitário dos dois candidatos é que eles vão discutir como acelerar mais, e eu gostaria de ver o debate de como transformar mais.

Nós temos duas visões hoje. Não vamos chamar de esquerda ou direita, mas a visão dos que querem acelerar e a dos que querem transformar. Eu acho pouco para o Brasil acelerar. Acelerar nesse rumo que está aí é levar a acabar a Amazônia em pouco tempo, é aumentar a desigualdade, porque, mesmo com a redução da desigualdade na renda, está aumentado a desigualdade no acesso à saúde, à educação. Está aumentando. Então, é entre acelerar ou transformar.

Deixemos o debate de como acelerar para o segundo mandato. Mas vamos fazer no primeiro mandato, vamos deixar que, no primeiro mandato, surja a possibilidade, Senador Mão Santa - e está na linha do que o senhor vem falando -, de haver também discursos de como transformar, mesmo que essa transformação no final não receba os votos que merece para ir ao segundo turno, mas que pelo menos fique registrado que o debate não pode ser apenas como acelerar, mas também como transformar o Brasil.

Era isso, Sr. Presidente, o que eu tinha a falar.

Agradeço...

O Senador Adelmir quer dar um aparte, com o maior prazer.

O Sr. Adelmir Santana (DEM - DF) - Senador Cristovam, eu vinha ouvindo o discurso de V. Exª, e uma coisa me chamou a atenção quando V. Exª falava do não surgimento de candidatos nas várias agremiações partidárias, especificamente no Senado. Mas o que mais me chamou a atenção foi quando V. Exª disse que deveria haver um dispositivo para fazer com que fosse obrigatório, nas eleições majoritárias, os partidos apresentarem candidatos, porque todos nós sabemos que, no regime democrático, o objetivo dos partidos é o poder. Eu acho que em boa hora - o senhor já fez discurso mais ou menos nessa mesma direção -, em boa hora, o senhor levanta essa questão de transformarmos o primeiro turno já numa eleição plebiscitária. Era a oportunidade de, em 90 dias, em 120 dias, enfim, o que regular a legislação - porque cada eleição é uma lei nova - para se fazer um pleno debate, um amplo debate nas várias agremiações partidárias. Aí nós iríamos chegar à conclusão de que não há necessidade de tantos partidos no Brasil.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - É verdade.

O Sr. Adelmir Santana (DEM - DF) - Não há tantas ideologias que necessariamente demandem trinta partidos políticos. É preciso que criemos mecanismos - e já foi tentado; entretanto, não tivemos sucesso nessa questão - para concentrar isso. Não há tantas ideologias assim, tantas doutrinas políticas, que tornem necessários trinta, trinta e tantos partidos. Então, eu acho que, além de todo o conteúdo do seu discurso, e eu ouvi bem os pontos que V. Exª colocou, isso me chamou a atenção. Acho que esse é um bom dispositivo para se buscar numa futura reforma, - se é que vamos ter essa reforma no futuro - a obrigatoriedade, para que o partido subsista, para que ele exista, ele dispute as eleições majoritárias onde ele estiver formado. Do contrário, ele não tem objetivos. Quer dizer, o objetivo é única e exclusivamente formar coligações - e até vem aquelas suposições de o ser um cartório para registro de candidaturas, ou para conchavos outros que ficam na obscuridade. Então, acho que hoje o senhor levantou uma questão que me chamou a atenção. A necessidade de encontrarmos um caminho da obrigação de cada partido político, onde estiver formado, participar do processo da eleição majoritária onde ela se der, no Estado, no Município e na União. E aí sim, iríamos saber efetivamente as intenções de cada um desses partidos quando assumisse o poder.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Senador Mão Santa, veja como este debate é importante. Eu tinha imaginado que a obrigatoriedade de cada partido ter candidato aos cargos de Prefeito, Governador e Presidente, de todo partido ter, era para levar ao debate. O senhor trouxe uma idéia que eu não tinha pensado: isso vai acabar com uma porção de partidos de aluguel, porque eles não vão ter condições de manter candidato a Governador em todos os Estados; eles não vão ter condições de ter candidato a Presidente. Então, eles desaparecem, e ficam os partidos... Nesse lado, eu não havia pensado. É um lado talvez até mais importante do ponto de vista do pragmatismo do que o que estava em vista, que era favorecer o debate de para onde conduzir o Brasil.

Então, agradeço-lhe esse argumento a favor, que talvez seja até mais importante do que o que eu tinha pensado. De fato, é a melhor maneira de resolver esse problema, que é o que todos queremos, de reduzir o número de partidos. Ficarão aqueles que tiverem substância suficiente para apresentar um candidato a Presidente, a Governador e a Prefeito. Além disso, esses partidos, em número menor, seriam obrigados a se diferenciar entre eles, a ter substância cada um deles e a propor coisas diferentes. Não vamos dizer que seriam de esquerda ou direita, mas seriam sim os da aceleração e os da transformação.

O plebiscito que se está tentando hoje, desde o primeiro turno, entre um candidato e uma candidata, os dois são do lado da aceleração, nenhum dos dois tem a visão da transformação, e isso é muito ruim para o Brasil. Como disse antes, isso leva a um quinto mandato: dois do Fernando Henrique, dois do Lula e mais um agora de quem vier, quinto mandato da aceleração. Não dá para continuar apenas com isso. Pior ainda, antigamente a renovação era entre São Paulo e Minas e agora é só São Paulo sempre, porque não importa onde nasceram esses candidatos, mas a visão é a visão pura e simples de uma economia que já vem há 60 anos sendo implantada no Brasil e que de fato acelerou o Brasil mas não o transformou.

Era isso, Sr. Presidente, que eu tinha para falar.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/06/2009 - Página 23585