Discurso durante a 110ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Voto de pesar pelo falecimento do Deputado Federal e médico José Aristodemo Pinotti.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Voto de pesar pelo falecimento do Deputado Federal e médico José Aristodemo Pinotti.
Publicação
Publicação no DSF de 02/07/2009 - Página 28925
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, DEPUTADO FEDERAL, MEDICO, PROFESSOR, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ELOGIO, VIDA PUBLICA.

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Para encaminhar a votação. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu divido a homenagem necessária, justa ao ilustre médico, eminente Parlamentar José Aristodemo Pinotti, com outro tema que eu considero inescapável neste momento por que passa o Senado Federal e - por que não dizer? - a Nação brasileira. E quero anunciar uma decisão que tomei.

            Antes de mais nada, quero deixar bem claro que Pinotti era uma figura de enorme humanidade. Médico de minha esposa, eu dizia há pouco a um jornalista com quem almoçava que, certa vez, ela, consultando-se com ele por telefone, disse que estava sentindo nódulos nos seios, num dos seios, e ele pediu que ela apalpasse e, por telefone, disse que não era câncer. Por telefone. Disse: “Vamos fazer os exames, mas não é câncer; estou lhe dizendo isso por telefone”.

            Era uma figura absolutamente genial, um médico humanitário, um parlamentar sem jaça, um grande Secretário de Saúde do Estado de São Paulo, um amigo que se foi e que merece toda esta justa homenagem.

            Por outro lado, Sr. Presidente, devo anunciar à Casa a decisão que tomei e julgo ser feliz contar com a presença de V. Exª neste momento. Fui vítima de uma matéria não assinada e aqui já bastante dissecada por mim em discurso que generosamente a Mesa permitiu que perdurasse por cerca de quatro horas, com dois tópicos. Aqui, contra conselho de amigos que, no fundo, no fundo, já se acostumaram como esta água parada do Senado - “não fale mais nisso” -, como se eu fosse algum culpado, estou aqui para falar nisso, com dois tópicos fundamentais. Nem me refiro à covardia de citarem minha mãe, que jamais foi minha dependente. Eu fui dependente dela. Eu. Ela era dependente do Senador Arthur Virgílio Filho e teve, de 1985 a 2000, nenhuma ajuda do Senado, pelo que me informou a minha irmã, Ana Luiza. Nós nem sabíamos que o Senado prestava esse tipo de auxílio a viúvas de Senadores. E, mais ainda: alertados por um amigo de minha família, o procurador aposentado da Fazenda Nacional, Dr. Armando Marques da Silva, minha irmã organizou, a partir daí, o seguro Bradesco, pagando as internações de minha mãe, que passou os cinco últimos anos de sua vida na UTI do Hospital Samaritano, no Rio de Janeiro. O Senado passou a pagar os médicos, e a família, que arcava com as despesas antes, passou a arcar com os extras, que só os extras não eram pouca coisa. Até isso, que, se irregularidade houvesse, seria muito mais uma irregularidade da forma como o Senado estaria tratando as viúvas dos Senadores do que propriamente algo solicitado por mim, que não solicitei nada a quem quer que seja a título de favor, até porque isso transcorreu sempre com muita naturalidade por aqui.

            Mas dois tópicos visavam me atingir, e atingir naquilo que eu tenho de mais precioso, que é inútil quem quer que seja tentar, porque quem quer que seja não vai conseguir, que é a minha honra pessoal.

            O tal empréstimo desse cidadão chamado Agaciel Maia a mim. Eu estava na França - já expus; não vou ser longo -, numa viagem tipicamente de classe média. Eu sou classe média, com todas as chances de ter mudado de padrão se eu fosse desonesto, como tem gente na vida pública que não se recusa a ser. Quatro filhos, minha mulher e eu. Quatro passagens viabilizadas por Smiles e duas compradas: a do meu filho, que é parlamentar, e a minha própria.

            Chego ao hotel, uma situação de vexame: não aceitam meus cartões, precisava se liberar o cartão. Eu ligo para um amigo, Carlos Homero Nina, e peço a ele que fale com sua esposa, que era funcionária recém-aposentada do Banco do Brasil, com muita influência no Banco do Brasil. Se eu quisesse dinheiro, eu teria recorrido a amigos, como os que me socorreram em seguida. Eu queria a funcionária do Banco do Brasil.

         Depois, liberaram meus cartões, com a ação que ela não pôde executar e que esse amigo recorreu, para resolver questão, ao Sr. Agaciel Maia, de quem ele era próximo e a quem eu sempre dizia que não se tratava de pessoa boa, por meu instinto de índio; de pele branca, mas índio. Eu digo: eu não confio nesse homem. Esse homem não tem cara boa. Se ele não tem cara boa é porque ele não é bom; Deus não ia fazer isso com ele, não ia dar essa cara para ele se ele fosse bom. Deus colocou aquela cara, e a alma levou para o fascies o que ele tinha de intenção em relação ao Senado, em relação à República.

            Mas muito bem. E me disse depois o Carlos Homero: a alternativa era eu ficar no vexame, que duraria até segunda-feira, quando haveria certamente a intervenção do Embaixador, que decerto não deixaria de me socorrer. O hotel foi muito compreensivo comigo, com a minha família. Ou a alternativa que Agaciel abriu para Carlos Homero era de, no sábado, o Banco do Brasil fazer uma transferência de conta para conta, que podia ser a de Agaciel ou a de Carlos Homero. E Carlos Homero disse: “Eu não tenho dinheiro”. Então, foi a de Agaciel.

            Na segunda-feira, o advogado Fernando Neves, o próprio Carlos Homero Nina e o arquiteto Antonio Augusto Rebelo quitaram essa dívida com ele, e eu, como figura de classe média, quitei com eles a dívida na medida em que recebi a minha restituição de Imposto de Renda. Longe de serem os tais dez mil dólares que uma figura irresponsável, acostumada a malas e malas de dinheiro, citou, eram três mil e trezentos euros, que representaram o... Tudo documentado nos Anais da Casa, inclusive com os bilhetes e com as contas angustiadas que minha mulher fazia sobre o que poderia ter em cada cartão de alguém que, como eu, já tinha sido Líder do Governo, Ministro, Prefeito de uma cidade importante como Manaus.

            Muito bem. Eu, então, chego ao Brasil e me dizem: “Foi feito assim e assado”. Eu quito a dívida. E essa... Eu submeti a vários amigos hoje: eu quero saber qual dos senhores não teria caído nessa armadilha - se é que foi uma armadilha, porque, no começo, nem parecia. Não me senti, em nenhum momento, devedor do Sr. Agaciel; não me senti, em nenhum momento, preso a ele, até porque, se me sentisse, eu não teria me manifestado, mas teria me calado, como vi tanta gente se calar.

            Na verdade, resolveram alvejar quem não se conformou, em princípio o único que não se conformou com o quadro de desmandos a que chegou o Senado. Eu não me conformei. Não calei minha voz. Cheguei a forçar apartes de Senadores. A Senadores tão ilustres, tão éticos, tão respeitados no País eu dizia: V. Exª não vai me apartear? V. Exª também não? V. Exª também não? Houve um dia em que três foram, compulsória e constrangedoramente, obrigados a me apartear. Ultimamente, fiz o mesmo com outro Senador tão ilustre. Eu disse: não vai me apartear? É preciso me apartear.

            Eu não podia esperar flores dessa gente. Espero mais. O que quiserem será bem recebido por mim. O que quiserem será muito bem recebido por mim, porque estou pronto para deixar bem claro que demarquei o campo e que, com ou sem companhia, com muita ou com pouca companhia, eu não abro mão das minhas convicções. Isso é uma coisa clara, nítida.

            O segundo ponto é extremamente constrangedor para mim, sim. Daquelas tolices todas ali levantadas, o fato é que eu tive um assessor que, em algum momento, foi com licença minha para o exterior. E não basta eu dizer que me arrependo desse gesto. Eu soube depois que o Senado financiaria viagens de assessores... Enfim, estou fazendo um requerimento a V. Exª pedindo um levantamento de todos os funcionários, comissionados ou efetivos, que porventura tenham recebido autorização e benefício do Senado para fazerem curso no exterior.

            Em princípio, não sou contra curso no exterior, acho que o funcionário volta melhor, volta mais qualificado. Mas o fato é que esse funcionário foi com a minha autorização e recebendo dinheiro do Senado. Vamos deixar isso bem claro. Ficou lá por três meses, depois voltou, passou um mês aqui, e novamente voltou para lá e ficou um período bastante mais longo. Estou pedindo que precisem o período, de que mês a que mês, de que ano a que ano.

            E tenho dito a jornalistas, tenho dito a pessoas todas que, em relação ao primeiro episódio, nenhuma preocupação, porque eu agi absolutamente conforme qualquer pessoa de boa-fé agiria. Não pedi ajuda ao Sr. Agaciel em nenhum momento. Essa ajuda veio pela prestimosidade de um amigo, que foi ressarcido. Nada a ver com isso.

           Agora, em relação ao outro, não. Se V. Exª me perguntar “V. Exª, Senador Arthur Virgílio, tem algo a justificar?”, eu direi que não tenho. Não tenho desculpa em relação à outra matéria. Não tenho desculpa. Vou fazer uma revelação estarrecedora à Casa, mas não sem antes anunciar uma providência que julgo saneadora. Conversei com minha esposa hoje e disse: Olha, eu não consigo conviver...” É muito fácil jogar, tem uma crise enorme no Senado, é muito fácil jogar... A imprensa já não está, praticamente, falando mais nada disso. Várias pessoas já disseram: “Você é estúpido em reviver essa coisa”. Como eu sou estúpido, então, estou aqui revivendo essa coisa, porque tomei a decisão de minha esposa vender bens nossos, dela, para quitar todo esse débito do funcionário que recebeu do Senado sem aqui estar prestando os seus serviços.

            Eu não sei se já houve caso semelhante. Tomara que tenha havido. Eu quero saber se houve casos de pessoas que foram financiadas pelo Senado para fazer cursos no exterior. Mas a minha decisão está tomada, eu quero saber isso e vou ver, então, a forma de pagar quanto seja, Senador Jarbas Vasconcelos.

            Agora, a minha mulher esteve no Banco do Brasil - isso é de estarrecer - e ouviu uma coisa estranhíssima de uma pessoa, que disse a ela: “Dona Gorete, nós respeitamos muito seu marido. Sabemos que seu marido entrou nisso mais porque essa gente quer alvejá-lo. Ou seja, se ele fosse mais um silente, mais um calado, mais um temeroso, se ele fosse mais um que tivesse se acovardado diante desse quadro, ele não estaria nisso”.

            Eu digo mais: se eu tivesse querido entrar para essa camarilha, para essa quadrilha, eu não só não estaria nisso, não só não teriam envolvido o meu nome, como eu estaria rico, coisa que eu me recusei a ser até hoje.

            Eu não sou rico, Senador Jarbas, por opção própria. Fui Prefeito da minha cidade e fui Ministro-Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República. Eu mandava na Petrobras, eu mandava nos outros ministros. Eu não fui rico porque não quis.

            Fui Líder de Governo e vejo maquinações e mais maquinações envolvendo coisas que cheiram mal aqui na tramitação de certas medidas provisórias. Entram com 30 artigos e saem com 450 artigos, cada um deles representando o atendimento a um determinado interesse. É coisa que você não prova, mas coisa que você fareja.

            Essa pessoa do Banco do Brasil disse à minha esposa: “O seu marido não tem nada com isso, mas não pense que esse caso foi o único, não. Esse homem fazia isso muito com vários Senadores aqui. Fazia isso muito com vários Senadores.”

         Então, está mais do que na hora, Sr. Presidente, de a comissão indicada por V. Exª para fazer as sindicâncias, que agora tem um membro do Ministério Público Federal e um membro do Tribunal de Contas da União, pedir e obter - certamente obterá - a quebra do sigilo bancário desse cidadão Agaciel Maia, para que nós possamos ver se é verdade ou não que ele tinha esse tipo de ligação com Senadores com assento nesta Casa, porque o fato é que deveria agora ser aberto gabinete por gabinete, coração por coração, mazela por mazela de todos que imaginem que devam se credenciar à legitimação da vida pública brasileira aqui pelo Senado. Todos!

            Mas de uma coisa eu tenho absoluta convicção: fui alvejado injustamente no episódio do tal dinheiro de Agaciel. E embora alvejado justamente no episódio do funcionário que não trabalhou, tenho certeza absoluta de que só fui alvejado porque não calei, só fui alvejado porque não silenciei, só fui alvejado porque não me abastardei, só fui alvejado porque não me ajoelhei!

            Hoje, estava cheio de boatos. Eu estou aqui pronto; pronto para colocar as minhas verdades até o final do meu mandato e até o final dos meus dias. No momento em que eu não tiver mais as minhas verdades para defender, eu estarei me demitindo da vida, não da vida pública, mas da vida.

            Portanto, faço aqui - e vou formalizar por escrito - a solicitação de que a Casa, pelos seus escaninhos legais, verifique o montante desse débito, que não é mais do funcionário, mas meu, para com a Casa, que vai ser ressarcido com o sacrifício pessoal meu e de minha família, mas justo sacrifício, porque, afinal de contas, é dinheiro que pertencia à Nação brasileira e que não podia ter sido usado dessa forma. Se isso é algo que representa alguma coisa, muito bem. Para mim, representa muito: representa a satisfação que eu tinha que dar à Nação, sem dúvida, mas a mim, como homem, como ser humano, como homem público sobretudo.

            Portanto, estou aqui solicitando também que a comissão peça a quebra do sigilo bancário do Sr. Agaciel Maia para sabermos até que ponto que um homem que tinha bunker aqui na Casa, que tinha esconderijo aqui na Casa, que tinha batcaverna aqui na Casa não teria imbricações absolutamente promíscuas, absolutamente torpes, quem sabe, com os Senadores. Comigo nunca teve. Se tivesse, eu estaria na bancada do silêncio. Como não tem, eu estou aqui...

(Interrupção do som.)

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Um minuto mais. Não preciso mais do que um minuto.

            Como não tem, não teve e não terá, eu estou aqui cumprindo com o meu dever, e, neste momento, um dever de consciência, o que me dá enorme alívio. Mas esta Casa precisa ser passada a limpo, sob pena de quaisquer atitudes que quaisquer pessoas tomem, Sr. Presidente, de V. Exª ou de qualquer um de nós, não serem atitudes que realmente mergulhem fundo na crise estrutural do Senado Federal, que vem de muito tempo para trás.

            No mais, eu imagino que o meu gesto possa ser também - e quero que seja interpretado também - como mais uma homenagem à honra desse homem ilustre e digno que, em vida, se chamou José Aristodemo Pinotti.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

            Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/07/2009 - Página 28925